1.2.20

Marcelo nunca falha



Já lá vão uns anos desde que escrevi um texto intitulado «Marcelo Rebelo de Sousa, criador de passados». Veio-me logo à memória ao ler, no Expresso de hoje (01.02.2020), o seguinte excerto de uma entrevista a Domingos Lopes, dirigente do PCP na Faculdade de Direito em 1974. Confere.
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André Ventura e a repetição da História


Foi preciso chegar ao Observador para encontrar um texto conciso e certeiro sobre o tema dos dias que passam. Muito mais útil, na minha opinião, do que gritar o currículo de x ou exigir pedidos de desculpa de y.

«Afinal, a esquerda tinha razão. Há mesmo um racismo estrutural na sociedade portuguesa. E eu, antes céptico, tenho que me render à evidência – convertido não por Joacine, mas por Ventura.

Em tempos normais, nada disto teria grande importância. A piadola morreria nas redes sociais ou nos cafés da claque. Acontece que não vivemos tempos normais. Na Europa e na América, as direitas conservadora, liberal e democrata-cristã, que no século passado combateram os totalitarismos e fizeram a União Europeia, sucumbem hoje ao vírus do populismo. Durante demasiado tempo, acreditámos que Portugal estaria imune. A eleição de Ventura para o Parlamento lançou as primeiras dúvidas. Os casos que se foram multiplicando com o Chega, da saudação nazi nos comícios aos filiados provenientes da extrema-direita, adensaram-nas. O post contra Joacine confirmou-as. A partir de agora, há um antes e um depois. Ninguém pode alegar que não viu, que não sabia, que não deu por nada, como muitos disseram não ter visto, não ter sabido, não ter dado por nada nos anos 30. É impossível ser neutro perante o racismo. Aqueles que não estão contra, são cúmplices.»

Pedro Picoito
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Mas porquê agora este eufemismo - pontos de contacto do PS com o PSD



«Não há ninguém que não tenha presente que no Parlamento há quase sempre pontos de contacto entre as várias propostas dos diferentes partidos. Sempre houve e vai continuar a haver. Branco é, galinha o pôs. Assim sendo o que fez a líder do grupo parlamentar do PS vir a terreiro garantir (quase a pés juntos) que entre o PS e o PSD terá de haver pontos de contactos?

A alta dirigente do PS parte do princípio que agora o PSD está estabilizado e que …“nós sabemos que o PSD esteve sempre com o PS, ou que estivemos em posições diferentes, mas muito próximas … E até nas questões estruturais do país”… No PÚBLICO do dia 30.01.2020 está lá pretinho no branco que tem de haver, vai haver pontos de contacto porque o PSD esteve sempre com o PS, ou próximo, até nas questões estruturais.

Nesse dia, António Costa num encontro com os deputados do PS, zurzia nos parceiros da “gerigonça” porque querem tudo num dia e o PS não pode dar tudo nesse prazo. Convém recordar que, apesar do PS se ter esfarrapado para obter uma maioria absoluta, o povo português não lha deu. Ora não a tendo dado, o PS tem de fazer opções de acordo com o que considera ser o seu programa.

Na campanha eleitoral fartou-se de elogiar a equipa vencedora, atacando o PSD e a direita. Isto foi o ponto forte da campanha - contido no pedido da maioria absoluta do género, nós queremos, mas não o dizemos, vocês já perceberam, se nos derem vão ser tudo rosas.

Mas não teve maioria absoluta. O caminho seria a consolidação e o reforço do anterior, e não um parênteses para voltar aos pontos de contacto até nas questões estruturais com o PSD.

O PS não precisaria de justificar os supostos “exageros” das esquerdas para abraçar os “pontos de contactos”. Para tanto basta-lhe a volta ao passado nesta legislatura – sossegar Bruxelas, voltar aos carris do centrismo, virar-se para a direita que diz ser o centro e o PS que se diz esquerda abraça o mesmo centro que é onde todos os do “sistema” querem estar a empurrar-se ver quem fica com mais lugares.

O PS e António Costa tiveram a virtude (vale uma vénia) de acabar com o muro que impedia acordos com os partidos da esquerda. Mas parece cansado por esses quatro anos de negociações com vista a que o povo português tivesse melhores condições de vida e o recuperasse rendimentos que o PSD/CDS lhe retirou.

