8.12.18

When Sócrates met Passos



«Instalou-se uma narrativa para um ano que se adivinha de campanha eleitoral: a esquerda à esquerda dos socialistas voltou a mostrar que é irresponsável. A sua irresponsabilidade comprovou-se em alguns cruzamentos de votos com a direita para estourar o dinheiro dos contribuintes. Se não se puser fim à dependência do PS em relação a estes partidos, eles acabarão por destruir o equilíbrio virtuoso conseguido por Mário Centeno e levar-nos de novo para o colapso financeiro. Para a direita mediática que já percebeu que o PS vai continuar a governar, este é o argumento que sobra: deem maioria absoluta ao PS.

António Costa explicou como o BE e o PCP se estavam a aliar à direita para preparar uma “catástrofe orçamental” a que levariam as mil propostas de alteração na especialidade. Em contabilidade muito criativa, inventou a possibilidade de desvio de 5,7 mil milhões de euros. Houve votações na especialidade, o Orçamento foi aprovado e não vemos catástrofe alguma. Mas ficou dado o guião que vários comentadores agarraram com empenho.

Curiosamente, repetem-se, em novas circunstâncias, os dois argumentos que ignoraram a crise financeira internacional, o comportamento da União Europeia e a prioridade no resgate aos credores para responsabilizar Portugal pela intervenção da troika: a aliança da esquerda com o PSD no chumbo do enésimo PEC que só Sócrates ainda acredita que nos salvaria e o suposto despesismo público a que Passos atribuiu as culpas da crise interna. Para explicar os riscos da influência da esquerda no Governo para o nosso futuro financeiro e preparar o caminho para as vantagens de uma maioria absoluta do PS repetem-se os argumentos de 2011 que prepararam o caminho para a culpabilização nacional pela austeridade. Os de Sócrates e os de Passos.

Esta linha é coerente com uma estratégia de “desgeringoncização” do PS em que alguns sectores centristas e a direita inorgânica apostam. Para isso repetem todos os temores que Cavaco Silva apresentou a António Costa quando ele avançou para a liderança do Governo e que ele, num momento em que precisava do BE e do PCP para chegar ao poder, pôs de lado. Só que esta narrativa choca com um dado: como se pode ver por todas as sondagens, os portugueses gostam desta solução política e não a viram ou veem como um risco para as finanças e para economia do país. Só graças a esta satisfação geral é que António Costa pode sonhar com uma maioria absoluta. Se há prova que o PCP e o BE deram nestes três anos foi de responsabilidade política. Não será fácil, a quem queira apostar nesta conversa gasta, vender o seu peixe.»

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