4.6.22

Olhar para além dos cem dias da agressão

 

«O presidente Zelensky tem sublinhado que a guerra só acabará com recurso à diplomacia. Tem razão. Precisa de construir um acordo de paz com o agressor. Não será fácil. O acordo não poderá premiar o que tem sido uma clara violação da lei internacional, uma sucessão de crimes de guerra, de destruição e de atos de pilhagem. Este é o grande dilema, que faz de qualquer processo de mediação um quebra-cabeças. Neste cenário, um acordo será apenas possível entre uma posição de força e outra de fraqueza. Esta é uma conclusão dramática. Leva à procura do esmagamento ou da humilhação do adversário.»

De e lede o texto completo AQUI.
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04.06.1989 – Tiananmen e o silêncio

 


Voltei há poucos anos à Praça Tiananmen. É óbvio que 1989 continua a ser tabu intransponível e retive o silêncio da simpática guia que nos acompanhava. Várias vezes interrogada, foi dizendo que dos acontecimentos de 1989 «nada sabia», que nasceu e vivia então na Manchúria, que nada viu, que não se aprende na escola, que há muitos milhões de chineses que nunca ouviram falar desse não assunto. «NÃO SEI NADA, NÃO POSSO SABER, NÃO INSISTAM POR FAVOR». Calámo-nos.
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Quero ser dono da minha morte (tanto quanto é possível)

 


«A decisão do Grupo Parlamentar do PSD de aceitar a liberdade de voto na questão da eutanásia corresponde inteiramente a um aspecto fundamental do programa do partido. Verdade seja dita que também a decisão de referendar corresponderia, em ambos os casos por razões idênticas. Tanto há legitimidade na votação parlamentar desta matéria como numa consulta popular, embora as dificuldades de uma e de outra sejam desiguais.

Todos os programas do PSD, o original de 1974, a revisão de 1992 e a de 2012 (que deviam ser de leitura obrigatória para os militantes, para não se dizerem muitas das asneiras que se ouvem), acentuam a laicidade do partido, mas com um papel genético para o personalismo, nos pontos sobre a Pessoa humana (com maiúscula), no mesmo plano do liberalismo político e do socialismo democrático, da social-democracia. A combinação destas três fontes é identitária e distingue o PSD dos outros partidos, embora haja em cada uma delas de per se proximidades. Um desses casos é o personalismo, em que o PSD se aproxima do CDS e se afasta do PS, que centra a sua visão política na cidadania, no cidadão e não na pessoa. É uma diferença relevante e tem consequências.

O personalismo é uma doutrina de origem cristã, embora tenha uma expressão filosófica mais lata, mas que mostra o papel que a formação cristã tinha nos fundadores do partido. Se fossem mações a escrevê-lo – embora houvesse mações entre os primeiros “PPD” –, o programa seria sem dúvida diferente nesta matéria. Mas Sá Carneiro, em particular, trouxe da sua formação cristã dois aspectos relevantes no plano ideológico e político: a doutrina social da Igreja e o personalismo. No caso do personalismo havia que o formular em conjugação com o carácter laico do partido.

Nos debates da revisão programática de 1992, em cuja elaboração e discussão interna participei, este foi um dos pontos mais discutidos na comissão política, com um papel activo de Durão Barroso e Silva Marques, e com uma particular atenção de Cavaco Silva. Guardo as notas desse debate e o ponto fundamental foi a afirmação de que o partido considerava que havia uma dimensão metapolítica, que estava para além da política e que a liberdade da “pessoa” nas suas convicções íntimas não podia ser reduzida à expressão de políticas concretas, legítimas em democracia, mas que podiam atentar contra os seus princípios. Era por isso que se considerava que havia questões que transcendiam o plano político, como o aborto e a eutanásia, e em que o papel da liberdade individual, religiosa ou cívica, no entendimento da moral individual e pública, teria de ser respeitado. Logo, essa dimensão de liberdade traduzia-se também na liberdade de voto dos deputados ou quaisquer eleitos do partido. Nem sempre foi fácil essa aceitação, como se viu no voto pioneiro de Pedro Pinto, e nos votos solitários subsequentes meus, de Rio e Silva Marques sobre o aborto.

Dito isto, a questão da eutanásia é da mesma natureza da do aborto, e compreende posições de carácter religioso, de ética profissional, de direitos humanos, de liberdade individual no mais profundo sentido, que não são fáceis de defrontar, muito menos no quadro de uma lei para uma sociedade naturalmente dividida nas suas opções metapolíticas. É também uma matéria em que valores cada vez mais ausentes na actual deriva para a radicalização, como seja o respeito pelas convicções alheias, e, se quisermos, uma delicadeza especial no tratamento deste tipo de matérias, devia estar presente.

