23.1.13

Benditos mercados que nos dão o pão nosso de cada dia



«(...) Imaginemos que a taxa de juro deste empréstimo a cinco anos seja de 3% (será muito superior). Ou a economia portuguesa cresce pelo menos 3% cada um desses cinco anos (para que as receitas fiscais aumentem também e o Estado possa pagar o serviço da dívida), ou esta operação não pode ser financiada. E Portugal não vai crescer 3% ao ano. Pelo contrário, neste ano de 2013 o produto vai cair pelo menos 2% (e pagar 3% de juro?). E as previsões das próprias instituições credoras são de que Portugal não consegue crescer a esse ritmo, entre outras coisas porque a política de austeridade que é aplicada com a sua bênção provoca recessão. Por outras palavras, isto é uma mistificação: benditos mercados que nos emprestam para que fiquemos a dever cada vez mais. (...)

Um dia, o essencial tem de bater à porta: a única renegociação que interessa realmente, porque tem efeitos para a economia, será a reestruturação da dívida que determine o abatimento de uma parte da dívida, a redução dos juros e das regras e a alteração dos prazos. Só assim será possível sacudir o peso da canga da dívida da vida das pessoas, em vez de se continuar a corrida para a bancarrota, acentuada agora com o anunciado corte de 4 biliões (ou seja, mais aumento de impostos ou mais redução do salário indireto e do valor real das pensões). Nada do que é agora feito altera essa evidência: Portugal não pode pagar em 2016 o dobro do que paga agora em serviço de dívida e não pode pagar em 2012 mais de 20 biliões de euros. Atrasar os pagamentos sem alterar a dívida é a estratégia de quem quer enganar os contribuintes.

Por isso, é lamentável mas compreensível a estratégia de António José Seguro, que se veio vangloriar de ter tornado possível a operação de hoje graças ao facto de ter garantido que, se houver mudança de governo, as políticas da troika continuarão a ser aplicadas rigorosamente. A esquerda e o país que luta contra a troika nem precisariam de ser lembrados que precisam de derrotar a estratégia da troika, que é a de Seguro. Mas é vantajoso que sejam os próprios promotores da austeridade e da economia da bancarrota a lembrar-nos o que querem fazer.»

Francisco Louçã, esta tarde, no Facebook
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