18.9.21

25.000??? Difícil imaginar

 



«Fontes policiais afirmam que "em nenhum momento foi prestada ou notificada informação prévia" sobre o evento. "A partir das 23h00, é recebida via email uma cópia de um email enviado à Delegação do Governo, em duas caixas de correio administrativas (não operacionais) da Polícia Municipal, com milhares de pessoas já na área. Parece que a ligação foi pelo WhatsApp e que estavam havendo festa da universidade ", acrescentou a Polícia Municipal ao jornal ABC.

A polícia local afirmou que "esteve na zona desde a meia-noite às 7 da manhã": "Mas sem aviso prévio da Universidade e, portanto, sem a operação correspondente preparada, dissolver cerca de 25.000 pessoas é tarefa quase impossível", indicou a autoridade.»

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Época de saldos...


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Adeus América, bom dia China

 


«No final do milénio, uma nova China foi entrando devagarinho no nosso mundo, uma companhia simpática que trazia produtos baratos e lojas que vendiam tudo e mais alguma coisa. Íamos também sabendo da deslocalização das fábricas, que implicava algum desemprego, é certo, mas pouco visível num mundo de deslumbre consumista e de frenesim financeiro. Consultores e uma miríade de especialistas massajavam o nosso ego com as vantagens da globalização. Além de que o milagre económico, que retirava milhões de pessoas da pobreza para as instalar em modernas cidades, era a prova de que o capitalismo tinha vencido tudo e todos, mesmo o empedernido Império Maoista que tanto veneno havia lançado ao Ocidente desde o fim da II Guerra Mundial. Com a nova China, acontecia um verdadeiro milagre que inundava de felicidade os consumidores ocidentais.

O problema com os milagres é que dispensam explicações. E tornam as perguntas desnecessárias e inconvenientes provocações. O que nós víamos era que tudo vinha da China. Tudo. Mas qual era o problema? Estávamos numa economia global e a eficiência económica era uma equação partilhada entre Wall Street e Pequim. É verdade que o Ocidente deixou de ter fábricas e passou a viver com desemprego, mas tudo acontecia em nome do progresso. E é também verdade que os chineses tinham comprado as máquinas das fábricas ocidentais, que depois copiavam sem perder tempo ou dinheiro com os direitos industriais. O que era facto é que alimentavam as lojas das sociedades ocidentais com (quase) tudo aquilo de que precisávamos. Ninguém, mas mesmo ninguém, se preocupou em ver quão bizarro era ver a tecnologia tomar o caminho da ida quando na volta apenas vinham produtos baratos. O milagre era visto de tal forma que, antes da pandemia, nunca se questionou de onde vinham, por exemplo, os medicamentos. Assim era e ainda assim é. Os EUA e a Europa estão hoje no momento doloroso de despertar para a situação de dependência em que se encontram e procuram desesperadamente explicações sobre como foi possível terem perdido a liderança de um mundo que controlavam há alguns séculos. O milagre continua, sim, mas não é para todos. O sonho ocidental, esse, acabou.

A China não é propriamente um recém-chegado ao pináculo do mundo. O Império Chinês existia já no tempo do Império Romano com o qual rivalizava em dimensão e força, embora funcionando em metades do mundo que, na altura, não comunicavam entre si. Mais tarde, e durante muitos séculos, a Europa e o Médio Oriente habituaram-se aos produtos fabricados na China, primeiro trazidos por muçulmanos e venezianos e depois por portugueses, holandeses e ingleses. Ao contrário dos restantes povos, nunca o Grande Império do Meio ao longo da sua História (com excepção pontual para uma audácia marítima no séc. XV) se mostrou interessado em afirmar o seu poder fora de portas. A China bastava-se a si própria na sua magnificência e extensão.

Mas, em meados do séc. XIX, a expansão colonial imperial europeia, principalmente inglesa, destruiu-lhe a independência e deu à China o mesmo tratamento que tinha sido dado aos outros povos “descobertos” e colonizados por esse mundo fora. Russos e japoneses completaram o quadro de insultos e humilhações que fizeram cair o Império e que continuou na República. Porém, com o fim da II Guerra Mundial e a vitória dos nacionalistas (que se auto-intitulavam de comunistas), a grande nação perdida vai ressuscitar. Foram os nacionalistas, mesmo os espalhados pelo mundo, que se colocaram atrás da bandeira vermelha para expulsar de vez os estrangeiros.

