5.4.14
Quando a História quebra
@Alfredo Cunha
«Nos livros de Astérix, quando se fala da batalha da Alésia (onde Vercingetórix capitolou aos pés de César) os gauleses respondem: "Não sei onde fica Alésia. Alésia nunca existiu e ninguém sabe onde fica". Outro gaulês, Napoleão, disse que "a História é um conjunto de mentiras sobre as quais se chegou a um acordo". Infelizmente, o acordo do sistema de poder português é de que a História não existe. A acusação recíproca em todos os assuntos não é uma repartição de culpas, mas uma diluição de responsabilidades. Mesmo que tudo não fique na mesma, todos ficam na mesma.
Alésia não existe. A História não existe. Só o sistema existe – e prevalece. Excepto quando, em vez de dobrar, ela quebra. Como quebrou um dia, há 40 anos.»
Pedro Santos Guerreiro, no Expresso de hoje.
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«Reestruturação», palavra proibida
«Portugal inteiro não pode balbuciar essa palavra maldita que é reestruturação, assim decretaram os entendidos, cá e em Bruxelas. Não vá o diabo tecê-las e os mercados (curiosamente, agora sempre no plural) desconfiarem. Previu-se até que só esta palavra faria subir em flecha os juros. Talvez renegociação, reorientação, resolução ou recomposição, que têm a vantagem de ser suficientemente ambíguas para não se dizer o que se quer dizer. Aliás, a palavra reestruturação até dá jeito a alguns críticos com a insistência desonesta da sua interpretação como perdão facial de dívida (ponto que afasto liminarmente). Insinua-se um falso “não pagamos” para se quase impor o “não falamos”. Como reflectiu Virginia Woolf: "A coisa nenhuma deveria ser dado um nome, pois há perigo de que esse nome a transforme."
Não se pode falar de reestruturação, mas não há pruridos em se falar em empobrecimento (à parte os Audi), ainda que às vezes enroupado de ajustamento e mesmo que em regime de experimentalismo social e geracional. E do empobrecimento através de uma reestruturação (camuflada de poupança) que se vem fazendo quanto à dívida da República aos reformados.»
Bagão Félix, no Público de hoje.
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Lido por aí (16)
@João Abel Manta
* Agonias (José Manuel Pureza)
* Onde se fala, sobretudo, de medíocres e galarós (Baptista Bastos)
* La Historia desentierra Treblinka (Carmen Rengel)
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4.4.14
As Cidades e as Praças (57)
Parque Setentrional das Estelas (Axum, 2013)
Ainda muito para recuperar:
Igreja de Santa Maria de Sião, onde, segundo a tradição etíope, se encontra a verdadeira Arca da Aliança, trazida de Jerusalém por Menelik, filho de Salomão e da rainha de Sabá:
(Para ver toda a série «As Cidades e as Praças», clicar na etiqueta «PRAÇAS».)
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Marguerite Duras – 100 anos
Marguerite Duras nasceu há 100 anos, em Saigão, actual Ho Chi Minh. No dia de hoje é especialmente recordada, sobretudo em França (mas estão programadas sessões de homenagem também em Lisboa e no Porto), aquela que foi uma grandes escritoras do século XX francês, também realizadora e guionista de filmes, para além de resistente durante a Segunda Guerra Mundial como membro do Partido Comunista Francês.
É vasta a sua obra no domínio da literatura, de início identificada com a corrente do nouveau roman, mas destaco dois livros que nunca esquecerei: L'Amant (1984) e antes, bem antes, de 1958, Moderato Cantabile, a que me rendi incondicionalmente.
Esta última obra viria a ser adaptada para cinema por Peter Brook, em 1960, e quem o viu terá certamente retido as interpretações de Jeanne Moreau e de Jean-Paul Belmondo. Inesquecível também, o guião que MD escreveu para que Alain Resnais realizasse aquele que foi para mim, durante algum tempo, o meu filme de eleição: Hiroshima mon amour. E quando há meia dúzia de anos fui ao Japão, e me passeei pelo local que foi vítima de uma das maiores tragédias da humanidade, não me saía da cabeça: «Tu n'as rien vu à Hiroshima!»