Há pouca coisa mais íntima e “pessoal” do que a morte. É também por isso uma questão na qual a liberdade individual, a escolha de cada um na sua solidão final, tem um valor supremo. Sabemos que essa liberdade é limitada pela dor e pelo sofrimento, mas é um absurdo pensar que não exista um direito individual a não sofrer, a liberdade de acabar com a dor ou com a extrema degradação física, quando nenhum outro método existe para as mitigar. Sim, tudo o que possa ser feito antes deve ser feito, mas nem tudo pode ser feito e tem de haver a liberdade de alguém dizer: “Assim não quero viver, ajudem-me a morrer com a dignidade que a minha vida deixou de ter.”

Admito que muitos médicos e enfermeiras tenham objecção de consciência que os impeçam de participar numa morte assistida e isso deve ser respeitado. Mas é uma das muitas hipocrisias em que vivemos, ignorar que muitas eutanásias consentidas se passam nos nossos hospitais pelas melhores razões: a recusa do sofrimento gratuito em quem o não quer ter e deseja ter este último acto de vontade e liberdade.

“Ninguém vive para si mesmo. Ninguém morre para si próprio”, dizia um cartaz numa manifestação contra a eutanásia em 2018. Com a primeira frase estaria de acordo, mesmo percebendo que o seu significado religioso não é o meu, mas aceito, não por Deus, mas pelos “outros”. Mas a segunda frase só pode ter sentido para quem é crente, e eu não sou. Ela obriga-me a ser, e por isso afecta a minha liberdade.

Eu votaria a lei da eutanásia, mesmo mal formulada e imperfeita, porque, tanto quanto possível, quero ser dono da minha morte.»

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3.6.22

48 artistas e dois murais


 

No dia 10 de Junho de 1974, um grupo de quarenta e oito artistas plásticos pintou, em Lisboa, um mural que viria a desaparecer num incêndio, em 1981. Entre os pintores, muitas caras conhecidas: Júlio Pomar, João Abel Manta, Nikias Skapinakis, Menez, Vespeira, Costa Pinheiro, etc., etc.

Em 2009, Fernando Matos Silva deu-me acesso a uma cópia deste documentário (realizado por Manuel Costa e Silva), notável e então muito pouco conhecido. Coloquei-o online, andou pelo meu blogue e por um outro e foi mais tarde colocado no Youtube por Maria João Pires.



Leio no Expresso desta semana que, no próximo dia 10 de Junho, «48 ARTISTAS RECRIAM MÍTICO PAINEL EM NOME DA LIBERDADE». Ou seja, 48 artistas de várias gerações vão reunir-se nos jardins do MAAT «a pintar um painel de 24 metros de comprimento por 3,5 de altura», para comemorar 48 de democracia. «Dos 12 artistas vivos que estiveram no primeiro evento, nem todos poderão participar por motivos de saúde, mas oito não vão faltar, passando por cima da idade, problemas de locomoção ou de algum medo da covid-19.» O resultado final será doado a um museu público de Lisboa.

Enquanto não existe o mural de 2022, reveja-se o de 1974. Vale a pena.
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Chapéus?

 


Quando o Reino Unido for uma República vão desaparecer estes «very typical» chapéus?
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Batalha pela ordem mundial

 


«A primeira coisa que se percebeu quando a Rússia invadiu a Ucrânia foi que a guerra não dizia apenas respeito a Kiev. O que estava em causa era o futuro do sistema internacional e da ordem mundial. Moscovo, apoiada por Pequim, desafiava a Pax Americana, a ordem mundial liberal liderada pelos Estados Unidos desde o fim da Guerra Fria.

Os combates travam-se na Ucrânia, mas têm uma repercussão mundial. Do futuro, pouco se pode dizer. O que hoje se discute é a marcha da guerra, que voltou a endurecer, e o longínquo quadro de uma negociação de paz. O modo de resolução da guerra, isto é, um acordo de paz, é ainda um enigma. Ninguém sabe o que quer ou pode alcançar, dada a incerteza dos combates e das sanções internacionais.

Desenham-se cenários, com diferentes consequências geopolíticas. Um analista russo, Andrey Kortunov, avança três hipóteses. O triunfo da Ucrânia levaria a uma “Rússia domesticada” e permitiria ao Ocidente “lidar mais facilmente com a China”. Admite também uma “desescalada” por exaustão de ambas as partes. Uma solução “menos imperfeita”, mais equilibrada para Rússia do ponto de vista do autor, abriria um horizonte diferente: “Se um acordo com Putin for possível, um acordo com Xi Jinping seria a continuação lógica”. Se o conflito se prolongar, podemos esperar “mais caos nos próximos anos”. Não são cenários muito originais.