A China de Mao e de Zhou Enlai apoia-se inicialmente da União Soviética, onde encontrava o motor ideológico para o renascimento e o apoio material e militar para existir. Mas esta convivência, mesmo entre irmãos fraternos, vai tornar-se impossível em 1960 e a cooperação com a URSS dá lugar à confrontação total. A cruzada marxista-leninista da Rússia pela libertação dos oprimidos no planeta vai ter a concorrência feroz da nova variante marxista-leninista-maoista. Mas, para além de exportar ideologia, a China não tinha vocação de conquista, pelo que se fechou e isolou do resto do mundo. As etapas de experimentação social interna que se seguiram, com o Grande Salto em Frente de 1958 a 1962 (40 milhões de mortos) e a Revolução Cultural de 1966 a 1976 (10% da população em presídios), destruíram muito do património material e cultural milenar e tornaram a China num gigante adormecido.

A abertura da China ao mundo vai ser tentada primeiro por De Gaulle em 1964. Um nacionalista que não temia afrontar o poder americano, De Gaulle quis posicionar a França como um árbitro europeu entre as superpotências. O inesperado reconhecimento pela França da República Popular da China, para além da afronta francesa aos seus parceiros ocidentais, não deu grandes resultados. A abertura irá começar apenas com Nixon, Kissinger, Mao e Zhou Enlai em 1972. A América tinha afinal o que mais nenhuma potência podia oferecer: tecnologia e recursos financeiros ilimitados. No entanto, vai ser preciso esperar pela morte de Mao e pela afirmação no poder de Deng Xiaoping para que o intercâmbio com o Ocidente e as transformações aconteçam a um ritmo que se vai tornar alucinante, mudando a China e revolucionando a economia mundial numa alteração estrutural que vai acabar por colocar hoje em questão a própria liderança global dos EUA.

O que se passou nestes 40 anos foi algo de extraordinário. Um país pobre e rural vai tornar-se (num pequeno momento histórico) numa potência económica com ambições de liderança global. A pressa em obter lucros por parte das empresas ocidentais lançou-as de peito aberto na partilha de meios e de tecnologia sem restrições de ordem estratégica. Aliás, o ambiente político foi por regra de grande amizade e colaboração, com a justificação moralizadora no Ocidente de que as melhorias económicas na China teriam como resultado inevitável a abertura da sociedade e a evolução para uma democracia solidária com os valores e os interesses do Ocidente. Só que, afinal, não foi isso que se passou.

As forças do desenvolvimento abriram efectivamente as portas para a expressão de valores humanistas, que foram entrando em confronto com a ortodoxia comunista. O grande choque vai ocorrer em Tiananmen em 1989, quando as potências Ocidentais se colocam ao lado dos que clamam por liberdade. A liderança comunista vê aí um momento de perigo fatal e vai ser o mesmo modernizador Deng Xiaoping que não terá dúvidas em fazer avançar a repressão. O grande reformador tinha afinal outras ideias para a China, que não passavam pela transformação democrática.

Vale a pena relembrar o que Deng explicava a um grupo de visitantes jugoslavos em Junho de 1987:

"Uma das grandes vantagens dos sistemas leninistas é que, quando algo está decidido e uma resolução foi tomada, ela pode ser concretizada imediatamente sem quaisquer restrições. Ao contrário dos americanos, a nossa eficiência é maior porque nós realizamos as coisas assim que estivermos convencidos. Essa é a nossa força e nós temos de manter essa vantagem.”

Com os tanques em Tiananmen e recuperado o controlo político e militar, Deng vai marcar a estratégia da China das décadas subsequentes, mantendo a ambição de crescimento e preservando a proximidade pacífica com o mundo capitalista. Para isso vai ser necessário fazer prova de humildade. A regra máxima de Deng, inspirada no património cultural chinês, que era “Esconde a tua força, espera o teu tempo, nunca tomes a liderança", vai ser repetida até à exaustão por sucessivos dirigentes e marcar profundamente o comportamento de todo um povo.

Esta atitude tranquilizadora para as relações com os parceiros ocidentais vai sendo progressivamente posta em causa por dirigentes chineses em afirmações de política estratégica bem mais interventivas. Da retenção e compostura no comportamento, vai-se passar a fazer apelo à necessidade de ‘concretizar coisas’, realizando acções que afirmem a identidade particular chinesa. Recentemente, apela-se mesmo à liderança de uma ‘Comunidade de Destino Comum’, à volta de um sistema de alianças controlado pela China e fortalecido com parcerias de investimento por ela financiadas, nomeadamente através da Iniciativa da Rota da Seda. Esta transfiguração interventiva, com tons cada vez mais agressivos, vai surpreender muitos políticos e parceiros ocidentais, que só podem concluir que os chineses mudaram.

