21.9.14

Sem desculpa



«Um ministro que tem a humildade de vir a público pedir desculpa por erros cometidos nos serviços sob a sua tutela deve, por norma, ser encorajado e respeitado por se empenhar na prestação de contas à sociedade. (...) O que esta relação entre a práxis recente e o pedido de desculpas pretende esclarecer é o grau de sinceridade da contrição. Convém saber se essa abertura para reconhecer em público que algo falhou resulta de uma atitude normal e saudável numa democracia avançada, ou se aconteceu apenas por interesse próprio, ao jeito de quem quer salvar a pele à custa da compaixão do público. (...)

As desculpas aceitam-se facilmente quando os erros acontecem por acidente, quando não são pautados por dolo ou por negligência. No caso da hecatombe do Citius, que deixou o sistema judicial sem acesso a mais de três milhões de processos, nada disto aconteceu. A ministra deveria ter suspeitado que o sistema informático podia estourar com a famigerada reforma do mapa judiciário. Mais, o seu braço direito no processo, Rui Pereira, teve o desplante de dizer à TSF que “este colapso estava pré-anunciado, mas não havia possibilidade de desenvolver uma plataforma alternativa num curto espaço de tempo”. Perante tantas dúvidas, Paula Teixeira da Cruz deveria ter adiado a reforma. Não o fez. E pôs toda a área que tutela enquanto ministra ou no caos (estado que nega) ou perto disso.

Se no ministério de Nuno Crato se podem adivinhar atitudes de incúria, de iliteracia matemática ou de irresponsabilidade num detalhe da governação que não tem de passar pelo gabinete do ministro, neste caso estava em causa uma reforma na qual Paula Teixeira da Cruz investiu todo o seu capital político. (...) A sua reforma, a peninha no chapéu do seu mandato, acabaria por correr pior do que todas as previsões. Um pouco de sentido de respeito pelos cidadãos não a levaria por certo a pedir desculpas. A não ser que, acto contínuo, apresentasse a sua demissão do cargo. Não o fazendo, o pedido que apresentou soa a apelo de lobo à compaixão da ovelha. Não merece consideração.»

Manuel Carvalho

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