28.1.13

Tema do dia: a Opus Dei e o seu Índex



O Diário de Notícias iniciou ontem, e termina amanhã, a publicação do resultado de uma investigação jornalística sobre a Opus Dei. Dedica-lhe hoje 12 páginas sobre várias vertentes da instituição, mas as mais badaladas estão a ser as que dizem respeito à «lista negra» de livros que figuram num Índex que, segundo o DN, contém 33.573 entradas. Este não é uma relíquia do passado, terá sido actualizado em 2007.

Estarão incluídas 84 obras de autores portugueses nos quatro «piores» de seis «níveis de interdição», sendo Eça de Queirós e José Saramago os mais castigados, mas sem que escapem Fernando Pessoa, Aquilino Ribeiro, Torga, Cardoso Pires e muitos outros.

O Nível 6 é o mais grave: «Leitura absolutamente proibida (só com autorização do prelado)», seguido pelo Nível 5: «Livros que não é possível ler (só com a autorização da Cúria), Nível 4: «Podem ser lidos apenas por quem tem formação ou profissão relacionada» e Nível 3:«Livros que contêm cenas ou excertos inconvenientes».

Se clicar nesta imagem, verá a lista dos 84 livros portugueses.


Que os membros da Opus Dei interditem uns aos outros o que quer que seja é lá com eles, não me aquece nem arrefece que não conheçam Os Maias e só leiam o Borda d'Água. Mas já me faz mais confusão que sejam responsáveis por vários estabelecimentos de ensino, entre os quais quatro reputados colégios, dois em Lisboa e dois no Porto, por onde passam milhares de adolescentes portugueses que se arriscam a ser educados, em pleno século XXI, num terrível obscurantismo.

Mais: um número razoável destas obras figura no Plano Nacional de Leitura (fui ver) e «saem» nos exames nacionais. Para não ir mais longe, numa das provas de Português do 12º ano, em 2012, havia um grupo de perguntas sobre o perigosíssimo Memorial do Convento, de Saramago, que está inscrito no nível mais interdito deste Índex. Como procedem os professores do Planalto ou do Mira Rio? Mandam ao «prelado» uma lista dos seus alunos para que ele autorize uma «leitura absolutamente proibida»? Ou vivem no mundo do faz de conta?

Há realidades tão absurdas que parecem pura ficção.

(Notícia parcial aqui.)
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11 comments:

Septuagenário disse...

Somos muito dados a "esquemas".

É a nossa desgraça nacional.

Ou será o segredo da nossa sobrevivência?

Aceitamos todas as "panelinhas".

Podemos dar aulas qualquer "padrinho" da sicília.

Helena Araújo disse...

Ninguém é obrigado a frequentar esses colégios, e eles são escolhidos pelos pais justamente para proteger os filhos deste nosso mundo de relativismo, anticlericalismo e falência de valores.
Até que ponto é que a sociedade pode impor que esses adolescentes leiam os livros? Até que ponto é que os pais podem recusar isso?
Penso que é uma questão para discutir com muita calma, porque toca a liberdade das pessoas.
Pergunto-me também como equacionar a liberdade dos menores neste contexto.
E pergunto a todos: se se tratasse, por exemplo, das regras de uma comunidade Amish, como é que reagiríamos?

Joana Lopes disse...

Helena,
Só para pôr uma questão prática: para o bem ou para o mal (na minha opinião para o bem), há exames nacionais em Portugal, onde muitos destes livros / autores fazem parte da matéria. Exclui-se «O livro do desassossego» de Pessoa, praticamente todo o Eça e Camilo, etc., etc. para «respeitar» este Índex? Como «proteger» os meninos dos colégios da Opus Dei?

Helena Araújo disse...

E não lhes é permitido invocar objecção de consciência?

Joana, eu não estou a dizer que está bem assim. Estou a perguntar quais são os critérios para o Estado impor essas leituras a menores, contra a vontade dos seus pais. E até onde queremos levar essa imposição.
E também o oposto: até que ponto é que os pais podem influenciar as leituras dos filhos? Ou proibir os filhos de ter acesso a certos livros?

Joana Lopes disse...

Helena,
Objecção de consciência em relação à literatura portuguesa? Eu não vi nenhum livro pornográfico, ou defensor de qualquer o totalitarismo, na lista. Não vejo outros critérios possíveis.

No limite, podemos dizer que o Estado não pode impor aprendizagem da Matemática ou da Biologia, se os pais se opuserem? Queremos, por exemplo, que seja proibido ensinar o darwinismo? É que nem consigo discutir este tema...

Para além de tudo o resto: quando tudo está à mão, em todo o tipo de comunicação social, «proibir» livros significa exactamente o quê? Os pais podem tentar e talvez nem seja preciso muito esforço porque o vício da leitura não é hoje dos maiores...

Anónimo disse...

As alunas Mira Rio e o Horizonte não só fizeram esses exames como ficaram entre as 3 escolas com melhores média. A Joaninha voa,voa, mas não se informa, não pensa.

Joana Lopes disse...

Talvez não fosse mau, caro anónimo, ler o post todo - e pensar. Claro que os alunos desses colégios fizeram exames. Nesse caso, quanto ao Índex, esses colégios «vivem no mundo do faz de conta»

Helena Araújo disse...

Anónimo,

Não é capaz de apresentar os seus argumentos de maneira civilizada, e assinando com o seu próprio nome?

Quais são os seus valores, que conclusões devo tirar sobre o carácter de alguém que ofende, a coberto do anonimato?

Joana Lopes disse...

Não se preocupe, Helena, os comentários ficam com quem os faz. Sinceramente, quando vi chegar este seu, já nem lembrava do outro.

Helena Araújo disse...

Joana,
objecção de consciência em relação a certos conteúdos da literatura portuguesa.
O Saramago, por exemplo, ataca muito a religião.
O ensino do darwinismo também é uma questão muito interessante: se fosse simples, nos EUA já estava resolvida há muito.

Eu gostava de discutir este tema partindo do princípio que um dia as coisas podem mudar, e a maioria pode ter uma opinião bem diferente da minha. Quais são as regras que devem valer nos dois casos?

Quanto aos limites dessa proibição: mesmo que não seja cumprida, está lá para "ordenar" aquele mundo. Um pouco como a lista de pecados: não é por se saber o que é correcto e o que é errado que fazemos sempre apenas o correcto. E não é por fazermos o errado que isso passa a ser correcto.
Sinceramente, se fosse para me preocupar, preocupava-me mais com os livros que eles lêem que com os que não lêem.
(Sim! :) Também tenho a minha lista de livros que não são nada adequados à boa formação das pessoas...)
(E não me peçam para dizer quais - nem às paredes confesso)

hajapachorra disse...

A porcaria da lista é para os membros da obra não para os alunos dos colégios. É difícil perceber isto?