Paradoxalmente olha agora para o velho PSD, sempre em pé de guerra, e vê-o estabilizado e pronto para os tais contactos até em questões estruturais.

Se o PS for por esse caminho de “contatos” com o PSD é natural que acabe incontactável para as esquerdas e regresse ao seu curso normal, agarrado aos contactos, construindo o centrão. Voltará o velho PS. Acabará por perder o que ganhou e resultou do acordo à esquerda. Sempre que fez acordos com a direita perdeu.»

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E tudo o vento levou



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31.1.20

Coronavírus



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31.01.1891 - A Revolta no Porto



Foram necessários quase 20 anos para a implantação da República, depois da revolta de 31 de Janeiro de 1891 no Porto.




«No dia 31 de Janeiro de 1891, eclodiu no Porto um levantamento militar contrário à cedência do Governo e da Coroa ao Ultimatum de 1890 imposto pela Inglaterra. Este levantamento pretendeu criar um governo provisório e foi a primeira tentativa de instauração do regime republicano em Portugal.

As figuras cimeiras da "Revolta do Porto" foram o capitão António Amaral Leitão, o alferes Rodolfo Malheiro, o tenente Coelho, além dos civis, o dr. Alves da Veiga, o actor Miguel Verdial e Santos Cardoso, e de figuras destacadas da cultura como João Chagas, Aurélio da Paz dos Reis, Sampaio Bruno, Basílio Teles, entre outros.

O acontecimento teve início na madrugada do dia 31 de Janeiro, quando o Batalhão de Caçadores nº9, liderado por sargentos, se dirigiu para o Campo de Santo Ovídio, hoje Praça da República, onde se encontra o Regimento de Infantaria 18 (R.I.18). Ainda antes de chegarem, juntou-se ao grupo o alferes Malheiro, perto da Cadeia da Relação; o Regimento de Infantaria 10, liderado pelo tenente Coelho, e uma companhia da Guarda Fiscal. Embora revoltado, o R.I.18 fica retido pelo coronel Meneses de Lencastre que, assim, quis demonstrar a sua neutralidade no movimento revolucionário. Depois juntou-se o regimento de infantaria n.º 10, comandado pelo capitão Leitão que assume o combate das tropas sublevadas, convencido de que o movimento não seria hostilizado por outras forças militares.

Os revoltosos desceram a Rua do Almada, até à Praça de D. Pedro, (hoje Praça da Liberdade), onde, em frente ao antigo edifício da Câmara Municipal do Porto, ouviram Alves da Veiga proclamar da varanda a Implantação da República.

Foi hasteada uma bandeira vermelha e verde e foi também anunciada a constituição de um governo provisório. A multidão decidiu subir a Rua de Santo António, em direcção à Praça da Batalha, com o objectivo de tomar a estação de Correios e Telégrafos.

Este cortejo foi no entanto barrado por um destacamento da Guarda Municipal, disposto ao combate. A Guarda estava posicionada ao alto da Rua de Santo António e principiou o tiroteio entrando a multidão em debandada.

A derrota consumou-se em poucas horas e a prisão ou o exílio esperavam os implicados. Alguns conseguiram fugir para o estrangeiro: Alves da Veiga iludiu a vigilância e foi viver para Paris: o jornalista Sampaio Bruno e o Advogado António Claro partiram para Espanha, assim como o Alferes Augusto Malheiro, que daí emigrou para o Brasil.

Em memória desta revolta, logo que a República foi implantada em Portugal, a então designada Rua de Santo António foi rebaptizada para Rua de 31 de Janeiro.

Do ponto de vista político, a revolta assumiu, fundamentalmente, o carácter de explosão de ódio contra as instituições monárquicas: pretendia-se sobretudo, destronar a dinastia reinante dos Braganças e, desse modo, resgatar a afronta nacional que a sua política tinha infligido à Nação.»

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Lisboa não precisa de “vistos gold”, dr. Medina



«Na passada terça-feira Fernando Medina deu um recado a António Costa: “Portugal não deve diminuir instrumentos de atração de investimento para o país”. O primeiro-ministro inscreveu o fim dos vistos gold em Lisboa e no Porto no Orçamento de Estado para 2020, mas o Presidente da Câmara de Lisboa acha que se deve manter a medida emblemática de Passos Coelho e Paulo Portas. Será que Fernando Medina ainda não percebeu os problemas que os vistos gold criaram em Lisboa?

