16.6.14

Vícios na vida, virtudes financeiras



A União Europeia tomou mais uma decisão para ajudar os países que a compõem a verem o PIB crescer de um dia para o outro. Não por via do desenvolvimento (velharias...), mas obrigando a contabilizar as receitas provenientes de prostituição, droga e contrabando. Como as avaliará correctamente parece ser ainda um mistério, mas já se adianta que, em Portugal, trarão um acréscimo de 0,4% àquele sacrossanto indicador – 680 milhões de euros não são trocos e nem o Tribunal Constitucional será chamado a escrutiná-los!

Mas há uma hipocrisia em tudo isto, que é importante desmascarar e penso que Celso Filipe o faz correctamente, em artigo publicado hoje no Negócios:

«François de La Rochefoucauld, um moralista francês que viveu no século XVII, identificou assim a natureza do comportamento hipócrita: "A hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude" sentenciou o aristocrata, que à época se distinguiu como fazedor de máximas. (...)
Dispense-se os moralismos e o que fica é uma flagrante contradição na forma como uma actividade é avaliada. Aos olhos da lei [em muitos países] a prostituição, a droga e o contrabando são vistos como crime, mas para quem faz contas são apenas actividades não autorizadas que ainda assim contribuem para a riqueza de um país. (...)
O Sistema Europeu de Contas vestiu a pele de François de La Rochefoucuald e do alto da sua frieza contabilística impõe uma situação que os pruridos morais preferem escamotear. O passo seguinte a dar pelos governos, em Portugal como noutros países da Europa, é o de que transponham a normalidade aritmética criada pelo Sistema Europeu de Contas para os respectivos sistemas jurídicos. Enquanto coexistirem dois sistemas diferentes para classificar uma mesma coisa o senhor de La Rochefoucuald irá andar por aí a apoquentá-los.» 
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