16.11.13

Parece bem certeiro



Orelhas de burro e tiro no pé. 

 (No Expresso de hoje)
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Mudam-se os tempos, mudam-se os chineses


Foi com um sorriso que li esta notícia no caderno Economia do Expresso de hoje. Não que não seja perfeitamente natural que o comércio de luxo se adapte às exigências e ao conforto dos seus melhores clientes, mas porque, há meia dúzia de dias, entrei numa loja chinesa do meu bairro onde vi, pela primeira vez, empregadas portuguesas.

Não sei se as de Chongqing que lá estavam até agora se mudaram directamente para a Avenida da Liberdade, mas é pouco provável. Julgo é que os pragmáticos donos das lojas baratas, cada vez mais frequentadas por portugueses, terão percebido o mesmo que os sócios das cadeias de luxo das nossas montras mais elitistas: o cliente é quem mais ordena e é fundamental perceber se ele quer uma chave de parafusos ou dois pares de cuecas.

Nada contra se tudo isto reflectisse, apenas ou sobretudo, um novo equilíbrio como resultado positivo da globalização. Mas infelizmente não é o caso. 
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Ide e lede

União Europeia: morte assistida



«Estamos a viver uma espécie de fim dos tempos – embora muita gente finja ainda não ter dado por isso. Os dois partidos fundadores da União Europeia – os sociais-democratas e os democratas-cristãos – foram capturados pelos interesses financeiros, pelos negócios, pela miséria ideológica do individualismo selvagem. Na prática, socialistas e democratas-cristãos morreram e o que vemos à nossa frente é um velório prolongado. Nenhum europeu teve ainda a coragem de lhes fazer o enterro, mas é urgente fazer esse funeral e o luto subsequente. Mais vale desligar a máquina que continuar neste estado comatoso a fingir que ainda existem partidos social-democratas, valores social-democratas ou democratas-cristãos.

O que sabemos que existe, neste momento, é uma extrema-direita a crescer e a organizar-se. Marine Le Pen deverá ganhar as eleições europeias em França e já prepara activamente uma aliança com os extremistas da Holanda, com a Liga Norte e com outras companhias do género. Estes senhores têm um programa, sociais-democratas e democratas-cristãos não têm nenhum. As coisas não vão correr bem.»

Ana Sá Lopes

15.11.13

«Give Peace a Chance» - Washington, 15/11/1969



Em 15 de Novembro de 1969 teve lugar «Moratorium March on Washington», considerado o maior protesto anti-guerra da história dos Estados Unidos, contra o conflito que então tinha lugar no Vietname: uma manifestação quase totalmente pacífica de meio milhão de pessoas, que se integrou num vasto movimento que percorreu a América, de S. Francisco a Boston, e não só. Apesar disso e como é sabido, a guerra em questão iria durar ainda quase seis anos, até 30 de Abril de 1975.

No protesto de Washington participaram políticos como Eugene McCarthy, George McGovern e Charles Goodell e cantores como Peter, Paul and Mary, Arlo Guthrie, John Denver e Pete Seeger que interpretou a celebérrimo canção «Give Peace a Chance» (lançada por John Lennon na Primavera desse ano), juntamente com os outros cantores e com a multidão que a terá repetido durante dez minutos.




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Relatório do Interior



A ler, sobre este livro que acabei de ler e que recomendo:

Paul Auster. "Somos todos um mistério sem qualquer resolução"

Querida, encolhe o cão



Parece que os portugueses continuam a gostar de animais domésticos, cada vez mais segundo leio, mas que o tamanho destes vai diminuindo, sendo que «metade dos cães tem menos de dez quilos e 69% dos gatos têm menos de quatro quilos». Crise a quanto obrigas: mais casas com bichos, mas pequenos e solitários, já que cada lar vai tendo apenas um exemplar.

Ainda assim, um cão ou um gato pesa cerca de 15% (???) no orçamento familiar, o que me faz crer que estes seres estão a viver claramente acima das possibilidades. A crise ainda tem pano para mangas. 
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14.11.13

Quem quer ser maltês?



Basta ter 650 mil euros e já está: nacionalidade, passaporte e acesso ao espaço Schengen. Só falta a assinatura do presidente. O governo de Malta espera arrecadar 30 milhões de euros (tão poucos candidatos?), metade dos quais irá directamente para o orçamento e a outra metade para a economia.