Tanto a China como a Rússia estão determinados a criar uma ordem global pós-ocidental. Por sua vez, os americanos desistiram de ser “o polícia do mundo” mas não abdicaram da sua vontade de hegemonia. Depois de terem voltado as suas prioridades para o Indo-Pacífico, os EUA regressam parcialmente à Europa e Moscovo sofre um desaire com o reforço da NATO, que queria esvaziar, na Europa de Leste.

A China, escreve a analista Angela Stent, da Brookings Institution, “quer uma ordem em que tenha um maior papel na definição da agenda mundial”. Ao contrário, a Rússia de Putin, potência revisionista, aposta no arbítrio e numa ordem com menos regras.

Os analistas adivinham um declínio do estatuto internacional da Rússia, independentemente do desfecho militar da guerra. Moscovo sobrestimou a sua força. Os erros de cálculo de Vladimir Putin e as primeiras semanas de guerra exerceram uma influência devastadora. Moscovo aparece doravante como “sócio menor” de Pequim.

Note-se que Washington e Pequim não se quiseram imiscuir directamente na guerra ucraniana. Ambas as superpotências lêem o conflito em termos de ordem e equilíbrios mundiais.

O Ocidente e o “Resto”

Angela Stent abre uma outra pista ao analisar a reacção do “Resto”, do mundo não ocidental, sobre as sanções e a condenação da invasão. Putin enganou-se em quase tudo, excepto num ponto: se a Rússia ficou isolada no mundo ocidental, não foi condenada nem sancionada pelo mundo não ocidental. Em parte, isto deve-se ao longo investimento diplomático da Rússia no Médio Oriente, na Ásia, na América Latina e na África.

Quer isto dizer que o mundo não esteve unido na condenação da agressão russa. “A relutância do ‘Resto’ em condenar a Rússia de Putin irá complicar a capacidade do Ocidente em criar laços e aliados, inclusive quando a guerra estivar terminada”, afirma Stent. É um factor que no futuro pesará. O “Resto” representa mais de metade da população do mundo.

Uns países reagem por uma histórica alergia aos Estados Unidos, outros, aliados dos americanos, por razões nacionais. A Rússia tem intensas relações com todos os países do Médio Oriente, desde a Síria que controla à sunita Arábia Saudita ou ao xiita Irão. Mas também não foi condenada pelos Emirados Árabes Unidos, pelo Egipto ou por Israel. Porquê Israel? Os iranianos estão na Síria, mas quem manda são os russos, e Israel quer poder agir na Síria sem pôr em perigo a sua fronteira norte. Na América Latina, Bolsonaro gosta de Putin e o México recusou uma mensagem comum da América do Norte, com os EUA e o Canadá.

A Índia é caso especial. Por um lado, participa na Quadrilateral (Quad) com os Estados Unidos, Japão e Austrália. Por outro, precisa do velho aliado russo para equilibrar as relações com a China, a razão básica da sua opção. Mas também há interesses: indianos e chineses contam adquirir o petróleo russo a preço “especial”. A Rússia, embora perdendo estatuto, não é um “pária mundial”, graças à China e à Índia.

Embora indiferentes ou amigos de Moscovo, são os países da África e do Médio Oriente os que mais depressa vão sofrer o efeito do bloqueio do trigo ucraniano pelos russos, ou seja, a fome. Esta guerra tem múltiplas frentes.

A fadiga de guerra

As guerras acabam pela derrota de uma das partes ou quando ambas percebem que nada ganham em continuar os combates. No fim, há negociações. O panorama não é optimista. A Rússia quer alargar a ocupação de territórios, para os anexar ou para reforçar a sua posição negocial. Putin tem de arranjar uma qualquer proclamação de vitória.

A posição de Zelensky é muito difícil. Para negociar, será pressionado pelos países amigos a fazer concessões territoriais, o que é difícil fazer aceitar aos ucranianos. De resto, trava-se uma prova de força ou de resistência. “A Rússia não está em condições de combater muito tempo, porque se esgotam os recursos humanos”, diz um analista russo. Por sua vez, Moscovo aposta na “fadiga de guerra” que se começa a manifestar no Ocidente, escreve o Financial Times.

Enfim, o desfecho desta guerra determinará a ordem mundial e, até, alguns princípios civilizacionais.»

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Maior optimismo é impossível

 


(Expresso, 02.02.2022)
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2.6.22

Cultura geracional

 

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Assim

 

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Os talentos já fugiram

 

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Eterno retorno das crises

 


«A crise implica sempre escassez de um qualquer recurso, seja ele financeiro, energético ou outro. Portugal parece viver, em períodos curtos, numa lógica de eterno retorno a essa penúria causada por diferentes fatores.