Provavelmente os dirigentes marxistas chineses sempre foram fiéis à sua linha de pensamento, nacionalista e autoritária. E agora aperceberam-se de que os tempos mudaram, pois com a Grande Crise Financeira de 2008, que pôs o mundo capitalista de joelhos, com o “Brexit” a colocar em causa o futuro da Europa, com a eleição de Trump que tornou os EUA num espectáculo decadente e, por fim, com o caos da resposta à pandemia e com a humilhação americana no Afeganistão, é razoável concluir que o mundo ocidental não era, afinal, o que dizia ser. Não restará, portanto, aos chineses mais do que dar um passo em frente e reivindicar a liderança. Com os EUA corroídos por divisões e alucinações internas, com a Europa incapaz de se assumir como uma potência e com a ajuda de uma Rússia ressuscitada e atenta às oportunidades estratégicas, a China, que escondeu a sua força e esperou pelo seu tempo, toma agora a liderança. Esperando que o Ocidente caia como a União Soviética. Sem guerra. Só por inanição. Percepção que pode originar reacções dos EUA que acrescentem novos perigos ao risco já existente.

É o momento que estamos agora a viver.»

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17.9.21

Então e não tem passado?

 

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Tribunal Constitucional em Coimbra?

 



Eu acho tudo isto de um ridículo atroz! Nem é desprestígio mudar o TC para Coimbra, nem serve seja para o que for fazê-lo. Se querem povoar o país, ponham o TC nas Selvagens, com as famílias dos juízes a tratarem das cagarras de Cavaco.
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O lamaçal que veio para ficar


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«A pequena trupe que insultou Ferro Rodrigues, enquanto almoçava em família, é reveladora de esquinas do nosso país. A técnica usada merece atenção: de todos os tiques em que a trupe abundou, desde a senhora apoplética ao megafone até às ameaças valentaças, o mais notável é que foram os próprios a divulgar orgulhosamente a imagem da façanha. Fornecem assim às autoridades judiciais a prova do feito, mas era isso mesmo que pretendiam, pois cada participante na gritaria estava a encenar-se a si próprio para as redes sociais. O gesto era calculado, não só para ali incomodar o presidente do Parlamento mas para o atazanar pelos tempos fora em partilhas de Facebook. Esta momice nas redes sociais funciona como um meneio efémero numa sala de espelhos, reproduzindo-se infinitamente, e é essa avalancha que é desejada.

O efeito de espelho infinito é a chave da estratégia do lamaçal. Instiga uma transformação dos modos de representação social, pois cria identidades específicas (desde o influencer, mais bacoco, até ao incendiário das emissões ao vivo ou aos exércitos de perfis falsos e às máquinas que multiplicam as suas diatribes), em que o superlativo é a única estratégia que prende a atenção, constituindo assim uma engenharia de ódios, mas também inventa formas de comunicação que atravessam as tradições culturais, e são por isso eficazes. Vários episódios recentes ilustram como este lamaçal mobiliza sentimentos nascidos na direita (o direito individual de recusar as regras da saúde pública) e na esquerda (a desconfiança em relação à Big Pharma ou até tantas das teorias da conspiração) e, por isso, vemos no movimento antivacinas pessoas que nos surpreendem. Essas misturas de sentimentos são evidentes no caso dos ‘coletes amarelos’ em França e, não por acaso, houve a tentativa de os reproduzir entre nós. Apesar desse primeiro falhanço e até da extravagância do antivacinismo em Portugal, é essa política que agora revemos na malta que desembocou no restaurante de Ferro Rodrigues.

Parece pouco e é ainda pouco, mas estas combinações tóxicas tornaram-se uma moda invasiva que empossa uma nova estirpe de figurões. São os profetas “antissistema”. O seu herói atual é Bolsonaro, o “antissistema” que manobra para um golpe militar, a ser feito pela instituição que é o sistema por natureza, enquanto explica candidamente que não aceita que mentiras sejam banidas das redes sociais, dado que “fake news fazem parte de nossa vida. Quem nunca contou uma mentirinha para a namorada? Não precisamos regular”, como dizia há dois dias. Trump, o primeiro iluminado desta saga, propunha mezinhas para curar a pandemia, sugeriu mesmo que lavássemos os interiores com lixívia e teve a segunda maior votação de todas as eleições presidenciais norte-americanas.

Dir-se-á que a trupe no restaurante de Ferro Rodrigues é uma farândola, comparada com estes mestres. Será. No entanto, aí estão a técnica, os meios e a vontade febril de brilhar nas redes de lama. Já há para isso um partido, ou dois, ou três. É assim que se forma gente cujo limite é o seu próprio espelho e que está disposta a tudo para impor a lei da selva.»

