16.7.11

Aos vindouros, se os houver...


Vós, que trabalhais só duas horas
a ver trabalhar a cibernética,
que não deixais o átomo a desoras
na gandaia, pois tendes uma ética;

que do amor sabeis o ponto e a vírgula
e vos engalfinhais livres de medo,
sem peçários, calendários, Pílula,
jaculatórias fora, tarde ou cedo;

computai, computai a nossa falha
sem perfurar demais vossa memória,
que nós fomos pràqui uma gentalha
a fazer passamanes com a história;

que nós fomos (fatal necessidade!)
quadrúmanos da vossa humanidade.

Alexandre O'Neill, Poemas com Endereço
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Dantes era assim (2)


Sem Barbies.

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Pois nós (também) somos a Grécia


... Mr. Obama.
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A destruição programada do SNS


No último número de Le Monde Diplomatique (edição portuguesa), um importante texto de Sandra Monteiro:

«Os cidadãos com rendimentos mais elevados também devem ter acesso gratuito a todos os cuidados de saúde prestados pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS). A concepção que esta afirmação encerra, e que está no centro da arquitectura do Estado social, não é uma herança de um qualquer tempo de vacas gordas em que se podia fazer tudo por todos − até pelos ricos, como se ouve agora −, nem exprime um pensamento utópico que ignora os condicionalismos dos recursos. Pelo contrário, assume que os recursos, além de serem limitados, são socialmente apropriados de forma assimétrica e em resultado de interesses divergentes e poderes desiguais. Procurando uma solução democrática de arbitragem e de escolha das finalidades a prosseguir, o Estado social procura encontrar as formas de redistribuição que melhor assegurem o bem-estar e a elevação geral do nível de vida dos cidadãos. Fazendo-o, o modelo em que ele assenta conseguiu resultados significativos ao nível da redistribuição de rendimentos, da diminuição das desigualdades e da racionalização dos recursos − muito mais do que os modelos assistencialista ou neoliberal, apesar dos erros, falhas e atrasos.

Em Portugal, o caso do SNS é exemplar, tanto pela melhoria dos indicadores de saúde por que é responsável nas últimas décadas, como pelos problemas persistentes que são visíveis no seu interior, mas exigem resolução concertada noutros âmbitos (caso dos determinantes sociais da saúde, que requerem alterações de políticas em sede de trabalho, salário, escolarização, habitação, ambiente…). Em vez de se pensar na melhoria do SNS, a actual crise a ser usada como pretexto para introduzir no sistema mudanças há muito desejadas, algumas já parcialmente concretizadas (parcerias público-privadas…), por elites económicas que vêem na saúde, sector com «clientes» inesgotáveis e particularmente fragilizados, um negócios muito lucrativo e quase sem risco. Essas elites apenas precisam de um Estado facilitador, algo que se prepara tanto com as medidas do «Programa do Governo» apresentado por Pedro Passos Coelho, que levam ainda mais longe o que estava previsto no «Memorando de Entendimento» assinado com a troika, como com a atribuição da pasta da Saúde ao ministro Paulo Macedo, ex-administrador da Médis e especialista na gestão de seguros de saúde.»

(Ler o resto AQUI.)
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15.7.11

Dantes era assim (1)


Sem email.
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Impunidade nos crimes políticos?


(Contributo de Jorge Pires da Conceição)

O que é que Zura Bitieva (1948-2003), Anna Politkovskaia (1958-2006), Alexander Litvinenko (1962-2006), Stanislav Markelov (1974-2009), Anastasia Baburova (1983-2009) e Natalia Estemírova (1958-2009), entre outros, têm de comum com a Chechénia, com Ramzam Kadyrov e com Vladimir Putin?... A Justiça internacional tem urgência em saber!!!

Por ocasião do 2º aniversário do horrível assassinato em Grozny da jornalista Natalia Estemírova (15.07.2011), militante dos direitos do homem na organização não governamental "Memorial", o Conselho da Europa tem urgência em conhecer e levar a Juízo, não apenas os quatro assassinos operacionais, mas os respectivos mandantes.

