28.3.24

Uma coisa pensa o cavalo...

 

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Alfredo Cunha, 25 de Abril (14)

 


«Amigos

A partir de agora, recomeço a publicar, na medida do possível, fotografias relativas ao livro "25 de Abril de 1974, Quinta feira". Espero que gostem tanto como eu gostei de o fazer.»

Alfredo Cunha no Facebook.
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A vitória quase invisível do Chega

 

Daniel Rocha

«Quanto à análise do que aconteceu na última terça-feira, remeto para o texto de ontem. Ao apresentar Francisco Assis como candidato à Presidência da Assembleia da República, depois de um acordo furado entre o PSD e o Chega, o PS tinha conseguido que a pressão ficasse onde tinha de estar: nos dois partidos que assumiram ter uma maioria e depois se desentenderam.

Mas, apesar da pressão estar sobre o Chega, foi o PS que não a aguentou. Chamado a resolver os problemas a Montenegro quando Ventura lhe falha, era evidente que assumiria o papel de “adulto na sala”, como o discurso político pueril gosta de dizer, amarrando-se ao papel que já se percebeu que terá. Se tem agora, quando não está em causa nada de fundamental para os cidadãos, imaginem quando for a sério. O que eu não esperava é que juntasse à mera desistência da sua candidatura, que ficou em primeiro duas vezes, um acordo absurdo. Se o impasse continuasse o PS acabaria por eleger José Pedro Aguiar-Branco. Não iria criar um impasse institucional. Mas teria de fazê-lo sem negociações ou moedas de troca para além, talvez, da recusa do nome de Pacheco Amorim para vice-presidente da AR. Como o PSD só fez asneira, tudo estava a favor do PS, que podia determinar os seus tempos, sem se envolver em acordos. Tinha o candidato mais votado e os argumentos que PSD e Chega lhe ofereceram de borla. Mas não se limitou a retirar a pressão sobre o Chega ao fim de 24 horas. Foi muito mais longe, achando que estava a conquistar alguma coisa: firmou, do ponto de vista simbólico, um acordo de bloco central para uma legislatura. Isto depois do PSD o ter ignorado, ter preferido falar com o Chega e ainda ter acusado o PS de convergir com Ventura.

Sem mérito do PS, o PSD deu-lhe uma oportunidade rara e o PS não aguentou 24 horas de pressão. Este era um momento pouco importante para a vida das pessoas, mas vai a determinando o padrão do que vai acontecer. E o que vai acontecer é isto: quando o Chega saltar fora (e é o que fará sempre que sentir que o PS pode estar a ganhar a liderança da oposição), o PSD chama o PS, como plano B, e amarra-o. Este foi o teste. Nos outros vai ser pior, porque estarão em causa a continuação do governo e questões relevantes para a vida das pessoas. O que quer dizer que, se o padrão de ontem se repetir, o PS nunca conseguirá fazer oposição.

Porque é que este acordo é pior do que seria a simples cedência, com abandono da candidatura? Porque é uma fraude prática e uma tragédia simbólica.

Na prática, o PS fica com a presidência da Assembleia da República na segunda parte do mandato que só os muito otimistas acreditam virá a acontecer. Ou o PS acredita que esta legislatura dura até ao fim, ou está satisfeito porque partilhou um queijo suíço e ficou com os buracos.

Do ponto de vista simbólico, a imagem dos dois partidos do “sistema” a chegarem a um acordo para partilharem uma cadeira é, nas águas onde o Chega pesca, perfeita. É acompanharem a campanha digital desenvolvida pelas suas figuras mais populares nas redes – que os media desconhecem – para perceber como a bolha vive uma realidade paralela à dos seus potenciais apoiantes. Não há acordo que dê menor dignidade institucional ao “bloco central” do que este. A presidência rotativa (que não nasce de qualquer tradição europeia, mas como solução de emergência) é o melhor que o Chega poderia ambicionar desta novela. Como bónus, a traição não lhe valeu o voto do PSD no seu vice-presidente, o que prova que o objetivo preferencial de Montenegro, depois do desastre, era prender o PS, não era entalar o Chega.

Teria sido francamente melhor o PS limitar-se a deixar passar o nome, sem exigências vazias e simbolicamente prejudiciais. Na prática daria no mesmo e não passaria a pior imagem. E o PS nem sequer exigiu o afastamento de Pacheco Amorim da vice-presidência, aceitando que o PSD mantenha o apoio ao vice do Chega no preciso momento em que vai bater à sua porta para o salvar de uma traição do Chega.

O PSD percebeu que o PS não aguenta 24 horas de pressão, mesmo quando o jogo é a feijões. Sabe que só tem de o prender à “responsabilidade” de o suportar e de entregar a oposição ao Chega, preparando o caminho para o voto útil pela democracia na AD. Apesar do enorme dano na sua imagem, o PSD teve uma vitória que parece uma derrota – tem o PS mais amarrado. O PS tem uma derrota que parece uma vitória – perdeu autonomia, em vez de a ganhar. E o Chega tem os dois tão junto como os queria.

