20.4.13

O velho Abril



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A origem do mundo



A guerra civil da Espanha tinha terminado há poucos anos e a cruz e a espada reinavam sobre as ruínas da República. Um dos vencidos, um operário anarquista, recém saído da cadeia, procurava trabalho. Virava céu e terra, em vão. Não havia trabalho para um comuna. Toda a gente fechava a cara, sacudia os ombros ou virava as costas. Não se entendia com ninguém, ninguém o escutava. O vinho era o único amigo que sobrava. À noite, em frente dos pratos vazios, suportava sem dizer nada as queixas de sua esposa beata, mulher de missa diária, enquanto o filho, um menino pequeno, recitava o catecismo para ele ouvir.

Muito tempo depois, Josep Verdura, o filho daquele operário maldito, contou-me. Contou-me em Barcelona, quando cheguei ao exílio. Contou: ele era um menino desesperado que queria salvar o pai da condenação eterna e aquele ateu, aquele teimoso, não entendia.

Mas, pai — disse Josep, chorando — se Deus não existe, quem fez o mundo?
Bobo — disse o operário, cabisbaixo, quase que segredando. Bobo. Quem fez o mundo fomos nós, os pedreiros.

Eduardo Galeano, O livro dos abraços

Valha-nos o humor



Notícias de Bogotá

- Não há cá Nobel, nem meio Nobel, filho. Acho muito bem que não faças publicidade a comunas e, se estão chocados, eu mandava-lhes um comunicado a mudar de conversa. Era tipo "Sara Mago, pseudónimo literário de Joana Vasconcelos, não pôde estar presente no discurso do senhor presidente derivado ao facto de ainda se estar a levantar do chão, depois de ter ingerido um par de jeans tónicos sem bainhas e um memorial com vento". E agora despacha-te que eu ainda gostava de ir ao enterro do Ricardo Reis, já que perdemos o da Tia Margaret...

(António Costa Santos no Facebook)
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Europa: ainda temos a Liga dos Campeões



«Até há 20 anos, a Europa era o sonho, a esperança, o desafio de um novo começo: a libertação pacífica dos países de Leste, a reunificação alemã, a abolição das fronteiras, a livre circulação das ideias e das pessoas, Erasmus. Atualmente, temos apenas a Liga dos Campeões para nos lembrarmos de que ainda somos uma União. Quanto ao resto, bem-vindos à Eurolândia, a árida terra do euro, uma união monetária em que as palavras mais aterradoras que um europeu pode ouvir são: “Olá, sou da UE e estou aqui para te ajudar”.»

(Daqui)

19.4.13

Aprendemos depressa


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A Associação 25 de Abril e as comemorações do 39º aniversário da Revolução


Mensagem da Associação 25 de Abril 

Foi há 39 anos que o Movimento das Forças Armada concretizou o derrube da mais velha ditadura da Europa. A luta de muitos portugueses contra a tirania, a opressão e o obscurantismo, culminou nessa radiosa jornada de 25 de Abril de 1974, que nos lançou na mais extraordinária aventura que um povo pode viver: construir um país novo, recuperar do atraso em que o haviam colocado, fazer um Estado Democrático e de Direito, reconhecer o direito à autodeterminação e independência de povos colonizados, retirar Portugal do isolamento internacional em que os ditadores o mantinham, inserir-se numa Europa onde o Estado Social garantia há mais de trinta anos uma situação de paz, progresso, bem-estar e justiça social.

Foi o tempo de todas as esperanças, convictos de que se caminhava numa estrada com sentido único, ao encontro de uma sociedade verdadeiramente livre e justa.
Hoje, envolvidos numa enorme crise, damo-nos conta de que não há conquistas irreversíveis, de que é sempre possível o regresso dos fantasmas, de que os tiranos estão permanentemente disponíveis para subjugar os povos que se descuidam e não se protegem eficazmente.

Hoje, assistimos e sofremos na pele, ao destroçar de muito do que de bom se conseguiu, ao retrocesso para “tempos da outra senhora”, à destruição do Portugal de Abril e ao abrir de portas a novas escravidões, à iniquidade, à perda de soberania.
Muitos perdem a esperança. Vemos com preocupação o regresso da emigração em massa, com muitos portugueses a procurarem no estrangeiro as condições de sobrevivência que não vislumbram na nossa terra natal.

