31.12.17

Bom 2018 a quem passar por aqui


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A minha fotografia de 2017



E já é 2018 no Fiorde Milford Sound (Nova Zelândia).
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31.12.1968 – Vemos, ouvimos e lemos



É quase um ritual: em 31 de Dezembro regresso à passagem do ano de 1968 para 1969. Há sempre quem não saiba que a Cantata da Paz, tão divulgada por Francisco Fanhais depois do 25 de Abril, foi por ele «estreada» nessa noite, numa Vigília contra a guerra colonial, com letra propositadamente escrita para o efeito por Sophia de Mello Breyner.



Em 31 de Dezembro de 1968, cerca de cento e cinquenta católicos entraram na igreja de S. Domingos, em Lisboa, e nela permaneceram toda a noite, naquela que terá sido a primeira afirmação colectiva pública de católicos contra a guerra colonial. O papa Paulo VI decretara que o primeiro dia de cada ano civil passasse a ser comemorado pela Igreja como dia mundial pela paz e, alguns dias depois, os bispos portugueses tinham seguido o apelo do papa em nota pastoral colectiva.

Assim sendo, nada melhor do que tirar partido de uma oportunidade única: depois da missa presidida pelo cardeal Cerejeira, quatro delegados do grupo de participantes comunicaram-lhe que ficariam na igreja, explicando-lhe, resumidamente, o que pretendiam com a vigília:

«1º – Tomar consciência de que a comunidade cristã portuguesa não pode celebrar um “dia da paz” desconhecendo, camuflando ou silenciando a guerra em que estamos envolvidos nos territórios de África.

2º – Exprimir a nossa angústia e preocupação de cristãos frente a um tabu que se criou na sociedade portuguesa, que inibe as pessoas de se pronunciarem livremente sobre a guerra nos territórios de África.

3º – Assumir publicamente, como cristãos, um compromisso de procura efectiva da Paz frente à guerra de África.»

Entregaram-lhe também um longo comunicado [que está online] que tinha sido distribuído aos participantes, no qual, entre muitos outros aspectos, era sublinhado o facto de a nota pastoral dos bispos portugueses, acima referida, tomar expressamente partido pelas posições do governo que estavam na origem da própria guerra, ao falar de «povos ultramarinos que integram a Nação Portuguesa».

Apesar de algumas objecções, o cardeal não se opôs a que permanecessem na igreja, ressalvando «a necessidade de uma atitude de aceitação da pluralidade de posições».

Pluralidade não houve nenhuma e, até às 5:30, foram discutidos todos os temas previstos e conhecidos: vários testemunhos, orais ou escritos, sobre situações de guerra na Guiné, Angola e Moçambique.

Hoje, tudo isto parece trivial, mas estava então bem longe de o ser. Aliás, seguiu-se uma guerra de comunicados entre Cerejeira e os participantes na vigília. Com data de 8 de Janeiro, uma nota do Patriarcado denunciou «o carácter tendencioso da reunião», terminando com um parágrafo suficientemente esclarecedor para dispensar comentários: «Manifestações como esta, que acabam por causar grave prejuízo à causa da Igreja e da verdadeira Paz, pelo clima de confusão, indisciplina e revolta que alimentam, são condenáveis; e é de lamentar que apareçam comprometidos com elas alguns membros do clero que, por vocação e missão, deveriam ser não os contestadores da palavra dos seus Bispos, mas os seus leais transmissores».

A PIDE esteve presente (há disso notícia em processo na Torre do Tombo), mas não houve qualquer intervenção policial. Alguns jornais (Capital e Diário Popular) noticiaram o evento, mas sem se referirem ao tema da guerra colonial – terão provavelmente tentado sem que a censura deixasse passar. A imprensa estrangeira, nomeadamente algumas revistas e jornais franceses, deram grande relevo ao acontecimento. E foi forte a repercussão nos meios católicos.

P.S. – Quatro anos mais tarde realizou-se uma outra vigília pela paz, na Capela do Rato, com consequências bem mais gravosas porque envolveu uma greve de fome, prisões e despedimentos da função pública.
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30.12.17

Idiotia e Felicidade



«Como pode ser-se idiota e, ao mesmo tempo, feliz, pergunta-me um leitor? Pois explico já. A idiotia e a felicidade são ideias muito vagas, difíceis de cingir em conceitos de circulação universal, digamos. Mas, pensando melhor, acho que certa idiotia é susceptível de conferir ao idiota seu proprietário (ou seu prisioneiro) uma espécie de segurança em si próprio que o levará, em determinados momentos, julgo eu, a uma beatitude muito próxima do que se pode chamar estado de felicidade. Assim sendo, não vejo incompatibilidade entre o ser-se idiota e o ser-se feliz. Bem sei que há várias maneiras de se chegar a idiota. (...)

Ora, um idiota que é infeliz por saber que é idiota já pode estar a caminho de deixar de o ser. É uma possibilidade. É a tal luz no fundo do túnel, como se disse tantas vezes a propósito da situação económica deste idiota de país.

Não se espante, por conseguinte, o leitor de que um qualquer idiota possa, ao mesmo tempo, ser feliz. É, até, assaz corrente. Há idiotas que se consideram inteligentíssimos, o que é uma forma muito comum de idiotia, e extraem dessa certeza alguma felicidade, aquela maneira de felicidade que consiste em uma pessoa se julgar muito superior às que a rodeiam.
O leitor gostaria de ser ministro ou secretário de Estado? Pois fique sabendo que há quem goste, embora - será justo dizê-lo - também há quem o seja a contragosto, por dever partidário ou patriótico.

Os idiotas, de modo geral, não fazem um mal por aí além, mas, se detêm poder e chegam a ser felizes em demasia podem tornar-se perigosos. É que um idiota, ainda por cima feliz, ainda por cima como poder, é, quase sempre, um perigo.
Oremos.
Oremos para que o idiota só muito raramente se sinta feliz. Também, coitado, há-de ter, volta e meia, que sentir-se qualquer coisa.»