Atualmente, em consequência da guerra, vivemos uma crise de escassez de bens energéticos e alimentares, o que está a provocar a subida acelerada dos preços e uma pressão considerável sobre os orçamentos das famílias e das empresas.

Apesar de termos desprendido um dos pés das areias movediças da crise sanitária e económica provocada pela pandemia de covid-19, estamos já com o outro bem enterrado no terreno da espiral inflacionista.

Um interessante projeto da Fundação Francisco Manuel dos Santos, que dá pelo nome de "Crises na economia portuguesa", mostra de forma científica que o país viveu seis recessões em apenas quatro décadas, sem contar com a atual conjuntura, que indicia um eventual sétimo episódio de aperto nas finanças de todos nós. E de que crises falamos? A de 1983/84, a de 1992/93, a de 2002/03, a de 2008/09, a de 2010/13 e a de 2019/20. A primeira delas (1983/84) tem algumas semelhanças com o presente, uma vez que implicou uma alta do preço do petróleo (bem maior do que os solavancos dos últimos meses) e, por arrasto, dos bens essenciais. À semelhança de 2022, a inflação tornou-se uma dor de cabeça. O resgate da economia por parte do FMI foi inevitável.

Tal como na Física, os próximos episódios são uma incógnita, assentando no princípio da incerteza. Vamos cair numa crise resultante da espiral inflacionista? O custo de vida vai aumentar, não pelo corte dos rendimentos (como aconteceu em 2010/13), mas antes devido à escalada dos preços, sem o devido contrapeso da atualização salarial? Os pedidos de ajuda alimentar vão continuar a crescer? A crise económica e social é inevitável? A regra do eterno retorno à crise, em ciclos curtos de tempo, vai ser de novo confirmada?»

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1.6.22

O eterno Cavaco

 


Cavaco Silva escreve hoje, no Observador, uma cínica e longa carta a António Costa, em que não faz mais do que louvar-se a si próprio e à sua governação. Está provado que não existe mesmo alguém que o ajude a gozar a sua reforma sossegada e decentemente.
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Judite de Sousa e uma rainha

 

- Elizabeth II nasceu em 1926 e é rainha desde 1952.
- A Primeira Guerra Mundial terminou em 1918.
- A Segunda Guerra Mundial terminou em 1945.

Agora é só fazer contas e ouvir JUDITE DE SOUSA, essa jovem e precária jornalista que tem percorrido várias estações de TV há décadas.


Galeano

 

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Estamos tramados

 


«Chegamos a maio com 8% de inflação. O valor mais alto desde 1993.

O ano em que a Checoslováquia deixou de existir, dividindo-se entre checos e eslovacos; o ano em que os EUA e a Rússia ainda eram amigos e George Bush (pai) e Boris Ieltsin (o primeiro presidente da Federação Russa) assinaram um acordo que permitiu reduzir os arsenais nucleares em 30%; e, já agora, o ano em que entrou em vigor o Tratado de Maastricht (que transformou a CEE em União Europeia).

Voltemos a 2022, uma vez que é no presente que temos de pagar a gasolina e a conta do supermercado. Os primeiros a sentir os efeitos da inflação foram, como sempre, os mais pobres e os remediados. Os primeiros dependem de novo da entrega de cabazes e da "sopa dos pobres" para alimentarem os filhos. Os segundos, que no ano passado contavam os euros e os dias, tentando chegar ao fim do mês, já não têm contas para fazer. Nos últimos dias do mês, já não há dinheiro.

Têm razão os portugueses quando dizem de forma esmagadora que o aumento extraordinário de 10 euros nas pensões não é suficiente (83%). Têm razão quando dizem que o aumento de 0,9% na Função Pública (10 euros num salário de 1200 euros) é insuficiente (79%). Tem razão Silva Peneda quando diz que é preciso aumentar 5% os salários no setor privado. Tem razão quem lembra que a inflação já "comeu" o aumento do salário mínimo (subiu 6%, a inflação vai nos 8%).

São pessoas concretas as que estão nesta linha de fogo. E não falta margem ao Governo para tomar medidas. O que talvez falte é vontade. Como anunciou a Comissão Europeia, o limite de 3% para o défice está suspenso. Portugal não tem de ficar amarrado aos 1,9% previstos para este ano. E ainda menos aos 1% do ano que vem. Isto significa que há uma margem de muitos milhares de milhões de euros, neste e no próximo ano. Há escolhas para fazer. Ou o PS aplica a receita da troika, e voltamos aos tempos de austeridade, ou deixa respirar os portugueses, aumentando os apoios sociais aos mais pobres e reduzindo a carga fiscal aos remediados e aos que para lá caminham. Se não o fizer, estamos tramados.»

