5.1.15

Malangatana morreu em 5 de Janeiro de 2011



Hoje, muito se fala de Eusébio, no primeiro aniversário da sua morte, mas ainda não vi ninguém que referisse que um outro moçambicano, para mim mais importante (que me desculpem os indefectíveis do tal desporto rei...), nos deixou 3 anos antes.

E Malangatana é para mim mais importante, não só pelo extraordinário artista que foi, mas pura e simplesmente porque o conheci e fui sua amiga.

Tenho aqui perto, à minha frente, desde há muitos anos, este auto-retrato que ele pintou numa folha do Record e me ofereceu – é exemplar único. Data de 1972, ano que passou em grande parte em Lisboa e em que convivemos num vasto grupo de amigos. Alguns deles recordaram-me, há meia dúzia de dias, uma história que não resisto a retomar, embora já dela tenha falado em tempos idos.

Talvez ninguém tenha andado aos saltos com Malagantana numa cama elástica e eu andei. Era um daqueles fins-de-semana prolongados, com um feriado que os espanhóis não festejam connosco (5 de Outubro, se não me engano), e mandava a tradição que se desse um salto a Espanha, de preferência em grupo e em caravana. Badajoz era quase sempre o modesto destino mas, dessa vez, foi-se até Madrid nuns belos dias do Outono.

Já não sei bem como nem porquê, um dos serões acabou algures numa espécie de cabaré onde estava em cena um espectáculo mais ou menos ginasticado. A páginas tantas, pediram insistentemente que dois espectadores fossem ao palco e saltassem, alternadamente, em cada uma das pontas de uma cama elástica. O Malanga e eu decidimos entrar na brincadeira e, como ele nunca foi leve e eu ainda não tinha engordado, cada um dos seus impulsos fazia-me subir quase ao tecto, para grande gáudio de toda a assistência – voei, no sentido estrito da palavra, como nunca me aconteceu na vida, nem antes nem depois.

Ao longo dos anos, sempre que nos reencontrávamos, ele repetia, com aquele sorriso inesquecível e do tamanho do mundo: «Patrícia, temos de voltar a saltar numa cama elástica!». Mas não voltámos. Nem voltaremos. Porque ele já deu o salto definitivo – há 4 anos. 
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4 comments:

a. fonseca disse...

deliciosa história e retrato :)

Domadora de Camaleões disse...

Que memória magnífica e que privilégio conhecer o Malangatana. Eu aprecio a sua obra e todas as vezes que vou a Maputo revisito os seus painéis.

roldeck disse...

Procuro, há anos, a confirmação da realização em Coimbra, numa galeria de arte do Governo Civil, de uma exposição de Malangatana. Foi antes do 25 de Abril de 1974, em 1972 ou 1973, mas não tenho qualquer confirmação dessa ocorrência. Nas minhas memórias de jovem universitário, terei visitado essa exposição, numa altura em que terei passado pela Redacção da revista Vértice, instalada perto do Governo Civil e acabei a acompanhar o Dr Joaquim Namorado, então director executivo da Vértice, a essa mesma exposição. Foi, sei, a primeira vez que visitei uma exposição de pintura e um momento muito forte, pelas cores do pintor e pelas explicações do Dr Joaquim Namorado. Desculpar-me-á a ousadia deste testemunho, mas pelo que li neste blogue talvez possa confirmar aqui essa exposição, para mim bem real, embora sem qualquer prova da sua realização. Júlio Roldão, verdadeiro nome do nickname Roldeck.

Joana Lopes disse...

Com pena, não tenho qualquer informação que posa ser-lhe útil.