Alexandre O'Neill, Uma Coisa em Forma de Assim, 1980 
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O cocó do Presidente



Não pode ser, a realidade ultrapassa a ficção, o «Inimigo Público» fez uma OPA à página da presidência!
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Um país encalhado



José Pacheco Pereira no Público de hoje:

«Poupo-vos os balanços do fim do ano. Um ano é uma convenção e quando termina significa que há preços (muitos) que vão aumentar e alguns impostos (poucos) que vão descer. Espera-se. As pessoas vêm das festas e isso embota a consciência, o que certamente ajuda. Depois volta a rotina.

A comunicação social torna-se absolutamente aborrecida e repete todos os anos as mesmas reportagens. Gostava de saber o que é que aconteceria se houvesse uma estação de televisão em que nada tivesse que ver com o Natal, nem filmes infantis, nem reportagens sobre as consoadas nos hotéis, nem competições de árvores de Natal, nem corridas de Pais Natal, nem multidões nas compras, nem voos cheios e esperas nos aeroportos, nem as greves sazonais. Nem nada. Sem um átomo de “espírito natalício”. Infelizmente ninguém o vai fazer, pelo que estamos condenados a ter tudo igual. Na verdade, não é nada de diferente do que acontece todo ano, só que aqui nota-se mais.

Novidades em 2017? Houve algumas, mas só duas é que podem ser importantes para 2018. Uma foi a crise dos incêndios, que afectou e muito o Governo, e a outra é o contínuo “cumprimento das regras europeias” — saída do défice excessivo — Centeno no Eurogrupo, três aspectos da mesma coisa: o Governo socialista-comunista-bloquista vai governar com o mesmo modelo dos governos da troika, moderado pela margem de manobra de uma melhor economia, mas igualmente castrador.

No PSD, um demónio vingador condenou tudo a continuar quase na mesma. Rio não é igual a Lopes, nem em carácter, nem em competência, nem em seriedade e responsabilidade, é melhor, mas ambos resolveram fazer uma campanha péssima de continuidade e de medo de tomar posições, numa altura em que mais do que nunca o PSD precisava de rupturas. Tornam-se assim um factor de conservadorismo, de bloqueio do debate político, logo um impeditivo à abertura e à vitalidade do partido. Colocar Passos Coelho numa redoma não diminui o poder dos seus actores menores que conduziram um processo sinistro de mediocratização do PSD, e cuja principal preocupação é a sua carreira. Ainda recentemente um deles fez uma exibição televisiva de absoluta ignorância sobre o que estava a dizer e não é excepção nesse abaixamento de bitola de qualidade mínima. Apostaram quase todos em Lopes, mas como a sua legitimação e poder partidário vinha de Passos, deixando os anos do “ajustamento” intactos, ou vão fazer a transumância, caso Rio ganhe, ou estão em condições para lhe fazer a vida negra, como Passos fez a Manuela Ferreira Leite. Por aí, infelizmente não vai haver a força necessária para virar situação de decadência do partido.

Por isso, em 2018, digam o que disserem as sondagens, o Governo está mais fragilizado, o PSD idem, e o país está condenado a uma política de estagnação para a qual parece não haver forças endógenas que alterem o rumo. Daí que por muito que a situação pareça de estabilidade ela é inerentemente instável. A única efectiva criação na política portuguesa dos últimos anos, a aliança PS-PCP-BE, está por isso condenada a traduzir essa instabilidade de fundo, e, a continuarem as coisas como estão, não vai acabar bem nas eleições de 2019. O excesso de tacticismo que domina a política portuguesa faz com que todos os membros da aliança estejam a fazer navegação de cabotagem e a ver se ganham alguma coisa pelo meio, sem qualquer plano consistente para o futuro. O PS pode esperar por ter uma maioria absoluta, o que até agora, mesmo no contexto mais favorável antes dos incêndios, não estava adquirido. Penso que Costa, que já aprendeu com os erros da campanha de 2015, é mais prudente e deseja uma forma qualquer de acordo eleitoral prévio, mas no PS há muita gente a desejar alijar o PCP e o BE, ou a negociar com eles na base de uma posição de força. Saliente-se que uma das razões por que foi possível o acordo de governo PS-PCP-BE foi o facto de o PS não ter condições para negociar a partir de uma situação de força.



29.12.17

São portugueses, com certeza

Dica (688)

Racismo? Balanço positivo



«2017 foi um ano zero no debate público sobre racismo em Portugal: proliferaram as vozes que denunciaram o racismo no quotidiano, nas estruturas de oportunidade e na construção de conhecimento – levando ao fim do estado de negação. (…)
Se 2018 for capaz de inscrever na nação as populações negras, ciganas ou muçulmanas com dignidade e complexidade, ficará para a história.»
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Quanto mais me financias, mais gosto de ti



«Queria começar esta crónica desejando um magnífico ano de 2018 para todos os leitores, excluindo os que pertencem a partidos. A esses é escusado desejar porque já o garantiram. Isto foi a forma irónica - ou, segundo o spin partidário, populista - de fazer uma "piada" à recente lei do financiamento dos partidos.

Para começar, o facto de termos de acautelar um limite para as doações é uma espécie de confissão dos partidos - agarrem-me, senão eu roubo. Vou usar de todo o meu populismo para dizer que somos um país onde os políticos ganham pouco, mas gastam muito.

Podíamos estar aqui horas a falar da forma e conteúdo desta nova lei, mas estamos todos demasiado cansados das consoadas e das conversas em família. Das alterações à lei, a que me faz mais confusão é a isenção total de IVA para os partidos políticos, com efeitos retroactivos.

Vamos lá ver. Se os partidos acham que era injusto o IVA que pagaram em tempos e querem recebê-lo de volta, eu também quero receber o IVA que paguei a mais nos restaurantes no tempo da PAF. Este Governo já confirmou que era injusto. Isenção do IVA com efeitos retroactivos aos processos pendentes dá vontade de chorar, não fosse o IVA dos lenços.

Acho espectacular que se pague IVA de fraldas e que, a seguir, se façam comícios e as bandeiras não paguem IVA e nem para limpar o rabo servem. Segundo o que li, os partidos passam a ter IVA mais favorável do que as IPSS. Pelo menos, já dá para comprar verdadeira roupa de alta-costura.

O mais extraordinário do spin partidário é o querer reduzir a indignação de muitos a populismo, logo aqueles que todos os dias o usam. A forma de tentar anular uma indignação que, estranhamente, muitos sentem é tentar diminuir intelectualmente quem a tem. Não resulta porque somos nós que vamos votar em vocês. A verdade é que, talvez por isso, julguem que somos intelectualmente fraquinhos.

