28.10.10

«Ich bin ein Berliner» - Agora é que dava jeito!


A Helena vive em Berlim e conta como é:

«O abono de família alemão é assim: 184 euros por criança, 190 para o terceiro, 215 para o quarto e seguintes. Uma família com seis filhos receberia mensalmente 1203 euros.»

Vai haver cortes? Sim, mas para rendimentos mais altos do que «250.000 euros anuais, ou 500.000 no caso de ambos trabalharem».

E continua a explicar: «Os custos de alimentação aqui são semelhantes aos portugueses. As rendas de casa são aceitáveis (nós pagamos, numa das melhores zonas de Berlim, cerca de 6 euros por metro quadrado). (…) Os cuidados de saúde das crianças são gratuitos (do champô para piolhos até às férias na praia ou nas termas para tratar a asma). O ensino é mais barato que em Portugal, porque (ainda) é a escola que empresta a maior parte dos livros. As famílias que têm menores rendimentos recebem participações especiais para as crianças terem acesso a actividades extra-escolares ou participarem nos passeios da turma.
Entre a Alemanha e Portugal: tanto mar, tanto mar.»

Nem sequer a 3.000 quilómetros, Helena, mas manda-nos notícias do além!
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9 comments:

Vitor M. Trigo disse...

Joana, ouvi recentemente na rádio uma mãe Portuguesa na Alemanha que se lamentava de:
1. Não existirem pre-escolas, o que "obrigava" as mães a desempregarem-se ou a pagarem fortunas em escolas privadas (mais do que normalmente é um ordenado) para lhes ficarem com os filhos enquanto elas trabalham;
2. Ela ainda por cima tinha um filho com deficiência e dizia não existirem quisquer apoios para estas situações não-standard.
Podes pf colocar esta questão à Helena para esclarecimento.
Obrigado.

Joana Lopes disse...

Vítor
A Helena está neste momento em viagem, mas verá certamente isto para a semana.
Acho muito estranho esse testemunho, tudo o que tenho ouvido vai na linha do que a Helena diz. Agora se há pré-escolas ou não, ignoro.

Vitor M. Trigo disse...

Eu tb não estou a duvidar da Helena, que não conheço. Gostava era de ouvir a sua opinião sobre isto.
Aproveitando para maior precisão:
A figura central da entrevista era uma senhora ligada (creio que médica) à saúde nos USA.
Essa senhora dizia que os apoios à saúde e às famílias em Portugal eram "coisas do outro mundo" e só criticados pelos portugueses porque "não sabem como é no estranjeiro, em particular nos USA".
Foi nesta linha que apareceu o depoimento da tal portuguesa que vive na Alemanha e tem um filho em idade pre-escolar com deficiência ignorado pela SS Alemã.
Lamento não ter mais dados. Mas isto, eu ouvi.

Joana Lopes disse...

Vítor,
No meu post, está link para o da Helena. Porque não pões lá a questão?
Como te disse, li que ela ia passar estes dias em viagem (La Toussaint, na Europa, é mais que um dia de feriado).
As C. de Comentários fizeram-se para isso... Eu também só a conheço da blogosfera!

Helena Araújo disse...

Lamento, só agora li estes comentários.
Caso ainda esteja aqui alguém:

É verdade que a Alemanha ainda é uma sociedade bastante conservadora, que parte do princípio que cada família tem um pai que assegura o seu sustento (no que é muito apoiado pelo Estado) e uma mãe que cuida das crianças.
Mas parece-me que essa mãe exagerou um pouco. A realidade é que não há creches e pré-escolas em quantidade suficiente. Mas também as há. Os meus filhos começaram a ir para uma creche estatal aos 6 meses de idade. Era um grupo de 15 crianças com idades das 8 semanas aos seis anos, três educadoras, quatro salas (uma para actividades comuns e refeições, uma para brincar, duas para dormir, segundo as idades), aberto das 6:30 às 17:00. Custava menos de 300 marcos por criança (comida incluída); eu ganhava uns 1000, já limpos de impostos e contribuições, trabalhando como tradutora, a meio tempo.
Uma outra solução a que muitas famílias recorrem: amas.
Sobre casos de crianças com deficiência: de facto, sei pouco. Mas ouvi há anos falar-se de um caso de uma mãe com deficiência mental que tinha assistentes sociais por turnos, a viver com a família dia e noite, para que a criança ficasse junto da mãe mas não corresse riscos devido à deficiência mental.
Também sei de vários organismos de caridade, sobretudo cristãos, que dão trabalho a uma multidão de voluntários. Ainda outro dia me telefonaram da Caritas, a perguntar se eu podia ajudar uma jovem estudante com um filho de um ano, que está grávida outra vez.

Em suma: parece-me que essa mãe teve o azar de não encontrar a porta certa. Também se pode dar o caso de não ser uma "residente oficial".

Uma vez, aconteceu-me uma burocratice absurda: por ter saído do país e ter ficado 17 dias para além do prazo permitido (fiquei dois anos fora, e só podia ter ficado x dias) fui corrida do sistema. De repente estava na Alemanha com dois miúdos alemães a frequentar a escola, e sem acesso ao SNS. A situação só se regularizou depois do regresso do meu marido, quando ele recomeçou a trabalhar na Alemanha e nos integrou no seu seguro de saúde. Na altura estive para mandar umas cartitas a pedir a regularização deste disparate, mas acabei por deixar andar.