No fim, temos uma situação caricata: BE, PCP e Livre apoiaram o PS na sua candidatura à Presidência da Assembleia da República, sem falharem com um voto; o PS saltou disso para um acordo com o PSD depois do PSD ter feito um acordo com Chega que correu mal; e, apesar disto, o PSD manteve o voto no vice-presidente proposto pelo Chega depois deste lhe roer a corda. É como se existisse um respeito institucional gradativo que vai indo da esquerda para a direita. Não se pode criticar quem mais ganha com ele.

Resta esperar que Aguiar-Branco, que teria sido eleito à primeira se a liderança do PSD não se tivesse revelado tão incompetente, seja bom presidente numa AR que promete ser a mais difícil de sempre.»

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27.3.24

Mariana Mortágua sobre a direita

 

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Diogo Pacheco de Amorim eleito VP da AR

 


Hoje sai mesmo apenas o chavão:
 
Não foi para isto que aconteceu o 25 de Abril. E até acrescento: nem mesmo o 25 de Novembro.
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Presidência repartida?

 


Espero que o acordo entre PSD e PS fique POR ESCRITO e assinado por Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos em nome dos respectivos partidos.

«Por isso mesmo, o acordo entre os dois maiores grupos parlamentares implicará que o social-democrata José Pedro Aguiar-Branco renuncie no termo da segunda sessão desta legislatura»

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Ninguém conseguiria tramar o PSD como o PSD se tramou

 


«A ver se consigo reconstituir o essencial do primeiríssimo e desastroso momento da maioria de direita. O PSD decide chegar a um entendimento para troca de votos com o Chega, garantindo a eleição de Pacheco de Amorim – já tinha sido a sua posição em 2022 – e o voto dos 50 deputados de extrema-direita em José Pedro Aguiar-Branco. Não fez, nem antes nem depois, um esforço de entendimento com o PS, deixando claras as suas preferências para o futuro, no que não corresponda a prender os socialistas a um orçamento para o impedir de fazer oposição.

Nas 12 horas seguintes, a AD deixa que Nuno Melo e Paulo Rangel neguem o entendimento com o Chega que nunca foi recusado por quem tem responsabilidades parlamentares. Apesar das pantomimas habituais, o Chega mostra compreensível incómodo por ser tratado como “intocável” por quem não deixa de querer os seus votos. E como é o Chega, tira o tapete ao PSD sem qualquer aviso.

Não satisfeito com o disparate, Miranda Sarmento resolve acusar o PS (com quem nem sequer falou) de se aliar ao Chega (com quem o PSD tinha um acordo), numa total inversão dos factos (a aliança que correu mal era entre PSD e Chega) e dinamitando pontes que ainda pudessem existir com os socialistas que decidira ignorado. E ainda tem a lata de ir pedir ao PS que seja uma espécie de suplente do Chega, substituindo os votos que este negou à última da hora.

Assim começou o mandato de Luís Montenegro como líder de uma curta maioria parlamentar. Prova-se que gerir silêncios não chega para ser um bom líder, muito menos quando o contexto político é tão difícil como este. A sorte é isto não ser importante para a vida concreta dos portugueses.

Algumas lições que o PSD pode tirar de um episódio que, se não tiver cuidado, se pode transformar no padrão desta legislatura. Um começo que já está a ajudar a marcar o lugar que cada um ocupará neste complexo xadrez político.

1 – O País não é a Câmara Municipal de Lisboa. As regras não são as mesmas, as consequências de uma crise não são as mesmas, o que está em jogo para cada um dos partidos não é o mesmo, o dramatismo de cada derrota não é o mesmo e o escrutínio mediático não é o mesmo. A “estratégia Moedas” de ir apresentando coisas a ver quem chumba para depois se vitimizar encontrará muito mais dificuldades e resistência. Duvido que funcione como tem funcionado em Lisboa.

2 – Aconselha-se o respeito político pelos oponentes. O PSD teve 29% dos votos, a pior percentagem (somada com o CDS) de sempre, e tem 78 deputados, exatamente o mesmo que o PS – na realidade, se o CDS valer o mesmo que o pior resultado de sempre, com Francisco Rodrigues dos Santos, o PSD vale menos 30 mil votos do que o PS. É deslocada a arrogância com que entrou neste processo.