A crise na habitação é a mais grave que a capital enfrenta. Neste momento o custo médio do metro quadrado em Lisboa é de 3.205 euros, o dobro do Porto, o triplo da média nacional. Alugar uma casa é ainda mais caro, um T2 ultrapassa os 900 euros por mês. É absolutamente incomportável um casal jovem com um salário médio conseguir fixar-se na capital. Mais novos e mais velhos estão a ser expulsos da cidade.

Mas o que é que os vistos gold têm que ver com a crise no imobiliário? Tudo. Os vistos gold vendem a cidadania portuguesa em troco de um investimento de quinhentos mil euros, o que fez com que muitas pessoas que queriam aceder ao mercado europeu comprassem casas para ficarem vazias. 95% do dinheiro que chegou a Portugal através deste mecanismo foi investido na aquisição de imóveis (3,6 mil milhões de euros entre 2012 e 2018). Ou seja, estes vistos fizeram aumentar o preço especulativo das casas e não contribuíram para que mais pessoas viessem viver em Lisboa.

O principal uso de uma casa deve ser a habitação e não o investimento imobiliário especulativo.

Mas os vistos gold são muito mais perigosos do que isso. De acordo com a Organização Não Governamental Transparência Internacional, estes vistos têm enormes riscos de corrupção e de segurança não só para Portugal como para a Europa. Desde que se iniciou este programa cerca de 17 mil pessoas beneficiaram destas facilidades, oriundos principalmente da China, Brasil e Rússia.

Já foi noticiado que alguns beneficiários dos vistos gold são procurados pelas polícias dos seus países de origem ou estão envolvidos em mega-investigações de corrupção como a Lava-Jato ou no saque a Angola. Enquanto milhares de refugiados morrem às portas da Europa, Portugal estende a passadeira vermelha ao crime e à corrupção.

Para além disso, os vistos gold não criaram emprego. Apenas 16 vistos atribuídos em Portugal foram ao abrigo da criação de emprego. Não há volta a dar, os vistos gold são um Cavalo de Tróia para a corrupção e agravam o problema das cidades.

Um Presidente de Câmara empenhado no combate à crise na habitação faria uma enorme guerra à Lei das Rendas do governo PSD/CDS, construiria um parque habitacional público para controlar as rendas e não aceitaria que se mantivessem medidas que estimulam a especulação imobiliária. Mas Fernando Medina decidiu o contrário, pedindo a António Costa que mantenha os vistos gold, com prejuízo de quem quer viver em Lisboa.»

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É isto, é isto


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30.1.20

Vanessa Redgrave



Chegou hoje aos 83.
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Ciganos, esses não portugueses…




«"Esta opção reforça a ideia, errada, de que as pessoas ciganas não são portuguesas, excluindo-as do tecido nacional. Por isso, deve ser revertida. As medidas de promoção de igualdade e de combate à discriminação das comunidades ciganas devem ser uma competência da Secretaria de Estado para a Cidadania e a Igualdade e não da Secretaria de Estado das Migrações", defende Beatriz Gomes Dias.»
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Nova sondagem



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Nigel Farage, André Ventura e os "homens reais"



«Imagine uma fábrica de burocratas com uma linha de montagem que tem todas as peças necessárias. Pega-se no tronco, encaixam-se as pernas, depois os braços e, por fim, a cabeça. A cor do cabelo pode variar. Temos duas opções à escolha: moreno ou louro. Pente três a toda a volta, grande em cima, para dar aquele aspeto ondulado que está na moda. Temos gordinhos, mas o modelo com mais saída é o magro. Daqueles que correm todos os dias às seis da manhã, faça chuva ou faça sol, antes do banho e antes de vestirem o fato azul escuro. Ao final da tarde, vão todos beber um copo ao pub mais perto do trabalho, antes de irem para casa.

QI? Muito elevado. Fazem contas como ninguém, são autênticas enciclopédias ambulantes e, quando falam, quase nunca fogem do guião. Normalmente não têm solução para nada, mas são óptimos a problematizar, fazem relatórios ao pequeno almoço, escrevem estudos ao almoço e são incríveis a organizar conferências e a fazer apresentações. Quase sempre para plateias que já estão evangelizadas, mas isso agora não interessa nada. Só não são perfeitos porque, se fossem, não eram humanos.

