23.4.11

Abril (9)

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Esperar não é saber

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Quem sabe faz a hora,
Não espera acontecer.
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Um olhar português sobre a Islândia


Por Luis Alves (especialista em temas dos países nórdicos, é responsável pelo blogue mokkikunta.org , co-editor do site Lusofin.com (comunidade de portugueses na Finlândia) e membro do magazine diário online Ovi Magazine, magazine diário sobre a Finlândia em inglês).

Entre 1991 e 1994, países nórdicos como a Noruega, a Suécia e a Finlândia passaram por traumáticas crises económico-financeiras. Anteriormente a esse período, estes países tinham um sistema de taxa de câmbio fixa e uma moeda sobrevalorizada, resultado de uma taxa de inflação alta, maior do que no núcleo de países do Sistema Monetário Europeu. Essa inflação e a sobrevalorização da moeda tiveram como causa a expansão do crédito bancário e a desregulação do mercado de capitais na segunda metade dos anos 80. Os mercados de capitais estavam desregulados na altura, aumentando assim a oferta de crédito, provocando o incremento da dívida do sector privado, da procura interna e dos activos e conduzindo ao agravamento do défice de conta corrente da balança de pagamentos.

Passados sete anos, na Islândia, outro país nórdico, os bancos também estavam desregulados - um cenário ideal para a acumulação de dívida no sector bancário. A crise desencadeou-se em 2008, quando os bancos islandeses se tornaram incapazes de refinanciar as suas dívidas de curto prazo. Historicamente, o colapso bancário da Islândia é o maior sofrido por qualquer país em relação ao tamanho de sua economia. Antes do colapso do sistema bancário, a dívida dos três maiores bancos da Islândia (Glitnir, Landsbanki e Kaupthing) excedia aproximadamente seis vezes o seu produto interno bruto (€14 mil milhões).

Sendo um mercado interno de pequena dimensão (a Islândia tem apenas 318 mil habitantes), os bancos islandeses financiavam a sua expansão através do mercado de empréstimos interbancário e através de depósitos no exterior. Esta situação, em conjunto com o endividamento das famílias e com as práticas de impressão de moeda do Banco Central da Islândia, conduziu ao agravamento da taxa de inflação. As altas taxas de juro (relativamente ao Reino Unido e à Zona Euro) encorajaram os investidores estrangeiros a efectuar depósitos em moeda islandesa, sobre-estimando o seu valor real - no início de 2007, a Coroa islandesa(ISK) era uma das moedas mais sobrevalorizadas do mundo.

O caso islandês, anterior à crise da dívida soberana na Zona Euro, veio demonstrar que o processo de globalização exige uma grande capacidade de adaptação à mudança, havendo ganhadores e perdedores, tanto entre estados-nação, como no interior destes. Mesmo nos países mais desenvolvidos, as desigualdades sociais acentuam-se, visto que os sistemas económicos globais necessitam apenas do sucesso de uma minoria da população.

Não é por acaso que, nos países nórdicos, existe atualmente uma opinião pública contrária a resgates financeiros do sistema bancário, pois não é compreensível como o Estado pode injetar biliões de euros no sistema financeiro, em detrimento da aplicação de fundos em áreas sociais e ambientais que necessitam de urgentes investimentos.

A questão que se pode colocar é a de que como pode ser preservado o essencial do "modelo nórdico" - e em especial a Islândia, com as suas características próprias - no que diz respeito à sua filosofia de sólidos mecanismos coletivos de partilha de riscos. Ao dizer não à garantia sobre a dívida aos ingleses e holandeses no último referendo nacional, o eleitorado islandês está a dizer que as dívidas privadas não devem ser colocadas em cima dos ombros dos contribuintes, que, de facto, nada tiveram a ver com o assunto. Na verdade, os mercados financeiros tomam decisões que podem dramaticamente afectar milhões de contribuintes não participantes nas suas transações e que não foram contabilizados nos preços de mercado.

E como sempre, numa crise deste género, emerge o confronto entre a opção de uma forte intervenção do Estado no sistema dos mercado financeiros e a visão "free market" de não interferência com as forças naturais do mercado. Ambas as táticas terão provavelmente sérios custos para a economia. A primeira poderia induzir uma recessão económica não tão intensa, mas muito prolongada no tempo - uma provável estagnação económica durante muitos anos sob atenta supervisão governamental. A segunda opção poderia ser mais intensa, conduzindo a uma uma severa recessão ou depressão, mas poderia permitir uma recuperação económica mais rápida.

