25.5.16

O Simplex e o cidadão digital



«O Simplex seria também uma espécie de aspirina milagrosa para as dores de cabeça que a administração pública costuma fornecer aos cidadãos. As suas novas propostas parecem um milagre quase tão grande como as vacas voarem alto ou os crocodilos voarem baixinho. Isso permitiu mesmo ao primeiro-ministro vislumbrar o paraíso: um país sem papel no próximo ano. Nada contra. Tudo a favor. Se tamanha revolução digital não tivesse uns pauzinhos na engrenagem dos milagres prometidos. Ou seja: maravilhas para a administração, dores de cabeça para os cidadãos. A informatização total será o caminho mais curto para a administração poupar resmas de A4. Quanto ao resto podemos ingenuamente perguntar: e o cidadão?

Esta reforma simplificadora parece continuar a caminhada para o "sistema virtual" onde todos nos perdemos. Transfere-se agora para o comum mortal, transformado em cidadão digital, aquilo que eram funções da administração. É ele que tem de ser mestre em informática para perceber no computador todos os serviços a que pretende aceder. Ou seja, o cidadão torna-se o funcionário público sem receber por isso. Como reforma audaciosa do Estado e como atitude de agilização de processos parece digna de La Palisse.

Toda esta história cor-de-rosa da digitalização lembra a do GPS: se um dia o "sistema" colapsa tudo desaparece como no mundo virtual. Nada de problemático para o Estado: o cidadão é que, como sempre que desaparecem papéis (ou dados no "sistema") na Segurança Social ou no IRS ou no IVA, é que tem de provar que entregou ou pagou. Já depois de ter sido multado. Se não tiver provas em papel para argumentar a sua inocência (porque contra a administração o cidadão é sempre culpado até prova em contrário) está entalado. O Simplex resolve mais um problema da administração. E alarga o mundo do Big Brother.»

Fernando Sobral

1 comments:

Margarida Bonvalot disse...

E assim se resolve, entre outros, o problema das 35 horas...