Tal como resulta mal as falsas virgens ofendidas. Ver Santana Lopes e Rui Rio ficarem chocados com esta lei é o tipo de lição de moral que não consigo aceitar. É como ver Maradona chocado com o doping no ciclismo. Ou ver Assunção Cristas, agora, depois de meses e reuniões mais secretas do que aquelas a que vai o Nuno Magalhães na casa Mozart, vir dizer que saltou fora. Imagino que jamais o CDS vai aceitar devoluções e IVA, a não ser que venham em nome de um Jacinto Leite Capelo Rego. O CDS é o partido que fica do outro lado do muro a guardar enquanto os outros vão roubar as nêsperas, mas se aparece o dono diz que os outros foram às nêsperas.

Para acabar, o nosso sempre presente e opinativo Presidente Marcelo diz que não pode pronunciar-se "já" sobre as alterações à lei do financiamento dos partidos. Fico impressionado, até sobre o sentido da vida ele conseguiria falar mas, sobre isto, tem de meditar.

Termino como comecei, desejando um bom ano de 2018 para todos e uma excelente passagem de ano, mas deixo uma sugestão: depois desta lei do financiamento dos partidos, proponho trocar as cartolas compradas pela CML por auréolas para todos os portugueses. Bom ano. »

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28.12.17

Apesar de já ser passado



… não perdeu a validade.
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O admirável mundo proibido




Vale a pena percorrer a notícia e ver a longa lista de alimentos e bebidas referidos para contatar como entrámos, decididamente, num admirável mundo novo onde cada vez mais realidades são obrigatórias ou proibidas.

É isto que queremos? Uma vida mandatoriamente liofilizada? Triste mundo hipercivilizado…
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Feliz 2018 (se existir)



Ricardo Araújo Pereira na Visão de hoje:


Na íntegra AQUI.
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Marcelo escreve a Marcello



A propósito do Congresso da Oposição em 1973

Excelentíssimo Senhor Presidente (do Conselho),
Excelência,

Pedindo desculpa do tempo que tomo a Vossa Excelência, vinha solicitar alguns minutos de audiência (...). Seria possível, Senhor Presidente, conceder-me os escassos minutos que solicito? (...) Acompanhei de perto (como Vossa Excelência calcula), as vicissitudes relacionadas com o Congresso de Aveiro, e pude, de facto, tomar conhecimento de características de estrutura, funcionamento e ligações, que marcam nitidamente um controle (inesperado antes da efectuação) pelo PCP. Aliás, ao que parece, a actividade iniciada em Aveiro tem-se prolongado com deslocações no país e para fora dele, e com reuniões com meios mais jovens.

Como Vossa Excelência apontou, Aveiro representou, um pouco mais do que seria legítimo esperar, uma expressão política da posição do PC e o esbatimento das veleidades «soaristas». O discurso de Vossa Excelência antecipou-se ao rescaldo de Aveiro e às futuras manobras pré-eleitorais, e penso que caiu muito bem em vários sectores da opinião pública. Com os mais respeitosos e gratos cumprimentos,

Marcelo Rebelo de Sousa

* in «Cartas Particulares a Marcello Caetano», organização e selecção de José Freire Antunes, vol. 2, Lisboa, 1985, p. 353).

(Publicado no grupo do Facebook «Fascismo nunca mais!»)
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Passos decididos na direcção do caos



«Os sinais de que os passos rumo ao caos climático estão a ser dados foram sentidos de forma inequívoca em Portugal: os incêndios florestais de Junho e de Outubro, fruto de aberrações de temperatura e humidade, mostram-nos como o território nacional é vulnerável às alterações climáticas, em particular quando estas aberrações se sobrepuseram a uma longa seca que inviabilizou até o abastecimento de água às populações e à agricultura. Só a redução da massa de árvores é que limita a probabilidade de nos próximos dois a três anos termos incêndios desta mesma magnitude. Mas depois disso façam as vossas apostas, porque estruturalmente nada mudou no grande pinhal-eucaliptal que é a nossa área florestal. No balanço do ano de 2017, a dimensão dos incêndios florestais em Portugal é um gigante que só tem paralelo em outra monstruosidade: um novo aumento das emissões de gases com efeito de estufa à escala global.

Em 2017 bateu-se o recorde de furacões formados num ano sob o Oceano Atlântico: Franklin, Gert, Harvey, Irma, Jose, Katia, Lee, Maria, Nate e Ophelia. Entre estes dez furacões, o Harvey no Texas, o Irma em Cuba, Florida e Barbuda e o Maria em Porto Rico foram autênticas armas de destruição massiva. Segundo a Organização Meteorológica Mundial, o Irma foi o furacão mais forte de sempre no Atlântico. Por outro lado, devido às temperaturas quentes aberrantes no Atlântico, o furacão Ophelia seguiu na direção da Europa, causando três mortos na Irlanda e na Grã-Bretanha, com os seus ventos quentes a contribuírem para o catastrófico dia de incêndios — 15 de Outubro — em Portugal e Espanha, que causou mais de 50 mortos. Entretanto, no Pacífico, o tufão Lan foi o segundo maior alguma vez registado e causou mortes e estragos no Japão. Cheias e aluimentos de terras na Colômbia, na Mauritânia, no Vietname e nas Filipinas provocaram centenas de mortes. Nos Estados Unidos, a época de incêndios, em particular na Califórnia, foi a pior de que há registos, devastando zonas urbanas e deixando centenas de milhares de pessoas sem casas.

Com o degelo recorde na Gronelândia e na Antártida Ocidental, a subida do nível médio do mar em 2017 foi de 3,4 milímetros.

Politicamente, a saída anunciada do Acordo de Paris por parte dos Estados Unidos de Trump confirmou a entrada num novo capítulo da retórica americana acerca das alterações climáticas (embora não na prática, já que vem das administrações anteriores a colocação dos EUA no topo das emissões e da produção de combustíveis fósseis). Entretanto, o Presidente francês Emmanuel Macron descobriu nas alterações climáticas um filão de oportunidade política e organizou uma cimeira em Paris para discutir em abstrato o que fazer. O Banco Mundial anunciou mais dois anos de financiamento à indústria fóssil e o governo francês aprovou no Parlamento a proibição da exploração de combustíveis fósseis... em 2040. A União Europeia, por outro lado, propôs ao Banco Europeu de Investimento que subsidie a construção de um sistema de infraestruturas de transporte e armazenamento de gás natural, mais de 90 projetos para resgatar a indústria petrolífera durante mais quatro ou cinco décadas e evitar a transição para as energias renováveis.