Dada a relativa rapidez com que os islandeses estão a sair da sua grave crise financeira e económica (2008-2011), tendo sobrevivido ao colapso total do seu sistema monetário, começa a fazer algum sentido acreditar numa solução política que combine uma "destruição criativa" com uma forte participação cívica e democrática onde se faça ouvir a voz do povo, contrabalançando o caráter antidemocrático das instituições financeiras.

(Via Jorge Nascimento Rodrigues no Expresso online.)
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22.4.11

Pinturas de 1974 - Um filme

Em vésperas do 25 de Abril, republico um post em que é divulgado um documentário precioso, pouco conhecido. É da autoria de Manuel Costa e Silva e foi-me disponibilizado por Fernando Matos Silva.

No dia 10 de Junho de 1974, um grupo de quarenta e oito artistas plásticos pintou, em Lisboa, um mural que viria a desaparecer, num incêndio, em 1981. Entre os pintores, muitas caras conhecidas: Júlio Pomar, João Abel Manta, Nikias Skapinakis, Menez, Vespeira, Costa Pinheiro, etc., etc.



(Pode ser necessário esperar um pouco antes do início do filme)
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O inevitável é inviável - Agora em desenho

O inevitável é inviável: Manifesto dos 74 nascidos depois de 74

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Somos cidadãos e cidadãs nascidos depois do 25 de Abril de 1974. Crescemos com a consciência de que as conquistas democráticas e os mais básicos direitos de cidadania são filhos directos desse momento histórico. Soubemos resistir ao derrotismo cínico, mesmo quando os factos pareciam querer lutar contra nós: quando o então primeiro-ministro Cavaco Silva recusava uma pensão ao capitão de Abril, Salgueiro Maia, e a concedia a torturadores da PIDE/DGS; quando um governo decidia comemorar Abril como uma «evolução», colocando o «R» no caixote de lixo da História; quando víamos figuras políticas e militares tomar a revolução do 25 de Abril como um património seu. Soubemos permanecer alinhados com a sabedoria da esperança, porque sem ela a democracia não tem alma nem futuro.

O momento crítico que o país atravessa tem vindo a ser aproveitado para promover uma erosão preocupante da herança material e simbólica construída em torno do 25 de Abril. Não o afirmamos por saudosismo bacoco ou por populismo de circunstância. Se não é de agora o ataque a algumas conquistas que fizeram de nós um país mais justo, mais livre e menos desigual, a ofensiva que se prepara – com a cobertura do Fundo Monetário Internacional e a acção diligente do «grande centro» ideológico – pode significar um retrocesso sério, inédito e porventura irreversível. Entendemos, por isso, que é altura de erguermos a nossa voz. Amanhã pode ser tarde.

O primeiro eixo dessa ofensiva ocorre no campo do trabalho. A regressão dos direitos laborais tem caminhado a par com uma crescente precarização que invade todos os planos da vida: o emprego e o rendimento são incertos, tal como incerto se torna o local onde se reside, a possibilidade de constituir família, o futuro profissional. Como o sabem todos aqueles e aquelas que experienciam esta situação, a precariedade não rima com liberdade. Esta só existe se estiverem garantidas perspectivas mínimas de segurança laboral, um rendimento adequado, habitação condigna e a possibilidade de se acederem a dispositivos culturais e educativos. O desemprego, os falsos recibos verdes, o uso continuado e abusivo de contratos a prazo e as empresas de trabalho temporário são hoje as faces deste tempo em que o trabalho sem direitos se tornou a norma. Recentes declarações de agentes políticos e económicos já mostraram que a redução dos direitos e a retracção salarial é a rota pretendida. Em sentido inverso, estamos dispostos a lutar por um novo pacto social que trave este regresso a vínculos laborais típicos do século XIX.

