Com a aproximação dos festejos do 25 de Abril, são muitos os que se reclamam da sua condição de opositores ao regime anterior, sem que aqueles que já era adultos antes de 1974 se recordem desse oposicionismo agora evocado.
No passado Domingo, Marcelo Rebelo de Sousa (MRS) referiu-se às vésperas do fim da ditadura e ao facto de o pai e ele estarem em dois lados diferentes da barricada, o primeiro com o governo e ele na oposição. A declaração fez tocar em mim campainhas e reviver um episódio que se passou há seis anos.
Em Março de 2008, uma jornalista do Público (Clara Viana) inquiriu um grande grupo de pessoas, do qual fiz parte, sobre a forma como tinham reagido à leitura, na Torre do Tombo, dos processos elaborados pela PIDE a seu respeito. Do referido grupo fazia parte MRS e algumas das suas declarações foram extraordinárias pela imaginação criativa, que revelavam. (O dossier está online, com destaque, a vermelho, para as declarações de MRS.)
As reacções não se fizeram esperar, primeiro no blogue de Vítor Dias «O tempo das Cerejas» (que, por azar tecnológico, deixou de estar acessível na sua primeira versão), depois neste, em cadeias de mails trocados com a jornalista que elaborou o dossier, finalmente em cartas ao director do jornal, de Vítor Dias e minha, que foram publicadas pelo menos parcialmente.
Retomo parte do que então escrevi:
É natural que MRS tenha processos abertos na PIDE e que lá estejam alguns dos factos que vêm relatados no Público. Mas não todos. Choca, sobretudo, a impressão geral de história oposicionista que quer deixar no leitor. Ninguém é obrigado a ter passados «com bom aspecto», o que não vale é burilá-los.
Por exemplo: MRS diz que «nasceu para a PIDE» aos 16 anos (em 1964, portanto) porque, enquanto o pai era dignitário do regime, ele pertencia à «oposição liberal». Oposição liberal em 1964? Alguém se lembra do que poderá ter sido? Se pretende referir-se à ala liberal de Marcelo Caetano, essa só nasceu uns cinco anos mais tarde.
Diz também que a PIDE registou que ele, de «ideias perigosas», era visto a colar cartazes e a distribuir propaganda subversiva de madrugada. Cartazes? Como escreveu Vítor Dias, só se fossem recreativos. Outros só foram permitidos, e poucos, nas campanhas eleitorais de 1969 e de 1973 e, aí, ninguém, «jamés», viu MRS do lado das oposições – nem a PIDE! Propaganda subversiva? De que organizações: do PCP, maoistas? Dos católicos progressistas, garanto eu que não eram. Etc., etc., etc.
A história só teria um valor anedótico, e nem valeria a pena recordá-la agora, não se desse o caso de MRS continuar a ter a audiência que tem e de figurar, destacadamente, como o preferido pelos portugueses para próximo Presidente da República, em várias sondagens recentes. Mas é bom que se tenha consciência de que a velha história da vichyssoise não é para arquivar, ela faz parte do seu ADN mais profundo.
Para loucura já basta assim. E grave seria se viéssemos a ter saudades de Cavaco.
.
3 comments:
Joana, tenho dúvidas de qual será a mentira: se a história do jantar, se a história sobre a história do jantar... :-)
Não gosto particularmente do estilo de análise politiqueira de Marcelo, mas: a) sempre o vi a fazê-la assim, desde a fundação do Expresso em 1973; b) ninguém confirma que ele seja mentiroso.
Sobre o seu passado de oposicionista, claro que é capaz de estar muito exagerado. Mas ele terá vindo para Lisboa em 66, e há um biógrafo dele que fala de um tal "Movimento de Acção Académica" criado por ele, o que não me parece inverosímil...http://www.ruadebaixo.com/marcelo-rebelo-de-sousa-entrevista-com-vitor-matos.html
Pinto de Sá, Marcelo é um mentirosos compulsivo, a história da vichysoise é apenas a mais conhecida...
Quanto a esta polémica de 2008, houve muito mais que nem citei aqui, por exemplo relativamente às suas posições na Fac. de Direito, onde sempre esteve contra tudo o que fosse oposição ao regime.
Finalmente, nasceu em 48, nunca podia ter 16 anos (como disse ao Público) em 1966.
Oh lol, " ninguém confirma que ele seja "mentiroso?
Joana, ainda há pessoas, que "nunca" ...OH Cristo, desce à terra homem...
Nossa...
Enviar um comentário