27.3.17

Agora, não “dormir sobre os louros”!




«Esta semana soube-se que o desempenho orçamental do país foi extraordinário. O défice público mais baixo desde há 46 anos (2,06% do PIB), não obstante uma factura com juros que é das mais elevadas da zona euro. Tal performance é excelente, mas é, em parte, perigosa. Porque poderá levar a acreditar que é possível cumprir o Tratado Orçamental, quando não o é.

Isto fundamentalmente porque o desempenho orçamental depende em grande medida do desempenho externo.

Ora, em 2016, pelo quinto ano consecutivo, a balança comercial do país será superavitária. Algo que não ocorria há muitas décadas, num país cronicamente deficitário nas suas trocas com o exterior ao longo de séculos. Estaremos perante um novo Portugal “alemão”?

Tivemos muita sorte (ou algum azar, dependendo da perspectiva) e beneficiámos de algum auxílio até à data. (…)

O desempenho da balança comercial é, aliás, um dos indicadores – em conjunto com a taxa de desemprego jovem e a evolução do valor dos salários – que evidenciam a pressão austeritária a que tem estado sujeita a economia portuguesa. Entre 1776 e 2011 – 236 anos – Portugal registou 7 anos de excedentes na balança de bens, os últimos dos quais em 1941-43 (não disponho nem existem, creio, séries históricas relativas à balança comercial antes de 1953). Entre 2012 e 2016, como referido, regista 5 anos consecutivos de excedentes na balança comercial.

Por conseguinte, os portugueses presentemente vivem um momento único na História do país, um momento em que Portugal parece a um “Portugal alemão”, com excedentes recorrentes na frente externa.

Mas (…) esse excedente da balança comercial é “comido” pelos juros e dividendos pagos ao exterior anualmente, que resulta numa balança de rendimento primário deficitária.

Assim, o bom desempenho das contas externas – que se deve também (ou, mesmo, sobretudo) ao esforço de contenção imposto à economia pela “brutal” travagem da procura interna (consumo e investimento) nas últimas duas décadas – não é utilizado para promover o desenvolvimento do país e as condições de vida dos portugueses. (…)

É, portanto, necessário aproveitar a actual envolvente externa favorável para adoptar medidas de médio e de longo prazo, que permitam, de uma vez por todas, deixar para trás a estagnação das últimas duas décadas…»

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