O segundo eixo dessa ofensiva centra-se no enfraquecimento e desmantelamento do Estado social. A saúde e a educação são as duas grandes fatias do bolo público que o apetite privado busca capturar. Infelizmente, algum caminho já foi trilhado, ainda que na penumbra. Sabemos que não há igualdade de oportunidades sem uma rede pública estruturada e acessível de saúde e educação. Estamos convencidos de que não há democracia sem igualdade de oportunidades. Preocupa-nos, por isso, o desinvestimento no SNS, a inexistência de uma rede de creches acessível, os problemas que enfrenta a escola pública e as desistências de frequência do ensino superior por motivos económicos. Num país com fortes bolsas de pobreza e com endémicas desigualdades, corroer direitos sociais constitucionalmente consagrados é perverter a nossa coluna vertebral democrática, e o caldo perfeito para o populismo xenófobo. Com isso, não podemos pactuar. No nosso ponto de vista, esta é a linha de fronteira que separa uma sociedade preocupada com o equilíbrio e a justiça e uma sociedade baseada numa diferença substantiva entre as elites e a restante população.

Por fim, o terceiro e mais inquietante eixo desta ofensiva anti-Abril assenta na imposição de uma ideia de inevitabilidade que transforma a política mais numa ratificação de escolhas já feitas do que numa disputa real em torno de projectos diferenciados. Este discurso ganhou terreno nos últimos tempos, acentuou-se bastante nas últimas semanas e tenderá a piorar com a transformação do país num protectorado do FMI. Um novo vocabulário instala-se, transformando em «credores» aqueles que lucram com a dívida, em «resgate financeiro» a imposição ainda mais acentuada de políticas de austeridade e em «consenso alargado» a vontade de ditar a priori as soluções governativas. Esta maquilhagem da língua ocupa de tal forma o terreno mediático que a própria capacidade de pensar e enunciar alternativas se encontra ofuscada. Por isso dizemos: queremos contribuir para melhorar o país, mas recusamos ser parte de uma engrenagem de destruição de direitos e de erosão da esperança. Se nos roubarem Abril, dar-vos-emos Maio!

Alexandre de Sousa Carvalho – Relações Internacionais, investigador; Alexandre Isaac – antropólogo, dirigente associativo; Alfredo Campos – sociólogo, bolseiro de investigação; Ana Fernandes Ngom – animadora sociocultural; André Avelãs – artista; André Rosado Janeco – bolseiro de doutoramento; António Cambreiro – estudante; Artur Moniz Carreiro – desempregado; Bruno Cabral – realizador; Bruno Rocha – administrativo; Bruno Sena Martins – antropólogo; Carla Silva – médica, sindicalista; Catarina F. Rocha – estudante; Catarina Fernandes – animadora sociocultural, estagiária; Catarina Guerreiro – estudante; Catarina Lobo – estudante; Celina da Piedade – música; Chullage - sociólogo, músico; Cláudia Diogo – livreira; Cláudia Fernandes – desempregada; Cristina Andrade – psicóloga; Daniel Sousa – guitarrista, professor; Duarte Nuno - analista de sistemas; Ester Cortegano – tradutora; Fernando Ramalho – músico; Francisca Bagulho – produtora cultural; Francisco Costa – linguista; Gui Castro Felga – arquitecta; Helena Romão – música, musicóloga; Joana Albuquerque – estudante; Joana Ferreira – lojista; João Labrincha – Relações Internacionais, desempregado; Joana Manuel – actriz; João Pacheco – jornalista; João Ricardo Vasconcelos – politólogo, gestor de projectos; João Rodrigues – economista; José Luís Peixoto – escritor; José Neves – historiador, professor universitário; José Reis Santos – historiador; Lídia Fernandes – desempregada; Lúcia Marques – curadora, crítica de arte; Luís Bernardo – estudante de doutoramento; Maria Veloso – técnica administrativa; Mariana Avelãs – tradutora; Mariana Canotilho – assistente universitária; Mariana Vieira – estudante de doutoramento; Marta Lança – jornalista, editora; Marta Rebelo – jurista, assistente universitária; Miguel Cardina – historiador; Miguel Simplício David – engenheiro civil; Nuno Duarte (Jel) – artista; Nuno Leal – estudante; Nuno Teles – economista; Paula Carvalho – aprendiz de costureira; Paula Gil – Relações Internacionais, estagiária; Pedro Miguel Santos – jornalista; Ricardo Araújo Pereira – humorista; Ricardo Lopes Lindim Ramos – engenheiro civil; Ricardo Noronha – historiador; Ricardo Sequeiros Coelho – bolseiro de investigação; Rita Correia – artesã; Rita Silva – animadora; Salomé Coelho – investigadora em Estudos Feministas, dirigente associativa; Sara Figueiredo Costa – jornalista; Sara Vidal – música; Sérgio Castro – engenheiro informático; Sérgio Pereira – militar; Tiago Augusto Baptista – médico, sindicalista; Tiago Brandão Rodrigues – bioquímico; Tiago Gillot – engenheiro agrónomo, encarregado de armazém; Tiago Ivo Cruz – programador cultural; Tiago Mota Saraiva – arquitecto; Tiago Ribeiro – sociólogo; Úrsula Martins – estudante
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21.4.11

