Da crónica «Rendição», de Miguel Sousa Tavares, publicada no primeiro caderno do Expresso de hoje (sem link). Mais um texto, cortante, que evidencia a quase unanimidade de opiniões e de críticas, no momento que passa. Raramente se terá visto uma frente tão ampla e tão aguerrida contra um governo – eu não me lembro de nenhuma situação equivalente.
«Fora dó círculo dos cinco terroristas económicos que nos governam, fora da nave de loucos supostamente conduzida pelo primeiro-ministro Passos Coelho, não há uma alma penada que não tenha percebido já que seguimos uma estratégia de suicídio colectivo. (...)
Perante a evidência do desastre, perante o descalabro do "bom aluno" e do "bom exemplo", os seus mentores tratam de tirar o cavalinho da chuva: o FMI fez um extraordinário exercício de mea culpa, reconhecendo ter-se enganado na teoria e na sua demonstração prática (o que, mesmo assim, não convenceu o último dos moicanos, o nosso Vítor Gaspar, que acha que tudo não passou de um problema de má tradução do inglês). E Bruxelas já tratou de esclarecer, pela voz do nosso amigo Durão Barroso, que a responsabilidade por tanta asneira junta, aqui ou na Grécia, "é dos governos nacionais". É assim que acontece nas histórias de espionagem, quando os agentes undercover são descobertos: abandonam-se à sua sorte. O careca, o alemão e o etíope já estão em roda livre e por conta própria: só Gaspar e Passos Coelho é que persistem em validar as suas credenciais. (...)
Há uma coisa pela qual Passos Coelho não merece perdão: dizer que estava preparado para governar. A ignorância só é desculpável quando é humilde, não quando se mascara de sapiência e suficiência, sabendo que, com isso, vai causar danos a terceiros de boa-fé. Mas é o que temos, por ora.
E, se ele não tem coragem para estar à altura da situação e fazer o que tem de fazer como primeiro-ministro de um país com quase 900 anos de história, que agoniza, sem sentido nem dignidade, pois que acorde então Sua Excelência que habita no Palácio de Belém e que tem o dom de falar quando é fácil ou lhe convém e de ficar calado e quieto quando acha prudente. Que Cavaco Silva obrigue o PM a defender Portugal, que o substitua nisso, se necessário, ou que o demita, se não restar alternativa. Mas que se deixe de silêncios palacianos e jogos florentinos, à mistura com desabafos de alma no Facebook. Eu nem sequer tenho conta no Facebook e não penso vir a tê-la para ler as mensagens criptadas do alter ego do Presidente da República. Ó, sorte a nossa!»
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