Mas, porque “há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não”, estamos a lutar, comas armas que a Democracia conquistada com Abril ainda nos permite, contra os novos tiranos que nos roubam o pão, o trabalho e a soberania!

É uma luta difícil, os inimigos são poderosos, mas a nossa História de quase mil anos e o direito à nossa vida com futuro a isso nos obrigam!

Estamos a lutar contra os que nos trouxeram a esta situação, contra os que se apoderaram do poder e o utilizaram em benefício próprio, contra os que se venderam ao capital financeiro e aceitam ser capatazes do seu próprio povo.

Estamos a lutar contra a corrupção, que foi a principal arma utilizada para provocar esta crise, e exigir a punição dos seus autores.

Estamos a lutar contra o agravamento da crise, que vem aumentando em relação directa com a responsabilidade dos detentores do poder – sejam eles o Presidente da República, os governantes ou os deputados, que se mostram incapazes de encontrar soluções que travem a crise. Mas também, é curial afirmá-lo, as oposições políticas ou sindicais, incapazes de apontar alternativas.

Temos consciência que a crise é generalizada no mundo ocidental, nomeadamente na Europa, mas isso não justifica a profundidade que atingiu em Portugal.
Estamos a lutar contra o marasmo, o conformismo, o amochar que se tem apoderado dos portugueses, perante as contínuas agressões, os roubos de que são vítimas, que os levam a olhar para a destruição do país, sem que se mobilizem e ponham cobro a uma situação que seria impensável há meia dúzia de anos.

Estamos a incentivar as acções da sociedade civil que vem despertando, vem assumindo a contestação e vem dando sinais inequívocos ao poder, que a não serem entendidos, provocarão fortes convulsões sociais, com a violência como pano de fundo.

Nesse sentido e considerando:

- O envolvimento em vários processos fraudulentos, de milhares de milhões de euros, de pessoas com as mais altas responsabilidades em diversos sectores da economia e das finanças da nossa sociedade, muitas vezes oriundos dos aparelhos partidários e tendo desempenhado as mais elevadas funções no Estado português;
- A continuação das enormes arbitrariedades que agentes do poder público continuam a praticar, ao mesmo tempo que se vêm conhecendo novos dados sobre a natureza e a responsabilidade de muitos actos “lesa pátria”, alguns configurando situações criminosas;
- A ausência de acções concretas, no sentido de responsabilizar os autores desses crimes;

A Associação 25 de Abril manifesta a sua indignação, face aos acontecimentos que se estão vivendo em Portugal e que configuram, sem a menor dúvida, um enorme e muito grave descrédito dos representantes políticos, um logro à confiança cidadã e um desprestígio para o nosso país, precisamente em momentos especialmente delicados e que requerem uma grande responsabilidade e compromisso.

A Democracia baseia-se num pacto social, onde os cidadãos elegem os que consideram os mais indicados para gerir os assuntos públicos e para os representar durante um período de tempo previamente acordado.

A Democracia não é, nem pode ser jamais, a concessão a uns quantos de uma patente de pilhagem para se enriquecerem durante quatro anos ou mais!

A Democracia tem o seu fundamento na confiança que os representados têm nos seus representantes ena lealdade destes perante quem os elegeu.

Quando essa confiança é traída e essa lealdade desaparece, o prestígio e a legitimidade moral da classe política desmoronam-se e o cimento da Democracia apodrece.

É o que, na opinião da Associação 25 de Abril, se está passando em Portugal!
E é mais que sabido o que sucede quando, num Estado de Direito, a classe política perde o seu prestígio porque se transforma numa espécie de casta que deixa de servir os interesses de todos para servir apenas os seus próprios interesses.

Basta analisar a história do século XX para se concluir que essa foi sempre a antecâmara do totalitarismo.

Nesse sentido:
- A Associação 25 de Abril reclama uma justiça firme, eficaz e rápida;
- A Associação 25 de Abril reclama junto dos partidos políticos, a todos sem excepção, que façam tudo o que estiver ao seu alcance para denunciar e expulsar das suas organizações todos quantos hajam tomado parte em práticas corruptas. A todos e a todas, sejam quem forem.