Entretanto em Itália

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No passado dia 12 de Março, Riccardo Muti acabara de reger o célebre coro dos escravos «Va, pensiero, sull'ali dorate», do terceiro acto de Nabucco, e o público do Teatro da Ópera de Roma aplaudia incessantemente e gritava bis! Muti voltou-se então para a plateia e, depois de recordar o significado patriótico do «Va, pensiero» (*), pediu ao público presente que o cantasse, juntamente com a orquestra e o coro do teatro, como manifestação de protesto patriótico contra «a ameaça de morte» contida nos cortes do orçamento da Cultura, planeados pelo governo italiano.

(*) Importa recordar que «Va Pensiero» foi uma espécie de hino informal dos patriotas do Risorgimento e, daí, ogrande conteúdo  emocional que tem para os italianos.



(Contributo de Jorge Conceição)
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Parece ficção?


… mas não é, garanto eu: são magníficas as lagoas de Miscanti e Miñiques,
em San Pedro de Atacama.


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Poupança em 5ª feira santa?


Nos idos de 80, numa ponte a meio de um daqueles longos fins de semana de Junho, entre Camões e Santo António, encontrei no Algarve o meu amigo Pedro (nome verídico), então a braços com a falência iminente de uma fábrica de que era o principal sócio. Contentíssimo, para meu grande espanto.

- «É que estou a poupar 500 contos! É o prejuízo que tenho por cada dia em que a fábrica trabalha.»

Raciocínio plausível do governo para a misteriosa decisão de conceder tolerância de ponto, hoje, aos funcionários públicos?
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20.4.11

Leaks?

No Facebook, há de tudo como na botica. Mais de 15.000 pessoas acedem a Facebook Leaks, uma página humorística que publica algumas pérolas, como a desta imagem (clicar para ler melhor).

O perigo é que os leitores fiquem um pouco baralhados e se julguem nesta página quando lêem a de Cavaco Silva que nela decidiu comunicar com os portugueses e queixar-se dos outros europeus.
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Abril (8)

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Companys, si sabeu
on dorm la lluna blanca,
digeu-li que la vull
però no puc anar a estimar-la,
que encara hi ha combat.

Companys, si coneixeu
el cau de la sirena,
allà enmig de la mar,
jo l'aniria a veure,
però encara hi ha combat.

I si un trust atzat
m'atura i caic a terra
proteu tots els meus cants
i un ram de flors vermelles
a qui tant he estimat,
si guanyem el combat.

Companys, si enyoreu
les primaveres lliures,
amb vosaltres vull anar,
que per poder-les viure
jo me n'he fet soldat.

I si un trist atzar...

(Via Mariana Avelãs no Facebook)
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Perdas e ganhos


Quando o Zé Neves acelera e escreve quase todos os dias, os posts saem-lhe cada vez melhores e (para mim...) acertam no alvo. É o caso de «Saber perder também é uma forma de ganhar», que eu assinaria da primeira palavra ao ponto final.

Que PCP e Bloco tenham decidido não participar nas reuniões com a troika financeira é certamente discutível, não se trata de uma questão transcendente que mereça desviar as atenções da orquestra que toca no Titanic, mas é útil que as ondas de choque que alguns têm provocado, e que nada têm de ingénuo, encontrem pela frente textos como este. Porque é sempre bom, e cada vez mais necessário, separar as águas.

Alguns excertos e recomendação de leitura na íntegra.