Na Chechénia e na Rússia poucos são os que terão dúvidas quanto à identidade dos mandantes: os assassinados na Chechénia (Zura e Natalia) tê-lo-ão sido por ordem expressa de Ramzam Kadyrov, o presidente, com o apoio e cobertura de Vladimir Putin. Os restantes, sobretudo a Anna e o coronel Alexander, por indicação directa de Vladimir Putin.

Um documentário passado (de madrugada) na TVI24 há menos de duas semanas dá claramente essas pistas, as quais eram, na verdade, factos já anteriormente dados como certos por muitos dos observadores.

Os responsáveis pelos estes crimes destes activistas dos direitos humanos - operacionais e mandantes - continuam impunes. Todos eles por, de algum modo, investigarem ou denunciarem o que se passava na Chechénia e por terem descoberto que os atentados em Moscovo tinham sido uma encenação concertada para justificar a intervenção russa na Chechénia, da qual resultou uma série de graves abusos dos direitos humanos. (Tema, aliás, que substanciou o livro "Um homem muito procurado", de John Le Carré). Pelo menos mantenhamos viva a memória dos que morreram por ser solidários e por lutar pela verdade e pela justiça, ousando enfrentar os poderosos deste Mundo!


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Please, Europe

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Heranças que se arrastam?

@Paulete Matos

Quatro países periféricos da zona euro, hoje especialmente atingidos pela crise – Grécia, Portugal, Espanha e Irlanda –, foram governados por ditaduras ou sistemas autoritários de extrema-direita durante décadas do século XX. Apesar dos progressos registados desde que esses regimes terminaram, eles foram determinantes para que esses países sejam ainda hoje pobres quando comparados com grande parte dos seus parceiros europeus (com um PIB bem abaixo da média registada na Europa dos 15).

Além de pobres, tratava-se de Estados altamente repressivos e com pouca sensibilidade social. Isso continua a reflectir-se no facto de serem, também na Europa das 15, aqueles que têm mais polícias por habitante e menor percentagem da população envolvida em actividades ligadas ao bem-estar (saúde, ensino, etc.).

Mais uma achega para percebermos porque estamos onde estamos…

(A partir de um texto de Vicenç Navarro, Las causas políticas de la crisis.)
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Ela, a crise, agora em música

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14.7.11

Descobri este vídeo enquanto ouvia o M. das Finanças

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… e acho que tem tudo a ver com ele.



(Para memória futura: «Desvio ($%&xYz$$$) colossal».)
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Um país «chumbado»


Notícias do dia anunciam que «os resultados dos exames do 9º ano são os piores dos últimos anos» e explicam que os mesmos se devem, fundamentalmente, ao facto de as provas serem agora mais difíceis.

Concretamente no que se refere à Matemática, a média dos mais de 90.000 alunos que se apresentaram à primeira chamada não ultrapassou 43% (sendo que mais de 16.000 não conseguiram ultrapassar 19% e cerca de 30.000 tiveram menos de 30%). Devastador! Assim não vamos lá, com FMI ou sem ele.

Ora acontece que não consigo admitir que alguém considere que o exame em questão (publicado aqui) deva, ou sequer possa, ser considerado difícil: percorri-o do princípio ao fim. Não o seria há cinquenta anos, nem há vinte – garanto eu que tenho bem presentes essas referências temporais –, quando nem sequer eram fornecidos, como agora, fórmulas tão elementares como as necessárias para calcular o perímetro de uma circunferência ou o valor de pi…

Haverá certamente muitos culpados - pais, professores, o Mário Nogueira, o 25 de Abril, Sócrates (sempre…) ou até a padeira de Aljubarrota – e dezenas de razões já apontadas por todos os Cratos deste país.

Acrescento mais uma: a infantilização que muitas perguntas de testes como este reflectem e que traduz um facilitismo bacoco e quase insultuoso, uma desistência de considerar que rapazes e raparigas com um mínimo de 15 anos são capazes de raciocínios abstractos e que não precisam que lhes contem histórias da carochinha para resolverem problemas elementares. Um exemplo nesta figura que reproduzo: por que raio se fala de uma choupana (!!!) para se pedir que se calcule a altura dum cilindro? Pretende-se exactamente o quê? Só se for que os alunos percam algum tempo por não saberem… o que é uma choupana!...