A caricatura - exagerada como são quase todas - dos burocratas que tomam conta das principais instituições políticas contrasta com uma outra caricatura - mais falsa que exagerada - dos chamados "homens reais". Não são políticos como os outros. Não. Nada disso. Eles são homens do povo, falam a sua linguagem e dizem "as verdades". Essa é que essa. Há quem lhes chame populistas, mas são só calúnias. Eles não são populistas, são homens com H grande, daqueles que adormecem e acordam a pensar em pessoas. Pessoas - não é cá ciganos, nem pretos e muito menos gays. São "homens reais", muito corajosos, que vão lá para a televisão e para o parlamento e dizem a verdade toda àquela cambada de burocratas.

Esta semana, enquanto andava pelos corredores do Parlamento Europeu, cruzei-me com estas duas caricaturas políticas: os burocratas - eles são mesmo todos iguais - e os "homens reais" (alguns bastante surreais, por sinal). Naquele dia, Nigel Farage, o político britânico que mais lutou pela saída do Reino Unido da União Europeia, fazia a sua última conferência de imprensa e a sua última intervenção no plenário como eurodeputado. Egocêntrico, como qualquer populista que se preze, cheio de frases feitas e soundbytes que não significam nada, com muitas mentiras à mistura, Farage não fez nada que não tivéssemos já visto, nos últimos anos, vezes sem conta. Só que, desta vez, com uma enorme diferença: ele falava na condição de vencedor. O "homem real" venceu o burocrata.

Ao mesmo tempo que Nigel Farage anunciava a festa do Brexit - continuando a não explicar aos britânicos o que os espera -, de Lisboa chegavam notícias, várias, sobre esta forma que os "homens reais" têm de fazer política. André Ventura, que já tinha o ego a dar horas, decidiu comentar uma ideia ridícula de Joacine Katar Moreira - continua em alta, a deputada - com todo o seu racismo. Se alguém ainda tinha dúvidas, Ventura arrumou com o assunto de vez: é racista e com muito orgulho. Francisco Rodrigues dos Santos, o novo líder do CDS, também já começou a dar um ar da sua graça e decidiu fazer uma piada de mau gosto com a deputada do Livre.

Tudo alta política. E, sobretudo, política daquela que interessa às pessoas. Ainda ninguém ouviu de André Ventura ou de Francisco Rodrigues dos Santos uma única ideia sobre o Serviço Nacional de Saúde, a crise demográfica ou as alterações climáticas. Mas ao nível do insulto, das piadas e do discurso populista, a competição à direita promete ficar renhida.

E eis o que me preocupa. Que os burocratas não percebam que estes "homens reais" estão a chegar às pessoas de uma forma muito mais eficaz. Que mentir, inventar, insultar dá muito menos trabalho do que explicar uma lei, uma decisão ou uma política que teve de ser estudada e pensada. O que me preocupa é ter de reconhecer o profissionalismo político destes "homens reais", que sabem exatamente para quem estão a falar e como as pessoas precisam de se identificar com alguém, de terem uma referência, de encontrarem um salvador - enquanto os burocratas continuam a comunicar entre eles, a admirarem-se entre eles e só olham para o eleitorado em período de eleições.

O que me preocupa é que os chamados "homens reais" estão a vencer. No Reino Unido, em Itália, no Brasil, em Espanha e em Portugal. Enquanto os burocratas continuam, business as usual, como se nada estivesse a acontecer. O que me preocupa é que os democratas, sejam eles mais ou menos burocratas, em Bruxelas, em Portugal e um pouco por todo o mundo, não compreendam que combater os populismos com as mesmas armas não significa responder aos populistas, mas às pessoas.»

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29.1.20

Maiorias «negativas»?




Acho muito bem.