«O Daniel queria que o Jerónimo de Sousa e o Francisco Louçã tivessem ido reunir com o FMI e que no fim tivessem dito aos jornalistas que acreditavam que as suas críticas ao FMI haviam sido minimamente levadas em linha de conta pelo próprio FMI. À semelhança do que fez Carvalho da Silva. Ora, uma e outra coisa não são perfeitamente comparáveis. Eu acho bem que Carvalho da Silva tenha ido reunir com o FMI, tal como acho bem que Louçã e Jerónimo não tenham ido. (…)

O que está em causa nestas reuniões, porém, é uma coisa muito diferente. E que tem que ver com princípios. Que interpelam os partidos de modo diverso do que interpelam os sindicatos. Os sindicatos reúnem com quem tem poder. Os partidos reúnem com quem tem poder mas um poder democraticamente legitimado. Estas reuniões do FMI com os partidos servem, sobretudo, para dar legitimidade a um programa de governo que se imporá a todo e qualquer partido que vença as eleições. (…)

É o próprio FMI que o afirma: trata-se de garantir o apoio da maior parte dos partidos de modo a evitar que o resultado das eleições – com essa chatice que são os governos minoritários, a heterogeneidade da vontade popular, a instabilidade política, a democracia e outras comichões que irritam os “mercados” – possa anular o trabalho de consolidação que agora começa a ser feito. (…)

Não sou um defensor do "quanto pior, melhor", mas também não creio que o melhor meio para melhorar as coisas seja procurar simular pequenas vitórias no que é uma clamorosa derrota. A esquerda, os trabalhadores, os benfiquistas, a democracia - como queiram - perderam com a chegada do FMI. Não vale a pena tentar disfarçar.»

Na íntegra aqui.
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Os Sopranos, nós e o FMI


«Na excelente série de televisão “Os Sopranos”, há um episódio em que o mafioso Tony Soprano conta a um jogador de pouca importância por que razão o deixou jogar e perder em grandes apostas. "Eu sabia que você nunca poderia pagar, mas a sua mulher tinha uma loja de artigos desportivos", explica ele depois de tirar a loja dos seus activos e deixando-a falir.

“Os Sopranos” estão disponíveis em português. Os telespectadores vão neles descobrir mais sobre o seu destino do que através da maioria dos meios de comunicação social. Portugal é a mais recente economia a cair nas garras da Comissão Europeia e, possivelmente, do FMI. É um abraço de mafioso, como os cidadãos irlandeses e gregos podem testemunhar.»

Ler o resto em The Guardian.
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19.4.11

Outras Troikas (2)

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Da vergonha


A crónica de José Vítor Malheiros, no Público de hoje (sem link), fica aqui na íntegra. É um fortíssimo grito de alma, que tende a ser colectivo porque reflecte muito do que pensam muitos daqueles que não têm (ainda?) coragem de o lançar. É certo que pode ser lido como uma guerra anti-partidos, o que é sempre perigoso, mas não vou por aí: os partidos têm de cumprir o seu papel e só lhes resta a alternativa de agarrarem o touro pelos cornos e de proporem o que honestamente souberem, e puderem, neste terrível momento que atravessamos.

Também não vejo, no texto, motivo para desalentos e desmobilizações. Muito pelo contrário, porque «há algo de que não se pode abdicar: do protesto, da denúncia e da voz. Pelo menos, poderemos dizer aos nossos filhos que há uma vergonha que não merecemos: a de nos termos calado».