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No 1º aniversário foi assim

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Ah ! ça ira, ça ira, ça ira,
Le peuple en ce jour sans cesse répète,
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira,
Malgré les mutins tout réussira.
Nos ennemis confus en restent là
Et nous allons chanter alléluia !
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira,
Quand Boileau jadis du clergé parla
Comme un prophète il a prédit cela.
En chantant ma chansonnette
Avec plaisir on dira:
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!

Ah ! ça ira, ça ira, ça ira,
Suivant les maximes de lévangile
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira,
Du législateur tout saccomplira.
Celui qui sélève on labaissera
Celui qui sabaisse on lélèvera.
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira,
Le vrai catéchisme nous instruira
Et laffreux fanatisme séteindra.
Pour être à la loi docile
Tout Français sexercera.
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!

Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!
Pierette et Margot chantent la guinguette
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!
Réjouissons-nous, le bon temps viendra!
Le peuple français jadis à quia,
L'aristocrate dit : mea cilpa!
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!
Le clergé regrette le bien qu'il a,
Par justice, la nation l'aura.
Par le prudent Lafayette,
Tout le monde s'apaisera.
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!

Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!
Par les flambeaux de l'auguste assemblée,
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!
Le peuple armé toujours se gardera.
Le vrai d'avec le faux l'on connaîtra,
Le citoyen pour le bien soutiendra.
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!
Quand l'aristocrate protestera,
Le bon citoyen au nez lui rira,
Sans avoir l'âme troublée,
Toujours le plus fort sera.
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!

Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!
Petits comme grands sont soldtas dans l'âme,
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!
Pendant la guerre aucun ne trahira.
Avec coeur tout bon français combattra,
S'il voit du louche, hardiment parlera.
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!
Lafayette dit : "Vienne qui voudra!"
Sans craindre ni feu, ni flamme,
le français toujours vaincra!
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!

(Palavras anónimas, mais tardias: )

Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!
Les aristocrates à la lanterne,
Ah ! ça ira, ça ira, ça ira!
Les aristocrates, on les pendra!
Et quand on les aura tous pendus,
On leur fich'ra la pelle au cul.
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Delirar também ajuda


Ferreira Fernandes, hoje, no DN.

007, o agente económico especial

Perguntam-me se sou a favor dos eurobonds. Claro, a 007 por cento! "Meu nome é Euro, Euro Bond", e em vez da Ursula Andress resgatava-se a Grécia, em vez do bikini, a tanga. O actual drama financeiro europeu ganharia em seguir os cenários de Ian Fleming e a fleuma de Sean Connery. A surpresa pela entrada de Itália entre os aflitos passava a titular-se "Nunca mais Digas nunca". A repetição do resgate grego vinha com um aviso: "Só Se Vive Duas Vezes." A chegada da troika a Lisboa era a "Operação Relâmpago". E Portugal procurava variantes: "From Angola with Love", "From Brasil with Love"... As agências de rating tinham "Licença para Matar", o FMI chama-se "Dr. No", e o misterioso George Soros era o "Goldfinger". Os agentes económicos estavam todos "Ao Serviço de Sua Majestade", naturalmente a dona Angela Merkel, também conhecida como M., o patrão de 007, cuja secretária é Miss Moneypenny (esta interpretada por Durão Barroso). Com algumas variações (os mercados apostavam mais no ouro do que nos "Diamantes São Eternos"), a política financeira continuava a repousar no "Casino Royale", ora na roleta, ora nos dados, ora nos hedge funds, ora nos credit defaut swaps, mas sempre, para alguns, com jackpots de prémio. Com eurobond-girls bem escolhidas, era o sucesso.

P.S. - Decididamente, James Bond é o que está a dar: Mi nombre es Putin, Vladímir Putin
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14/7

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13.7.11

As civilizações também se abatem


4ª Feira é dia de crónica de Rui Tavares no Público e a de hoje veio tocar algumas campainhas a que sou especialmente sensível. (Clicar na imagem para ler. Online, para já, só em inglês…)

Há muito que penso, sem qualquer pretensão de originalidade, que é muito provável que estejamos a viver a última fase de um certo protagonismo que a Europa ainda tem no mundo (menor do aquele que a própria imagina, mas ainda assim…). Mais: dada a velocidade a que tudo se passa nos tempos que vão correndo, e tendo em conta os acontecimentos recentes dos quais o «drama» financeiro é apenas a ponta do icebergue, é bem possível que o fim só não esteja à vista porque recusamos olhar para a linha do horizonte. Se o fizéssemos, talvez retardássemos o processo ou, pelo menos, limitássemos melhor os estragos. Mas parecemos estar a escolher o caminho diametralmente oposto.

