26.9.12

Há 44 anos, a primeira noite sem Salazar


No dia 26 de Setembro de 1968, às 20:00, Américo Tomás anunciou a substituição de Salazar por Marcelo Caetano, neste curto e tétrico discurso: 



No dia seguinte tomou posse o novo governo e, do discurso de MC, ficaria a célebre frase: «Não me falta ânimo para enfrentar os ciclópicos trabalhos que antevejo.» (Texto do discurso aqui.)

Sabendo o que se seguiu entre 1968 e 1974, não é fácil, sobretudo para os mais novos, compreender que muitos, mesmos entre os resistentes antifascistas, criaram grandes expectativas com a nomeação de Marcelo (ter um chefe de governo que NÃO era Salazar constituía, por si só, uma experiência única...). A «Primavera Marcelista», expressão usada para caracterizar os dois anos que se seguiram, alimentou muitas sonhos quanto ao sucesso de uma «evolução na continuidade». .

Mas foram também numerosos os que nunca alimentaram quaisquer esperanças e, a 44 anos de distância, acho graça e alegro-me ao reler o que então escrevi, num depoimento para O Tempo e o Modo (não esquecer que as revistas eram submetidos a «exame prévio», o que nos forçava a exercícios de encriptação em que éramos exímios...) (*):

«O que penso do actual momento político?
1º – Que o Estado, agora novíssimo, merece os nossos parabéns. Simplesmente porque há muita gente contente. Pois então não é bom que os jornais embandeirem em arco porque podem dizer que já podem dizer e começam mesmo a dizer, que haja regressos anunciados e partidas «aboatadas» e que os empregados da CP escrevam ao Presidente do Conselho? Que sejam prometidas prioridades para o ensino e apareça já uma reforma (!)? Afinal o De Gaulle é um grande homem! Vai ajudar-nos daqui a uns anos (se ainda formos vivos). O pior é o Marcuse. E os outros.
2º – Que não faltarão boas vontades para a acção imediata. Esperemos também que haja quem queira parar, não ter pressa (de quê, agora?), tirar lições. Porque há muito, muito que pensar, que estudar e que fazer a longo prazo. Com havia há dois meses.»

(*) Dossier especial publicado durante o quarto trimestre de 1968, que incluía vários artigos e depoimentos de pessoas, pró ou contra MC, que aceitaram responder à pergunta «Como encara o actual momento político?»: António Alçada Baptista, Eduardo Prado Coelho, Francisco Balsemão, Joana Lopes, Jorge Sampaio, Luís Moita, Manuel Roque, Nuno de Bragança e Raul Rego. Este dossier foi republicado em O Tempo e o Modo – Antologia, Fundação Calouste Gulbenkian / Centro Nacional de Cultura, Lisboa, 2003, pp. 613-648. 
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