7.11.20

EUA

 

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A nova cassete da direita


 
Tomem nota porque uma nova versão desta cassete foi gravada ontem, mas corre a grande velocidade. Esta gente não é menos perigosa para a democracia do que o Ventura, porque está instalada no mainstream.
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Farta de esperar!



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Estado de emergência: declaração de voto

 


«A pandemia que estamos a atravessar desafiou-nos juridicamente, na medida em que as leis em vigor não foram pensadas para um fenómeno desta natureza. É por isso compreensível que o Governo tenha sentido dificuldades e tenha enfrentado críticas pelo recurso a diplomas como a Lei de Bases da Proteção Civil para restringir direitos, liberdades e garantias através de Resoluções do Conselho de Ministros. 

Uma calamidade é, certamente, um fenómeno limitadíssimo no tempo, daí que a referida lei autorize o Governo a atuar em termos que nunca tive por admissíveis em situação pandémica, situação essa que é global e de duração ilimitada. 

Tenho sustentado que a Assembleia da República não podia ser afastada, como foi, em matéria de restrição de direitos, liberdades e garantias. Se compreendo a dificuldade do momento presente a urgência de um conforto jurídico para correta atuação do Governo, por isso mesmo, creio que teria andado bem o Executivo, e andará bem se o fizer rapidamente, se tivesse apresentado uma proposta de lei à Assembleia da República que servisse de autorização legislativa à sua atuação em tempos pandémicos. Não seríamos inovadores, já que foi o que se fez em França, com a “lei da urgência sanitária”, no Reino Unido, com a “Coronavirus Act 2020” ou em Itália, países onde o Parlamento não perdeu a centralidade na matéria, o que aqui seria, também, de enorme importância, por respeito pelo artigo 165/b da Constituição e porque o Governo responde perante a Assembleia da República. 

Lendo o Decreto do Senhor Presidente da República, rapidamente nos apercebemos da desadequação da figura da Declaração de Estado de Emergência aos tempos que vivemos. Não há qualquer razão para se lançar mão de um estado de exceção constitucional que existe para suspender alguns direitos, liberdades e garantias. Tanto assim é, que não há direitos suspensos. 

O Decreto presidencial limita-se a autorizar o Governo e as autoridades competentes a “limitar, restringir ou condicionar parcialmente o exercício” vários direitos (liberdade pessoal, liberdade de circulação, liberdade económica, direitos dos trabalhadores, direito ao desenvolvimento da personalidade). Diz-se que tem carácter preventivo, o que não tem qualquer cabimento constitucional. 

Entendo que estamos perante um desvio de poder constitucional. O Senhor Presidente da República lança mão de um instituto constitucional que tem uma função delimitada para lhe atribuir uma outra, precisamente a que caberia ao Parlamento, essa de restringir ou autorizar a restrição de direitos, liberdades e garantias. 

Tudo isto é apenas tolerável pela imaterialidade do presente Estado de emergência, na condição, no que me toca, de ser aprovado, rapidamente, no Parlamento, um quadro jurídico que habilite o Governo a atuar em tempos pandémicos, ou cairemos no absurdo de renovarmos com banalidade, de quinze em quinze dias, um instituto decretado e executado por democratas, mas que amanhã será o precedente apetecido sabe-se lá por quem. 

Em suma, nada justifica que não seja o Parlamento o protagonista da medida em que podem e devem alguns direitos, liberdades e garantias ser restringidos, a responsabilidade pela ação política é, depois, claro, do Governo, e só do Governo, que responde perante o Parlamento, ao contrário do Presidente da República.» 

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6.11.20

06.11.1919 – Sophia

 


Este é o tempo
Da selva mais obscura

Até o ar azul se tornou grades
E a luz do sol se tornou impura

Esta é a noite
Densa de chacais
Pesada de amargura

Este é o tempo em que os homens renunciam.
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06.11.1975 - «Olhe que não! Olhe que não!»