A ministra portuguesa do Mar assinou um acordo com um subsecretário de Estado dos EUA com a intenção de tornar o Porto de Sines uma porta de entrada para o gás de fracking americano. Na cimeira de Macron, António Costa aproveitou para repetir um anúncio que já tinha feito na Cimeira (oficial) do Clima em Bona: as duas maiores centrais a carvão do país fecharão até 2030. O cenário de referência para o Programa Nacional para as Alterações Climáticas, aprovado pelo governo Passos Coelho, colocava a central térmica de Sines da EDP fora de funcionamento já em 2020. A ambição do Governo do PS é dar-lhe mais dez anos. Ao mesmo tempo, o Governo recusou-se pôr um ponto final nas concessões petrolíferas ao largo do Alentejo e em terra (Batalha e Pombal), apesar de várias propostas parlamentares nesse sentido. Se decidir prolongar pela terceira vez a autorização da ENI/Galp para furar em Aljezur, o Governo comprará uma grande batalha para 2018.

Tal como se fazem diariamente as contas dos orçamentos de municípios, regiões, países, espaços comunitários, também se fazem contas para o "orçamento de carbono", com a atualização constante das emissões de gases com efeito de estufa que podem ser feitas até se atingirem aumentos de 1,5ºC, 2ºC, 3ºC e por aí fora. Segundo o Carbon Brief, site de académicos e jornalistas dedicado às alterações climáticas, estamos a menos de cinco anos de atingir um aumento de temperatura de 1,5ºC, e a menos de 20 anos de atingirmos um aumento de temperatura de 2ºC. Este aumento de temperatura é aquilo que o Acordo de Paris teoricamente queria evitar até 2100, mas que, mantendo este rumo, ocorrerá em 2036. Em 2017, depois de três anos de estagnação das emissões de gases com efeito de estufa, as emissões voltaram à trajetória ascendente, devendo aumentar 2% em relação ao ano anterior, naquele que é o sinal mais inequívoco de que entre o oportunismo político e a força da indústria petrolífera, estão longe de ser atingidas as acções necessárias devido à fraqueza e à cobardia das instituições nacionais e internacionais, que marcham alegremente na direção do caos.»

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27.12.17

Dica (687)




«Sim, é verdade que muitas vezes governo, Parlamento e tribunais se colocam a jeito e dão enormes tiros no pé mas, com Marcelo desabrido, como aconteceu ao longo deste ano, na opinião pública prevalece a ideia de que nem o governo governa, nem o Parlamento é útil, nem os tribunais fazem justiça e, por isso, parece que todos os órgãos de soberania, tirando a Presidência da República, são inúteis. Isto, para mim, é suficiente, apesar de gostar da persona Marcelo Rebelo de Sousa, para achar que ele não é o político do ano e, até, que pode vir a ser pernicioso para o país... Esperemos que não.»
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Ei-lo, o primeiro caso «pós-natalício»



«Foi recebido no Palácio de Belém na passada sexta-feira, 22 de dezembro, o Decreto da Assembleia da República n.º 177/2017, que altera a Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional), a Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de agosto (Lei dos Partidos Políticos), a Lei n.º 19/2003, de 20 de junho (Lei de financiamento dos Partidos Políticos e das campanhas eleitorais) e a Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de janeiro (Lei da organização e funcionamento da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos.

Trata-se, portanto de uma Lei Orgânica, ou seja, de um diploma sobre o qual o Presidente da República não se pode pronunciar antes de decorridos oito dias após a sua receção, nos termos do Artigo 278.º, n.º 7, da Constituição da República.

Como previsto no mesmo artigo, durante este período de oito dias e após a notificação pelo Presidente da Assembleia da República, têm o Primeiro-Ministro e um quinto dos Deputados em funções, o direito de requerer a fiscalização preventiva da constitucionalidade do decreto.»

E agora, senhores partidos? Uma prendinha de Ano Novo para o presidente vetar?
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E assim se fazem notícias



Um jornal publica, os outros papagueiam e abre-se um pé de vento. Quando, afinal, as cartolas, que tanta tinta fazem correr nas redes sociais, custam zero euros à CML:

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Orçamento: ainda falta segurança contra riscos



«Diz o Presidente, num excessivo gesto de comentador: cuidado com os eleitoralismos em 2019. A boa notícia é que Marcelo, como toda a gente, dá como garantida a execução orçamental de 2018; a má notícia é que há nervosismo no horizonte de 2019. Ora, gostaria de contrariar esta flutuação e de recomendar mais prudência. Neste artigo, apresento a minha lista dos riscos para o orçamento, para provar que não há favas contadas.

Risco 1. Olhar só para muito longe pode dar tropeção, falta cumprir o orçamento de 2018. E vão surgir previstos e imprevistos. Os previstos: desgaste dos serviços públicos, que têm uma dívida oculta correspondente ao não investimento. No caso da saúde, o défice é tal que o reforço de verbas não tem sido suficiente para evitar a redução do peso dos cuidados garantidos pelo Estado, ou seja, as famílias pagam um imposto secreto que é o seu custo suplementar com saúde. Assim, o tempo de espera aumentou e as consultas de cuidados primários ainda são menos do que 2011. É certo que Portugal teve grandes progressos, que nascer aqui é mais seguro do que na maior parte dos países europeus, que as complicações pós-cirúrgicas são delimitadas. Mas falta investimento em carreiras profissionais e reequipamento. A saúde vai sempre ser mais cara, até por causa dos problemas estruturais do envelhecimento e estilo de vida. O Orçamento precisaria de mais 1% do PIB para começar a inverter a degradação dos serviços públicos. Depois temos os imprevistos internos, como os resultados da negociação sobre as carreiras da função pública, ou externos, como Trump.