A vergonha ou a denúncia

Uma palavra que está a aparecer cada vez com mais frequência nas conversas onde se discute a situação portuguesa - situação económica, financeira ou política - é “vergonha”. Vergonha própria e vergonha alheia. Até amigos estrangeiros me confessam sentirem um bocadinho de vergonha por Portugal. A vergonha própria é aquela que sentimos por aquilo que não conseguimos fazer colectivamente e pelo mundo que vamos deixar aos nossos filhos. A vergonha alheia é por aquilo que vemos os outros fazer em nosso nome. As cascatas de mentiras que jorram da boca dos políticos nacionais, profissionais ou amadores, que afinal sabiam o que juraram não saber, fazem o que juraram não fazer e contradizem o que juraram defender. Mas também a desfaçatez dos empresários que pregam moral mas nem sequer pagam os seus impostos. Ou a oca altivez de quem reclama a mais exigente pose moral mas não perde uma oportunidade de ganhar uns euros à conta de um favor de um banqueiro amigo. Todos nos perguntamos como deixámos as coisas chegar a este ponto, em que não podemos acreditar nos governantes, mas também não podemos acreditar na oposição, nem podemos acreditar que as eleições tragam uma brisa de honestidade. Em que o Presidente da República lança bocas da geral e desaparece quando há trabalho sério a fazer. Em que os bancos acumulam juros fabulosos enquanto o país se arruína, mas pedem esmola ao Estado e roubam impostos ao povo como um Robin dos Bosques ao contrário. Em que os empresários só aparecem para se queixarem do desperdício dos investimentos públicos depois de terem metido ao bolso o dinheiro dos investimentos públicos e quando têm a certeza que a fonte secou. Em que todos os ex-governantes (e os ex-ministros das Finanças, em particular) vêm para a praça pública queixar-se dos actuais governantes e garantir que todos eles sem excepção governaram com escrupulosa honestidade e inexcedível competência e deixaram o país melhor do que o encontraram. Não haverá limite para a lata dos ex-ministros das Finanças? Não há.

As páginas dos jornais são colecções de histórias de terror e as saídas que discutimos para a crise são ou fazer “greve à democracia” (Marinho e Pinto), ou voltar atrás no tempo e não fazer o 25 de Abril (Otelo) ou apostar na democracia directa em vez da democracia representativa (Otelo bis). A política já acabou? Estamos em plena farsa? Qual é o gesto político a fazer? Impugnar os partidos? Greve à democracia como quer o bastonário dos Advogados? Desobediência civil? Emigrar? O que fazer quando os partidos do “arco do poder” se tornaram coios de salteadores e usurpam a República? O que fazer quando nos obrigam a escolher entre Sócrates e Passos Coelho para primeiro-ministro? O que fazer quando nos querem obrigar a escolher entre um Governo de bananas liderados por um aldrabão ou um governo de aldrabões liderados por um banana? O que fazer quando nos obrigam a escolher entre a forca e a guilhotina?

Neste momento de crise, onde os pobres aumentam, onde o número de desempregados reais cresce, onde os salários descem, onde a fome alastra, onde a corrupção é sempre impune, onde a iniquidade é regra, onde o FMI e a União Europeia nos vêm ditar as regras de conduta que garantirão que os banqueiros serão pagos mas que não garantirão absolutamente mais nada - nem bem-estar, nem justiça, nem liberdade, nem democracia, nem progresso, nada daquilo que nos diziam que a Europa simbolizava -, o que se pode esperar? O que se pode fazer? Há algo de que não se pode abdicar: do protesto, da denúncia e da voz. Pelo menos, poderemos dizer aos nossos filhos que há uma vergonha que não merecemos: a de nos termos calado. Essa vergonha cai inteira sobre os submissos militantes dos partidos que escolheram e nos propõem esta forca e esta guilhotina.
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Fascínio por robots

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Estes robots bailarinos da Sony (um pouco trôpegos…) fizeram furor, a semana passada, num festival em Coachella, na Califórnia.



Ninguém bate os japoneses neste domínio: ficaram célebres as suas performances na Expo de Aichi, em 2005 (e na de Xangai, em 2010, eu sei). Bem quis vê-los, quando por lá andei, mas as filas de espera davam largas voltas a muitos quarteirões.




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Desmitos


… é o nome de um blogue que descobri há poucos dias, juntamente com o seu autor, Álvaro Santos Pereira, com quem agora «esbarro» a cada esquina. Ignorância minha em boa hora reparada, porque gosto, e preciso, de explicações em linguagem simples para assuntos que são para mim complicados.

É o caso deste post sobre O impacto da reestruturação grega.

«Continua a abrir-se a porta para uma reestruturação da dívida grega. (…)  Já há bastante tempo se percebeu que esse cenário é realmente inevitável. Basta comparar a dívida pública grega com a dívida de outros países que foram forçados a reestruturar as suas dívidas e/ou entraram em insolvência para chegar à conclusão de que não há grande alternativa.

