7.5.21

Vacinas: podia ser uma cimeira social, mas parece que não



 

«Aquele Land-Rover modificado que transportou o caixão do príncipe Filipe do Castelo de Windsor à Igreja é uma boa metáfora da Europa: é visualmente agradável, sem dúvida, mas aquela lentidão própria de um enterro torna-se exasperante quando há uma profunda crise nas mãos.

Joe Biden já tinha surpreendido bastante com a resposta económica à crise provocada pela Covid enquanto a Europa ainda anda a aprovar os Planos de Recuperação dos respectivos países e o comissário Dombrovski volta a ameaçar o regresso às metas do défice em 2023.

O anúncio do apoio da Administração Biden à suspensão temporária dos direitos das patentes das vacinas contra a Covid – como a Organização Mundial de Saúde, África do Sul, Índia, ex-primeiros-ministros como Gordon Brown têm vindo a pedir – é um passo de gigante no combate a um problema global. Ursula von der Leyen foi tímida a responder a Biden (a Europa iria discutir o assunto) mas Charles Michel foi mais incisivo sobre a bondade da proposta Biden e anunciou que o tema seria discutido na cimeira social do Porto, a jóia da presidência portuguesa.

Mas algum júbilo que o anúncio da administração Biden mais a abertura da Europa provocaram em parte da população global – nomeadamente em África – foi rapidamente arrefecido com o balde de água fria vindo da Alemanha: o motor europeu não está disponível para viabilizar a proposta. Com Merkel à distância e o seu veto antecipado, a oportunidade da cimeira do Porto ser, efectivamente, uma cimeira profundamente social parece comprometida, o que é lamentável. A falta de acesso a vacinas nos países mais pobres é um problema de direitos humanos e os tratados admitem que em situação de calamidade como a que vivemos a suspensão das patentes seja possível. Mas também é um problema para a livre circulação dos “ricos”, coisa que Joe Biden percebeu mas o seu interlocutor telefónico na Europa (que não é von der Leyen nem Michel mas por enquanto ainda é Angela Merkel) não.

Assim sendo, é natural que a declaração do Porto seja agradável – como o Land Rover do príncipe – mas não traga muito de novo. Pôr de pé o pilar europeu dos direitos sociais ou reagir à emergência sanitária global será à velocidade óptima para um enterro.»

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1 comments:

António Alves Barros Lopes disse...

Num era para me meter nisto! No entanto e apesar dos anos ainda sofro de Nôjo!
Em primeiro lugar, no caso "Zmar", nem concordo com o procedimento. Deveria, isso sim, haver primeiro uma satisfação com os proprietários do empreendimento (entendido como legal) para indagar se havia algum alojamento disponível para receber os imigrantes contaminados.
Depois, que eu saiba, essa coisa do direito a propriedade, perde-se face a um interesse público superior. Se assim não fosse não se teria construido um metro de Auto-estradas.
Desta forma torno extensível esta minha observação ao caso da propriedade das patentes das vacinas Anti-Covide!
- Se está em causa um bem maior ( veja-se o que está a acontecer na Índia) porque é que essa tal prerrogativa não poderia ser suspensa???