Sendo os partidos políticos elementos essenciais ao funcionamento democrático, só com a sua elevação ética e regeneração poderá a classe política recuperar o prestígio perdido e a sua representatividade moral.

Sem isso, a democracia, tal como a entendemos, será uma mera ficção!

Por isso, se não forem os partidos políticos a alterarem este estado de coisas, terão de ser os portugueses a alterar os partidos políticos.

Para isso, os partidos políticos têm de ser capazes de ultrapassar os interesses próprios, de “capelinha”, e privilegiar os interesses colectivos. Só assim serão responsáveis, só assim serão patriotas!
A Associação 25de Abril exorta os meios de comunicação social a que, nestes tempos tão graves, sirvam, acima de tudo, os interesses dos cidadãos! Informem com verdade, objectividade e exaustivamente, sem negar ou ocultar a realidade nem manipular os factos. Só da difusão e do conhecimento da verdade pode surgir a regeneração ética, de que a nossa nação necessita mais do que nunca!

A Associação 25de Abril manifesta, por último, a sua esperança e a sua confiança, assim como a sua total lealdade, no sistema democrático e no Estado de Direito a que o 25 de Abril deu origem em Portugal, plasmados na Constituição da República.

Reclamamos pelas medidas necessárias ao impedimento da proliferação dos que se aproveitam do sistema para o seu próprio lucro e benefício, mas reclamamos também que essa exigência se faça rejeitando tutelas e “salvadores da pátria”.

Continuamos pensando que o sistema de liberdades e o pacto democrático entre os cidadãos é o melhor dos sistemas de governação.

Não desistimos, numa luta que não é só nossa. Nós e os outros povos europeus temos de ser capazes de perceber que os inimigos não são os outros povos, mas sim o capital financeiro que nos domina a todos e os que, em cada um dos países, a ele se venderam. A nossa luta é contra os tiranos e não de uns povos contra outros povos.
A Associação 25 de Abril exorta a uma democracia com ética e justiça!

Vamos vencer o medo, reafirmar Abril, construir o futuro!

A Direcção

Lisboa, Abril de 2013 

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Alem disso, ler também:


Por uma vez, totalmente de acordo, dr. Soares!




O PS continua fiel a si próprio e António José Seguro é o merecido, e merecedor, líder do partido que hoje comemora o seu 40º aniversário –assino por baixo. A realidade comprova-o todos os dias, certo?

Talvez os fundadores se tenham enganado na escolha do apelido para a organização, mas isso é uma outra história e já se sabe que ninguém alguma vez a levou a sério – a começar pelo próprio Mário Soares, obviamente.

Fantasia



«Às vezes a política não é uma encenação, mas é raro tal acontecer; às vezes a política consegue ser coerente, mas não é nada frequente; às vezes os políticos são sinceros, mas não é costume. A semana que agora acabou foi pródiga em tudo isto. Por momentos, parecia um ensaio de bailado entre Passos Coelho e Seguro - só que ambos escorregavam e caíam, sem conseguirem completar os movimentos. Na época da comunicação digital, o primeiro-ministro e o líder do maior partido da oposição correspondem-se por carta para criar um ambiente de romance - uma coisa para inglês ver, melhor dizendo, para troika observar. Nesta última semana, não houve dia em que Passos e Seguro não falassem. Falaram demais - dias de cacofonia, de simulações e de muito poucos actos. Até a cena final - a conferência de imprensa matinal de quinta-feira, depois da dramatização de um Conselho de Ministros ao longo da madrugada, foi um triste espectáculo de vazio, uma ilusão de óptica. No fim da conferência de imprensa, fiquei com a certeza de que a troika vai saber, antes dos cidadãos, os cortes orçamentais que não foram revelados. Fecho os olhos e imagino tudo isto como se fosse um filme: o Governo retocou-se, escolheu uma nova maquilhagem, até fez um "casting" interessante para novos personagens. Mas mesmo bons actores podem aparecer em maus filmes, quando o realizador falha o seu serviço e o produtor está apenas interessado em tapar as evidências de que as coisas não vão bem. Olho para o Governo e tenho a sensação de que estou a ver um filme que é uma produção falhada, um filme que ultrapassou o orçamento, falhou a história, um filme onde os actores não se entendem e realizador e produtor não conseguem concretizar o projecto. Vítor Gaspar falhou estrondosamente no orçamento de produção, e Passos Coelho é um realizador que deixa a história degradar-se, por causa das dificuldades do produtor, e que não consegue dirigir os seus actores. Espero que nunca se candidatem a um subsídio à produção de cinema.»