Risco 2. A banca é um susto e é um susto caro, já custou 40 mil milhões numa década. São agora mais 30 mil milhões de crédito malparado que a banca quer que o Estado pague de uma forma ou outra (ou em impostos ou em donativos). Mas há outros problemas, como a União Bancária. Diz o Governo, complete-se. Insensatez, porque o problema é que essa máquina foi criada para retirar ao soberano o poder de agir sobre o sistema bancário do seu país e para promover a concentração bancária, como explicou Danièle Nouy ao PÚBLICO. Ou seja, para fazer do Santander o banco da Europa do sul. E isto pode tremer, sobretudo com a banca italiana e mesmo a alemã. Ninguém sabe quanto vai custar.
Mais riscos: a partir de Setembro não se sabe o que fará o BCE com os títulos de dívida portuguesa (37 mil milhões). A melhor solução seria uma garantia de recompra de títulos emitidos sempre que os actuais chegarem à maturidade. Mas pode haver outras que pressionem a subida dos juros e efeitos recessivos (e as aventuras de Trump também puxam os juros para cima).



26.12.17

Dica (686)




«When it comes to the would-be AI jobocalypse the Kool-Aid flows mightily. For those that drinketh of it, it is certain that in the not-too-distant future artificial intelligence and-or robots will steal the vast majority of jobs currently occupied by human beings. In the United States, where the social safety net is all but nonexistent, the outcome of such a technological leap forward would be societal collapse, barring dramatic progressive economic restructuring.

On the other hand, this might not be at all true. Maybe in real life there are a great many jobs that we just don’t want machines to do—such as those in healthcare, the fastest-growing job sector by a wide margin—or even that machines fundamentallycan’t do. This second category is the focus of a policy paper published this week inScience by researchers Erik Brynjolfsson and Tom Mitchell of the Sloan School of Management at MIT. Generally, they find that while, no, it’s not really the “end of work,” things are nonetheless about to get weird.»
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Jean Ferrat teria 87

O grande Jean Ferrat, representante típico de gerações de intérpretes politicamente engagés, para sempre ligado a «Nuit et Brouillard» e a tantos outros títulos, o eterno compagnon de route do Partido Comunista Francês, que não hesitou em denunciar a invasão de Praga em 1968.




C'est un nom terrible Camarade / C'est un nom terrible à dire / Quand le temps d'une mascarade / Il ne fait plus que fremir / Que venez-vous faire Camarade / Que venez-vous faire ici / Ce fut à cinq heures dans Prague / Que le mois d'août s'obscurcit.

Mas para além de tudo isto ficará para sempre:


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Belém, palácio desocupado



Excelentes condições, belas vistas.
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Este jovem faria hoje 124 anitos


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Pós-democracia



«O conceito de pós-democracia, tal como o vamos desenvolver adiante, parece ter partido do sociólogo Colin Crouch, (n. 1944), professor em Inglaterra na Universidade de Warwick, no seu livro Coping with Post-Democracy, publicado em 2000.

Trata-se da constatação de que, com a globalização, muitas das decisões tomadas, na política como na economia, são-no a nível global, nos foros internacionais, de que a maior parte das pessoas estão arredadas. Daí uma clara falta de interesse pela política e consequente abandono da participação nos actos eleitorais, principalmente nos países desenvolvidos, onde raramente as abstenções são abaixo dos 50%.

Aqui, apontar-se-ia de imediato a União Europeia como uma das causas para o alheamento referido. Mas o mesmo acontece noutras regiões como nos Estados Unidos e Japão, onde as instituições políticas são de outro tipo. Porém, o que Colin Crouch esclareceu foi que nessas sociedades as instituições democráticas existem, mas são meramente formais, uma vez que as decisões são tomadas por uma elite que detém o poder político e económico. E isto é evidente desde que o neoliberalismo se tornou teoria e prática depois da implosão da União Soviética e dos outros países socialistas.

A financeirização da vida política e económica, onde tudo é considerado mercadoria, desde os humanos à arte, é aceite por todos os “especialistas” destas questões, que aparecem com os seus comentários e alertas sempre a invocar o imperativo do lucro das grandes empresas. Dois casos recentes em Portugal são elucidativos. Quando o governo de Passos Coelho ficou na posse de 85 quadros de Miró, que pertenciam ao BPN, logo se disponibilizou para os leiloar a um preço avaliado em 36 milhões de euros, seguramente para agradar à troika e às instituições que tinham o governo sob tutela. Muito se devem ter impressionado alguns elementos dessas instituições pelo menosprezo demonstrado por uma colecção de arte ímpar, a troco da redução de uma parcela ínfima da dívida portuguesa.



25.12.17

Espanha: não há rei para tanto país



Mais um discurso de um rei tão desastroso que talvez venha a ajudar Espanha a tornar-se uma República mais depressa do que previsível.

«Hoy, el rey Felipe ha intentado entrar en muchas casas asegurando que “hay que reconocer que no todo han sido aciertos; que persisten situaciones difíciles que hay que corregir, y que requieren de un compromiso de toda la sociedad para superarlas". ¿Qué "sociedad", se preguntarán muchos/as españoles? ¿La que Su Majestad protegía el 3 de octubre? ¿Esa mayoría silenciosa que resultó ser un engaño electoral? ¿La que eligió y reeligió la opción independentista en Catalunya? ¿La que contempló horrorizada, desde Lugo a Málaga, las cargas del 1-O y el encarcelamiento sin sentencia y sin consenso jurídico de líderes políticos con su bendición?»

Daqui – a ler na íntegra.
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A gente põe-se a pensar e pergunta

Dia de era bom


DIA DE NATAL

Hoje é o dia de era bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.

É dia de pensar nos outros- coitadinhos- nos que padecem,
de lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar a sua miséria,
de perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos que não merecem,
de meditar sobre a nossa existência, tão efémera e tão séria.

Comove tanta fraternidade universal.
É só abrir o rádio e logo um coro de anjos,
como se de anjos fosse,
numa toada doce,
de violas e banjos,
Entoa gravemente um hino ao Criador.
E mal se extinguem os clamores plangentes,
a voz do locutor
anuncia o melhor dos detergentes.

De novo a melopeia inunda a Terra e o Céu
e as vozes crescem num fervor patético.
(Vossa Excelência verificou a hora exacta em que o Menino Jesus nasceu?
Não seja estúpido! Compre imediatamente um relógio de pulso antimagnético.)