Encontrei hoje alguns vídeos com entrevistas e declarações de MD. Julgo que vale a pena saber como ela previa, em 1985, o que seria o homem no ano 2000:
L'homme sera littéralement noyé dans l'information (...) pas loin du cauchemar (...) tout sera bouché, tout sera investi, il restera la mer, la lecture (...) un jour l'homme sera seul de nouveau (...).Quand la liberté aura déserté le monde, il restera toujours un homme pour en rêver.
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Luther King morreu num 4 de Abril e a PIDE proibiu uma homenagem
Martin Luther King foi assassinado em Memphis, em 4 de Abril de 1968.
Um mês
depois, em 4 de Maio, devia ter tido lugar, no salão de
uma igreja de Lisboa, uma sessão em sua homenagem. Estava planeada a projecção
do filme «Marcha em Washington», seguida de um debate orientado, entre outros,
por Luís Lindley Cintra e José Carlos Megre.
Na véspera,
a PIDE proibiu a sessão. Mas à hora marcada concentraram-se centenas de pessoas
em frente da igreja de portas fechadas. Como em muitas outras ocasiões, tudo
acabou com dispersão, à força, desta vez por agentes da polícia à
paisana.
Foi depois
elaborado, e amplamente distribuído, um folheto intitulado «Porquê?» com um
breve relato dos acontecimentos. Terminava com uma citação do próprio Luther
King:
Não vos posso prometer que não vos batam,
Não vos posso prometer que não vos assaltem a casa,
Não vos posso prometer que não vos magoem um pouco.
Apesar disso, temos que continuar a lutar pelo que é justo.
Era assim que vivíamos / tentávamos viver os grandes acontecimentos da História.
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Lido por aí (15)
@João Abel Manta
* Os dez deveres do desempregado, segundo Isabel Jonet (João Teixeira Lopes)
* Why aren't Europe's young people rioting any more?(Costas Lapavitsas e Alex Politaki)
* "Estamos viendo la cara más desagradable de la ansiada Europa" (Ricardo García)
. 3.4.14
E quanto a líderes da social-democracia europeia...
Manuel Loff, no Público de hoje, a propósito da nomeação de Manuel Valls como primeiro-ministro francês.
«O que têm em comum todos estes líderes da social-democracia europeia dos últimos 20 anos, os da treta do Fim da História? O buraco que cavaram dentro si próprios ao decretar o fim das ideologias (Valls acha que o adjetivo socialista “é datado, já não significa nada”, e por isso publicou em 2008 o livro Pour en finir avec le vieux socialisme... et être enfin de gauche!) é habitualmente coberto por uma ambição pessoal desmedida, que, curiosamente, é tida pelos seus apoiantes como uma garantia de determinação e empenho. Passaram pelos movimentos estudantis (umas vezes vindos da extrema-esquerda, outras, como Blair e Sócrates, da própria direita), dali foram diretamente para cargos partidários, deputados, assessores. Nos países do Sul, viraram maçons. Apostaram na comunicação. Seduzir jornalistas está-lhes no sangue. Quando não conseguem, movem cordelinhos para os reduzir a pó. Nunca vêm, isso não, do mundo do trabalho, ao contrário de muitos dos seus antecessores até aos anos 70, sobretudo na Europa do Norte. (...)
Admitem publicamente que não partilham quase nada da cultura histórica da esquerda: as revoluções – francesa, russa, portuguesa – parecem-lhes totalitárias, eram jovens de mais para terem feito alguma coisa em 1968 (ou em 1974), e quando olham para a guerra do Vietname, Che Guevara e a descolonização só vêem o que chamam geopolítica e desprezam a emoção emancipadora que atravessou o mundo. Podem hoje papaguear umas coisas sobre Mandela, às vezes Gandhi, mas sabem tanto deles quanto sabem da vida de uma operária têxtil que perde o emprego.»