Nem os seus dois intervenientes, nem muitos dos que assistiram àquele que foi o mais célebre debate da nossa democracia, estão cá hoje para o recordar. Os outros nunca esquecerão o frente-a-frente entre Soares e Cunhal, em 6 de Novembro de 1975. Durou quase quatro horas – uma eternidade impossível de repetir nas televisões apressadas que hoje temos – e o país parou para ver e ouvir.

Há 45 anos, a poucos dias do 25 de Novembro, eram mais do que raros os pontos de acordo entre Soares e Cunhal. Dessa noite ficou para a história uma frase com que Cunhal respondeu a Soares quando este afirmou que o PCP dava provas de querer transformar Portugal numa ditadura: «Olhe que não! Olhe que não!»




Texto com alguns excertos do que foi dito:


Adelino Gomes e José Pedro Castanheira, Os dias loucos do PREC, Expresso / Público, Lisboa, 2006, pp. 382-383. 
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Oiçam, EUA: fala quem sabe...

 

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5.11.20

Estado de Emergência à vista

 

O texto do decreto enviado pelo presidente da República para aprovação pela Assembleia da República (amanhã, 06.11.2020) pode ser lido AQUI.
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Protecção ou Abuso Civil?

 


A que propósito é que a Protecção Civil me manda, por sms, instalar uma Aplicação não obrigatória, como se estivesse ao mesmo nível de usar máscara, lavar as mãos e cumprir distância? Não acordem, não… 

Ainda por cima, isto mete medo a muita gente que não tem, nem pode ter, a App e que passa a achar que ela é tão OBRIGATÓRIA como usar máscara! Já tive essa experiência numa conversa, hoje mesmo.
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As eleições numa democracia doente



 

«A democracia na América está doente e, sabia-se, o remédio convencional das eleições jamais seria suficiente para a recuperar. Num corpo político e social com fracturas intransponíveis, sem espaço de diálogo e de compromisso, a braços com uma crise crescente de confiança nas instituições, com uma parte da população fixada na ideia de que a democracia é apenas um artifício dos políticos para lhe roubar o direito à cidade, é difícil afirmar valores morais, princípios republicanos, ideias de soberania ou de legitimidade baseadas na vontade popular. 

A América elegeu Donald Trump com a sensação difusa de que a democracia liberal se tornara uma farsa e voltou a entregar-lhe mais de 67 milhões de votos por acreditar que essa farsa continua. Uma vitória de Joe Biden permite acreditar numa convalescença longa e penosa; a reeleição de Trump confirmará talvez a sua agonia. 

Se os americanos elegeram em 2016 um fanfarrão demagogo e impreparado, era possível suspeitar que o fizeram por desconforto, por raiva ou, simplesmente, por protesto contra a sua adversária. Mas se tantos americanos insistiram em Trump em 2020, depois de anos de erros, de mentiras, de logros, de falsas promessas, de perturbações e ameaças, de cumplicidade com a guerra racial ou cultural, de falta de transparência em questões cruciais como os impostos, é porque a democracia se tornou uma moeda de escasso valor facial. 

Não é a velha clivagem saudável entre esquerda e direita, entre progressismo e conservadorismo que está em causa: é a oposição entre a decência e a falta de escrúpulo. Se a democracia hesita nesta escolha, é porque se tornou uma banal formalidade. 

A responsabilidade do problema não é, como tantos dizem, da imprensa liberal, que fez o seu dever de expor mentiras, o nepotismo ou a crendice no combate à pandemia. Nem das divergências de um país de extremos, apesar das feridas abertas do racismo. 

Na procura de uma resposta para a doença da democracia, o efeito Trump pode então ter uma utilidade – a de demonstrar que não há democracia na desigualdade extrema. Quando as classes trabalhadoras dos subúrbios empobrecem, quando 1% dos americanos controla 40% da riqueza nacional, a tolerância acaba, a revolta cresce e a democracia degrada-se. 