Francisco Louçã
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16.9.21

É como dizer que o Pai Natal não existe

 

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Um pequeno absurdo quotidiano

 



Dai-nos, meu Deus, um pequeno absurdo quotidiano que seja,
que o absurdo, mesmo em curtas doses,
defende da melancolia e nós somos tão propensos a ela!
Se é verdade o aforismo faca afia faca
(não sabemos falar senão figuradamente
sinal de que somos pouco capazes de abstracção).
Se faca afia faca,
então que a faca do absurdo
venha afiar a faca da nossa embotada vontade,
venha instalar-se sobre a lâmina do inesperado
e o dia a dia será nosso e diferente.
Aflições? Teremos muitas não haja dúvida.
Mas tudo será melhor que este dia a dia.
Os povos felizes não têm história, diz outro aforismo.
Mas nós não queremos ser um povo feliz.
Para isso bastam os suíços, os suecos, que sei eu?
Bom proveito lhes faça!
Nós queremos a maleita do suíno,
a noiva que vê fugir o noivo,
a mulher que vê fugir o marido,
o órfão que é entregue à caridade pública,
o doente de hospital ainda mais miserável que o hospital
onde está a tremer, a um canto, e ainda ninguém lhe ligou
nenhuma. Nós queremos ser o aleijado nas ruas, a pedir esmola, a
a bardalhar-se frente aos nossos olhos. Queremos ser o pai
desempregado que não sabe que Natal Dai-nos, meu Deus…
há-de dar aos seus.
Garanti-nos, meu Deus, um pequeno absurdo cada dia.
Um pequeno absurdo às vezes chega para salvar. 
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Marcelo – palavras de ferro ou de malabarista?



 

«Marcelo declarou, em Roma, na terça-feira, que a ignomínia levada a cabo pela turba de arruaceiros contra o presidente da Assembleia da República, quando almoçava com a esposa, é um caso de justiça e não comentava.

Dando o dito por não dito, comentou, acrescentando que em Portugal a esmagadora maioria da população é a favor da vacina e a hiperbolização das minorias não pode esconder esse facto.

Foi o que a mais alta figura do Estado disse sobre as ameaças, os insultos, as ofensas e as provocações feitas à segunda figura mais relevante do Estado.

Marcelo sabe, não pode deixar de saber, e desse facto tem consciência, que o sucedido nada tem a ver com o facto de haver uma minoria de portugueses que não se vacinam e que o episódio frente ao restaurante é um insulto à imensa maioria dos que se querem vacinar e rejeitam liminarmente aquele tipo de violência.

O grupo que já se tinha perfilado atrás de um senhor juiz igual a ele, insultando e dando-se ares de ser superior, ofendeu e ameaçou de modo grave Ferro Rodrigues.

A turba não se limitou, no exercício do seu direito de se exprimir, manifestar e reunir, a expor as suas ideias sobre o “malefício” das vacinas, o que as leis portuguesas lhe permitem. Nada disso. O grupo insultou Ferro Rodrigues, ameaçou-o de o perseguir até ao fim dos dias e em relação ao dono do restaurante de ficar marcado para sempre. É um ataque brutal ao Estado de Direito democrático na pessoa do Dr. Ferro Rodrigues.

Uma minoria deve poder expressar as suas ideias dentro do quadro legal vigente. Quer a maioria, quer a minoria não têm o direito de saltar por cima das leis, violá-las e ameaçar seja quem for.

A mais alta figura do Estado, professor de Direito Constitucional, não pode e não deve confundir maiorias e minorias com condutas criminosas de turbas arruaceiras de duas ou três dezenas de associados na maldade quimicamente pura.

Ao fazê-lo, Marcelo, o Presidente da República, está a prestar um péssimo serviço às instituições da República, desde logo àquela que lhe deu posse e onde jurou cumprir e fazer cumprir a Constituição.

Este grupo de foras da lei aterroriza sem sentido e merecia de Marcelo um comentário bem diferente e que, infelizmente, deixou no vazio da sua mente.

Marcelo é o que é, esteja onde estiver, ocupe o cargo que ocupar. Poder-se-ia então concluir pela sua coerência, o que não corresponderia à verdade dos factos. Diz que não vai opinar e opina. Toda a sua vida foi feita de ziguezagues, uns estonteantes e muito comprometedores, outros próprios de menino traquinas e destemperado. Balsemão classificou-os nas suas memórias.

O caso do ataque covarde ao presidente da Assembleia da República exigia do mais alto magistrado da nação outra atitude, mas Marcelo é Marcelo, sempre enredado em jogos e mais jogos e mais jogos, un jongleur.»

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15.9.21

Os candidatos do Chega

 


É sabido que muitos candidatos do Chega às Autárquicas têm faltado aos debates. Percebe-se por esta amostra: se escrevem «proficionais» e «apoio às saúde», o que seria se falassem! Como escreveu uma pessoa no Facebook, «antes de candidatar alguém seja ao que for, convém saber se sabem pelo menos distinguir uma pedra de uma pêra rocha».
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Ventura condenado

 



O Tribunal da Relação decidiu que o líder do Chega e o partido vão ter mesmo de se retratar.