«PSD, Bloco de Esquerda, PCP e PAN podem vir a aprovar uma alteração ao Orçamento do Estado para que novas injeções de capital no Novo Banco tenham de ser aprovadas pela Assembleia da República» 

Expresso, 29.01.2020
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Mr. Ventura, I presume



(Daqui)
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Não aprendem! Depois queixem-se…



Um dia de greve não é um dia de férias e o primeiro implica ausência de vencimento. Uma Câmara Municipal a incentivar a mentira. Alguma dúvida?
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Luanda Leaks: licença para “matar” sem irritar



«Nos anos duros da crise, o dinheiro roubado ao povo angolano ajudou a tapar muitos buracos da nossa economia. Recebemos esse dinheiro, que entrava em empresas portuguesas e por isso na economia, entre o nojo e a gratidão. Todos os que diziam que isto não só era imoral como insustentável, porque se perderia entre os dedos das mãos mal as coisas mudassem, eram chamados irresponsáveis. Recebi mensagens de muitos emigrantes em Angola que me explicavam o mal que lhes fazia quando criticava o poder angolano, indispondo-o contra os portugueses. Respondia-lhes que compreendia a sua frágil situação mas um erro não deixava de ser um erro, uma aposta insustentável não passava a ser sustentável, só porque garantia emprego (cá e lá) num determinado momento. E é por isso que a política tem de ser mais do que a gestão quotidiana das coisas.

Sente-se o alívio ético. Subitamente, todos podem dizer que a mulher que canalizou tanto dinheiro de Luanda para Lisboa, enchendo os bolsos a tantos portugueses, é uma ladra. E quanto maior foi a dependência maior é o asco. E mais adjetivados são os ataques morais. É sempre assim. Compreende-se o alívio. Estamos a exorcizar a amoralidade que marca o comportamento das nações em crise.

Devemos, no entanto, ser moderados no contentamento. Por cá, está tudo na mesma em relação a Angola. Não foram todos os jornalistas que acompanham esta investigação um pouco por todo o mundo que finalmente apanharam Isabel dos Santos. Tiveram um papel central no tratamento e confirmação da informação. Mas ela chegou-lhes por via indireta. Já sabemos que a fonte é Rui Pinto, mas não sabemos muito mais do que isso. Nem sabemos em pormenor como Rui Ponto opera. É impossível ignorar que esta informação, toda concentrada numa figura, é libertada numa nova circunstância política: Isabel dos Santos deixou de ter a proteção política do regime angolano.

Estarão muitos empresários, bastantes políticos e até alguns jornalistas e comentadores moderadamente embaraçados com tudo isto. Uns falam, outros calam-se e esperam. Mas todos sabem que passará. O que não vemos nem veremos é alargar a crítica e a denúncia política a quem esteja demasiado próximo do atual círculo de poder de João Lourenço. Nas investigações até há algumas incursões a figuras muito gratas ao “novo” poder. Mas isso não se traduz nem se traduzirá num discurso político e empresarial, porque isso seria mudar o satus quo que determinou o papel de Isabel dos Santos na economia portuguesa: que é o regime de Luanda, e não a lei ou a ética, a determinar a legitimidade ou ilegitimidade do dinheiro angolano.

Nisto, e apenas nisto, Isabel dos Santos tem razão: ela é vítima de uma perseguição política. Isto não retira nenhuma legitimidade à “perseguição” mediática e à “perseguição” da Justiça. Toda a informação que recebemos demonstra de forma gritante a sua justeza. Apenas quer dizer que se está a atingir seletivamente um elemento que foi expulso do círculo do poder, porque ele pretende renovar parte da elite económica angolana para reforçar o seu próprio poder. E é por isso que o ataque a Isabel dos Santos, sendo justo, não corresponde a qualquer mudança na cultura de submissão do poder político e económico português. Pelo contrário, a escolha seletiva deste alvo, por parte das críticas que se fazem em Portugal, apenas a confirma. Denunciar os negócios de Manuel Vivente, que foi protegido por João Loureço, será o sinal do fim dessa submissão. Ou do fim do estatuto de intocável do ex-vice-Presidente.

Nada disto é uma crítica à denúncia e cerco que se está a fazer a alguém que construiu uma colossal fortuna à custa do roubo dos recursos que pertencem a todos os angolanos. Como alguém que, nos últimos 15 anos, escreveu e falou sobre Isabel dos Santos, celebro-o. Foi uma das principais beneficiárias de um regime que usou a gestão desse roubo para se perpetuar. É apenas um lembrete: nada mudou na relação de Portugal com Angola. Percebemos os recados: Isabel dos Santos já não conta, mas aborrecer outros, como Manuel Vicente, continua a ser “irritante”. Foi e continuará a ser compreendido pelo poder político e económico do país. Espero, e tenho algumas razões para o esperar escrevendo num jornal que nunca deixou de fazer o que tinha de fazer em relação ao poder instituindo em Angola, que não o seja pela comunicação social.»