É neste pântano social e político que nascem fenómenos como o de Trump. Ele, está provado, não tem soluções para o problema (até o agrava via política fiscal). Mas, ao continuar a ser capaz de captar a indignação e o descontentamento, prova que as democracias adoecem quando deixam de se preocupar com as pessoas. Mesmo que perca, a força de Trump está aí como um aviso. Deixou de ser possível vê-lo como um acidente.» 

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Nem o pai morre, nem a gente almoça...

 

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4.11.20

Que os deuses te ajudem, Joe...

 

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Natal 2020

 


No mesmo noticiário, com um minuto de intervalo, ouvi que o primeiro-ministro está preocupado com desfasamento de compras de Natal e que se registaram ontem mais 7497 novos casos de Covid-19 e 59 mortos (sendo este o valor mais alto de sempre). 

Foi depois esclarecido que o número elevado de novos casos de ontem, e os especialmente baixos dos últimos dias, se devem ao facto de não terem sido registados casos do Norte, agora acumulados com os actuais. Mesmo com esta ressalva, mantenho a minha indignação: festas e prendas no NATAL 2020? Esqueçam! Ou preferem morrer em Janeiro?
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Como acordou a América?

 


«Há quatro anos ouvi aquilo que pensei nunca ouvir: uma Nova Iorque completamente silenciosa. Era quarta-feira de manhã, dia de trabalho; mas o ruído constante que atravessa e acalenta a cidade tinha desaparecido. Como se alguém tivesse desligado o som da televisão e os nossos passos não fizessem barulho, saímos para o mundo tarde e caminhámos pela cidade em ressaca até nos juntarmos a uma dúzia de pessoas para o seminário que já estava marcado antes. Naquele dia um palestrante apresentava o resultado das suas investigações sobre como a Alemanha nazi se inspirou na legislação do Sul segregacionista dos EUA. No fundo, como os regimes autoritários se copiam uns aos outros. Mas de repente o tema tinha deixado de ser uma curiosidade histórica e, naquela tarde escura e fria, adquirira uma relevância sinistra. 

Tudo começara quando? Talvez uns dias antes, quando fomos ver um dos mais conhecidos especialistas em sondagens e estatísticas eleitorais dizer-nos, debaixo do esqueleto de um dinossauro no Museu de História Natural, que Clinton já tinha ganho as eleições “a não ser que algo de muito estranho aconteça”. 

Mas algo de muito estranho tinha já acontecido — e várias vezes até. Teorias da conspiração, apagões da internet, desinformação e delírios coletivos. Mas nada tão grave quanto a sensação sobranceiramente confortável de que “isto não pode acontecer aqui”. A ideia de que o povo dos EUA nunca elegeria um ser tão mentiroso e egoísta, tão impreparado e incompetente, foi a pior aliada dos democratas naquelas eleições. Os americanos, afinal, eram como todos os povos do mundo. Também elegiam demagogos e fanfarrões. A falta de imaginação foi a principal culpada do resultado. A credulidade foi a sua principal vítima. 

A partir daí, os dias — e, na verdade, anos — seguintes foram de negociação com a incredulidade. As pessoas começaram a falar-se nos corredores e elevadores dos blocos de apartamento. Olhavam-se de soslaio, depois encolhiam os ombros, e depois diziam “dá para acreditar nisto? Como é que isto foi acontecer?”. Nos transportes públicos, gente com aquele ar de sinceridade diligente tão típico da América do Norte sobraçavam dossiês que lhes tinham oferecido lá no trabalho sobre “como lidar com o trauma pós-eleitoral”. O reitor da universidade escrevia-nos todos os dias, querendo saber como estávamos, oferecendo-nos os números das linhas de apoio psicológico, insinuando-nos que lhes devíamos fazer uma chamada, explicando-nos atenciosamente os passos que haviam sido tomados para pôr cobro à vandalização do ponto de encontro dos estudantes muçulmanos num dos edifícios do campus. As pessoas de minorias cerraram os dentes, prepararam-se para serem erigidas em bodes expiatórios por analistas de vários campos políticos, e tiraram os seus instintos de sobrevivência do armário onde nunca os tinham verdadeiramente esquecido. E um pouco por todo o lado percebia-se a gargalhada incontida daqueles que tinham querido ver acima de tudo aquele resultado: a incompreensão e o pânico entre os bem-pensantes e os bem-comportados. Um país lançado à instabilidade para chatear os progressistas. 