«Ventura e o Chega têm agora, como decidido em maio na primeira instância, 30 dias após o trânsito em julgado para se retratarem das ofensas nos locais onde as concretizaram - SIC, SIC Notícias, TVI e conta do partido no Twitter -, devendo também reproduzir a sentença publicamente, a suas expensas, em todos os locais onde as ofensas foram proferidas. Por cada dia em que o não fizerem, pagarão 500 euros.

A sentença da juíza Francisca Preto, agora confirmada pela Relação, obriga também os réus a "abster-se de proferir ou divulgar, no futuro, declarações ou publicações, escritas ou orais, ofensivas ao bom nome" dos membros da família, sob pena de pagarem 5000 euros por cada nova ofensa. Mas Ventura não só declarou repetidamente, mesmo após a condenação, que nunca se retrataria das ofensas como as reiterou várias vezes - incluindo na TV, ao reagir à sentença -, o que deverá obrigá-lo agora a pagar o valor referido por cada uma. Metade será para os ofendidos.»
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A perigosa noção de ausência do futuro

 


«Um estudo sobre a avaliação dos impactes da crise climática realizado entre jovens de dez países de diferentes latitudes e estágios de desenvolvimento (entre os quais, Portugal) deixa no ar um retrato que tem de estar na primeira linha das discussões políticas do nosso tempo: a maioria (56%) dos jovens envolvidos neste estudo pré-publicado na prestigiada revista científica Lancet diz que o mundo está condenado; quatro em cada dez não quer ter filhos por não acreditar no futuro; seis em cada dez dizem que a sua vida será pior do que a dos seus pais e acusam os políticos de traírem as suas expectativas.

Um estado de espírito assim tão deprimente causa de imediato ansiedade, stress e problemas físicos e mentais nos jovens, dizem os especialistas. E põe em causa as noções de progresso, de expectativa, de confiança e de sentido de devir colectivo que formam as bases das democracias. Quando individualmente não se acredita no futuro, é muito mais difícil acreditar nas respostas de soluções partilhadas e em valores comuns. Cria-se assim o vazio onde cai a democracia e emergem os populismos providenciais. A defesa de soluções radicais contra os “traidores” do poder que vêem o futuro dissipar-se sem fazerem nada para o salvar acentua-se.

Chega-se assim à grande questão: o que fazer para contrariar o agravamento da crise climática e as suas consequências. A dimensão dos desafios leva muitos a considerar que o presente modelo de desenvolvimento é insustentável, que é necessário alterar padrões de consumo e recuperar a frugalidade das gerações anteriores. Esta avaliação, como já aqui defendemos, tem o terrível custo de afrontar o natural “egoísmo” das pessoas, de lhes impor mudanças de vida que na História só aconteceram sob a égide de guerras ou pandemias, ou de esperar conflitos que ameaçam os fundamentos da democracia.

Há depois os optimistas históricos, que acreditam que, nestes tempos, o egoísmo que funcionou como a mola do progresso humano pode funcionar como resposta à crise actual, fazendo com que a ciência resolva os problemas – um texto de Francisco Mendes da Silva no PÚBLICO (edição impressa de 5 de Setembro) é a esse propósito exemplar. Mas também aqui há um problema: o de aplicar à crise do presente uma leitura sobre eventos do passado. Nada nas constatações da ciência ou das ameaças presentes justificam esse optimismo. É essa noção que perturba as perspectivas dos jovens sobre o futuro. Mas é no meio, no compromisso entre mudanças políticas e confiança na capacidade da criação humana que se poderão encontrar as melhores respostas.»

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14.9.21

Não é proibido proibir...

 

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Queridas autárquicas

 


Os monárquicos perderam umas vírgulas pelo caminho quando escreveram este texto, mas são coerentes no trato. Mas não estão interessados nos príncipes?
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Estamos à espera que um chalupa nos tire o sorriso trocista?

 


«Não são esses dois capangas que te protegem, podes ter a certeza!” “Esse restaurante está marcado pelo povo português, nunca mais vai ter paz!” “Assassino”, “bandido”, “pedófilo”. Estas foram algumas das coisas gritadas, através de um megafone, para dentro de um restaurante onde Ferro Rodrigues almoçava com a sua mulher. Algumas pessoas podem estar tão transtornadas que é possível que achem que pegar num megafone para ameaçar e insultar alguém que está dentro de um restaurante, num momento privado e com a sua família, é um exercício de liberdade de expressão. É crime. Não sou jurista, por isso não sei se se trata de um crime público ou semi-público, por ser contra um titular de um órgão de soberania, como se passa com o Presidente da República. Sei que o Ministério Público já abriu um inquérito.