É neste contexto que insiro o que Rui Tavares escreve:

«Não pensamos nisto todos os dias, mas as entidades políticas acabam. A União Soviética acabou – quem o imaginaria um par de anos antes? Acabaram grandes impérios como o Austro-Húngaro – e também em pouco tempo. (…)
Um evento financeiro em grande escala não se limita nunca a um mero evento financeiro, mas é um catalisador de consequências sociais e políticas pelas quais às vezes se paga um preço duríssimo. (…)
Na Europa, não vejo um cenário de desagregação que não seja arriscado. Mesmo que fiquemos longe das calamidades de que este continente é capaz, basta o desenvolvimento das tendências actuais para que a União Europeia seja globalmente irrelevante daqui a trinta anos.»

Julgo que é para aí que caminhamos. Tirei da frase a palavra «infelizmente», que tinha inicialmente utilizado, porque não corresponde ao que sinto: sei lá se é infelizmente! Sem dramatismo: outros passarão, estão já a passar, para a linha da frente.
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Mais rápido que a própria sombra


Depois da volta ao mundo em 80 dias e a Le Mans em 24 horas, um «programa de ajustamento português» em 180 segundos. Temos homem!
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Auditar é a palavra de ordem

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Leonidas Vatikiotis, economista, jornalista e professor, é um dos participantes na Comissão Cidadã para a Auditoria da Dívida Grega e foi o editor científico do documentário Debtocracy».
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Qualquer coisa que se anuncia


Tão óbvio que só não vê quem não quer. José Gil, esta manhã:



(Se não conseguir ouvir, clique aqui.)

P.S. - Deixado pela São Carvalho, no Facebook, como «comentário» a este post:


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Se o Chico Buarque...

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... entrasse nas Caixas de Comentários dalguns blogues portugueses (não na deste, felizmente...), ainda se ria mais!


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12.7.11

Neruda forever


Pablo Neruda faria hoje anos (muitos, 107…). Nasceu em Parral e morreu em Santiago do Chile, em Setembro de 1973, poucos dias depois da tragédia que vitimou Salvador Allende - «de tristeza», diria mais tarde Isabel Allende. O que talvez seja menos conhecido é que não se candidatou às eleições presidenciais de 1970 precisamente porque considerou que Allende teria mais possibilidade de as vencer, como veio a verificar-se.

Neruda que é um dos grandes heróis desse extraordinário país que é o Chile que nos entrou pela casa dentro, durante semanas, quando dezenas de mineiros viveram um drama terrível no fundo de uma mina e de onde, hoje mesmo, nos chegam notícias de lutas de outros mineiros na maior produtora mundial de cobre, precisamente quando se comemora o 40º aniversário da nacionalização desse tipo de minas, sob a chefia de Allende.

País com uma história complexa, lindíssimo, onde regressei há poucos meses, inesquecível pela absolutamente inigualável Patagónia, do extremo Sul aos Lagos Andinos, pelo estranho e inesperado deserto de Atacama, pela belíssima capital com uma arquitectura fora de série, noites animadas e restaurantes onde as listas de vinhos têm quase tantas folhas como as nossas Páginas Amarelas, etc., etc. (E, já agora, onde um ladrãozeco me roubou alguns dólares enquanto eu comprava uns discos na casa-museu de Neruda, que se vê nesta foto…)

Com a sua voz inconfundível, Pablo deixou-nos gravada uma parte da sua poesia.




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Contágio – a nova epidemia


(Via Auzenda Silva no Facebook)
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Mais complexo que ratings e deficits


E, de repente, foi como se a Moody’s e suas congéneres tivessem passado a ser culpadas de quase tudo (sem que ponhamos em causa a sua própria existência, mesmo que nos tivessem classificado com um belíssimo AAA…), num clamor patriótico que, como alguém lembrou, só parece ter tido equivalente recente em torno da questão de Timor (por onde andas, Luís Represas?...).

