27.1.22

O liberalismo dinamarquês

 

«Quando para o meu filho mais novo chegou a altura de escolher o que queria estudar e onde, colocou-se além da hipótese de ficar por cá e continuar em casa dos pais, naturalmente a de ir para a Alemanha. Já sabia a língua e teria apoio prático e moral dos familiares que lá temos, não teria que pagar propinas – isso não há neste país – e poderia sustentar a sua vida enquanto estudava através do “Bafög”, um empréstimo público com juros e condições de pagamento vantajosos.

Não fez nenhuma destas escolhas.

Decidiu estudar na Dinamarca. Soube dessa possibilidade através da família da sua namorada. Ao ajudá-lo na candidatura, aprendi como isso funciona.

Qualquer jovem cidadão de um país da UE que tem concluído o 12º ano, pode candidatar-se para um curso no ensino superior na Dinamarca. É ajudado de forma muito eficiente e nada burocrática por uma entidade – pública, note-se! - que se encontra online através do site”Study in Denmark”. Lá pessoas bem-formadas explicam tudo de forma clara, com simpatia e paciência – de facto, achei que estava a falar com o atendimento público duma empresa bem gerida de quem sou um cliente estimado. Um exemplo: quando houve uma pergunta a que a senhora no telefone não soube responder, disse: “Isso é uma questão a colocar mesmo à Universidade de Aarhus – por favor, não desligue, vou ligar para lá e perguntar.” E esclareceu a questão por nós ainda no mesmo telefonema!

Então o Vicente matriculou-se na Universidade de Aarhus, encontrou habitação com ajuda do “Study in Denmark”, onde também há uma bolsa de empregos. Mas, se não estou em erro, o emprego encontrou depois com ajuda direta da Universidade. As regras são as seguintes: O estudante não paga propinas e recebe durante o tempo dos seus estudos um subsídio para se sustentar, de ca. de 700€/mês, a fundo perdido, sob a condição que além disso encontra e exerce um trabalho no mercado livre com, no mínimo, 40horas/mês. Este ordenado – não há ordenado mínimo legal, mas há ordenados mínimos para os diversos ramos, resultantes da negociação coletiva entre patronatos e sindicatos fortes - de 14,50€*40= 580€, somado aos 700€ oferecidos, é suficiente para se sustentar neste país, mesmo tendo em conta os custo de vida lá mais elevado.

E quem paga isso tudo? O contribuinte. Percebe-se agora porque este país tem impostos tão elevados. E porquê os contribuintes não elegem governos que acabam com isso? Se já não para os jovens dinamarqueses, mas para o meu filho? São estúpidos ou vítimas de uma alucinação altruísta?

Não. Pagam-no porque valorizam a educação. Porque sabem que o retorno desta beneficia todos. E sabem que isso vale também no caso do meu Vicente que teve a oportunidade duma experiência de viver nesta sociedade solidária, e está tentado de lá ficar para sempre e, em vez de contribuir para as despesas públicas e as reformas em Portugal, pagar os elevados impostos na Dinamarca e contribuir para o seu sistema social cujos benefícios tão bem conhece.

Lembrei-me disso à propósito deste trecho dum texto de Daniel Oliveira, que encontrei no mural da Joana Lopes:

“No debate com Catarina Martins, João Cotrim Figueiredo disse que para termos os rendimentos da Dinamarca, teríamos de ter as políticas da Dinamarca. Nas redes sociais, espalham memes onde se diz “a Dinamarca é economicamente mais liberal do que os EUA, Portugal está cá para trás, ao nível do Botsuana”. A Dinamarca é só o país com a mais alta carga fiscal europeia, o terceiro com mais despesa social, o terceiro com mais habitação pública, o segundo com mais despesa em saúde em percentagem da riqueza, o terceiro com mais despesa pública na educação, o segundo com as maiores taxas de sindicalização.”

Venha o liberalismo dinamarquês! Que não tem nada, mas mesmo nada a ver com o programa e os valores que se depreendem do programa e do discurso da IL.

Lutz Brückelmann no Facebook
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