Os negacionistas – já sei que não são negacionistas, só acham que os responsáveis pela vacinação são “assassinos” – não me interessam muito. Se fosse francês ou norte-americano, interessavam-me. Aí são um real perigo para a saúde pública. Aqui, onde ainda há a memória de doenças que podem ser prevenidas matarem, são poucos. Tão militantemente desinformados como em todo o lado, mas felizmente desligados do esforço nacional que fez de Portugal um exemplo na vacinação. Assim sendo, não se lhe deve dar mais espaço do que a relevância que têm.

O que está em causa no episódio de sábado, no Largo de São Bento, em Lisboa, é outra coisa. Não encontrando qualquer resistência das autoridades públicas perante os seus atos de intimidação, estas pessoas estão a tornar-se cada vez mais agressivas. Não estamos a falar de pessoas que, neste ou naquele momento, contestam esta ou aquela opção do Estado. Basta procurar nos arquivos das crónicas que aqui escrevo para perceber que me incluo nesse grupo. Até me opus à prioridade dada à vacinação de menores. Não porque fosse “assassínio”, mas porque vacinar noutras paragens é mais urgente. Mas estas pessoas aparentam ser, em muitos casos, desequilibradas. Noutras ocasiões, viveriam o seu desequilíbrio de forma mais isolada, importunando familiares, amigos e vizinhos. Mas as redes sociais permitem que se juntem e tornam-se num perigo para outros.

Assistimos a esta agressividade totalmente deslocada perante o coordenador da task-force, a quem tentaram barrar a passagem à entrada de um centro de vacinação, com insultos. Voltámos a ver o mesmo com um juiz que, estando suspenso, continua a ser um magistrado e usou do seu estatuto para um abuso de poder sobre a PSP, incentivando outros a seguirem-lhe o exemplo. E, agora, voltam à carga contra o presidente da Assembleia da República. A lei não se suspende porque, coitados, são chalupas. Podemos ir sorrindo, mas um dia aparece um chalupa mais chalupa que nos tira o sorriso trocista da cara. E outros, bem menos chalupas, não hesitarão em aproveitar a corda que se vai esticando para a rebentar. Sinto-me civicamente insultado ao ver um grupo ensandecido a insultar a segunda figura do Estado, num momento privado e familiar. Revira-me o estômago de cada vez que oiço o mesmo insulto atirado a Ferro Rodrigues, que resulta da lama que foi lançada sobre ele, sem que alguém, na justiça e na comunicação social, alguma vez tivesse sido responsabilizado pelo mal que causou. Mas, acima de tudo, não posso tolerar que a esmagadora maioria do país continue a assistir em silêncio à agressividade de uns poucos lunáticos que, de tanto não serem levados a sério, podem, um dia destes, vir a ser um problema sério.

Li, nas redes sociais, muitas pessoas condenarem este ato, começando por um temeroso “apesar de não gostar de Ferro Rodrigues”. Isso nem deve entrar na equação. Não foi apenas Ferro Rodrigues que foi assediado, insultado, perseguido e ameaçado. Foi o presidente da Assembleia da República. A democracia dá àqueles cidadãos o direito ao protesto em frente à Assembleia da República que nos representa, por mais delirantes que sejam os seus argumentos. Têm, em Portugal, uma enorme margem de liberdade. Não lhes dá o direito de invadirem o espaço privado dos que têm o voto popular para os amedrontar. Porque é a todos nós que tentam impor a sua vontade através da ameaça. E, nesse momento, espero que a lei cumpra a sua função.»

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13.9.21

Será bom ou mau?

 

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Isto não vai acabar bem

 


No Sábado passado, Ferro Rodrigues almoçava com a mulher perto da Assembleia da República quando foi insultado assim por uns negacionistas tresloucados. Já aqui chegámos? E não há sempre polícias naquelas paragens?

Mais informação AQUI
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Jorge Sampaio e a “malta de 62”

 


Nós, “a malta de 1962”, perdemos no dia 10 de Setembro um dos nossos, o Jorge Sampaio.

É muito comovidamente que aceitamos a ideia de que deixamos de o ver e ouvir como pessoa presente. E que temos que o transformar em memória, como a de outros que já partiram. Mas este, que é um de nós, ganhou, ao longo dos quase sessenta anos de verdadeira comunhão de experiências e convivialidade de um grupo muito alargado, uma simbologia muito especial. Ao longo destes sessenta anos decorreu História.