Passa-se para segundo ou para terceiro plano a nossa má integração na União Europeia e no euro, por culpa própria e não só, omite-se que vivemos numa democracia sequestrada pelo poder financeiro e que a batalha a travar é bem mais difícil e mais complexa do que reduzir o deficit aos valores desejados pela senhora Merkel e por Durão Barroso (se é que este deseja mais do que salvar a própria pele…).

Regresso ao livro de Boaventura Sousa Santos, que tenho vindo a citar (*).

«Os fundos estruturais e de coesão foram desbaratados no que constitui a história mais secreta da corrupção em Portugal. O euro, combinado com a abertura da economia europeia ao mercado mundial foi a última machadada nas aspirações portuguesas, pois tínhamos têxteis e sapatos para vender, mas não aviões nem comboios de alta velocidade.

Os termos da integração foram-nos sendo progressivamente mais desfavoráveis, o projecto europeu foi-se desviando das vontades originais e os mercados financeiros aproveitaram-se das brechas criadas na defesa da zona euro para se lançarem na pilhagem em que são peritos, agravando as condições do país muito para além do que pode ser legitimamente atribuído à nossa incúria ou incompetência. A verdade é que vivemos a hora dos grupos e classes dominantes, cujo poder parece demasiado forte para poder ser desafiado, e nunca tanta força esteve ligada a tanta ausência de projecto. A democracia, que aparentemente controla o seu poder, parece sequestrada por ele. Vivemos um tempo de explosão da precaridade, obscena concentração da riqueza, empobrecimento das maiorias e incontrolável perda do valor da força do trabalho.» (p.152)
(O realce é meu.)

(*) Portugal. Ensaio contra a autoflagelação, Almedina.
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Persepolis


«Persepolis is the poignant story of a young girl in Iran during the Islamic Revolution. It is through the eyes of precocious and outspoken nine year old Marjane that we see a people's hopes dashed as fundamentalists take power- forcing the veil on women and imprisoning thousands. Clever and fearless, she outsmarts the "social guardians" and discovers punk, ABBA and Iron Maiden. Yet when her uncle is senselessly executed and as bombs fall around Tehran in the Iran/Iraq war, the daily fear that permeates life in Iran is palpable.

As she gets older, Marjane's boldness causes her parents to worry over her continued safety. And so, at age fourteen, they make the difficult decision to send her to school in Austria. Vulnerable and alone in a strange land, she endures the typical ordeals of a teenager. In addition, Marjane has to combat being equated with the religious fundamentalism and extremism she fled her country to escape. Over time, she gains acceptance, and even experiences love, but after high school she finds herself alone and horribly homesick.

Though it means putting on the veil and living in a tyrannical society, Marjane decides to return to Iran to be close to her family. After a difficult period of adjustment, she enters art school and marries, all the while continuing to speak out against the hypocrisy she witnesses. At age 24, she realizes that while she is deeply Iranian, she cannot live in Iran. She then makes the heartbreaking decision to leave her homeland for France, optimistic about her future, shaped indelibly by her past.»


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11.7.11

Heróis do mar, nobre lixo

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O Pedro Vieira / Irmão Lúcia no seu melhor.


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«Não será como Fátima por deficit de pastorinhos no distrito» (*)


… mas estão já inscritas mais de 440.000 pessoas para a Jornada Mundial da Juventude, que terá lugar, em Madrid, de 16 a 21 de Agosto, por ocasião da visita de Bento XVI.

Muitas organizações reclamaram pelos 50 milhões de euros previstos para custos (é muito dinheiro…), mas Rouco e os seus amigos já vieram explicar que nada sairá dos cofres públicos, mas sim de contribuições de empresas e dos próprios peregrinos, e que se prevê que entrem em Espanha 100 milhões de euros - «Sua Santidade como propaganda turística», até e portanto.