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31.5.22

No humor é que está o ganho

 

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Isto vem de muito longe

 

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Dia dos Irmãos?

 

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Jovens com bolsos rotos

 


«A crise financeira de 2008, a crise da dívida pública entre 2010 e 2014, a pandemia de covid em 2020 e agora a guerra na Ucrânia estão a dar cabo de uma geração que encontra no mercado de trabalho parcos empregos e ainda mais parcos salários.

Que contas faz um jovem que recebe, em média, 817,67€ mensais? E estamos a falar em médias, porque há quem receba muito menos. Esse jovem tem de pagar renda de casa ou empréstimo à habitação, contas domésticas, alimentação e transportes e ainda ter algum dinheiro para gastar em cultura, saídas à noite e conseguir juntar alguma poupança. Claro está que tal não é possível. Parece que os bolsos estão rotos.

A única forma de conseguir enfrentar a gestão pessoal é a ajuda dos pais ou dos avós, e só para aqueles que a têm. Em Portugal, nunca conheceram intervalos de real prosperidade e são os mais castigados no mercado de trabalho. Se não é a recessão económica é a pandemia, se não é a pandemia são os efeitos da guerra na Europa.

Portugal estava menos bem preparado do que outros países europeus para resistir a quatro golpes consecutivos que quebraram completamente as expectativas dos jovens, os seus planos de futuro ou algo tão elementar como a confiança na própria capacidade para melhorar a sua vida. Com a pandemia, segundo o INE, a taxa de pobreza subiu para 18,4%, sendo que este agravamento foi o maior registado nas últimas duas décadas num único ano.

Após os confinamentos, muitos jovens deixaram de trabalhar. A taxa de desemprego jovem continua bastante agravada, a atingir 23,4%. Perante os salários baixos, a única hipótese dos jovens é continuar a viver em casa dos pais. Portugal é um dos países da União Europeia em que, em média, os filhos saem mais tarde de casa, ou seja aos 30 anos.

A habitação continua a ser um problema crónico que abafa a autonomia dos jovens e reduz a sua independência. Provavelmente, a infância dos jovens atuais terá sido melhor que a dos seus pais, mas os obstáculos criados ao longo destes anos vão refletir-se no empobrecimento material e intelectual. É nisso que qualquer partido político deveria pensar seriamente. Não só pensar, agir.»

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30.5.22

30 de Maio, o fim do «Maio de 68»

 


Há 54 anos o general de Gaulle pôs fim a um mês verdadeiramente alucinante que a França viveu em 1968. Numa alocução difundida pela rádio, que ficou célebre, dissolveu a Assembleia Nacional e anunciou a realização de eleições antecipadas: contra o perigo do «comunismo totalitário», «La Réplubique n'abdiquera pas!»



Nessa mesma noite, uma gigantesca manifestação de apoio (fala-se de 500.000 pessoas) invadiu os Campos Elíseos e marcou o desejo de «regresso à ordem», que os resultados das eleições, que tiveram lugar em 23 e 30 de Junho, confirmaram com uma vitória esmagadora da direita.


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Slavoj Zizek e a guerra

 

Goste-se ou não de Zizek, aqui fica um excerto de um texto publicado há alguns dias:

«Na actual crise da Ucrânia, ambas as partes apresentam os seus actos como algo que simplesmente tinham de fazer: o Ocidente tinha de ajudar a Ucrânia a permanecer livre e independente; a Rússia foi obrigada a intervir militarmente para proteger a sua segurança. O exemplo mais recente: o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo afirma que a Rússia será “forçada a tomar medidas de retaliação” se a Finlândia se juntar à NATO. Não, não será “forçada”, da mesma forma que a Rússia não foi “forçada” a atacar a Ucrânia. Esta decisão só parece “forçada” se se aceitar todo o conjunto de pressupostos ideológicos e geopolíticos que sustentam a política russa.

Estes pressupostos têm de ser analisados de perto, sem quaisquer tabus. Ouve-se frequentemente que devemos traçar uma linha estrita de separação entre a política de Putin e a grande cultura russa, mas esta linha de separação é muito mais porosa do que possa parecer. Deveríamos rejeitar resolutamente a ideia de que, após anos de tentar pacientemente resolver a crise ucraniana através de negociações, a Rússia foi finalmente forçada/coagida a atacar a Ucrânia — nunca se é forçado a atacar e aniquilar um país inteiro. As raízes são muito mais profundas; estou pronto a chamá-las devidamente metafísicas.»