Helena Araújo disse...

Joana, desculpe encher-lhe a caixa de comentários com tantos detalhes, mas lembrei-me de um que é muito interessante: uma amiga minha, com três filhos cujos pais se tinham posto a andar (para o estrangeiro, não pagavam nada), engravidou de novo. Não teve coragem para abortar, e nasceu a quarta criança. O Estado sustentou esta família de forma digna (como já contei: habitação, saúde, educação, vestuário e mais umas largas centenas de euros) até a mais nova fazer três anos. Aí, a mãe meteu-a num infantário, e começou a trabalhar a tempo inteiro. Os outros três, já na primária, passavam algumas horas da tarde num centro de actividades estatal. O filho mais velho, um miúdo muito inteligente, conseguiu fazer o secundário no liceu mais elitário da cidade.
A única explicação que tenho para essa mãe portuguesa é que não estaria dentro do sistema. Ou então, moraria numa aldeia ou cidade pequena, sem estruturas de apoio.

Também sei de dois casos de crianças com "síndroma de Ondina" (deixam de respirar quando adormecem) para quem a segurança social paga alguém que passe a noite acordado, em casa da família, para os pais poderem dormir. Uma das famílias teve até direito a dois turnos de ajudantes (para a noite e parte do dia) para a mãe poder fazer outras coisas. E nem sequer tinha um emprego fixo.

Quanto aos cuidados de saúde comparados por países:
- Tenho feito óptimas experiências em Portugal. Sempre que os meus filhos precisam de ir ao hospital devido a pequenos acidentes, são bem tratados e atendidos com rapidez. (Em compensação, os amigos portugueses contam-me histórias de arrepiar.)
- Tenho feito ainda melhores experiências na Alemanha. Para as crianças, é tudo gratuito. A minha filha, que partiu há tempos um pé, pôde ser vista pelo melhor ortopedista da cidade, que lhe receitou umas palmilhas especiais e as sessões de fisioterapia que forem precisas. Não pagámos um cêntimo.
- Quando morávamos nos EUA fizemos um seguro de saúde que, para ser mais barato, estava circunscrito a uma única cadeia de hospitais. Para ter uma segunda opinião, teríamos da pagar do próprio bolso. Os medicamentos também não eram gratuitos. Para dois anos não foi mau, mas não se compara de modo algum ao que temos na Alemanha.

Joana Lopes disse...

Muito obrigada, Helena, por todos estes elementos tão elucidativos. Vou assegurar-me de que o V. Trigo as leu.

Vitor M. Trigo disse...

Obrigado Helena pelo cuidado e detalhe da informação.
Obrigado Joana pela hospitalidade e seguimento da conversa.

Foi-me muito útil conhecer estes casos que a Helena relatou, e não estranharia que o tal caso que contei (por ter ouvido na rádio) não passasse de algo pontual, ou fora do sistema como a Helena sugeriu.

O tema central da outra senhora era a "péssima" assistência nos USA comparada com a "maravilhosa" assistência pública em Portugal, tão mal compreendida pelos portugueses (segundo ela).

En passant, citou o tal caso na Alemanha, mas não era esse o tema.

Por tudo, obrigado pelo tempo que vos tomei.

Helena Araújo disse...

Joana, Vitor,
não agradeçam - para mim, comentar neste blogue é um prazer.
Acredito que o SNS português seja melhor que o americano. Nos EUA, até há pouco ninguém era obrigado a ter seguro de saúde, e quem não o tivesse ficava livre para ir morrer na praia, caso fosse necessário.
Um exemplo a que assisti em San Francisco: o caso de um pai de família que, ao saber que tinha cancro, se suicidou para não arruinar completamente a família com os custos do tratamento.
Claro que os do Tea Party virão dizer que qualquer um pode trabalhar um pouco mais e fazer um seguro de saúde qualquer. Ou bastante mais, e fazer um seguro de saúde bom.
De Portugal, conheço os inaceitáveis períodos de espera, e os esquemas: os pequenos presentes que se dão ao porteiro ou à senhora da secretaria ou ao médico privado que também trabalha no hospital público...

Uma outra questão é: quanto é que se paga, e o que é que se recebe?
O sistema de saúde estatal alemão funciona mais ou menos assim: um assalariado paga cerca de 8% do seu salário, o seu empregador paga 7% (ou seja: a Caixa recebe 15% do salário). Se o assalariado tiver família a seu cargo (mulher sem emprego) o seguro abrange todos. Se a mulher tiver um salário, faz obviamente os descontos. Depois, as consultas médicas são praticamente gratuitas, tal como operações cirúrgicas e tratamentos hospitalares.

Os seguros privados são individuais. É preciso pagar por cada filho.
Um problema: quanto mais se ganha, mais se paga para o seguro de saúde estatal, pelo que fica mais barato passar para um privado. O princípio da solidariedade é posto em causa, porque os mais ricos escapam ao sistema.
Vendo um pouco mais de perto, há muitos outros problemas, mas tenho dó dos leitores, e não conto. ;-)