30.9.14

O «novo» PS



«A primeira consequência da vitória de António Costa nas primárias do PS é que vamos deixar de ver e ouvir António José Seguro na televisão. E isso, só por si, é uma bênção. (...) A pose rígida de Seguro, o seu sorriso crispado, sempre em tensão, o seu discurso estereotipado, sempre em torno das mesmas cinquenta palavras, indicavam alguém que se mantém numa auto-vigilância constante, que não se sente bem na sua pele, que receia a todo o momento ser apanhado em falta, que representa um papel que aprendeu mas que não é o seu verdadeiro eu. (...)

Será Costa um líder de esquerda, capaz de levar a cabo uma política de real combate às desigualdades e à pobreza, aos privilégios dos poderosos, à corrupção e aos interesses ilegítimos, de defesa do Estado Social e dos serviços públicos, de defesa do emprego? Talvez. E será capaz de fazer frente aos interesses financeiros que sequestraram o Estado, de defender Portugal na União Europeia, de construir na União as alianças necessárias para inverter as políticas que nos escravizam, de pôr em causa o Tratado Orçamental, de impor aos credores uma renegociação justa da dívida, de pôr sobre a mesa condições de permanência do euro que defendam o interesse nacional? Atendendo ao seu passado e às suas escassas e prudentes declarações políticas sobre estes temas, é muito pouco provável. E o drama é que, sem tomar estas últimas posições, não será possível levar a cabo aquelas primeiras políticas.

Costa irá tentar navegar entre duas águas, enquanto for possível, tal como navegou entre as conjecturas de alianças à esquerda ou à direita. Se for governo, irá provavelmente adoptar políticas fiscais menos penalizadoras dos trabalhadores e políticas sociais mais generosas que o actual governo PSD-CDS e isso será melhor do que o status quo actual, mas será dramaticamente insuficiente. (...)

O que deve fazer a esquerda à esquerda do PS? O seu dever: continuar a defender uma política para as pessoas sem receio de afrontar os poderes ilegítimos da finança, dos mercados e de Bruxelas e demonstrar, em cada momento, a justeza e a justiça das suas propostas — como o fez com a ideia da renegociação da dívida. Se o acordo com o PS de Costa é possível e benéfico, só o futuro o dirá.» (O realce é meu.)  

José Vítor Malheiros

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