3 – PSD, PS e Chega estão lutar pela sua autonomia estratégica que pode determinar a sua própria sobrevivência política. Isso será, em grande parte, decidido nestes primeiros meses, em que ficará claro que se o PSD tem um interlocutor preferencial, se fica em condições de o prender à sua governação e se terá condições para o responsabilizar por uma crise política. Será isto que dará mais ou menos liberdade de cada um decidir o que fazer a qualquer momento – no caso do PS, isso inclui oposição construtiva, só possível se não ficar sob chantagem. Nenhum aceitará ser usado sem dar muita luta. O PSD terá de decidir se quer matar o PS, amarrando-o ao seu governo, ou se prefere normalizar o Chega, abrindo o diálogo com ele. Tudo mau, mas é o que resulta das eleições.

Os jogos de sombras, as meias palavras, os acordos escondidos, as chantagens dissimuladas só resultariam com muita arte política. Aquela que conhecemos, como a poucos, a António Costa. E que Luís Montenegro está muito longe de ter. Não tendo, deve evitar brincar com o fogo. Neste jogo, o PSD terá de fazer escolhas e aceitar o preço dessas escolhas. Quando quiser fazer acordos com o Chega, terá de os assumir. Quando quiser falar com o PS, não fala antes com o Chega (os socialistas não aceitam conversar tripartidas) e tem em conta que está a conversar com um partido que tem os mesmos deputados que ele.

O primeiro dia do resto da vida do PSD não podia ter sido mais desastroso. Juntou-se o amadorismo ao cinismo, uma combinação politicamente explosiva. O Chega mostrou a massa de que é feito e que não aceita ser o amante escondido. O PS mostrou que não cai facilmente em ciladas e não aceita ser o plano B do PSD.

O Chega conseguiu o caos de que se alimenta. O PS conseguiu uma primeira volta em que houve três blocos e o da esquerda é maior e uma segunda em que já só o Chega, que ficou pelo caminho, pode ser pressionado. O PSD, com a sua displicência arrogante e o seu jogo dúplice, ofereceu ao PS todas as condições para apresentar o seu próprio candidato. E ofereceu ao Chega o poder de decidir. Ninguém conseguiria tramar o PSD como o PSD se tramou.»

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26.3.24

Esgotos

 


Estação de bombeamento de Crossness, sob as ruas de Londres, parte da reconstrução do sistema do esgoto da cidade. 1859-1865.
Construtor: William Webster.

Daqui.
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As direitas começam bem

 


Líderes do PSD e do Chega tinham combinado apoio, mas Aguiar Branco não foi eleito: só teve 89 votos a favor (134 votos brancos e 7 nulos).

P.S. 19:00 - A AD retirou a candidatura, nova reunião às 21h para apresentação de outras hipóteses pelos vários partidos.
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«O excedente orçamental»

 


Vieira Resurrected no Facebook.
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Eleições e coligações

 


«Como é sabido, com o nosso sistema eleitoral, a distribuição dos lugares de deputados depende muito da existência ou não de coligações pré-eleitorais. Com essa vantagem, a AD ganhou, embora por pouco, as legislativas de 10 de março. Mas com os dados apurados é agora possível compreender qual teria sido a distribuição dos mandatos se tivessem existido outras coligações pré-eleitorais, tanto à esquerda como à direita. É o resultado deste exercício que aqui se apresenta no gráfico com a distribuição atual de mandatos no círculo de dentro e com a que resultaria de potenciais coligações no círculo de fora.

Se a "Esquerda + Verde" (PS+BE+CDU+Livre+PAN) tivesse concorrido coligada e obtido o mesmo número de votos, o número de mandatos conquistados teria aumentado dos actuais 92 (78+5+4+4+1) para 106, resultando na diminuição de uma potencial coligação de centro-direita (AD+IL) dos atuais 88 (80+8) para 84 mandatos e numa redução ainda mais significativa do Chega, que teria obtido 40 em vez dos 50 mandatos.

Na verdade, o reforço da representação parlamentar da "Esquerda + Verde" não teria, no entanto, sido suficiente para atingir a maioria absoluta, ficando ainda a 10 mandatos de distância. No entanto, com os mesmos votos, os papéis teriam ficado trocados.

Teria sido naturalmente Pedro Nuno Santos o indigitado para a formação de governo e seria a Luís Montenegro que se pediria que, em nome da estabilidade, viabilizasse um programa da "Esquerda + Verde" e os seus orçamentos. E se, como noutros países, a maioria relativa fosse suficiente, não seria mesmo necessário pedir a Luís Montenegro, como agora se pede a Pedro Nuno Santos, esse exercício de responsabilidade.

De qualquer forma, é claro que a existência de coligações pré-eleitorais pode fazer a diferença. Fez a diferença nestas eleições com a vitória da AD. E espero que também a possa fazer no futuro para uma "Esquerda + Verde".»

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25.3.24

Tinteiros

 


Tinteiro Jugendstil banhado a prata, em forma de coruja estilizada com olhos de vidro. 1906.
WMF, Alemanha.

Daqui.
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