Dez dias depois, a um sábado, há violência inesperada e repentina à porta dos bares e restaurantes. Gente assustada procura refúgio (e sentido para o que está a acontecer) nos prédios vizinhos ou nas redes sociais. Um grupo até então quase desconhecido de homens que glorificam a agressividade gratuita como uma forma de combater os seus fantasmas — o feminismo, o politicamente correto e a decadência do ocidente — concertou-se para atacar gente ao calhas nos bairros boémios da cidade. Não houve qualquer provocação para aqueles atos, apenas a necessidade de ir esmurrar uns quantos dos tais progressistas ainda baralhados com a vitória de Trump e mostrar-lhes quem mandava agora. A tensão nesses dias, e depois deles, não era uma coisa dos livros; era das ruas e era palpável. Esse grupo violento que apareceu então bruscamente ainda existe; foi a eles que Trump se dirigiu num dos recentes debates presidenciais, pedindo-lhes que “estivessem prontos, e a postos” para logo a seguir às eleições. A partir de hoje. 

Se Trump perder as eleições de forma inequívoca que garanta a sua saída do poder sem causar muito mais dano, logo virão as análises que nos dirão que a democracia americana é afinal forte e que as suas instituições sobreviveram. Nada disso é verdade. A democracia americana não é nem forte, nem sequer muito democrática — e um dos seus dois principais partidos continua apostado em fazer com que assim seja. As instituições foram usadas a seu bel-prazer por Trump, com quase nenhuma resistência, e com o apoio servil do seu partido. E foi preciso a total incompetência na gestão de uma pandemia que já matou mais de 200 mil cidadãos dos EUA para que Trump chegasse a estas eleições no estado em que chegou. Um tirano um pouco mais metódico — um Putin, em vez de um Trump — teria devorado o governo dos EUA por tempo indeterminado. 

E em rigor, à hora a que escrevo esta crónica, isso não é ainda impossível. Por isso, digam-me, vocês que sabem mais do que eu: como acordou a América hoje?» 

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E nos EUA...

 


De uma amiga portuguesa que vive em Washington.
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3.11.20

Dia em que as imagens dispensam palavras

 

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H-O-J-E ?!?

 

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A quanto está o PSD?

 


«Não há debate sobre a legitimidade do PSD governar a Região Autónoma dos Açores se conseguir uma maioria que suporte essa solução. Assim como não havia debate sobre a legitimidade da solução da “geringonça”. O facto de a direita estar a tentar construir essa maioria, mesmo sabendo que o PS ficou em primeiro, é a confissão da má-fé da sua posição de há cinco anos. Se acreditassem no que diziam não fariam o que consideraram errado só pelo facto de a esquerda também o ter feito. Reconhecem que a legitimidade do governo nacional, como a do governo central, resulta das eleições parlamentares e que é o Parlamento, e apenas ele, que tem autoridade para decidir quem governa. 

Sendo legitima, esta negociação é perigosa. E, se chegar a nascer, a “geringonça” de direita é mais complicada do que a de esquerda. São precisos cinco partidos, dois deles estreantes e com provas a dar. E um deles é o Chega. 

