30.5.11

Utopia com pés na terra


Duas semanas depois de 15 de Maio, os «acampados» decidiram permanecer na Puerta del Sol e na Plaza de Catalunya. Não sei se nas 797 localidades espalhadas pelo mundo inteiro, que até hoje se solidarizaram com a iniciativa espanhola, existem mais ou menos discussões acaloradas do que em Portugal sobre aplauso ou condenação das mesmas. Mas, por cá, a ajuizar pelas controvérsias que ontem inundaram alguns blogues, os ânimos estão longe de se acalmar.

Nada tendo a ver com a repulsa de alguns, e não me revendo no «nim» de outros, um texto encontrado hoje no Publico.es15-M: La nueva utopía tiene los pies en el suelo – reflecte o meu posicionamento em relação ao que tenho visto e ao que tenho lido: «Aconteça o que acontecer, o 15-M deixou uma pegada que não poderá ser apagada como se nada se tivesse passado. E marcará todo o conjunto das esquerdas, gostem ou não os seus dirigentes».

O artigo cita um grande número de analistas e merece ser lido na íntegra. Retiro algumas afirmações: «La mayoría de propuestas son muy sensatas y tienen un apoyo abrumador en las encuestas desde hace tiempo», «Cualquier político que aspire a ganar debería escuchar a este movimiento porque sus opiniones han calado muchísimo», «No se diluirá si la plaza se agota. Y como tiene un método organizativo propio y tremendamente eficaz gracias a las redes sociales, en cualquier momento podrá volver a la plaza». E, sobretudo, «en dos semanas han logrado que se vuelva a hablar de política y con una seriedad impresionante».

Claro que o Rossio não é a Puerta del Sol, e não pretendo extrapolar nem tirar conclusões fáceis do que é necessariamente diverso, mas é do mesmo tipo de acontecimento que estamos a falar. E como acabo de ler que está em preparação uma manifestação mundial, anunciada para 15 de Outubro, mais vale retirar as vendas dos olhos e olhar para a realidade que aí vem – inevitávelmente.

Por tudo isto, custa-me muito perceber (ou percebo?...) a recusa apriorística de alguma esquerda em aderir, escutar, participar, TER ESPERANÇA. Em vez de achincalhar, condenar, sublinhar defeitos e perigos ou aconselhar caldos de galinha.
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4 comments:

Helena Romão disse...

É uma "esquerda" status quo, pelo menos a que andava ontem a lançar provocações... e que é na realidade tão à esquerda que basta dizer-lhes o nome do partido por extenso para ficarem ofendidos.

Também há as esquerdas do "ainda um dia vão todos acordar e perceber repentinamente que nós vimos a luz e nós é que temos razão", o que só pelo facto de serem várias explica muito!

E no entanto, como muito bem diz hoje o Fernando Alves na sua crónica da TSF, quando algum político se quer promover, fazer passar por bem-pensante, honesto, preocupado, etc., diz-se sempre à esquerda dos outros. Ser de esquerda é assim entendido como uma promoção e eles sabem que é de tal forma consensual que o usam nas campanhas políticas. Não usariam se achassem que isso lhes poderia fazer perder votos, como Paulo Portas com cravos e a clamar que nalguns aspectos está à esquerda do PSD a 5 dias do fim da campanha. Todas as palavras são medidas ao milímetro e Paulo Portas nenhuma delas é inocente.

Jorge Conceição disse...

Idêntica posição negativista teve a esquerda francesa (leia-se PCF e a central sindical a ele afecta) no Maio de 1968, para no final se tentar apropriar da movimentação conseguida...

Joana Lopes disse...

Só há pouco ouvi o Fernando Alves, Helena.
De resto, a ver vamos...

Joana Lopes disse...

Claro que teria tido todo o sentido referir Maio de 68, Jorge, mas nem «ousei»: mesmo os grandes entusiastas do Quartier Latin da década de 60 (sem lá terem posto os pés, claro) não admitem agora a comparação. Vá lá saber-se porquê, mas estou com pouca pachorra para algumas polémicas.