. Para a «pequena história» de um grande concerto
A propósito de um espectáculo realizado há poucos dias no Coliseu de Lisboa, e que comemorou um outro que teve lugar no mesmo local há 40 anos, o Centro de Documentação 25 de Abril divulgou no Facebook o «Relatório da Brigada de fiscais da Repartição de Fiscalização e Contencioso da Direcção de Serviços de Espectáculos sobre o I Encontro de Canção Portuguesa em 29 de Março de 1974».
Fica aqui para a posteridade, com uma nota especial que me foi enviada pelo meu amigo Alexandre Romeiras: descobriu agora que um dos elementos da referida Brigada, que assina o relatório (Malta Romeiras), era seu familiar próximo. Muitas histórias haverá ainda enterradas em arquivos espalhados por esse Portugal fora!
Contribuição para a história do concerto do Coliseu.
O meu pai tinha três primos direitos:
- Cel Romeiras, com intervenção (contrária) no 25 de Abril – contou-me o Sousa e Castro que teve uma pistola apontada à cabeça, mas a coisa resolveu-se.
- Morgado Romeiras, diretor de abastecimentos da CM Lisboa, saneado, por levar para casa, ao longo de muitos anos, víveres sem fim.
- Juiz Malta Romeiras, que assinava mandatos de captura para o Rapazote (Ministro do Interior), após a prisão dos ativistas pela PIDE, para «legalizar» o acto. Foi considerado agente da PIDE, constando da lista, publicada na imprensa, dos que não se apresentaram.
Este último tinha um filho, Filipe Malta Romeiras, da minha idade, nazi, suásticas como botões de punho, conhecido também pelas provocações e sovas ao Jorge Silva Melo, com o seu grupo.
Um dia houve uma manifestação em frente ao Centro Cultural Americano, na Duque de Loulé, e ele estava em casa de um colega de curso aí residente, à janela. Pois foi ao telefone da casa denunciar todas as pessoas que conhecia, incluindo o dono da casa!!! (...)
Descobri ontem o relatório anexo relativo ao concerto do Coliseu de há 40 anos. Comprova que era agente da PIDE, ou a censura tinha outros agentes? (dúvida minha)
Considerando o relatório uma pequena maravilha, junto em anexo.
Para a pequena história.
Ver as restantes quatro páginas:
Diálogo delirante
... no Conselho de Ministros da passada segunda-feira, segundo Ricardo Araújo Pereira:
PASSOS COELHO: Como é que estamos em relação àquela minha ideia de moer funcionários públicos para almôndegas?
PAULA TEIXEIRA DA CRUZ: Parece que é inconstitucional.
PAULA TEIXEIRA DA CRUZ: Parece que é inconstitucional.
PAULO PORTAS: Para almôndegas? Não era para hambúrgueres?
PASSOS COELHO: Mudou-se para almôndegas.
PUALO PORTAS: Nesse caso, demito-me irrevogavelmente. Eu não transponho a fronteira da almôndega.
Na íntegra AQUI.
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O BPN foi um gambozino
«O BPN nunca existiu. Ou, se existiu, foi um filme menor de Federico Fellini, entre a fantasia e o desejo.
O realizador italiano dizia: “Odeio o cinema verdade. Gosto mesmo é do cinema mentira. A mentira é sempre mais interessante do que a verdade. A ficção pode levar-nos a uma verdade mais aguda que a realidade quotidiana e aparente”. No BPN não há realidade: só existem pesadelos. (...)
O BPN era o Darth Vader do regime. Todos sabiam da sua existência, mas ninguém o via. O “risco sistémico” foi a melhor ficção inventada para limpar a casa de nódoas com muitas impressões digitais. Só que a limpeza já custou sete mil milhões de euros, perto de um décimo da “ajuda externa” que tanta austeridade nos está a custar. (...)
O BPN foi um filme mal realizado. Que, enquanto durou, foi o símbolo do nosso regime no seu momento mais eufórico onde o dinheiro caía do céu. O BPN foi “O Carnaval de Arlequim” de Miró, numa fantasia pintada por artistas menores. Ou melhores, consoante as leituras. BPN? Foi um gambozino?»
Fernando Sobral, no Negócios.