Quem ainda achar que estas coisas não podem, ou não devem, acontecer na Europa, que ponha um dedo no ar.

(Fonte)

Nós e a Venezuela



Ricardo Araújo Pereira sublinha semelhanças e diferenças.

«A economia portuguesa está tão morta como Hugo Chávez, mas tanto o governo português como o venezuelano garantem que eles ainda vivem. (...)
O presidente venezuelano resolveu antecipar o Natal, para proporcionar uma alegria ao povo; Passos Coelho decidiu prolongar uma alegria a Quarema, para proporcionar uma alegria à troika

Na íntegra AQUI.
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Nação valente!



Um excelente texto de Luís Nazaré, com uma ironia cortante, no Negócios de hoje (*).

«É o segredo mais bem guardado do planeta. Nós, precisarmos de um novo programa de assistência? Nós, pensarmos numa reestruturação da dívida pública? Claro que não. Isso é coisa de masoquistas ou de incontinentes verbais. Qualquer criatura minimamente lúcida sabe que daremos a volta por cima. A economia está a recuperar, o desemprego a baixar, as medidas de austeridade a funcionar em pleno. A Alemanha está tranquila, a Comissão Europeia idem, a confiança dos mercados e das agências de notação em alta. Os portugueses voltaram a acreditar no Pai Natal. O que terá dado, então, ao ministro dos Negócios Estrangeiros? Quatro e meio por cento de juros para nos furtarmos a um qualquer programa de intervenção? Nem pensar. Seja qual for a taxa, cá estaremos para honrar os nossos compromissos. (...)

Cabecinha fria, é o que se pede. Eles bem sabem, lá fora, que os lusitanos são gente de bem. Podemos ter de emigrar, definhar, entristecer, quebrar os laços de solidariedade intergeracional, mas incumprir nunca, nem num tostão. Não somos de defaults, isso é para gente pouco honrada como norte-americanos, alemães, islandeses e outras tribos bárbaras que, em momentos de aperto, tiveram o despudor de reestruturar. Nós, orgulhosamente intervencionados, pagámos sempre as nossas dívidas ao preço que nos exigiram. Connosco, os mercados financeiros não têm de se preocupar. Nação valente! (...)

Ora, estes registos descrentes e tendenciosos têm de ser exterminados. Há que manter um silêncio absoluto sobre a dívida. Nem falar de programas cautelares ou de reestruturação, que o mundo nos quer como sempre nos viu – cordatos e cumpridores. Qualquer estratégia comum com a Europa periférica é contra-producente. Siga-se a velha norma latina das infidelidades: negar até ao fim e manter o sorriso. E esperar que nenhum analista internacional tenha alguma vez lido ou sonhado que nós portugueses abdicaremos de ser nobres e imortais.»

(*) O link pode só funcionar mais tarde. 
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13.11.13

Faltava esta cereja


... em cima de vários bolos.

O cidadão Ramalho Eanes será homenageado no próximo dia 25 de Novembro, por iniciativa de uma longa lista de notáveis, também aberta a subscrição pública. 
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Nem sei como comentar




As fotografias mostram um baixo-relevo no Palácio das Nações Unidas em Genebra, («A criação do homem», uma obra onde é representado um homem nu), tal como é, e tapado antes da chegada da delegação do Irão a uma reunião dos membros permanentes do Conselho de Segurança, para não chocar aquela delegação.

E, no entanto, se eu quiser desembarcar em Teerão, terei de o fazer de cabeça tapada – razão pela qual, até hoje, resisti a visitar um país que todos dizem ser lindíssimo.

O Ocidente rastejando, vá lá saber-se com que vantagens e para quem.

(Fonte)

Um Estado refém


O texto de Sandra Monteiro no último número de Le Monde Diplomatique (edição portuguesa):

«Houve um tempo em que o neoliberalismo actuou como se acreditasse que a população era desperdiçada no Estado. Estávamos na década de 1980 e as primeiras experiências neoliberais, indissociáveis dos governos de Aníbal Cavaco Silva, sonhavam com a constituição de um mercado privado que canalizasse os recursos dos cidadãos. Estes haviam acedido à liberdade e à democracia constitucional há pouco tempo, mas criações como o Estado social já melhoravam as condições de vida. Uma arquitectura assente na fiscalidade progressiva e em serviços públicos universais e gratuitos, e na protecção social e laboral, era, no entanto, bastante perturbadora. Como levar os cidadãos a pagar no privado o que recebiam no público, com qualidade e «gratuitamente»?