Manuel Falcão
(O link pode só funcionar logo mais tarde ou amanhã)
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18.4.13

Empresta-me para eu vestir na Colômbia?


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Túnel ao fundo do túnel



Ricardo Araújo Pereira, na Visão de hoje, sobre alternativas e falta delas.

«O nosso destino é falhar. Vamos falhar todos juntos. E sem estrebuchar. Há que educar o gosto para a beleza do falhanço colectivo. Imagine que vai ser devorado por um tigre. Não seja lírico. Já lhe disseram que não há alternativa. Lutar com o tigre é inútil (recordo que não há alternativa). O melhor é ficar quieto e deixar-se devorar. E, já agora, deitar uma pitada de sal no lombo, que o tigre gosta da carne apaladada. O trabalho do Governo é tratar deste tempero. Não se preocupe com nada.»

Na íntegra AQUI.
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Pequenino, tão pequenino

Para além dos Urais e da Ilha das Flores



A descrição terá origem numa espécie de conclusão do FMI e ilustra a realidade de um certo ponto de vista: viveríamos agora uma «Primavera perfeita», «se não fosse a velha Europa estar numa profunda crise económica, que pode voltar a provocar uma crise financeira grave e profunda com efeitos sistémicos a nível mundial».

Países emergentes, Estados Unidos e asiáticos protestam e todos apontam o dedo à «estúpida política de austeridade imposta a muitos países europeus pelos parceiros mais ricos da União Europeia», que impede o crescimento e nem resolve o problema das dívidas.

Não sei se a Primavera mundial seria assim tão perfeita sem a nossa desgraça, mas o tema serve-me para regressar ao que sinto sempre que saio desta velhíssima Europa, sobretudo se aterro na América Latina ou em certos países da Ásia: são mundos virados para o futuro, optimistas de certa maneira mesmo quando (ainda?) pobres, lugares de esperança, terras de lutadores.
Nunca esquecerei a terrível sensação que tive ao passear pelas ruas desertas de Frankfurt, num Sábado cinzentíssimo de Inverno, acabada de chegar de Pequim: esvaziaram a Europa e ninguém me disse, transformaram isto em museu. Já lá vão nove anos e a palavra «austeridade» não fazia ainda parte do nosso léxico diário. Mas tudo vinha a caminho.

A partir daqui.
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17.4.13

Os últimos presos da ditadura



Cheguei com o livro a casa e li-o todo, da primeira à última página. A obra de Joana Pereira Bastos, que agora chegou às livrarias e que será lançada em Lisboa no próximo dia 23, propositadamente em vésperas de mais um 25 de Abril, fala-nos de quem se encontrava nas prisões da PIDE em Abril de 74, da violência então vigente na actuação daquela polícia política, da longa espera pela libertação dos presos, que só ocorreu já nas primeiras horas do dia 27.

JPB, que é uma jornalista de 33 anos, bisneta de Maria Lamas, não pretende abordar o tema como historiadora que não é, mas sim transmitir o que ouviu em muitas horas de entrevistas, sobretudo para que a sua geração não continue a desconhecer a acção daqueles a quem deve, em grande parte, a liberdade em que nasceu e se tornou adulta.

Em 1973 e 1974, a PIDE prendeu mais de 500 pessoas, acusadas de activismo em vários movimentos políticos e de diferentes classes sociais – para além de militantes do PCP, maoistas, trotskistas, católicos progressistas, membros de organizações ligadas à luta armada, como a LUAR (Liga Unitária de Ação Revolucionária), a ARA (Acção Revolucionária Armada) e as BR (Brigadas Revolucionárias). Com as prisões a abarrotar e confrontada com organizações e métodos que não conhecia, a PIDE reforçou a violência e a tortura tornou-se, mais do que nunca, o meio trivial de obter confissões.