Há preços diferentes de inscrição, conforme a suposta «riqueza» dos diferentes países de origem, sem que se diga em que grupo se integram os peregrinos dos intervencionados pelo FMI…: [«Los peregrinos del grupo A (Italia, Qatar, Estados Unidos) pagan entre 210 euros - por alojamiento, inscripción y comida - y 45 euros si solo hacen inscripción de fin de semana. España tiene estas tarifas. En el grupo B (Arabia Saudí, Argentina o República Checa), las tarifas oscilan entre 163 y 40 euros. El grupo C (Angola, Afganistán, Macedonia o Paraguay) paga entre 122 y 30 euros.»]

Alugam-se janelas para melhor avistar o espectáculo e enumeram-se «detalhes estrambólicos» ligados á visita como, por exemplo, as sete toneladas de terços destinados às mochilas dos participantes, que um grupo de 150 mulheres está a produzir numa pequena fábrica do Equador, ou um desafio de futebol de beneficência (lá estaremos, representados pelo nosso Futre…)

Enfim: «eles» saberão se daqui virá muito bem à humanidade, ou mesmo aos jovens crentes, mas será sem dúvida o mundo do espectáculo em todo o seu esplendor. Com algum espírito de sacrifício, digo eu: deve estar fresquinho, em Madrid, em meados de Agosto…

(Fonte, entre outras)

(*) Diz a Izquierda Unida.
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Bem-aventurados os pobres porque deles é o reino dos céus


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Lições da História


Luís Alves de Fraga publicou este texto no Facebook. Concorde-se ou não com o diagnóstico, ele vai fazendo o seu caminho e há aqui matéria para reflexão incontornável.

«Quando, em Abril de 1945, a paz pairou sobre a Europa, depois de os Aliados terem derrotado a Alemanha nazi e a Itália fascista, qual era o panorama que se podia ver no Velho Continente e nos EUA?

Na Europa, era tanta a fome na Alemanha, na Áustria, na Itália, como na vitoriosa Grã-Bretanha ou na desocupada França e na mártir Bélgica. A fome estendia-se, também, aos países neutros como Portugal e Espanha. Os circuitos produtivos estavam completamente destruídos e as correntes comerciais eram quase inexistentes. Milhões de desalojados deambulavam de um lado para o outro à procura das suas antigas raízes. Era dantescamente um caos. Em contrapartida, nos EUA, pesem embora as elevadíssimas perdas de vida entre a juventude americana, não havia desemprego, a economia era florescente, as fábricas trabalhavam a bom ritmo e produziam em abundância.

Este cenário era magnífico para os americanos e péssimo para os europeus. Mas o que interessa uma economia florescente se não puder expandir-se? Rigorosamente nada, porque transporta no seu seio o feto da crise. Uma crise que, mais tarde ou mais cedo, estalará em função da retracção que se irá verificar no mercado interno por estar saturado. Assim, interessa expandir-se, abrir-se ao exterior, para continuar a fazer crescer a produção, as vendas, o emprego e o rendimento das famílias e o lucro dos capitais.

Isto mesmo percebeu George Marshall, Secretário de Estado dos EUA, que propôs uma ajuda financeira à Europa, para recuperação da máquina produtiva. Claro que a ajuda saía por um lado, mas o retorno fazia-se por outro, na medida em que o Velho Continente passou a ser um excelente comprador dos produtos americanos. Isso permitiu, de facto, a recuperação europeia, mas uma recuperação dependente dos EUA que se concretizou melhor e mais eficientemente na imediata criação da OTAN ou NATO.

O progresso europeu foi tal que, uma dezena de anos após a guerra, vivia-se por cá um boom económico muito significativo. Ao romper a década de 60 do século passado a Europa tinha recuperado e estava a lançar as bases da Comunidade Económica Europeia (CEE). Era o nascer de uma nova temporada. Uma temporada que veio desembocar na União Europeia e na moeda única, o Euro. De repente (duas dezenas de anos em História é um curto lapso de tempo), aquilo que começou por ser um plano para manter os altos padrões de produção e de consumo da economia dos EUA tornou-se numa ameaça série à economia americana. A palavra de ordem, depois da última crise económica dos EUA, foi simples: destrua-se o Euro, destruindo, se necessário for, a Europa. E por onde se inicia essa destruição? Pelos flancos mais frágeis: Grécia, Portugal e Irlanda, passando, depois aos restantes. E até onde se pode e deve ir? Até que a Europa fique, sem nela rebentar uma bomba, tal e qual como estava em 1945, ou seja, com os circuitos económicos todos destruídos. Para quê? Para que os EUA possam, uma vez mais, desenvolver um qualquer programa de auxílio semelhante ao plano Marshall. Um plano que auxilia mais quem o dá do que quem o recebe.