Era central para o neoliberalismo português ultrapassar este obstáculo, num país pobre e pouco integrado na globalização comercial e financeira. Como os sectores que prometiam lucros mais seguros, além dos ligados aos monopólios naturais, eram os da educação, saúde, segurança social, esse período foi marcado por fortes ataques ideológicos ao público, com campanhas intensas sobre os seus desempenhos e com os primeiros incentivos à dualização dos sistemas, traduzidos na eliminação progressiva da gratuitidade (propinas, taxas) e depois com as tentativas de plafonamentos.

O projecto que levaria ao aprofundamento das desigualdades e ao empobrecimento do país começou aqui. Mas começaram também as resistências sociais de vários sectores, reprimidas como o foi a acção sindical, numa fantasia adiada de desregular totalmente os direitos laborais e acabar com a contratação colectiva. Foi também o tempo dos primeiros sinais do elogio da juventude, antecipando o incitamento à quebra das solidariedades inter-geracionais, outra pedra angular do sistema social que incomodava as seguradoras privadas. A Constituição da República sofria várias revisões e a Europa «aproximava-se», prometendo modernidade e coesão entre os povos mas realizando projectos de liberalização das trocas, desregulação financeira, destruição de aparelhos produtivos a troco de subsídios e construção mal escrutinada de infra-estruturas. Com a adesão à União Europeia, e depois à zona euro, acentuaram-se as desigualdades entre um centro excedentário e uma periferia deficitária. Mas, em todos os países aderentes, os povos viram os rendimentos do seu trabalho, os seus ganhos de produtividade, serem cada vez mais canalizados pelo poder político em benefício do poder económico e de interesses privados.»

Continuar a ler AQUI
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Notícias do arco da velha




«A eleição de 14 novos Estados-membros das Nações Unidas para integraram o Conselho dos Direitos Humanos deste organismo está a gerar grande polémica, com críticas em especial à escolha da China, Cuba, Rússia e Arábia Saudita. Contudo, há quem junte a estes quatro nomes a Argélia e o Vietname, lamentando que nesta matéria estejam países considerados “abusadores”.»

Infelizmente não há muito a esperar de uma Organização, com quase sete décadas, que foi criada «com o objetivo de deter guerra entre países e para fornecer uma plataforma para o diálogo», enquanto continuarem a ser conscientemente escolhidos pirómanos para bombeiros, surdos para professores de canto e pedófilos para educadores de infância. 
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Será?



Fonte: Negócios.
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12.11.13

Este arco que nos governa



No Público de hoje (sem link), José Vítor Malheiros analisa bem o significado de expressões a que nos vamos habituando sem termos a consciência plena do seu peso e do alcance da sua utilização sistemática e perseverante: «arco da governação» e «arco da governabilidade». Vale a pena ler este excerto e parar para pensar.

«O que quer dizer "arco da governação"? A expressão foi inventada por Paulo Portas e representa os três partidos políticos mais à direita no espectro parlamentar: o CDS, o PSD e o PS. Os três partidos que assinaram o memorando da troika.

Para o CDS a expressão vale ouro. Num sistema que funciona garantindo a alternância entre PS e PSD, o "arco da governação" foi a sua maneira de meter o pé na porta e garantir a entrada na primeira divisão. "Eu também! Eu também sou da governação!" E é verdade. O CDS tem estado em coligação em vários Governos, ajudando o PSD ou o PS a garantir a maioria que lhes forneceu apoio parlamentar.

Depois do "arco da governação" Portas lançou o "arco da governabilidade", esticando um pouco mais a corda. Se o "arco da governação" podia ser definido como o conjunto de partidos que "têm governado" nos últimos anos, o "arco da governabilidade" é o conjunto dos partidos que "podem governar", os partidos que podem garantir que o país é governável.

O problema com essas expressões é que são ambas expressões de propaganda, que têm o objectivo de excluir do panorama político e mediático as forças mais à esquerda.

Usar a expressão "arco da governabilidade" para representar a tríade PS-PSD-CDS é equivalente a proclamar um direito natural destes partidos a governar e a proclamar a não-naturalidade da participação de outros partidos no Governo. Um Governo com o PCP? Com o BE? Hmmm... não sei... não fazem parte do "arco da governação", pois não?