Declaração de interesses, antes de avançar. Se não conheço pessoalmente a autora, os seus pais, tios e dezenas de amigos comuns fazem parte da minha vida há décadas. Mais: das pessoas entrevistadas para o livro, três são meus amigos íntimos, vivi de perto o drama das suas prisões e de tudo o que no livro é relatado. Estou a falar de Nuno Teotónio Pereira e dos irmãos Maria da Conceição e Luís Moita. Faltar-me-á talvez por isso alguma distância crítica – que nem me interessa ter, confesso – em relação às 180 páginas que acabei de «digerir».
A leitura das descrições de algumas torturas deixou-me de novo transida, apesar de as conhecer praticamente desde que aconteceram. E porque não me apetece poupar quem ler este texto, reproduzo duas páginas do livro, com uma parte – só uma parte – do que se passou com Luís Moita. Sem comentários.

(Clicar para ler)

Os capítulos mais interessantes do livro são talvez aqueles em que é pormenorizadamente descrito tudo o que precedeu a libertação daqueles que estavam em Caxias no dia 25 de Abril de 1974, desde a total ignorância do que tinha acontecido, ao medo de que se tivesse tratado de um golpe de direita, de que os agentes da PIDE se vingassem e os liquidassem, à longa espera da decisão da Junta Nacional, que permitisse a libertação de todos, como exigiram depois de saberem que se punha a hipótese de ela ser selectiva.

Um livro que é sem dúvida um marco para que seja salvaguardada a memória da ditadura e dos seus horrores, mais do que oportuno neste momento tão difícil da vida de todos nós. 
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A Oeste, nada de novo



... para já com balanços, no mínimo, divergentes:

«A reunião desta manhã entre o primeiro-ministro e o líder da oposição "marca", no entender do Governo, "o início do clima de diálogo" com o Partido Socialista. (...)
O Governo manifestou ainda intenção de querer envolver o PS nas políticas de crescimento económico e está disponível para aceitar "propostas politicamente viáveis" do PS para a criação de emprego.»

«António José Seguro afirmou nesta quarta-feira que “não houve nada de novo” nas reuniões com Governo e com os membros da troika e que o PS continua a divergir do Executivo nos caminhos para superar a crise. (...)
"O primeiro-ministro recusou todas as nossas propostas", acrescentou.»

Pergunta inocente: será que este (não) «consenso» é suficiente para satisfazer Bruxelas, a Troika e Cavaco Silva? 
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Gaspar a caminho do psicanalista

Passos / Seguro: antes da reunião desta manhã





Depois, logo veremos se este encontro terá tido alguma importância para o resto das nossas vidas, sendo certo que não será inócuo para o futuro político de Passos Coelho e de Seguro.

Não é preciso ser-se analista especializado, e ainda menos astrólogo, para prever que, num dos cenários mais prováveis, o governo dirá que inclui no pacote umas medidazinhas para o crescimento, de modo a que o PS salve a face e Seguro não saia humilhado. A Europa e a troika aplaudirão o nosso consenso ajuizado e Cavaco verá com mais calma as maravilhas de Cartagena das Índias.

Mas há sempre a hipótese de sermos surpreendidos...

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PS - Comunicado do Gabinete de António José Seguro

O diálogo político e institucional é uma das marcas identitárias do PS à qual permaneceremos fiéis e da qual não nos afastamos. Se o Primeiro-Ministro convida, formalmente, o PS para uma reunião, o PS não a recusa.

É esta conduta que temos adotado no relacionamento com o senhor Presidente da República, com o Governo, com os partidos políticos e com os parceiros sociais.

As posições do Partido Socialista sobre todos os pontos referidos na carta do Primeiro Ministro são há muito do conhecimento dos portugueses.