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2.4.14
Marcelo Rebelo de Sousa, esse grande opositor à ditadura
Com a aproximação dos festejos do 25 de Abril, são muitos os que se reclamam da sua condição de opositores ao regime anterior, sem que aqueles que já era adultos antes de 1974 se recordem desse oposicionismo agora evocado.
No passado Domingo, Marcelo Rebelo de Sousa (MRS) referiu-se às vésperas do fim da ditadura e ao facto de o pai e ele estarem em dois lados diferentes da barricada, o primeiro com o governo e ele na oposição. A declaração fez tocar em mim campainhas e reviver um episódio que se passou há seis anos.
Em Março de 2008, uma jornalista do Público (Clara Viana) inquiriu um grande grupo de pessoas, do qual fiz parte, sobre a forma como tinham reagido à leitura, na Torre do Tombo, dos processos elaborados pela PIDE a seu respeito. Do referido grupo fazia parte MRS e algumas das suas declarações foram extraordinárias pela imaginação criativa, que revelavam. (O dossier está online, com destaque, a vermelho, para as declarações de MRS.)
As reacções não se fizeram esperar, primeiro no blogue de Vítor Dias «O tempo das Cerejas» (que, por azar tecnológico, deixou de estar acessível na sua primeira versão), depois neste, em cadeias de mails trocados com a jornalista que elaborou o dossier, finalmente em cartas ao director do jornal, de Vítor Dias e minha, que foram publicadas pelo menos parcialmente.
Retomo parte do que então escrevi:
É natural que MRS tenha processos abertos na PIDE e que lá estejam alguns dos factos que vêm relatados no Público. Mas não todos. Choca, sobretudo, a impressão geral de história oposicionista que quer deixar no leitor. Ninguém é obrigado a ter passados «com bom aspecto», o que não vale é burilá-los.
Por exemplo: MRS diz que «nasceu para a PIDE» aos 16 anos (em 1964, portanto) porque, enquanto o pai era dignitário do regime, ele pertencia à «oposição liberal». Oposição liberal em 1964? Alguém se lembra do que poderá ter sido? Se pretende referir-se à ala liberal de Marcelo Caetano, essa só nasceu uns cinco anos mais tarde.
Diz também que a PIDE registou que ele, de «ideias perigosas», era visto a colar cartazes e a distribuir propaganda subversiva de madrugada. Cartazes? Como escreveu Vítor Dias, só se fossem recreativos. Outros só foram permitidos, e poucos, nas campanhas eleitorais de 1969 e de 1973 e, aí, ninguém, «jamés», viu MRS do lado das oposições – nem a PIDE! Propaganda subversiva? De que organizações: do PCP, maoistas? Dos católicos progressistas, garanto eu que não eram. Etc., etc., etc.
A história só teria um valor anedótico, e nem valeria a pena recordá-la agora, não se desse o caso de MRS continuar a ter a audiência que tem e de figurar, destacadamente, como o preferido pelos portugueses para próximo Presidente da República, em várias sondagens recentes. Mas é bom que se tenha consciência de que a velha história da vichyssoise não é para arquivar, ela faz parte do seu ADN mais profundo.
Para loucura já basta assim. E grave seria se viéssemos a ter saudades de Cavaco.
. CRP, 38 anos – 2 de Abril de 1976
A Constituição da República Portuguesa foi aprovada em 2/4/1976 por todos os partidos, à excepção do CDS: os seus 16 deputados votaram contra. Uma espinha espetada na garganta de muitos, que, apesar de todas as revisões que já tiveram lugar, gostariam de apagar muito daquilo que se conseguiu salvaguardar até hoje.
Nesse mesmo dia teve início a campanha para a primeira eleição de deputados à Assembleia da República, que viria a ter lugar a 25 de Abril.
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O suicídio de Hollande?