A colagem de epítetos aos partidos sempre fez parte do debate político, com o intuito de criar divisões ou forçar alianças, de promover ou atacar esta ou aquela força. O que é novo e surpreendente é o facto de expressões deste tipo, politicamente marcadas, criadas para ser usadas no combate político, carregadas de uma intenção de segregação de uma parte do espectro político, serem usadas por pivots de telejornais, por jornalistas e comentadores de jornais, por académicos e responsáveis políticos mesmo quando possuem um dever de neutralidade e mesmo quando pensam estar a ser equidistantes.» 
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Nunca discutir com idiotas



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Machete «rules»



«Num momento de boa disposição, Pedro Passos Coelho inventou Rui Machete como ministro dos Negócios Estrangeiros. Julgava-se que o homem, cansado por ter passado anos sem fim sentado na cadeira da FLAD, iria aproveitar para ocupar o seu tempo nas Necessidades a dormir uma boas sestas, a viajar apenas até Washington e a estar calado. Aconteceu o oposto: o inventado Rui Machete revelou-se um inventor. Viaja e fala cada vez que lhe colocam um microfone à frente. (...)

O Governo, claro, parece um pinto molhado depois do que o ainda ministro disse na Índia quando descobriu um microfone para onde podia debitar algumas frases. Mas, desta vez, Rui Machete disse tudo o que pode pensar mas que não se pode nem se deve sussurrar. (...)

Ao dizer estas coisas, Rui Machete transformou-se em nitroglicerina. Fala e rebenta com toda a política de luvas de pelica com que está a ser tratado o drama português. Só resta uma dúvida: quando é que o inventor demite o inventado?»

Fernando Sobral, hoje, no Negócios
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Cercos como este é que já não existem




No dia 12 de Novembro de 1975, operários da construção civil iniciaram o chamado «Cerco à Constituinte», que durou até ao fim da manhã do dia 13. Um breve resumo.

«Perante a decisão governamental de encerrar as instalações do Ministério do Trabalho na Praça de Londres, os dirigentes sindicais conduziram os associados (…) num desfile que subiu do Terreiro do Paço até à Alexandre Herculano, inflectindo então para a sede do poder político, onde encheu a Praça de S. Bento e adjacentes.
Depois de um encontro, inconclusivo, com o ministro Vítor Crespo (…), os representantes dos trabalhadores foram recebidos, em audiência, pelo chefe do executivo, Pinheiro de Azevedo.
Ao fim de três horas de discussão (…), Pinheiro de Azevedo comprometeu-se a fazer sair o Contrato Colectivo de trabalho, vertical, com o sector, até ao próximo dia 27, e a abrir um inquérito ao Ministério do Trabalho [com algumas contrapartidas por parte dos sindicatos]. (…)
Terminada a reunião, o primeiro-ministro acede a falar aos manifestantes. Ao aparecer à varanda, porém, Pinheiro de Azevedo é “largamente vaiado” pelos manifestantes, que mal o deixam concluir as primeiras frases. (…)
Decididos a permanecer no local até que um acordo favorável seja alcançado, os manifestantes fecham o cerco a S. Bento, onde os deputados constituintes se vêem obrigados a permanecer durante 16 horas. (…)
A saída dos sequestrados, ao fim da manhã [do dia 13], por entre alas dos manifestantes, que apupam uns e vitoriam outros (à esquerda do PS), alguns dos quais correspondem erguendo o punho, ficará como uma das imagens mais fortes do processo revolucionário em curso.»

In: Adelino Gomes e José Pedro Castanheira, Os dias loucos do PREC.





N.B. - Até hoje, dura a polémica sobre o verdadeiro âmbito deste «cerco», nomeadamente quanto ao papel do PCP no mesmo. A ler, por exemplo: 

11.11.13

Brincando com o olhar



Vale muito a pena ver esta série de vinte fotografias!

(Via Helena Araújo)
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Hoje é o dia



... delas, quentes e boas. Em pleno Verão de S. Martinho ou «Été indien», conforme tradições e latitudes.




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É um Partido Socialista, com certeza

Europa, esse velho continente acolhedor



O acolhimento dos que fogem de ditaduras – de tiranos ou da fome – foi uma atitude louvável, e devidamente apreciada, ao longo de muitas décadas. As Américas receberam europeus perseguidos pelos nazis, a Europa africanos fugitivos das lutas de libertação das colónias e emigrantes dos países mais pobres, europeus incluídos, e assim por diante.

