20.1.11

A Internacional Socialista e o caso tunisino


Sobre "valores e princípios"

Tudo indica que as coisas, na Internacional Socialista (IS), funcionam assim: um partido que imponha uma feroz ditadura no seu país, que ocupe todos os escalões da Administração Pública com "boys" e homens de mão tornando-se um verdadeiro Partido-Estado, que pilhe os recursos colectivos e seja a cúpula política de uma gigantesca rede organizada de corrupção e nepotismo, "reflecte os valores e princípios que definem o nosso movimento" desde que vá mantendo o poder, nem que seja à custa de repressão e da violação sistemática dos direitos humanos.

Logo, porém, que se deixe apear e não ressuscite ao terceiro dia, passa imediatamente a não "reflectir os valores e princípios que definem o nosso movimento" e a IS já não o quer como membro.

Foi o que aconteceu ao RCD, partido do deposto ditador tunisino Ben Ali, que, três dias depois de este e família se terem metido no seu avião privado (acompanhados, segundo os media, de 1 500 barras de ouro do Banco Central) e fugido para a Arábia Saudita, foi expulso da IS por ter deixado de "reflectir os valores e princípios que definem o nosso movimento".

Isto é, durante os 23 anos em que esteve no poder, o RCD de Ben Ali prendeu, torturou, roubou e submeteu o povo tunisino sem que isso incomodasse a IS. Quando já não pode fazê-lo, é que os "os valores e princípios" da IS se ofendam.

O MPLA e o FPI de Laurent Gbagbo (entre vários outros) que ponham as barbas de molho.

Manuel António Pina, no JN.
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3 comments:

Anónimo disse...

O Mundo foi e é feito de alianças, Joana. Os membros do PCP viam na URSS um potencial aliado caso a revolução portuguesa não tivesse sido estrangulada pelo PS: que importavam os gulags, então? Os EUA estão hoje apoiados na emissão de dívida que a China lhes compra, que lhes importa a falta de direitos humanos? E por falar nestes dois, o PCP actualmente não mantém perante a China uma submissão semelhante à de Obama?

Se a IS tivesse deixado de apoiar a ditadura tunisina antes, talvez o movimento teocrático tivesse ocupado o seu lugar e hoje o país fosse uma ditadura ainda pior. Penso que não adianta de nada darmo-nos ao purismo radical se isso constitui apenas e só um atalho para a perda do poder. O lirismo é muito bonito...

Joana Lopes disse...

«Se a IS tivesse deixado de apoiar a ditadura tunisina antes, talvez o movimento teocrático tivesse ocupado o seu lugar e hoje o país fosse uma ditadura ainda pior.». Não vejo porquê, caro Anónimo. E de realpolitik em realpolitik, chegámos a situações hoje deploráveis.

Anónimo disse...

A realpolitik pró-URSS terá ajudado por exemplo o PCP a financiar-se, a formar quadros e outras ajudas antes do 25 de Abril. Não que a nossa revolução não fosse possível sem recorrer a um aliado pouco recomendável, mas foi um atalho. E a realpolitik Carlucci foi a que acabou com a revolução. Por isso, a alternativa à realpolitik, por vezes é outra realpolitik. A não-realpolitik é para os líricos.

Quanto ao que eu disse sobre a IS, talvez esse mau aliado tenha sido um mal menor para manter a Tunísia como um Estado laico. Vamos a ver se isso se mantém, agora com eleições livres.