Torna-se difícil caminhar nas preciosas ruas.
Toda a gente se acotovela, se multiplica em gestos, esfuziante.
Todos participam nas alegrias dos outros como se fossem suas
e fazem adeuses enluvados aos bons amigos que passam mais distante.

Nas lojas, na luxúria das montras e dos escaparates,
com subtis requintes de bom gosto e de engenhosa dinâmica,
cintilam, sob o intenso fluxo de milhares de quilovates,
as belas coisas inúteis de plástico, de metal, de vidro e de cerâmica.

Os olhos acorrem, num alvoroço liquefeito,
ao chamamento voluptuoso dos brilhos e das cores.
É como se tudo aquilo nos dissesse directamente respeito,
como se o Céu olhasse para nós e nos cobrisse de bênçãos e favores.

A Oratória de Bach embruxa a atmosfera do arruamento.
Adivinha-se uma roupagem diáfana a desembrulhar-se no ar.
E a gente, mesmo sem querer, entra no estabelecimento
e compra- louvado seja o Senhor!- o que nunca tinha pensado comprado.

Mas a maior felicidade é a da gente pequena.
Naquela véspera santa
a sua comoção é tanta, tanta, tanta,
que nem dorme serena.

Cada menino
abre um olhinho
na noite incerta
para ver se a aurora
já está desperta.
De manhãzinha,
salta da cama,
corre à cozinha
mesmo em pijama.

Ah!!!!!!!!!!

Na branda macieza
da matutina luz
aguarda-o a surpresa
do Menino Jesus.

Jesus
o doce Jesus,
o mesmo que nasceu na manjedoura,
veio pôr no sapatinho
do Pedrinho
uma metralhadora.

Que alegria
reinou naquela casa em todo o santo dia!
O Pedrinho, estrategicamente escondido atrás das portas,
fuzilava tudo com devastadoras rajadas
e obrigava as criadas
a caírem no chão como se fossem mortas:
Tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá.

Já está!
E fazia-as erguer para de novo matá-las.
E até mesmo a mamã e o sisudo papá
fingiam
que caíam
crivados de balas.

Dia de Confraternização Universal,
Dia de Amor, de Paz, de Felicidade,
de Sonhos e Venturas.
É dia de Natal.
Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade.
Glória a Deus nas Alturas.

António Gedeão
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24.12.17

Natal, Natal



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Assombrações natalícias



Vai uma pessoa comprar um bolo-rei ao Califa, como habitualmente, e está pela primeira vez na vida a um metro deste paspalho!
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Não Digo do Natal



Não digo do Natal – digo da nata
do tempo que se coalha com o frio
e nos fica branquíssima e exacta
nas mãos que não sabem de que cio

nasceu esta semente; mas que invade
esses tempos relíquidos e pardos
e faz assim que o coração se agrade
de terrenos de pedras e de cardos

por dezembros cobertos. Só então
é que descobre dias de brancura
esta nova pupila, outra visão,

e as cores da terra são feroz loucura
moídas numa só, e feitas pão
com que a vida resiste, e anda, e dura.

Pedro Tamen, in Antologia Poética 
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23.12.17

Esta sai todos os anos


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Ladainha dos póstumos Natais



Ladainha dos póstumos Natais

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que hão-de me lembrar de modo menos nítido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós consigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem vivo esteja um verso deste livro

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito

David Mourão-Ferreira, in «Cancioneiro de Natal»
 

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Experiências natalícias



A verdade é que eu sei de quem já tenha pegado num jeep da GNR, nas mesmas circunstâncias, e chegado bem a casa.
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A insuportável evidência das coisas



Miguel Sousa Tavares no Expresso de 23.12.2017 (excerto): 

«Assim que foram privatizados, os CTT encerraram o posto de correio que ficava a cem metros de minha casa, em Lisboa — um entre dezenas ou centenas que vêm encerrando pelo país todo, e em especial no interior, que todos os políticos juram não querer ver desertificado. Agora o mais próximo da minha área de residência fica a dois quilómetros. É preciso ir de carro e só por milagre se arranja lugar para estacionar nas proximidades. Seria de crer que o encerramento de balcões tivesse conduzido a uma concentração de pessoal em menos, mas maiores e melhores balcões, mas, no caso concreto, foi pura ilusão: aparentemente, nenhum dos funcionários do posto extinto se transferiu para este. Mas os utentes, esses sim, dobraram em número e nem sequer têm cadeiras suficientes para se sentarem enquanto esperam: da última vez esperei 25 minutos para levantar uma carta registada — a pior coisa que alguém me pode mandar hoje em dia. Do fundo do coração, só posso agradecer a Passos Coelho, Paulo Portas, Vítor Gaspar e Maria Luís Albuquerque o notável benefício que trouxeram ao concreto da minha vida. Eu e milhões de outros portugueses.

Os CTT públicos eram uma empresa eficiente e rentável: dava, em média, €60 milhões de lucros por ano ao Estado e cumpria, sobretudo na província, uma função social preponderante. Isso, mais o facto de ser um serviço público funcionando em regime de monopólio, deveria aconselhar qualquer pessoa minimamente dotada de sensatez (já não falo de ideologias) a pensar dez vezes antes de se decidir pela sua privatização. Mas nada deteve a teimosia de Passos, feita de um liberalismo enxertado à pressa, talvez pelo mestre António Borges, o je-m’en-fichisme de Portas e, desculpem a ousadia, a impensável incompetência económica de que a dupla Gaspar/Maria Luís deram provas.

Mas podiam ao menos ter revelado algum sentido de história, lembrando-se do que foi a privatização dos correios ingleses, levada a cabo por Margaret Thatcher, e que conseguiu transformar um serviço, que já no reinado da Rainha Vitória era conhecido por ter duas distribuições diárias de correio, numa atividade quase terceiro-mundista. Porém, preferiram privatizar os CTT, dando ainda como benesse uma licença bancária, cuja finalidade era transformar os postos de correio em agências bancárias e as pensões dos reformados em depósitos à ordem ou em investimentos a cargo do banco. Hoje, três anos decorridos, constatamos várias coisas: que o serviço postal é uma droga, sem apelo; que fecharam balcões e despediram trabalhadores; que os accionistas retiraram uma média de €80 milhões por ano, onde o Estado só retirava €60 milhões; e que estão semifalidos. Por conseguinte, acabam de anunciar mais 800 despedimentos, e mais uns quantos encerramentos de balcões. E sabem o que aconteceu no dia a seguir a este anúncio? As acções dos CTT chegaram a subir 10% na bolsa. Ou seja: aquilo que é mau para o país e para os trabalhadores da empresa, é bom para os accionistas. Alguém quererá pedir desculpa pela privatização dos CTT?»