Em 1962 eramos um grupo de jovens que olhávamos à volta e víamos: proibição de associações, polícia nas Faculdades, censura, prisões, “bufos” que nos faziam desconfiar de qualquer desconhecido. E também a proibição de celebrar o Dia do Estudante. Alguns foram mais longe e perceberam que tinha que ser travada a luta pela Liberdade. Alguns dias depois já não eram só alguns, mas toda a Universidade que estava de pé.

Jorge Sampaio era então o secretário-geral da RIA (Reunião Inter-Associações) e assumiu a liderança do movimento, com um conjunto de amigos de várias Faculdades. E assumiu, com as características que lhe eram próprias. Não era o “chefe”. No grupo dirigente analisava, discutia, decidia com o colectivo. E para a multidão, porque o era, no estádio universitário, falava com as palavras certas e inclusivas de quem estava em frente de socialistas, comunistas, republicanos, católicos, ou, na sua maioria, jovens que procuravam o caminho para lutar pela Liberdade. Este grupo orgânico, que não era partido nem movimento, ficou cosido entre si pelo espírito de Jorge Sampaio.

A História e a vida vieram dar-nos razão que podíamos escolher Jorge Sampaio como símbolo. Esteve no Tribunal Plenário a defender presos políticos de forma solidária. Esteve nas Comissões Democráticas Eleitorais de Lisboa em 1969.Foi eleito presidente da Câmara Municipal de Lisboa, antecipando a unidade política de Esquerda, que lhe era tão cara. Mas abriu à direita, a quem quisesse colaborar. E, finalmente, foi eleito Presidente da República. Discreta e serenamente ousou dissolver o Parlamento quando o estado do Governo, aliás de substituição, ultrapassou o admissível.

Ousou como chefe supremo das Forças Armadas que não participassem na invasão do Iraque. Com que antecipada perspicácia e sabedoria o fez.

E é simbólico que tenha corrido a meio da noite, sem seguranças, sozinho na cidade, para salvar Timor.

E poucos dias antes de desaparecer apelava à Solidariedade para sírios e outras vítimas da guerra que não era deles.

Em todos estes momentos, “a malta de 1962”, dos vários matizes políticos, esteve com ele. Representava-nos.

Jorge Sampaio, o “nosso” secretário-geral da RIA, nunca deixou de nos honrar com a sua presença nas diversas comemorações do Dia do Estudante que levámos a efeito, mostrando sempre grande disponibilidade. E quando, já no final do seu segundo mandato, faz uma comemoração do 25 de Abril no Pavilhão de Portugal, não se esquece de convidar os seus velhos companheiros, “a malta de 62”. E todos sentimos como Jorge Sampaio privilegiava, uma vez mais, os sentimentos da amizade e da solidariedade.

No próximo ano vai faltar ao nosso encontro, que será o do 60.º aniversário da Crise Académica de 1962, e que se realizou todos os anos até à pandemia. Sem sectarismos nem espírito fechado. Éramos, somos, inclusivos, no espírito de Jorge Sampaio. Outros desapareceram e estão connosco. Jorge Sampaio vai estar sempre presente.

Pela Malta de 62,

Adalberto Casais Monteiro
Álvaro Soares de Almeida
Ana Benavente
António Correia de Campos
António Curvelo-Garcia
António Morais Arnaud
Artur Pinto
Carlos Alberto Sequeira
Carlos Macedo
Eliana Gersão
Feliciano David
Fernando Figueiredo
Filipe Carmo
Filipe Rosas
Francisco Leal Paiva
Helena Cabeçadas
Helena Pato
Herculano Ferreira
Graça Aníbal
Graça Ferreira
Inácia Neves
Isabel do Carmo
Joana Lopes
Joaquim Alexandre Ribeiro
Jorge Freire
Jorge Vasconcelos
José Brandão
José Guimarães Morais
José Carlos Abrantes
José Manuel Calafate
José Zaluar Basílio
Leonor Baeta Neves
Lúcia Ezaguy
Lucinda Vinagreiro
Luísa Corte-Real
Manuel Barata Simões
Manuel Macaísta Malheiros
Margarida Amaral Freire
Maria Eduarda Colares
Maria Eduarda Cortez
Maria Eugénia Malheiros
Maria João Gerardo
Maria da Luz Lima
Maria Manuel Calvet Ricardo
Maria Margarida Silva
Maria Otília Frazão
Maria da Piedade Ferreira
Mário Lino
Maximiano Gonçalves
Miracel de Lacerda
Noémia de Aríztia
Pedro Germano
Pedro Borges
Tereza Bento
Teresa Trigo de Sousa
Vera Adão e Silva
Vítor Matias Ferreira
Yolanda Barbosa 


(Publicado AQUI)
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12.9.21

Sampaio e gays num jantar de Estado

 


É público que Alexandre Quintanilha e Richard Zimler são gays, que estão juntos desde 1978 e que se casaram em 2010, ano em que foi aprovado, em Portugal, o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Mas Zimler contou agora «uma história breve» que teve lugar em 2000. Fê-lo na TV e resumiu-a neste texto que publicou no Facebook. E eu estaria disposta a apostar que nenhum outro Presidente (nem mesmo Mário Soares) teria tido o gesto de Sampaio em circunstâncias idênticas.