E se a Europa continua (oficialmente) a negar essa possibilidade não é só por uma questão de orgulho, mas também porque os líderes europeus (e os bancos) preferiam que essa reestruturação acontecesse só partir de 2013, depois do início do Mecanismo de Estabilização Europeu, onde já se prevêem reestruturações das dívidas. Só que, neste caso, não é linear que o que é melhor para a Europa (isto é, os bancos do centro da Europa), é realmente preferível para os países altamente endividados, como a Grécia (e Portugal e a Irlanda). É que a haver uma reestruturação, seria bom se esta acontecesse o mais cedo possível.

É certo que é sempre melhor evitar uma reestruturação da dívida, principalmente devido às eventuais repercussões em relação ao financiamento dos países que são obrigados a fazê-la. No entanto, se o endividamento chegar a um ponto tal que se torna verdadeiramente insustentável, é melhor efectuar a reestruturação da dívida o quanto antes, até porque os custos dos "default" são mais de curto e médio prazo do que de horizontes temporais muito longos. Por outro lado, protelar aquilo que é inevitável só agrava a situação económica e social dos países altamente endividados. (…)

E quanto a nós? Será que uma eventual reestruturação da dívida grega nos vai impactar? Obviamente que sim. A nós e à Irlanda. No entanto, e como já aqui defendi e vários outros economistas já chamaram à atenção, se tal acontecer, seria bom que Portugal, a Irlanda e a Grécia pensassem em encetar uma estratégia concertada de negociação com os nossos credores para que entrassem nessas negociações numa posição mais forte. (…)

Se nos acontecer o mesmo e se as coisas forem bem feitas e bem planeadas, uma reestruturação da dívida poderá ser o primeiro passo (ou o segundo, agora que o resgate foi activado) para conseguirmos mudar a trajectória insustentável dos últimos anos. Um primeiro passo que terá de incluir uma nova política de finanças públicas, uma economia muito menos endividada, e uma economia mais dinâmica e produtiva. Um primeiro passo que nos conduza uma trajectória mais responsável, mais sustentada e mais sustentável. O mais importante é que saibamos aprender as lições do presente para que, no futuro, não tenhamos de cair na mesma lamentável situação.»
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18.4.11

Outras Troikas

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Parabéns aos Ladrões


… de Bicicletas, evidentemente, porque o blogue faz hoje 4 anos. O que eu tenho aprendido tentado aprender com estes ladrões, nos tempos que vão correndo!...
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Os finlandeses, esses patifes


E, de repente, o modesto xenófobo que dorme no coração de muitos pequenos portugueses acordou num fim-de-semana de Sol e descobriu que os finlandeses são as piores criaturas da Europa – ou mesmo do hemisfério Norte, como diria o outro. São péssimos e o único objectivo que os guia, neste momento, é tornar-nos a vida infernal.

Há meia dúzia de anos já foram modelo a imitar (e de que maneira…), é bem provável que lhes devamos em parte a invenção do fenómeno Magalhães, mas...meu deus, onde é que isso já vai! Hoje, são carrascos em potência, que gostaríamos que alguém apagasse do mapa o mais depressa possível.

É de lamentar, e de temer, a subida assustadora do Perussuomalaiset e o que ela representa como força crescente da extrema-direita? Certamente. Mas as eleições de ontem não foram um acto isolado, mas sim mais uma das consequências do «suicídio europeu» que «resulta do monstro que construímos», sendo verdade que «o egoísmo é o mais estúpido dos instintos perante esta crise europeia» e que «é respondendo a esta irracionalidade que a Europa se está a desgovernar», como escreve hoje o Daniel Oliveira.

Desta vez, caímos na folha errada do calendário finlandês. Mas estamos longe de ter razões para invejar esse povo da chamada «Zona Cinzenta», com a história recente que tem, parente pobre de alguns vizinhos muito ricos e vítima de outros, terrivelmente dominadores. Há bem pouco tempo, quando nós já beneficiávamos de chorudas benesses europeias.

E é bom recordar que Helsínquia é uma cidade acinzentada mas bem mais acolhedora do que Reiquiavique (por mais impopular que seja dizê-lo neste momento…), que Alvar Aalto foi um artista excepcionalíssimo e, também, já agora e bem a propósito, que a Finlândia continua a ser a terra do Pai Natal…
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Para a agenda e não só

(Clicar na imagem para ler melhor)

É já amanhã que tem lugar, em Lisboa, o lançamento deste livro de Luís Salgado Matos, com prefácio de José Vera Jardim – um pesado volume, com mais de 700 páginas, que já comecei a ler e que me ocupará ainda durante muito tempo (*).