(Texto daqui.)
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22.12.17

Dica (685)

E agora, Rajoy?



Daniel Oliveira no Expresso diário de 22.12.2017:

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«Descabezado» é uma bela palavra




«Rajoy não admite dialogar com Carles Puigdemont, que propôs uma conversa fora de Espanha. O presidente do Governo espanhol disse que só vai falar "com quem ganhou as eleições, que foi a senhora Arrimadas". À questão sobre se admite encontrar-se com Puigdemont se ele vier a ser o líder de um Governo formado pelos partidos separatistas, Rajoy deu uma resposta institucional, que não esclarece se Puigdemont poderá assumir essa posição devido ao facto de ser procurado pela Justiça espanhola: "Tenho de falar com a pessoa que vier a exercer a presidência da Generalitat."»

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Uma reflexão de Natal



«É Natal e eu gostava de fazer uma crónica que unisse todos os povos do mundo ou que, pelo menos, reduzisse a metade os insultos nos comentários, se bem que, do meu ponto de vista, os insultos são melhor do que palmas. Palmas, qualquer um bate, seja ao que for, inclusive ao discurso do nosso patrão, que não podemos ver à frente. O insulto é algo que sentimos necessidade de fazer. Quer dizer que não ficámos na mesma. Que mexeu connosco. Por isso, agradeço desde já a todos os que, nos comentários online, me têm motivado a continuar a mexer convosco. O Natal é isto, gratidão (e algumas greves).

A ideia era fazer uma crónica politicamente correcta, mas o politicamente correcto, hoje em dia, não tem o mesmo grau de aprovação do politicamente incorrecto. Imaginem que eu fazia uma piada que envolvesse o PM Costa e uma consoada com chamuças. A ausência de graça, e a referência xenófoba, era compensada pelo meu atrevimento e capacidade de ser livre e de rejeitar o politicamente correcto, mesmo sacrificando princípios.

A pergunta que mais vezes me fazem, a seguir a "Quadros, como é que aos 53 anos tens esse corpo escultural?", é "Quais são os limites do humor?" Eu acho que os limites do humor são aquilo que deve ser ultrapassado sem darmos por isso. É uma coisa natural porque não sabíamos que havia limites.

É diferente de fazermos uma piada apenas porque queremos chocar quem tem esses limites. Uma espécie de bimby da piada politicamente incorrecta. Pomos uma lésbica, um gay, um deficiente, um judeu, um forno, um tipo a morrer de fome, uma mãe que perdeu um filho e umas pitadas de pedofilia, e temos material que faz de nós um comediante livre e sem barreiras. Achincalhar as minorias faz de nós homens corajosos.

Ninguém nega a existência de uma espécie de polícia do politicamente correcto das minorias, mas lembro-me que sempre existiu uma do politicamente correcto das maiorias. Sou do tempo em que "sketches" com bichas era na maior, mas um com o Santuário de Fátima dava origem a cancelamento de programa. Apesar de achar que Fátima é uma cena um bocado bicha. É como a Amália e a Madonna. Cá está, uma "piada" que é politicamente incorrecta e que pode ser ainda mais se eu disser que é uma "piada" que dá para os dois lados.

Tenho a certeza de que se Hitler fosse vivo, hoje, seria considerado um tipo politicamente incorrecto e sem papas na língua e escreveria para o Observador, ia à RTP 3, jogava padel com o David Dinis e estava em quase todos os Prós e Contras e a Fátima tratava-o por Doutor Adolfo.

Esta era para ser uma crónica de Natal porque eu gosto muito de vocês, estimados e magníficos leitores, e era suposto ser a minha prenda. Pela vossa cara, vejo que preferiam Mon Chéri, mas o que conta é a intenção. Bom Natal.»

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A grande derrota de Rajoy!


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21.12.17

Carlos Carmo, 78 anos



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21.12.1988 – Lockerbie: o dia em que eu não morri



Em 1988, eu trabalhava e vivia na Bélgica com a família. Para evitar uma das habituais e terrivelmente cansativas vindas a Lisboa em tempo festivo, decidimos passar o Natal nos Estados Unidos.

Por razões de férias escolares do meu filho, só poderíamos partir já bem perto de 24 de Dezembro, de preferência a 21. No meu local de trabalho tínhamos uma agência de viagens, gerida por um companheiro quase quotidiano dos meus almoços. Quem me conhece sabe que detesto desistir seja do que for e quase o torturei para que me conseguisse os lugares que eu pretendia nos voos Bruxelas / Londres / Nova Iorque – os tais do dia 21. Sem sucesso, fomos obrigados a ir na véspera.

Já num hotel em Manhattan, vi as imagens do PAN NAM 103 do dia 21 de Dezembro de 1988. Sempre que volta a falar-se de Lockerbie ainda fico paralisada. E não estaria aqui para contar.
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Balanço dos balanços do ano



Ricardo Araújo Pereira na Visão de hoje:



Na íntegra AQUI.
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Por que votar independentista no #21D mesmo sem o ser



«El 21 de diciembre votaremos a partidos independistas aunque algunos de nosotros no lo seamos. Podríamos argumentar que lo hacemos por democracia y no por la independencia, pero es algo todavía mucho más básico:

Lo haremos por instinto de autoconservación. Los brutales recortes de derechos que estamos viendo con la excusa de “los catalanes” son terribles.

La posibilidad de que el bloque del 155 gane el #21D da puro y franco miedo.

Siempre hemos considerado el hecho de votar en las elecciones solamente como un movimiento estratégico dentro de una lucha cotidiana mucho más compleja. Nada puede haber menos democrático que reducir la política a la lucha electoral partidista.

Prácticamente nunca la opción a la que votas te representa de verdad o coincide con tus ideas al 100%.

Pero nuestros votos diseñan el tablero en el que tendremos que luchar en los próximos años.