A posição do Partido Socialista é clara. O PS defende a renegociação das condições de ajustamento, uma trajectória credível de consolidação das contas públicas, o fim da política de austeridade para travar a espiral recessiva e preservar o emprego, a adoção de uma agenda para o crescimento e emprego e a defesa firme dos interesses de Portugal na União Europeia.
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16.4.13

Censura e Liberdade de Expressão



(Clicar para ler)
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Querido Tó Zé - a carta de Passos Coelho




 (Se não vir o texto, clique em Share)


O secretário-geral do PS já leu a carta de Passos a convidá-lo para uma reunião, mas prosseguiu a agenda marcada e ainda não decidiu que resposta dará.
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Voltarei a jogar no Euromilhões



Sócrates perdeu 200 mil telespetadores na segunda semana como comentador na RTP, teve menos de metade do que aqueles que escolheram ver e ouvir Marcelo Rebelo de Sousa, sensivelmente à mesma hora.

Sempre me pareceu que isto aconteceria. Passada a curiosidade de rever «o bicho», de perceber se estava mais gordo ou mais velho, se o penteado era o mesmo e se vinha para sacanear o Tó Zé Seguro ou nem por isso, era de prever que tudo regressaria à normalidade e que Marcelo venceria, sem apelo nem agravo. Se ninguém lhe atribui grande credibilidade, tem pelo menos um carisma zandinga que diverte.

Além disso, e independentemente de comparações, o povo é sereno mas ainda não esqueceu o passado recente e estou certa de que houve uma debandada às 21:12, quando Sócrates voltou a falar do PEC IV! Confesso que resisti para não escolher outro botão no comando da TV, mas terá sido provavelmente a última vez.

O antigo primeiro-ministro não terá percebido que o seu regresso foi pelo menos prematuro. O país mudou muito. Ele não.
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Adios, adieu, auf wiedersehen, goodbye

15.4.13

Onde é que isso já vai...



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As multidões gostam de vencedores



Uma recente conversa num jantar de amigos faz-me regressar a um acontecimento, que é conhecido mas não suficientemente recordado. No dia 31 de Março de 1974, quinze dias depois do golpe falhado das Caldas e três semanas antes do fim da ditadura, Marcelo Caetano fez a sua última aparição em público, num Sporting-Benfica que viria a ficar célebre não só, nem sobretudo, porque os visitantes venceram por 3-5.

Num texto publicado em 1978 (Depoimento), MC comenta: «Quando o alto-falante anunciou que eu me achava no camarote principal, a assistência calculada em 80.000 espectadores como que movida por uma mola oculta, levantou-se a tributar-me quente e demorada ovação que a TV transmitiu a todo o Pais. Isso foi interpretado como repúdio por aventuras militares.»

E é verdade – confirmo eu que lá estava. Se houve vaias, e parece que sim, não foram significativas quando comparadas com a ovação. À minha volta, só o grupo de amigos em que eu me integrava e, umas filas mais abaixo, Vasco Pulido Valente e Filomena Mónica, assistíamos, perplexos, ao entusiasmo generalizado.



Há 39 anos que arrasto uma pergunta que nunca terá resposta: quantas daquelas pessoas terão estado no Largo do Carmo na última quinta-feira de Abril e nas ruas de Lisboa do 1º de Maio que se seguiu? Um grande número, certamente. As multidões manifestam-se contra muitas coisas, mas gostam de vencedores – é bom não esquecer. 
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Destruição em curso


«Há uma destruição de Portugal em curso – provocada por um governo obediente, venerador e obrigado a políticas europeias devastadoras, mas dificilmente reversíveis. Acreditar numa mudança radical na Europa – onde Hollande se passeia a fazer figuras tristes– já começa a ser equivalente a acreditar nos amanhãs que cantam.»  

Ana Sá Lopes

Carta a Wolfgang Schäuble



Amigo Wolfgang: 

Espero que esta carta te encontre bem aí em Berlim. Acredita que tenho muitas saudades dos tempos que labutei na fábrica da Volkswagen, em que trabalhámos juntos e éramos unha com carne: tu a mandar e eu fazer. Formávamos uma bela equipa e eu trouxe recordações das quais nunca mais me vou esquecer: uma hérnia discal, artrite, varizes nas pernas e uma reforma imune a cortes.