Um «elogio» para além de muitos outros? A crítica relativamente negativa de João César das Neves, no DN de hoje…

«O livro de Salgado de Matos […] abre interpretações refrescantes e sugestivas pistas de investigação, sempre bem fundamentadas. Apesar disso, o autor foi longe demais na originalidade das conclusões. É evidente, como todos confirmam, que a realidade do processo não é unívoca. Apesar disso é forçado negar o propósito explícito de acabar com a religião ou dizer que "os republicanos sempre quiseram o acordo com a Igreja" (Matos 33).
Muitas das supostas contradições detectadas nascem da incompreensão das razões do Vaticano e episcopado. Também fica difícil aceitar a recusa do intuito persecutório: "A relação entre o Estado separatista e a Igreja Católica é combate, antes de ser perseguição" (675). Considerando a origem, acinte e gratuitidade das agressões e disparidade de forças nos dois lados, temos de aceitar a classificação tradicional, mesmo tomando em conta a engenhosa mas forçada distinção de época: "Houve perseguição segundo os critérios posteriores a 1945 mas não segundo os padrões então vigentes" (673). Há limites para o relativismo histórico.»

(*) No Porto, lançamento no dia 20 de Abril, 18:30, Palácio da Bolsa, apresentação por D. Manuel Clemente.
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17.4.11

Convergência nacional em torno do emprego e da coesão social


O apelo à «Convergência nacional em torno do emprego e da coesão social», publicado ontem no jornal Público e transcrito neste blogue, foi transformado em Petição Pública e está disponível para assinaturas AQUI.

É uma forma de adesão à iniciativa e de suporte ao conteúdo da mesma. Agradece-se divulgação.
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Which side are you on

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In the mountains of Kentucky in 1931, the coal miners of Harlan County went on strike. Officers hired by the mining company roamed the countryside hunting for the union leaders. The independent coal miners fought back gallantly against the hired company deputies and blood was spilled on both sides. "Which Side Are You On," was written by Florence Reece, the wife of Sam Reece, a union leader who had escaped into the Kentucky mountains for safety. Class warfare continues in the United States and in most nations throughout the world. Woody Guthrie, Pete Seeger, Lee Hays, and Millard Lampell of the Almanac Singers made this song famous in 1941. - Spadecaller
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Les «sans-culottes»


A partir de agora, a França pode expulsar do seu território estrangeiros gravemente doentes, já que o Senado acaba de ceder a pressões governamentais nesse sentido. Mais concretamente, foi alterada uma disposição legal que concedia direito de residência a doentes com morada habitual em França «com a condição de não poderem beneficiar, efectivamente, de tratamento apropriado no seu país». A dita disposição explicita agora: «com a condição de não existir tratamento apropriado no seu país».

Vai dar ao mesmo? Não, defendem as organizações que se opõem à alteração: teoricamente, não há tratamentos «inexistentes» em nenhuma parte do mundo, ao mesmo tempo que, na prática, continuam inacessíveis a um número elevadíssimo de pessoas que deles necessitam.

Existiam abusos? Que fossem identificados. Estaremos a falar de um batalhão de imigrantes agonizantes ou quase? Parece não ser o caso: segundo dados de 2008, representariam, no máximo, 0,04% da população recenseada em França.

Trata-se, sim, de homofobia crescente, de defesa da quinta e do quintal, da desesperada ilusão de resolver crises e carências com egoísmos mesquinhos que já se revelaram inelutavelmente ineficazes, da eterna tentação de erguer muros protectores, em cimento ou sob a forma de passaporte.

Dói especialmente quando tudo isto se passa na pátria das nossas grandes utopias, da igualdade e da fraternidade, onde os novos «sans-culottes» do mundo são atirados sem cerimónia para a valeta do século XXI.

(A partir daqui.)


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Foi assim que o planeta girou

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(Via Júlia Coutinho no Facebook)
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Ai, Europa…


Se lêssemos isto há uns anos, há uns meses, há umas semanas...:
Economistas portugueses preferem plano do FMI à proposta de Bruxelas.

A propósito, Miguel Portas. Na Antena 1:

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