O texto completo pode ser lido AQUI.
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As guerras são muito antigas, mas não morrem


@Salvador Dali

 

«“O Homem, no começo, é um animal e só depois… deixa-se recobrir com uma camada de decência” 
Erich Maria Remarque em A Oeste Nada de Novo, 1929

Em 2022 tocam as sirenes da guerra anacrónica desencadeada pela Rússia numa Ucrânia que resiste com determinação. O Deus da Guerra tem com ele o Deus da Morte e da Destruição. As epidemias e as guerras atormentam muito a Humanidade. Podem parecer inevitáveis, mas são diferentes. Umas têm origem natural e procura-se a vacina, outras resultam de vontades humanas e têm uma indústria.

Mas mantém-se, em 2022, uma situação não civilizada, obscena, um escândalo: as guerras entre humanos, organizadas por grupos, países ou Estados. Existem há milénios, como um fungo agarrado à nossa pele (H. Arendt): a História parece gostar de guerras, de batalhas e dos seus heróis. Com o desenvolvimento da técnica, são cada vez mais mortíferas, dispendiosas e ameaçadoras, num instante são planetárias. A internet ajuda nas consultas de estatísticas de suas vítimas mortais: no século XX foram cerca de 160 milhões em 509 conflitos, na Primeira Guerra Mundial 20 milhões, na Segunda 60 milhões e, no século XXI (até 2018), dois milhões. No período da minha vida, cerca de 45 milhões de mortos em cerca de 100 conflitos. Será que a memória das guerras prescreve? (pergunta do meu texto no PÚBLICO online de 27/4/22). Penso que sim e, por isso, elas não “morrem”.

Em 2022, a Europa é de novo surpreendida por uma guerra no seu território, a primeira desde 2001 ou 2014, mais uma entre outras no mundo. Com notícias ao minuto e comentadores sapientes. As anunciadas fraquezas e incompetências do atacante são tantas que não tenho dúvidas sobre o desfecho da contenda. Os países ocidentais unem-se, esforçam-se em ajudar e aplicam sanções, estão em alerta. Organizações internacionais intervêm. Estou de acordo e compreendo esta reacção, mas para esta guerra nada de útil posso acrescentar para além do desejo que termine com justiça e que sejam salvas vidas. Sem confundir paz com ingenuidade ou cobardia.

Mas impõe-se tentar salvar o futuro da Humanidade e eliminar a obscenidade e o horror das guerras, de cada guerra. Henri Dunant, após ver os feridos deixados no campo de batalha de Solferino (1859), foi co-fundador da Cruz Vermelha Internacional e o 1.º prémio Nobel da Paz. Reza o testamento de A. Nobel que este prémio seria concedido àqueles que “fizeram o melhor trabalho pela fraternidade entre as nações, pela abolição ou redução de exércitos permanentes e pela realização e promoção de congressos de paz”. Em 2012 foi concedido este galardão à União Europeia.

Nunca mais! O grito foi apropriado no final da Segunda Guerra Mundial e, desde 1945, a ONU tem-se esforçado por ser um garante da paz através da sua Carta, das suas agências e da diplomacia. Em 2022 existem tribunais internacionais e um conjunto de instrumentos de direito humanitário relativos a crimes de guerra (sem prescrição), a restrições ao uso de algumas armas e à protecção de prisioneiros e não-combatentes. É um caminho para o futuro que já vem de longe (de H. Grotius, no séc. XVII), mas que ainda é insuficiente para resolver contendas e injúrias entre Estados sem guerras.

Razões muito poderosas resistem ao debate moral da guerra. Ainda nos agarramos ao conceito de guerra justa e aos critérios do princípio ético do duplo efeito: há causas imperativas, ideais positivos pelos quais se combate e o efeito negativo, o sofrimento não é desejado (nem sempre: os bombardeamentos para desmoralizar civis em 1940-45 foram premeditados). Os textos de História apresentam sempre as mais diversas justificações para cada guerra de acordo com a época. Alianças, ligas, coligações e tratados aparecem e desaparecem até novo conflito. Exaltam-se heróis combatentes, decoram-se datas e locais de batalhas, mas o sofrimento dos não-combatentes tende a ficar na obscuridade.

O mal e o sofrimento humanos serão comensuráveis? O filósofo Marcel Conche (1922-2022) definiu o sofrimento das crianças como referência injustificável do mal absoluto: elas ainda não têm a capacidade de aceitar a dor com uma capa sobrenatural e espiritual de resistência, de herói, sábio ou santo. A responsabilidade pelo futuro pertence aos adultos, mas as crianças e a comunicação social podem catalisar mudanças. Dois exemplos: um realizado, o outro em esperança.