Só não vê quem não quer ver! A História dá as lições… é necessário saber interpretá-las! Esse era (é) o motivo porque nas Academias Militares se ensinava (ensina) História militar, pois, os campos de batalha podem variar e mudar os intervenientes, mas não mudam as táctica nem as estratégias… Alteram-se em função da tecnologia, nada mais! Infelizmente, não há academias para formar os políticos… Assim, poderiam estudar História e saber que nihil sub solo novum
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10.7.11

Já foi

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Menos um


O cantor argentino Facundo Cabral foi ontem assassinado, na Guatemala, sem que se perceba ainda se os tiros lhe eram dirigidos.

Com ele, desaparece mais uma das vozes comprometidas da América Latina. Exilado no México durante o tempo de ditadura no seu país, tinha agora 74 anos e anunciara ser era esta a sua última digressão. Estupidamente, não a terminou.

Sempre gostei desta que foi a sua canção mais emblemática:


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A Moodys tem razão

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Um texto de José Manuel Pureza.

Toda a indignação é legítima. Não pela frivolidade e pela leviandade interessada irresponsável das agências de rating, mas contra as opções de política de empobrecimento que lhes serve de pasto.


E, de repente, ficaram todos indignados. E, de repente, todos viraram críticos de sempre das agências de rating. Foi como se o fervor de união nacional “a la Scolari” tivesse regressado, desta vez sob a forma de resposta unida contra a ofensa ao brio patriótico perpetrada pela Moodys.

Não nos tirem a memória. Lembramo-nos bem de que, há menos de uma semana, a quem pusesse em causa a autoridade sacrossanta destas agências hoje abutres estava destinada uma desqualificação absoluta. Lembramo-nos ainda melhor que foram as notações destas agências que foram assumidas como fundamento incontestável para legitimar a intervenção da troika e o seu alcance arrasador. Nessa altura, Passos Coelho não sentiu nenhum murro no estômago, antes achou que a economia nacional o requeria quanto antes.

E, no entanto, este consenso ofendido evita falar do essencial. E só por isso é consenso. O essencial é saber se é não verdade que Portugal não estará em condições de pagar esta dívida, com os juros fixados pela troika, tendo em conta a recessão profunda que o plano de austeridade impõe ao país. Por aí passa a linha divisória que conta. Ela não separa adeptos das agências e dos seus métodos de críticos destas nebulosas, ela separa adeptos da política de austeridade por elas legitimada de críticos dessa política. Porque quem brada contra a decisão da Moodys só porque ela desprezou o “grande e sério esforço do Governo está agora a fazer para pôr as contas públicas em ordem” através de políticas de orientação recessiva radical alimenta objectivamente as razões que a levaram a tomar aquela posição. Quanto mais recessão, mais inviabilidade de pagamento – não restam dúvidas sobre isso. Toda a indignação é, pois, legítima. Não pela frivolidade e pela leviandade interessada irresponsável das agências de rating, mas contra as opções de política de empobrecimento que lhes serve de pasto.

(Daqui.)
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E o êxodo continua


Não pára o fluxo de imigrantes que chega à ilha italiana de Lampedusa, na sua maioria composto por subsarianos: há dois dias, em apenas sete horas, 1.042 provenientes da Líbia, das quais 122 mulheres grávidas.

Desde que tiveram inicio as revoltas na Tunísia e na Líbia, foram mais de 40.000 pessoas que conseguiram alcançar Lampedusa. Mais ou menos como se víssemos esvaziar-se a cidade de Faro e avistássemos os seus habitantes em barcaças, rumo a Marrocos…

Ocupados como temos andado com as nossas problemáticas caseiras, e com as «maldades» que outros nos fazem, tendemos a esquecer estes dramas maiores que se passam, afinal, bem perto de nós.

(Daqui.)
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