É confortável a simetria entre Chega e BE/PCP. E é falsa, porque estes partidos ocupam à esquerda o espaço que o CDS sempre ocupou à direita. Ainda assim, vários comentadores, mortinhos por normalizar Ventura, vieram desdramatizar um possível acordo entre o PSD e o Chega, usando a “geringonça” como exemplo. Julgam que a História é um contínuo onde se confrontam moderados e extremistas. Só que os riscos para a democracia vêm de lugares diferentes em momentos diferentes. Nem sempre dos extremos, nem sempre dos dois em simultâneo. Qualquer pessoa que tenha a mínima noção do tempo histórico que vivemos percebe, mesmo que seja de direita, que é da extrema-direta que hoje vem o perigo para as democracias liberais. Que é ela que tem, neste momento, a capacidade e os instrumentos políticos para subverter o sistema democrático. 

Não vou perder tempo a discutir as posições políticas e ideológicas do BE e do PCP, os regimes que cada um apoia (não são os mesmos) e o amor que têm ou não têm pela democracia. O debate no espaço público, onde uma pessoa como eu é colada a Maduro ou à ditadura castrista, está tão degradado que nem acredito na possibilidade desta conversa ser produtiva. Fico-me por isto: os perigos que cada partido representa não resultam das suas posições explícitas ou imaginadas mas do que querem e podem fazer no exercício prático da sua atividade política real. Para isso, não precisamos de suposições. Bloco de Esquerda e PCP não põem, no exercício das suas atividades políticas, o Estado de Direito democrático em risco. Não o contestam em nenhuma proposta que tenham feito, nas últimas décadas, no Parlamento. São dois partidos do arco constitucional. Tanto como o CDS, pelo menos. 

Mas nem preciso de fazer este exercício de memória recente. Basta-me comparar o que se está a tentar comparar: a “geringonça" e o que se sabe das conversações para um acordo nos Açores. Na “geringonça”, BE e PCP apresentaram a sua agenda social, defenderam mudanças na lei laboral (no que saíram derrotados em quase tudo) e exigiram o recuo em medidas impostas pela troika. Nem uma única das suas propostas estava relacionada com a natureza do nosso regime constitucional. Na negociação para a formação de um governo regional, e não de uma maioria parlamentar nacional, o Chega exigiu imediatamente o envolvimento do PSD numa revisão constitucional. E isto basta para perceber todas as diferenças. 

Ao contrário do Bloco e, sobretudo, do PCP, o Chega não tem uma densidade ideológica que lhe permita propor a superação do sistema económico vigente. Pelo contrário, defende o aprofundamento agressivo do que já existe, reforçando desigualdades sociais e económicas. Mas, mesmo que o PCP tenha uma agenda revolucionária, não se encontra no seu programa eleitoral, nas suas propostas legislativas e na sua prática autárquica nada que seja incompatível com a nossa tradição democrática. Pelo contrário, mesmo não sendo revolucionário, o Chega tem propostas legislativas que subvertem a continuidade constitucional. Traduzida num slogan em defesa de uma “IV República” e na vontade de fazer uma profunda revisão constitucional, elas incluem medidas atentatórias da nossa tradição humanista. E estas propostas precisam de romper o cerco sanitário que as deslegitima aos olhos de muitos. Não interessa ao Chega se as suas propostas contarão com o apoio do PSD, desde que conte com o seu beneplácito para iniciar esse processo tendo apenas um deputado. Só quer meter o pé na porta. 

Como outros líderes populistas de extrema-direita, o que interessa ao Chega não é a aplicação do seu programa. É a normalização do seu discurso, abrindo caminho ao abandono de consensos civilizacionais. Pretende criar um corte político que lhe dê espaço para crescer. E esse corte é o caos, como se tem visto pela forma como os seus ativistas têm multiplicado movimentos para pôr em causa o combate à pandemia, imitando outros partidos congéneres. Felizmente, com pouco sucesso. Deste caos, não crescerá a proposta autoritária sonhada por saudosistas como Jaime Nogueira Pinto. Partidos como Chega são apenas oportunistas. Mas o Chega não deixará de aproveitar a atual fragilidade do PSD e do CDS e o momento trágico que vivemos para tentar criar o clima que permita fazer implodir o sistema partidário, crescendo sobre as suas cinzas, como outros fizeram. 