«Uma história breve sobre o Jorge Sampaio... Em 2000, quando o President Bill Clinton visitou Portugal, o Alexandre organizou a sua visita ao Pavilhão do Conhecimento. Correu muitíssimo bem. O Alexandre foi convidado ao jantar para o Clinton no Palácio Presidencial. O funcionário do Palácio perguntou-lhe se queria ser acompanhado pela sua esposa. O Alexandre respondeu que queria um convite para mim. O funcionário disse que talvez não fosse possível. Seria a primeira vez que um homem seria acompanhado oficialmente por outro homem. Nesse mesmo dia recebi um convite. E o funcionário disse que o Presidente Jorge Sampaio aprovou o pedido com muito prazer. E no jantar ele apresentou-nos ao Clinton como um casal (com a sua esposa Maria José Ritta a sorrir calorosamente a mim e ao Alexandre).»
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O direito à busca da felicidade

 


«Tanto quanto sei, não foram escritas obras de grande fôlego acerca do direito à busca da felicidade. Isso, para mim, é um sinal evidente de que a ideia de que a dignidade da pessoa humana assume uma fundamental centralidade no funcionamento das Sociedades e dos Estados ou está completamente afastada das mentes das várias elites dirigentes das comunidades ou então é apenas uma flor retórica nos seus discursos.

E Portugal é, nesse aspecto, um caso paradigmático pois a dignidade da pessoa humana é expressamente mencionada logo no artigo 1.º da Constituição, no qual se afirma que esse valor ético constitui uma das bases da República (a outra é o respeito pela vontade popular). Mas, enfim, a dignidade dos seres humanos também é referida no artigo 1.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Mundo está no estado que todos sabemos. Como bem salientou, bem no início do século XX, o americano Nathan Roscoe Pound, existe um abismo entre a lei que está escrita (Law in Books) e os direitos que temos condições para exercer no dia-a-dia das nossas vidas (Law in Action). E, de facto, cada um de nós verdadeiramente só tem os direitos para cujo exercício dispõe das condições materiais para os pôr em prática. Os outros direitos estão apenas "no papel". E é por isso que é indispensável colocar o direito à busca da felicidade individual, que é algo totalmente inerente ao reconhecimento prático e não teórico dessa fundamental centralidade da ideia de dignidade da pessoa humana no funcionamento das Sociedades e dos Estados, na primeira linha do combate em defesa dos direitos humanos. Combate esse que, para ser eficaz, tem de começar por ser um individual - de cada pessoa concreta; ou seja, cada um de nós deverá perguntar, a si próprio, o que é que já fizeste hoje para ver reconhecido que és um ser humano dotado de dignidade própria (logo, de direitos e deveres) e que, sem que com isso tenhas o direito de prejudicar os outros, tens direito a tentar ser feliz e não apenas a sobreviver? Quando isso acontecer, os cidadãos serão mais conscientes/lúcidos e também mais exigentes, em suma, mais cidadãos. E, espero eu, reconhecerão que as instituições da Sociedade e em especial as do Estado estão vinculadas ao cumprimento de certas funções sociais e que só esse cumprimento dessas funções justifica a sua existência - isto é, essas instituições são apenas instrumentos da Comunidade que existem para satisfazer necessidades sociais dos cidadãos. Mas, atenção, como já referi, ninguém tem o direito de prejudicar os outros. Ou de impor as suas ideias aos outros. Como é comum dizer-se, o meu direito termina onde começam os direitos do outro. O direito à busca da felicidade individual tem como corolário o reconhecimento de que todos os outros seres humanos que connosco convivem têm também o direito a buscar a sua felicidade pessoal (sendo certo que não existe um estado geral de felicidade permanente, mas apenas momentos de felicidade - que, por isso mesmo, são tão preciosos e não podem ser desperdiçados) e que são eles e não nós que têm de escolher o caminho para alcançar esse objectivo que também terá de ser fixado por cada um desses outros indivíduos dotados, como nós, de inteligência e livre arbítrio.»

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Sampaio e Timor

 


Do célebre debate na CNN, em 10 de Dezembro de 1996, em que Jorge Sampaio confrontou o embaixador da Indonésia nas Nações Unidas sobre Timor.
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