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28.1.20

Novo Banco, ainda (28.01.2020)


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«We Are The World» – 35 anos




Canção idealizada e composta por Michael Jackson e Lionel Richie, gravada em 28.01.1985 por 45 dos maiores nomes da música norte-americana, no projecto conhecido como «USA for Africa».
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Do assalto ao BES Angola às injeções no Novo Banco



«BES Angola (BESA) foi fundado em 2001. Três anos depois, o BES vendeu 19% à Geni, do general Dino, sócio de Isabel dos Santos. Em 2009, vendeu 24% à Portmill, de Manuel Vicente e dos generais Kopelipa e Dino, o triunvirato próximo de José Eduardo dos Santos.

Esta participação foi comprada com um crédito de 375 milhões de dólares concedido pelo próprio BESA. A Portmill recebeu ainda outro crédito de 375 milhões, concedido pelo Banco Angolano de Investimentos (o banco da Sonangol), cujo destino se desconhece. Os acionistas mais pequenos do BESA eram Álvaro Sobrinho, seu presidente, e Hélder Bataglia, da Escom.

Já depois do afastamento de Sobrinho, tornou-se público que o BESA teria concedido 5700 milhões de dólares em empréstimos secretos (e irrecuperáveis...) a figuras do regime angolano e ao próprio Sobrinho. Estes créditos foram suportados por constantes financiamentos vindos do BES Lisboa.

Sob risco de falência, o saque do BESA - e do BES - acabaria exposto. Para o evitar, no fim de 2013, Salgado negociou com José Eduardo dos Santos uma garantia estatal sobre os créditos ruinosos. Tarde demais. Em 2014, os destroços do BES caem sobre o Estado português e o presidente angolano apressa-se a cancelar a garantia angolana. Começa aqui a segunda parte da nossa história.

Do BESA, ficaram duas heranças. No Novo Banco, os créditos concedidos ao BESA, 3 mil milhões. No BES "banco mau", a participação de 55,7% na instituição angolana. Em outubro de 2014, o banco central (Banco Nacional de Angola) reúne os acionistas do BESA em Luanda - estão representados Kopelipa, Dino, Sobrinho. A representante do BES (55,7% do BESA) é retida numa operação stop. Quando chega à assembleia, a estrutura acionista do BESA é já outra.

O BNA decidiu novos donos, liderados pela Sonangol, que se comprometeu a injetar 650 milhões de dólares, por si e pelos generais: Dino ficou com 19,9%, Kopelipa com 30,9%. O BES perdeu 273 milhões naquele dia. O Novo Banco, em vez de créditos de 3 mil milhões de euros, levou uma pequena participação no novo BESA, rebatizado como Banco Económico e agora administrado pelo responsável do BNA pela mudança. Das instituições portuguesas - Governo PSD/CDS, fundo de resolução, Banco de Portugal -, nem uma palavra.

Em 2018, os créditos do BESA representavam 80% dos prejuízos do Novo Banco nos cinco anos anteriores. O Novo Banco, entretanto privatizado, voltará a pedir injeções de dinheiro público. É por esta e outras razões que o Bloco quer retirar do Orçamento do Estado o aval ao Governo para continuar a sangria.»

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27.1.20

Rastos de Abril



Quando abri hoje o correio, tinha lá esta fotografia que nunca tinha visto e que alguém me enviou. Foi tirada no fim da tarde de 25.04.1974, quando regressávamos do Carmo onde tudo estava já resolvido. Irá para o meu baú das relíquias.

(Francisco Sousa Tavares, Nuno Bragança, Maria Belo, eu e, atrás de mim, Pedro Tamen)
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Itália: efeitos das «sardinhas»




«La elevada participación, en parte provocada por la agitación llevada a cabo por el movimiento antisalvini de las Sardinas, fue la noticia de la jornada electoral y probablemente uno de los factores que impulsó a la izquierda. "Muchas gracias al movimiento juvenil de las Sardinas", expresaron los dirigentes del PD, Romano Prodi, padre fundador, y Nicola Zingaretti, secretario general.»
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Libertação de Auschwitz – há 75 anos



Hoje é o Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto, data em que se celebra o 75º aniversário da chegada das tropas soviéticas a Auschwitz e da consequente libertação de cerca de 7.000 sobreviventes que ainda permaneciam no campo, criado em 1940 e onde foi exterminado mais de um milhão de pessoas.