Si en Catalunya gana el “bloque del 155”, está claro que este ahondará en la represión y en el recorte de los derechos más básicos como el de tener opiniones y poderlas expresar. No solo más gente en prisión o perseguida, sino también más leyes creadas en Catalunya que son paralizadas para que no podamos avanzar. Ya van 47, la mayoría sin relación con la independencia y algunas de ellas socialmente urgentes. Quieren empobrecernos – en Catalunya y en toda España – para que no tengamos más fuerzas y seamos obedientes y completamente dependientes.

Si el “bloque del 155” tiene un solo voto más que el “bloque independentista” sus líderes se comportarán como los vencedores en un país ocupado.

Si es al revés, tendremos un contexto en el que haya la legitimidad para el diálogo, para que Catalunya sea escuchada y no sea una simple colonia.

Si llega a solucionarse la actual situación no será gracias a los que se han mantenido equidistantes repitiendo mantras irrealizables como “referéndum pactado”, si no a la gente de cualquier bando que no acepta la brutalidad de un gobierno que se niega a cualquier solución.

Comprendemos el cansancio por la dinámica del procés. Lo escribimos ya en marzo 2017. Ahora lo reafirmamos: desde el 22D, sea cual sea el contexto, hay que avanzar a través de una construcción concreta, es decir, crear y defender un marco legal detallado y concreto que nos permita transformar y prosperar. Esto no se puede hacer en un tablero en el que un bando tiene la legitimidad de usar la fuerza bruta para callar a todos los demás.

Por esto votar a Catalunya en Comú no ayuda a salir del bucle narrativo de “procés sí” o “procés no”. Solo sirve a que el bloque del 155 pueda afirmar ser el triunfador y ahonde en su prepotencia.

Los que se sienten afines a Catalunya en Comú no deben preocuparse: por una cuestión puramente matemática es más que probable que Catalunya en Comú sea quien tenga la llave del futuro gobierno, independientemente de si recibe muchos o pocos votos.

Pero muy diferente será la situación con una Catalunya en Comú operando con un “bloque del 155” desbocado, que con la dignidad de un “bloque independentista” que gane a pesar de estar siendo discriminado, perseguido y represaliado.»

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20.12.17

Costas e Cristas




Via Carlos Oliveira no Facebook.
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E sobre os CTT, é isto





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Pedido de auxílio financeiro urgente para o Observatório do Controlo e da Repressão e para o caso de tortura, agressão e racismo na esquadra de Alfragide – Cova da Moura



O Observatório do Controlo e da Repressão (OCR) anuncia a todos os interessados que está a levar a cabo uma campanha de apoio financeiro, de forma a poder continuar o auxílio que desde a primeira hora tem sido dado ao caso da infundada “invasão de esquadra” do dia 5 de Fevereiro de 2015, o célebre caso da Cova da Moura.

O OCR foi criado em 2011 tendo com objetivo responder, por via do apoio e solidariedade, às medidas repressivas de que eram alvo os movimentos sociais e as populações mais desfavorecidas.

Até à data, o OCR já gastou cerca de 5000 euros em apoio médico e legal para com as vítimas. Estas, tendo sido ilibadas de qualquer crime, são agora autoras no processo em que 18 elementos das forças policiais são acusados de sequestro e tortura agravada por discriminação racial.

Os fundos providenciados pelo OCR resultaram de contínuos donativos de particulares e de associações que se foram solidarizando com o caso. Mas esgotou-se, estando neste momento as contas do coletivo a zeros.

De forma a poder continuar o seu trabalho de apoio a este e a outros casos futuros, torna-se imprescindível a solidariedade de todos os que têm consciência da importância de casos como os dos da esquadra de Alfragide que está já a movimentar outras vítimas de casos idênticos para que avancem com os seus processos.

Assim, agradecemos todas as contribuições que possam ser realizadas para o IBAN/NIB do observatório: PT5000350100 0003237453069 / CGDIPTPL.

(Daqui)
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As bitcoins desta vida


«Cristiano Ronaldo vai construir um hospital pediátrico em Santiago do Chile, em 2020. (…)
Deixa pesquisar melhor... O CR afinal não é sócio do Proto. Afinal este encosta-se a famosos e dá notícias sobre amizades e negócios que não tem. E se tudo... Olha, é mesmo, última hora: o CR desmente a notícia do hospital pediátrico. E que não tem nada a ver, "nem negócios", com o famoso Alessandro. Ora, ora, não há fumo sem fogo: Santiago é no Chile. Publique-se.»

Uma deliciosa crónica de Ferreira Fernandes.
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A Catalunha e o regime



«Depois da eleição na Catalunha a Espanha terá, fatalmente, de confrontar-se com uma crise de regime que põe em causa a Constituição pós-franquista de 1978 e deslegitima a monarquia.

A radicalização secessionista de nacionalistas conservadores na última década reforçou o republicanismo na Catalunha e abriu caminho para a esquerda, extrema-esquerda e movimentos anarquistas assumirem a liderança ideológica da reivindicação de ruptura com Madrid.

O momento de viragem ocorreu em Junho de 2010 quando o Tribunal Constitucional declarou inconstitucional o Estatuto de Autonomia aprovado pelo "Parlament" de Barcelona no final de Setembro de 2005 com o voto contra dos deputados do Partido Popular.

O texto rejeitado pelo Tribunal Constitucional era, contudo, um compromisso negociado entre Artur Mas, líder da conservadora "Convergència I Unió", pela "Generalitat", e o chefe do governo socialista de Madrid José Luis Zapatero.

Nessa versão, votada nas Cortes na Primavera de 2006, o "Preâmbulo" fora expurgado da referência a Espanha como "estado plurinacional" e da afirmação peremptória da Catalunha como "uma nação".

O texto mitigado e inconclusivo afirmava que o parlamento de Barcelona definira "de forma amplamente maioritária a Catalunha como nação. A Constituição espanhola, no seu artigo segundo, reconhece a realidade nacional da Catalunha como nacionalidade".

A constitucionalidade da maioria das disposições do Estatuto foi contestada pelo PP e pelo Provedor de Justiça, enquanto a Comunidade Autónoma de Murcia, La Rioja, "Generalidad Valenciana", Governos de Aragão e das Ilhas Baleares requereram a anulação pontual de artigos diversos.