Em 1972, Nick Ut fotografou numa estrada do Vietname a menina Kim de nove anos, nua, que fugia, chorando, de braços levantados. O napalm tinha queimado o vestuário e a pele. Esta foto foi prémio Pulitzer e provocou milhões de lágrimas. Em 1980 foi aprovada a proibição de uso de napalm contra civis. Em 2022, no dia 11 de Maio, Kim, agora embaixadora da UNESCO e feliz, visitou com Nick o Papa Francisco. Uma esperança?

Agora o meu segundo exemplo. Em 2022, num canal de TV francês, um vídeo é dedicado ao efeito do conflito na mentalidade das crianças ucranianas refugiadas. Surge na pantalha, em interior sombrio, uma menina de nove anos, Katya. De pé, olha a câmara com determinação. Após descrever o medo que sentiu com as bombas, perguntam: o que desejas para o futuro? Resposta de Katya: que a palavra guerra desapareça do dicionário. Mas que inesperada lição, pensei. Que tenha futuro este pedido. Terá?

A face da Katya recorda-me a pintura de Dalí A Face da Guerra, de 1940. Vejam-na. Parece não ter fim a lista de pintores e de escritores que têm sinalizado e descrito o sofrimento nas guerras contemporâneas. Pretendem abanar a nossa consciência, mas depois da emoção tudo volta a preparar-se para a próxima guerra. E a ciência e a tecnologia não têm uma solução? Até agora têm desenvolvido novas armas, mais letais, mais certeiras e automáticas que tendem a afastar os combatentes de perigos. E em percentagem a morte de civis tem vindo a aumentar. Aviões com aviadores são substituídos por mísseis e drones e as bazucas antitanque são substituídas por mísseis automáticos. A inteligência artificial e os robots poderão vir a fazer as tele-guerras do futuro. Mas, em 1945, a ciência proporcionou um patamar inesperado: as armas nucleares. Uma armadilha: é tão mortífera e destruidora que não acreditamos que volte a ser utilizada no futuro, donde podemos arriscar e avançar… E neste raciocínio não sei se receio mais os militares com experiência, se os civis com desejos.

Em 1983, Isaac Asimov fez previsões para 2019 sobre informatização, exploração espacial e guerra nuclear. Interessa esta última área: “A possibilidade de um conflito nuclear sempre existirá enquanto existirem armas nucleares.” Em 2022 podemos dizer o mesmo. De guerra em guerra e com a geoestratégia entre blocos atingimos uma situação de equilíbrio instável, perigosa. “Na realidade, a Terra seria gerida por quem tivesse a bomba nuclear preparada para atirar contra o território dos adversários. Ou, mais precisamente, por quem as tivesse em maior número, mais potentes e mais mortíferas. Era esse o equilíbrio. Para dizer a verdade, um pátio infantil em que cada criança teria o poder do último fogo.” É o que nos diz Lídia Jorge, no livro Estuário, ao descrever a segunda parte de um livro imaginário do personagem Edmundo que teria o título 2030 Estuário, 2018, D. Quixote, pp. 278-280.

Não temos muito tempo! Ao longo dos séculos, muitas chagas da Humanidade tidas por inevitáveis e naturais têm sido combatidas e eliminadas, mas a guerra é a mais resistente. A montante das leis deve existir uma convicção moral, uma nova educação desde criança para afastar a guerra e os armamentos pesados. Para evitar que tenham de ser os sobreviventes do holocausto nuclear a retirar definitivamente a palavra guerra dos dicionários. Obrigado Katya!»

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29.5.22

A melhor decisão

 

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Sita Valles

 


É imprescindível que este documentário de Margarida Cardoso seja visto.

«Sita Valles viveu 26 anos. Nasceu em Angola em 1951 e ali morreu, em 1977, em circunstâncias misteriosas. Estudou Medicina em Lisboa, e foi uma dirigente estudantil carismática e militante do PCP. No Verão de 1975 decidiu voltar a Angola, que considerava o seu país, ligando-se a um grupo de pessoas, mais tarde apelidados de fraccionistas, que questionavam a linha ideológica do MPLA. Acusada de ser uma das cabecilhas da alegada tentativa de golpe de estado de 27 Maio de 77, Sita é perseguida e presa. Rumores indiciam que foi torturada e morreu frente a um pelotão de fuzilamento. Nos dois anos que se seguiram mais de trinta mil pessoas tiveram o mesmo fim, ou passaram anos em cadeias e campos de concentração.
Testemunhos dos sobreviventes, guiam-nos na possível reconstituição da vida e do tempo de Sita Valles, vida que terminou num episódio traumático, de uma violência absurda, e há muito silenciado.»