Se não perceberam de que massa é feita esta nova direita, vejam como Trump se prepara para reagir à possibilidade de uma derrota nas urnas, tentando impedir que votos sejam contados, semeando o caos institucional e recusando a vontade popular. Não se trata de saber que partidos acreditam ou não acreditam na democracia. É daqui que vem o perigo - e quem o tente normalizar é cúmplice. 

Se Rui Rio abrir a porta ao Chega, abrirá a porta à destruição do seu próprio partido, como Costa nunca abriu quando conversou com o BE e o PCP. Como o PP o fez quando deu ao VOX as armas para desfazer a direita espanhola. Pablo Casado percebeu-o agora, tarde de mais. Se forem verdadeiras as notícias que têm saído e ainda não foram desmentidas, é assustador ver como basta a simples liderança de um governo regional para o PSD abrir um processo negocial com o Chega que ultrapassa os limites regionais e, ainda por cima, passa por temas constitucionais. É caso para dizer que o PSD está em saldos.» 

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Se puder ser já hoje...

 

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2.11.20

A Nova Zelândia soma e segue

 



«Depois de ter merecido um enorme voto de confiança do eleitorado, a primeira-ministra neozelandesa, Jacinda Ardern, aproveitou a formação do novo Governo para reforçar as suas credenciais como uma das líderes mundiais mais progressistas do planeta. O Executivo tem pela primeira vez uma mulher indígena como ministra dos Negócios Estrangeiros, três ministros homossexuais e outras minorias. “Reflectem a Nova Zelândia que os elegeu”, afirma Ardern. 

Uma das maiores novidades é a nomeação de Nanaia Mahuta como ministra dos Negócios Estrangeiros, que é a primeira mulher maori a exercer o cargo. Há quatro anos, Mahuta já tinha sido a primeira deputada a usar o moko kauae, uma tatuagem tradicional do povo maori, e agora é a primeira mulher indígena a chefiar a diplomacia neozelandesa.»
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No dia deles

 


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Os Mercadores de Atenção

 


«A atenção dos cidadãos é, talvez, o produto mais valioso do mundo, como refere Tim Wu num livro cuja tradução em português corresponderia ao título deste artigo. Em meados do século XIX, percebe-se que seria possível atrair e vender a atenção dos consumidores, cobrando-a aos fabricantes que quisessem publicitar produtos junto destes. Assim nasceu o marketing, que se foi progressivamente adaptando aos novos media, primeiro os jornais e o correio, depois a rádio e a televisão e, agora, a Internet. Ao princípio, o marketing foi usado principalmente para vender (falsos) remédios e mezinhas, mas rapidamente se expandiu e passou a representar uma parte significativa da actividade económica e política. 

Que o valor da nossa atenção é enorme é atestado pelo facto de as empresas que a comercializam serem, neste momento, as mais valiosas do mundo, com capitalizações bolsistas que, para as quatro primeiras (Apple, Microsoft, Amazon, Alphabet-Google) excedem em muito o bilião de dólares, seguidas pelo Facebook com um valor de aproximadamente 750 mil milhões de dólares. É por esta razão que as televisões, as rádios, os jornais, as redes sociais e os sites na Internet tudo fazem para prender a nossa atenção, apresentando conteúdos que maximizam o tempo que dedicamos a cada plataforma. Nos dias que correm, poucos media se podem dar ao luxo de apresentar visões equilibradas e profundas dos temas importantes. Para cativar a nossa atenção, é necessário apresentar aquilo que cada pessoa prefere ver, ler ou ouvir, o que conduz ao reforço das opiniões preexistentes, à criação de bolhas onde apenas se é exposto a um dos lados das questões e à radicalização das opiniões políticas, sociais e económicas. 

