Golpistas, recolham suas indignações seletivas e suas
panelas. O país está em paz. Encaminhou-se a consumação do golpe. Guardem o que
sobra da brutalização das falas e dos gestos para outros momentos, porque daqui
a alguns anos teremos outro golpe, e depois mais outro, até o fim dos tempos.
Está tudo dominado. Ninguém mais precisa ter medo das
cotas, do ProUni e das fortunas que mantêm milhões de vagabundos viciados em
Bolsa Família. Salvaram-se reputações, interesses e brioches. Recolham o medo
que um dia sentiram do avanço do comunismo, da nova classe média e do filho da
empregada que vai virar doutor e pode ter a petulância de querer tratar dos
nossos reumatismos.
A família brasileira, tão exaltada nos discursos do
golpe na Câmara, estará em breve sob a liderança do grande chalaça. O líder
Michel Temer foi o que sobrou para a direita enrustida. A direita que andou de
mãos dadas com Bolsonaro e com Zé Agripino (onde andam Zé Agripino e Aloysio
Nunes Ferreira, se já podem sair dos esconderijos?) tem agora a quem seguir.
A direita, tão agarrada a lições bíblicas - citadas à
exaustão na falação na Câmara -, passou trabalho mas venceu, depois de
abandonar Aécio e os tucanos avariados pelas pesquisas sobre as eleições de
2018. Vai seguir a orientação do autor de uma carta infantil com queixas de que
Dilma nunca olhou direto nos seus olhos e nunca ligou para suas carências
afetivas.
Mas o medíocre Michel Temer, Cunha e seus asseclas
desmoralizaram o jornalismo brasileiro. Nunca se viu tantos jornalistas sob a
saia de golpistas. Vergonhosamente, nunca se viu tão pouco jornalismo.
Desde ontem, os golpistas e seus cúmplices (inclusive
os camuflados) podem acalmar suas almas. Já podem até jogar Eduardo Cunha ao
mar. Podem dormir em paz porque o Brasil e a Lei de Responsabilidade Fiscal,
sem pedaladas, estarão daqui a pouco sob a austeridade de Michel Temer e de
Armínio Fraga.
Liberais, defensores de normas e leis que os
favoreçam, adoradores do livre mercado que ontem votaram em nome de Deus e da
família, durmam em paz. Indignem-se com a corrupção e continuem
aplaudindo corruptos impunes. Economizem os discursos duplos, as duas caras, a
falsa defesa da democracia. Cuidem bem da fala dos seus oráculos adesistas.
Comemorem, abram champanhe, reabram contas secretas,
voltem a superfaturar metrôs, roubem a merenda das crianças paulistas e
enterrem a Lava-Jato antes que chegue mais perto das suas casas, dos seus
governos e dos seus ninhos. Peçam para que os delatores parem de delatar Aécio
Neves. Leiam a Constituição onde lhes interessa, declamem o Hino, vistam a
camiseta da Seleção dos 7 a 1.
Percorram o Brasil com Janaína Paschoal em sessões de
exorcismo. Gritem o nome do procurador-geral da República, de Gilmar Mendes e
do juiz Moro. Elejam o japonês da Federal como o mais votado deputado
brasileiro de todos os tempos. Reexaminem com cuidado, sabedoria e critério a
Previdência Social, o SUS, o FGTS, os direitos trabalhistas. Façam o arrocho
sem parcimônia.
O governo será de Michel Temer, do Lobão, do Paulinho
da Força, do Caiado, do Abel das Galinhas, dos investidores estrangeiros e dos
seguidores dos patos da Fiesp. Eles conseguiram o que velhos protagonistas e
figurantes da velha direita do golpe que derrubou Jango nunca imaginaram. A
nova direita venceu e tomará o poder sem votos, sem farda e sem tanques.
Golpistas sobreviventes de 64 devem estar espantados
com o que viram ontem, enquanto Eduardo Cunha votava pelo golpe e rogava aos
céus para que Deus tenha misericórdia do Brasil. Com tanta proteção, não há
quem possa conspirar contra a família brasileira.
Moisés
Mendes, jornalista brasileiro
(Via Diana Andringa por mail)
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