*** A ler: «Somos os últimos sobreviventes de Auschwitz».

*** A percorrer: este excelente dossier – Viaje al Holocausto.

*** A ver: Las fotos de los SS que reflejan el horror cotidiano de Auschwitz.

*** A ver e ouvir:






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26.1.20

Francisco Rodrigues dos Santos - aí o têm



(E vieram-me à memória os dez anos de Boas Festas de Cavaco…)
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CDS



Pode ser que esteja enganada, mas creio que o que se passou neste fim de semana vai ter mais consequências do que aquilo que se pode prever para já. Para todos, não só para o partido em questão, nem só para a direita.
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O parto que o polícia afinal não fez e outras fábulas



«A 15 de janeiro, o Comando Metropolitano da PSP enviou para as redações um tocante comunicado: um agente tinha ajudado uma mulher a dar à luz "em plena rua". Sob o título "Polícia auxilia parto em plena rua de Lisboa", lia-se uma descrição bastante pormenorizada: "Deparou-se com um aglomerado de pessoas em volta de uma mulher deitada no chão e em trabalho de parto. Aquando da ligação à emergência médica (112), e uma vez que já era visível a cabeça do feto/criança, a operadora foi-lhe dando indicações médicas a fim de continuar com o auxílio à progenitora, até à chegada dos meios de socorro."

Como boa história que era, foi de imediato publicada em vários media, que, claro, a assumiram verdadeira: por que raio iria a PSP inventar tal coisa? Por que raio de facto, mas inventou. Quer a SIC quer o DN falaram com pessoas que estiveram presentes e todas negaram que o agente se tivesse sequer aproximado da mulher. O técnico do INEM que deu indicações para o parto foi taxativo: não foi com um homem que esteve a falar. E dá-se o caso de o bebé - uma menina, e prematura - ter nascido "ao contrário", ou seja, por "parto pélvico", pelo que aquela de "já era visível a cabeça" demonstra que o agente nem viu a expulsão da criança.

Confrontada pela SIC, a PSP disse "manter integralmente as informações veiculadas" admitindo, porém, não ter sido o polícia que realizou o parto. Não foi enviado qualquer desmentido do comunicado; o porta-voz da Direção Nacional, a quem perguntei porquê, disse achar que "não valia a pena". Quando lhe disse que realmente não havia porquê, já que o problema do comunicado era apenas ser falso, riu-se. A seguir, assegurou que não se tinham dado conta, ao escrever, que estavam a dar uma ideia errada do que tinha acontecido, e que tinham aprendido com o caso.

Gostava de acreditar, juro que gostava. Mas tenho umas décadas de comunicados da PSP e da GNR na memória, mais ene exemplos de autos de notícia totalmente martelados - do género do subscrito pelo subcomissário Filipe Silva, que em 2015, em Guimarães, filmado em direto a agredir, por aquilo que parece razão absolutamente nenhuma, um adepto do Benfica e respetivo pai à frente dos respetivos filhos e netos, os acusava de o terem cuspido, rasgado o uniforme e agredido - e não vejo a PSP e a GNR mudar de modus operandi. E o modus operandi é o de "alindar" os acontecimentos, de modo que pareça sempre que não há nada que se possa apontar aos agentes envolvidos, aliás pelo contrário: são sempre verdadeiros heróis, na fila para receber um louvor ou mesmo uma comenda (vá lá que o Presidente da República não foi a correr abraçar o polícia que "fez o parto em plena rua").

É aliás normal que assim seja, já que, explicou-me o porta-voz da PSP, os comunicados são baseados nos autos de notícia elaborados pelos agentes. E qual o agente que vai escrever no auto de notícia "dei uma carga de porrada completamente sem razão porque me passei da cabeça", ou "disparei três tiros na direção do carro porque achei uma ideia boa, ia lá imaginar que balas matam"?


Vhils



Mindelo, Cabo Verde.
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