Hoje, tudo mudou. Em nome de crises económicas e de temores de terrorismo, os «heróis» do passado passaram a inimigos e são rechaçados, sob o olhar indiferente ou aprovador dos povos, que os deixam morrer, ou com um vago tremor humanitário inconsequente.

No último número de Le Monde Diplomatique (edição portuguesa), Serge Halimi comenta bem essa realidade, a propósito dos recentes acontecimentos em Lampedusa.

«Há trinta anos, fugir do sistema político opressivo do seu país valia aos candidatos ao exílio os elogios dos países ricos e da imprensa. Nessa altura considerava-se que os refugiados haviam "escolhido a liberdade", isto é, o Ocidente. Assim, um museu em Berlim honra a memória dos cento e trinta e seis fugitivos que pereceram entre 1961 e 1989, quando tentavam transpor o muro que dividia a cidade em dois.
As centenas de milhares de sírios, somalis e eritreus que, neste momento, "escolhem a liberdade" não são acolhidos com o mesmo fervor. (...) O Muro de Berlim destes boat people foi o mar; a Sicília foi o seu cemitério. A nacionalidade italiana foi-lhes concedida a título póstumo. (...)
O Ocidente valia-se, há trinta anos, da sua prosperidade e das suas liberdades como de uma lança ideológica contra os sistemas que combatia. (...)
Um dia, o Velho Continente vai voltar a fazer apelo a jovens imigrantes para travar o seu declínio demográfico. Nessa altura os discursos vão inverter-se, os muros vão cair, os mares vão abrir-se…»
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10.11.13

Quando abre a boca, entra mosca ou sai asneira

O bom aluno da Europa

Movimentos




(Daqui)

Das não-pressões



Com uma ironia fininha, de uma cajadada, Pedro Marques Lopes mata dois coelhos. Ou um Coelho e um dos seus patrões.

«Durão Barroso, que pôs Portugal nas bocas do mundo quando ensinou George Bush a dizer correctamente José, decidiu não pressionar o Tribunal Constitucional português. E não o pressionou dizendo que se o Tribunal chumbasse algumas normas do Orçamento as consequências para Portugal seriam medidas ainda piores, mais gravosas.

Como Durão Barroso é presidente de uma instituição que faz parte dos credores de Portugal, está-se mesmo a ver que não está a pressionar coisa nenhuma. É assim como dizer "se não fizeres como te disseram, dou-te uma marretada na cabeça". Como está bom de ver, isto não é uma ameaça, é uma sugestão.

Ao lado do presidente da Comissão Europeia estava o primeiro-ministro de Portugal. Como é evidente, Passos Coelho teve bem a noção de que Durão Barroso não pressionou o Tribunal Constitucional. Se assim não fosse, o primeiro-ministro teria imediatamente posto na ordem o presidente da Comissão. Guardião da independência nacional e defensor da democracia liberal, jamais admitiria que um representante de uma organização internacional ameaçasse uma instituição fundamental da nossa democracia. O primeiro-ministro não pactuaria com ataques às instituições do seu país. Mesmo pensando que as medidas que serão avaliadas são óptimas e que o Tribunal estaria a prestar um péssimo serviço ao País se as chumbasse.

É que se assim não fosse, poderíamos pensar que Durão Barroso e Passos Coelho estavam a levar a cabo uma inconcebível farsa. Estaria o guloso a pedir para o desejoso. Que havendo um alinhamento completo de vontades entre os dois, o presidente da Comissão estaria a ameaçar o Tribunal para reforçar os já habituais ataques do Governo e do primeiro-ministro. Passos diria mata, Durão Barroso esfola, o povo português, bem entendido. Ou seja, Passos Coelho não se importaria - e até combinaria - com o presidente de uma organização estrangeira um ataque a uma fundamental instituição portuguesa. Não, não poderia ser. Seria demasiado infame. Seria um acto tão impensável que se assim fosse podíamos duvidar do patriotismo do primeiro--ministro - e eu penso, francamente, que não é o caso.

Quanto ao outro senhor, o Durão Barroso, enfim, é o que é, anda lá por fora a tratar da sua vida.» 
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