A pandemia, com a sua mistura de novidade, mistério e perigo, tem os ingredientes para atrair, como poucas outras coisas, a nossa atenção. Temos assistido assim a um foco quase total dos media, e das redes sociais, nos assuntos relacionados com a pandemia, em detrimento de um tratamento de outras questões que são tão ou mais importantes no médio e longo prazo, como o aquecimento global, o crescimento das desigualdades ou os riscos para a saúde causados por diversos comportamentos comuns. As redes sociais e os media encheram-se de discussões acaloradas e mesmo violentas sobre a evolução da pandemia, que capturam e monopolizam a atenção de milhões de portugueses. Porém, uma análise objectiva do real impacto da pandemia na mortalidade não torna imediatamente claras as razões para este foco total e completo nesta única questão. 


1.11.20

11.10.2019 – Repito 2019, 2019

 


Foi nesse dia que fiz e divulguei aqui esta imagem. 

Eu sei que há quem acredite em ressurreições, mas isso só deve acontecer no fim dos tempos e ainda não chegámos lá. Portanto, podem pôr flores nesta campa sem saírem do concelho em que residem, mas não tentem argumentar dizendo que existe uma moribunda que alguém quer matar, porque estão a usar um calendário errado. A Geringonça morreu, paz à sua alma, para a frente é que é o caminho – novo, diferente e corajoso.
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Antes de 01.11.1755 Lisboa era assim

 

 
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Nova sondagem legislativas

 


Fontes em muitos jornais, por exemplo AQUI.
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O vírus acelerou o “milagre económico” da China

 


«Enquanto a Europa e a América estão a braços com a pandemia e fazem planos para semanas, Pequim repensa a sua estratégia económica a médio prazo. 

Com a pandemia da covid-19 sob controlo, a China vê a sua economia crescer e repensa a sua estratégia económica para se adaptar à nova conjuntura internacional e reforçar a sua posição no confronto com os Estados Unidos. Há uma nota significativa: enquanto na Europa e nos EUA se fazem planos para meia dúzia de semanas, a China aprova um plano para cinco anos, inserido num horizonte mais longo – a “Visão 2035”. Enquanto os EUA estão envolvidos numa feroz batalha eleitoral, num clima de grande incerteza e a braços com uma nova vaga da pandemia, a covid acelera a recuperação económica da China. 

O anúncio de um crescimento do PIB chinês, de 4,9%, no terceiro trimestre não foi grande surpresa para os meios económicos. É uma consequência do controlo da pandemia. Neste mesmo trimestre, os EUA registaram um crescimento de 7,4% e a zona euro de 12,7%. Mas há uma diferença fundamental. No fim do ano, prevê-se que o crescimento do PIB chinês supere os 2%, o mais forte no conjunto das economias do G-20. Em contrapartida, os EUA poderão registar um saldo negativo de 4% e a Europa uma taxa negativa mais alta. No começo do quarto trimestre, o controlo da pandemia parece dependente do aparecimento da vacina. 

Ao mesmo tempo, a pandemia permitiu a Pequim aumentar a sua quota no comércio mundial, aproveitando a forte procura de produtos de combate à covid. A China continua na rota de se tornar na maior economia mundial em 2030, afirma Justin Yifu Lin, antigo economista-chefe do FMI. “Pequim pode agora olhar em frente, enquanto as outras grandes economias tratam de minorar os estragos e controlar a dívida.” 

A “circulação dual” 

A reunião plenária do Comité Central do Partido Comunista Chinês (PCC) terminou na quinta-feira, em Pequim, e definiu uma nova estratégia de desenvolvimento. O Plano 2021-25 só será divulgado em 2021, mas Xi Jinping já anunciou as grandes linhas. Tem duas vertentes. 

A primeira foi designada por “circulação dual”. É uma aposta no crescimento do mercado interno e do consumo para promover o aumento dos rendimentos, reduzir as desigualdades e tornar a China menos vulnerável às turbulências da globalização e às crises geopolíticas. O Estado deverá orientar o ciclo da produção, circulação, distribuição e consumo no território nacional. A circulação interna deverá reduzir a dependência das exportações, uma das grandes vulnerabilidades da economia chinesa. 