Pois que agora li que aí na Alemanha querem contratar 200 mil camionistas e que andam à procura deles no meu querido Portugal. Eu já não tenho idade para essas aventuras e além disso não tenho carta de pesados, mas informei o pessoal que pára aqui no café da Clotilde de que a oportunidade existe e que é de agarrar com as duas mãos. (Nota: tentativa de fazer piada, porque um volante agarra-se normalmente com as duas mãos).

Escrevo-te, amigo Wolfgang, para te meter uma cunha. O meu cunhado, o André, assim que soube disto dos camionistas quis ir logo para a Alemanha.(...) Eu estou a incentivá-lo a ir e até lhe prometi que dava um palavrinha por ele a ti, Wolfgang, que tens bons conhecimentos aí no Governo. É isso que estou a fazer. Por favor, ajuda o meu cunhado que é um bom moço, apesar de às vezes parecer desmiolado. Então não é que se pôs a criticar o Wolfgang Schäuble (pssiuuu!!! que ele não sabe que esse és tu), porque esta coisa da austeridade, diz ele, não leva a lado nenhum, e que esse tal de Schäuble (que afinal és tu) se comporta como um regedor da Europa. Já lhe disse para tirar essa ideias malucas da cabeça, porque os alemães são boas pessoas, só querem o bem da Europa e tomar conta de nós, devido à nossa manifesta incapacidade para o fazer. Afinal, são vocês que conduzem o nosso destino e nós somos apenas motoristas do grandioso itinerário que nos traçaram para lá chegar. Bem hajam por isso.

Um amplexo forte deste que te estima,

Virgolino Faneca

(Daqui, mas o link pode só funcionar mais tarde.)
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14.4.13

Who cares? We'll always have Joana Vasconcelos

As mãos





Com mãos se faz a paz se faz a guerra.
Com mãos tudo se faz e se desfaz.
Com mãos se faz o poema - e são de terra.
Com mãos se faz a guerra - e são a paz.

Com mãos se rasga o mar. Com mãos se lavra.
Não são de pedras estas casas, mas
de mãos. E estão no fruto e na palavra
as mãos que são o canto e são as armas.

E cravam-se no tempo como farpas
as mãos que vês nas coisas transformadas.
Folhas que vão no vento: verdes harpas.

De mãos é cada flor, cada cidade.
Ninguém pode vencer estas espadas:
nas tuas mãos começa a liberdade.

Manuel Alegre
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Um merecido prémio



O cartoonista grego Kountouris venceu o Grand Prix (o principal galardão) do World Press Cartoon.

«O desenho, com o título “Equipa de resgate da UE”, mostra homens vestido de fato preto a segurar uma cama elástica com as estrelas da União Europeia e, no chão, marcas de corpos de pessoas que não foram apanhadas. Foi publicado na revista grega Efimerida Ton Syntakton, em Dezembro do ano passado.»

Mais adequado aos tempos que passam seria difícil.

(Daqui)

Gaspar, um ministro das Finanças da troika



«Durante estes quase dois anos, o primeiro-ministro defendeu Miguel Relvas contra tudo e contra todos. (...) Com Vítor Gaspar é a mesma coisa: não há clamoroso erro, não há falha gritante no atingir de metas, não há desvio colossal, não há disparar do desemprego, não há agravamento do buraco nas contas públicas, não há recessão, não há teimosia contra a Constituição que não aumente o poder do revolucionário ministro. (...)
Pode o primeiro-ministro ver as pessoas a desesperar sem emprego e sem dinheiro, a miséria a crescer nas ruas, em resultado da política criminosa de Gaspar e camaradas troikanos, que não o deixará de acompanhar de lira em punho enquanto o País arde aos seus pés. Talvez até convide os ministros alemães, finlandeses e outros tratantes europeus para assistir ao espectáculo. Os tais que se atrevem a mandar bitaites sobre os nossos assuntos, sem que o nosso primeiro-ministro ou o nosso Presidente da República se indignem e os mandem abaixo de Braga.»

E porque vem bem a propósito, oiça-se este vídeo (a que cheguei via Câmara Corporativa) e leia-se a notícia que o acompanha. Vítor Gaspar, a contra favor, «a troika finance minister»