Quando se sabe agora a composição do novo governo francês, no qual se mantém a maioria dos antigos ministros (o que implica algumas cedências «à esquerda», o que quer que isso possa significar...) e todas as atenções se dirigem para a entrada de Ségolène Royal, que passa a ser o nº3 do novo gabinete, este texto de Ana Sá Lopes é útil para antever o que aí vem:
Hollande suicida-se (agora, sim, foi de vez)
«A vantagem de Manuel Valls, o novo primeiro-ministro francês, é que, ao contrário de François Hollande, não engana ninguém. É o mais sincero dos militantes do PS francês - há uns anos sugeriu a mudança de nome do partido tendo em conta que havia pouco "socialismo" a difundir pelo PSF na sociedade francesa e era preciso não assustar nem mercados nem capitalistas. Martine Aubry, antiga presidente do PSF, respondeu-lhe que se não se sentisse bem no partido o abandonasse, mas era impossível banir o socialismo do nome do partido. Valls ficou e agora está a colher os frutos de ser o mais à direita dos ministros de Hollande e de ter ocupado o topo das sondagens enquanto a popularidade do presidente agonizava.
Manuel Valls (...) tem uma linguagem contra os imigrantes mais dura que a de Sarkozy. Aliás, enquanto ministro do Interior expulsou de França mais comunidades ciganas que Sarkozy. (...) Querem a direita? Então tomem lá, decidiu Hollande. E desde segunda-feira é oficial: toda a França, incluindo o governo socialista - de que já se auto-excluíram os Verdes - virou totalmente à direita. Hollande e todo o seu projecto de acabar com a austeridade, etc., suicidaram-se. Não existe nenhuma aldeia gaulesa capaz de resistir ao consenso invasor de Bruxelas, Berlim e Frankfurt, quando todos os partidos socialistas e social-democratas são cúmplices da via única traçada que nos promete austeridade para o resto das nossas vidas. (...)
Mas a entrega do Palácio de Matignon a um duro da direita do partido que não gosta do nome "socialista" simboliza o suicídio de François Hollande e, de certa maneira, a capitulação de toda a social-democracia europeia.» (O realce é meu.)
Na íntegra aqui.
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1.4.14
Quantas mortes são necessárias?
Crónica de Diana Andringa, hoje, na Antena 1, a propósito do desaparecimento, da fachada da ex-sede da PIDE/DGS, da placa com os nomes dos mortos de 25 de Abril:
- Quantas mortes são necessárias
para que a sua memória seja guardada e respeitada?
- Depende. Próximo de nós ou
longe de nós?
- Varia?
- Claro. Próximo de nós, um pode
ser bem mais que suficiente. Longe, não basta.
- Como não basta?
- Um jornalista inglês, McLurg,
falando daquilo que Eça de Queiroz descreveu, em Cartas de Paris, como a «abominável
influência da distância sobre o nosso imperfeito coração» e em teorias da
comunicação se diz lei da proximidade espacial ou geográfica, criou mesmo uma irónica
escala de noticiabilidade relativa para os desastres, em que um europeu
equivale a 28 chineses, e a que o jornalista Daniel Ricardo se refere, também
com ironia, como fórmula de número de mortos por quilómetro.
- Tudo depende então da
distância?
- Não só. Há outras proximidades.
De tempo, de cultura, de afinidade. Por exemplo: excepto em casos de Censura,
um morto das “nossas” tropas vale sempre mais, muito mais, em termos
noticiosos, que todos os mortos do “in” – ou, até, desses civis que como
cantava Zeca Afonso, “morrem sem tal saber” e nunca passam da categoria de
“danos colaterais”. Mas, em Leçon de Choses, traduzido por David
Mourão-Ferreira, Guillevic escreveu, O
sangue de um morto por acidente/ Não é o mesmo, na rua,/ Que o de um morto pela
liberdade, / Derramado na mesma rua. //Tem cada qual um modo particular //De
ser vermelho e de gritar.”
- Deve ser isso que mos torna tão próximos, a esses
mortos frente à sede da PIDE, na Rua António Maria Cardoso, em Lisboa, a 25 de
Abril de 1974.
- Mas parece que teriam tido que
ser mais, para conquistar o direito à memória.
Um seria bastante, mas pelos
vistos há quem os considere tão poucos que não merecem ser recordados numa
placa no condomínio em que este país amnésico permitiu que se transformasse o
que deveria ter sido, obviamente, um espaço de memória da Resistência.
- Quantos te parece então que
teriam de ter sido, para não tentarem retirar de vez em quando a placa?
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