Neste plano, será dada prioridade à inovação tecnológica. O objectivo final, promete Xi, é elevar os padrões da sociedade chinesa, de forma a proporcionar um rendimento alto aos cidadãos. 

O plano quinquenal inscreve-se num horizonte mais largo, designado por “Visão 2035”. Entre os objectivos está a remodelação de um ambiente devastado pelo crescimento industrial forçado. Esta vertente, relativa ao médio prazo, visa alcançar um estatuto de vanguarda nas tecnologias de nova geração, no momento em que as tensões com os Estados Unidos não se circunscrevem ao comércio mas dizem respeito, sobretudo, ao domínio da alta tecnologia. A China quer passar de “fábrica do mundo” ao estatuto de colosso tecnológico. 

Para acelerar a recuperação pós-covid, a China recorreu a grandes investimentos públicos, como várias linhas de comboios de grande velocidade. Por fim, nos últimos meses, houve uma clara recuperação do consumo interno. O Presidente Xi passa a ter uma “poderosa narrativa” para conservar ou alargar o seu próprio poder. 

Note-se que Pequim não se quer fechar ao investimento externo, nem aos bens e serviços importados, nem renunciar às exportações. Trata-se, simplesmente, de mudar o acento tónico: uma economia mais baseada no mercado interno e menos na integração internacional. 

O historiador britânico Rana Mitter, um dos mais reconhecidos especialistas da China contemporânea, assinala o alcance e os limites da nova política. “A China está a tentar criar dois sistemas ligados, mas distintos. Um é uma economia doméstica nacionalista, que faz evocar uma ideia da era de Mao, a de auto-suficiência (…).” O outro ponto diz respeito à tecnologia. “A China está a investir fortemente na investigação e desenvolvimento. O vírus, de facto, deu um impulso à ciência chinesa em diversas áreas, da biotecnologia à inteligência artificial”. 

No entanto, “a ‘circulação dual’, a ideia de que a China pode separar a economia doméstica das economias internacionais é insustentável a longo prazo. Mais reformas estruturais serão necessárias. E há outros temas, como a poluição, a mudança climática e o declínio demográfico – a partir de 2029, haverá menos cinco milhões de chineses por ano e uma população a envelhecer rapidamente.” 

Não será o século chinês 

É preciso distinguir entre uma conjuntura excepcional e uma nova ordem. Se a conjuntura da pandemia favorece a China, não se pode daí deduzir que esteja a caminho de substituir a América no plano geopolítico. À pandemia, que enfraqueceu as democracias ocidentais, soma-se outro elemento que joga a favor da China: Trump e as eleições americanas. São um factor de caos político, paralisia internacional e incerteza económica. 

“[O século XXI], no pós-covid, não será o século americano. Mas também não será, assim não facilmente, o século chinês”, escreve a analista italiana Marta Dassù. “Será, mais realisticamente, o século do Pacífico, no sentido de que a competição geopolítica entre os EUA e a China se decidirá nos mares da Ásia Oriental.” A Europa não será o terreno directo desse confronto, mas será um actor decisivo na balança de forças entre a China e a América. 

Uma derradeira nota. Se a China foi o berço da pandemia, foi também a primeira potência a controlá-la, com meios que as democracias não podem usar. Lembrem-se os progressos da China na utilização da inteligência artificial como meio de controlo da população. 

O Ocidente acabou por adoptar a estratégia chinesa do confinamento. Mas não pode utilizar meios totalitários de controlo das pessoas. “Felizmente é impossível”, responde o jornalista italiano Danilo Taino. “É esta contradição que impediu a Europa e os Estados Unidos de vencer a pandemia. Teremos de conviver com ela por muito tempo.” Nas sociedades ocidentais, para o bem ou para o mal, a única garantia de vencer a pandemia reside no comportamento dos cidadãos.» 

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