A Vida e o Tempo de Sita Valles
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Lisboa, capital da chinfrineira

 


«Antes da pandemia Lisboa já podia ostentar o título de cidade do ruído. Depois surgiu o vírus e o rumor de fundo, essa segunda pele de uma cidade, diminuiu, impondo-se uma amena temperatura sonora. Agora que regressamos à chamada “normalidade”, o ruído, que apesar de tudo remete para alguma estruturação, foi superado. O patamar agora é outro.

O que temos hoje já não é isso. É barulheira, algazarra, cacofonia, um gigante cagaçal, por entre música, aviões, berbequins, carros, motores e, agora que o turismo regressou a todo o vapor de forma sôfrega, excitações a toda a hora, em qualquer lugar, consoante os diferentes interesses económicos aí radicados. Para uma cidade que vive obcecada em ser “marca”, como se os seus habitantes fossem meros consumidores, abre-se aqui uma janela de oportunidade em termos de designações que ajudem à sua promoção. Lisboa, capital da chinfrineira, podia ser um excelente chamariz turístico. Ironizo, claro.

Já se sabe que, hoje, proliferam os discursos na ponta da língua sobre o ambiente. É o aquecimento global. É o ar e a atmosfera, o lixo, os plásticos, os oceanos. No meio, sempre esquecida, a poluição sonora. Há pouca sensibilidade cidadã. Uma ineficaz pressão pública concertada. Uma condescendência geral. Até alguma censura quando se fala do assunto, como se quem o fizesse fosse desmancha-prazeres. Um total e inacreditável alheamento político. Um fechar de olhos das autoridades. Até certo ponto, percebe-se. O ruído é imaterial. Parece passageiro. Associamo-lo a festa e prazer. Mas o problema existe e agrava-se cada vez mais, principalmente nos centros urbanos saturados, onde as fontes de barulho são múltiplas e omnipresentes, com efeitos graves, profundos e nem sempre perceptíveis na saúde física e mental (alterações de sono, problemas cognitivos, hipertensão e por aí fora).

Apesar da legislação existente, paira uma sensação de impotência. A fiscalização é ineficaz. O mapeamento do ruído assenta em medições quantitativas, esquecendo-se a experiência das pessoas. Não se contempla que são as baixas frequências que mais danos causam. Ou se é rico, e vive-se numa fortaleza acústica, ou vai-se resistindo como se pode (“põe tampões”, “toma um comprimido”, “muda de casa”, e outras coisas que tais, são os conselhos inúteis que se ouvem em contextos sociais). Quando se faz queixa às autoridades, o paternalismo é o mesmo. A polícia tem sempre algo mais importante para fazer. Os organismos municipais são inoperantes. Não há relação de confiança. A sensação é de impotência e abandono.

Viver no centro de uma cidade acarreta sempre algum desconforto. Não é de romantismo e de silêncio que aqui se fala. Aqui sugere-se um mínimo de equilíbrio. Nem sequer é de design sonoro eficiente de espaços públicos, como há em tantas cidades europeias. Estamos muito longe desses cenários. É apenas de não sacrificar o direito ao bem-estar dos cidadãos a qualquer preço, permitindo todos os abusos de indústrias e negócios. O afluxo de receitas é relevante para alguns, mas também é a sanidade de todos, num ecossistema frágil onde tudo está ligado.

Um dos muitos exemplos possíveis da situação actual acontece junto ao rio, entre o Cais do Sodré e Santos. Alguém durante o reinado de Medina teve uma grande ideia reservar aquela zona para diversão nocturna, num exemplo datado e esgotado de planeamento urbano, colocando ali três discotecas a funcionar ao ar livre. Repito: ao ar livre. O som propaga-se pelas colinas, sendo frequentes as queixas, inclusive, da outra margem, porque o som, pois é, também desliza pela água. Até às 7 da manhã, de quarta a sábado, é assim. Não satisfeita, a freguesia da Estrela resolveu, durante o Inverno, e agora nas semanas que antecedem os Santos Populares, instalar ali uma feira de diversões, todos os dias, até às 2 da matina. De maneira que até certa hora se ouve o Quero cheirar o teu bacalhau, Maria do Quim Barreiros em competição desenfreada com o tecno do lado, e depois leva-se com três discotecas a ver quem provoca mais alarido até de manhã. Há quem chame “animação” a isto. Para os que não pregam olho é só um inconcebível sofrimento.

De quem nos governa desejava-se apenas uma gestão estratégica, saber identificar tendências, antecipar soluções, ampliar modos de governação, com uma participação cidadã efectiva. Mas népias. A voragem e a chinfrineira mandam.»

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