Exmº Senhor Presidente da República de Angola,
Eng. José Eduardo dos Santos
Os abaixo-assinados integraram, em 1970-1971, na qualidade de réus e de advogados destes, o Processo nº 44/70, do 4º Juízo Criminal de Lisboa, vulgo Tribunal Plenário da Boa Hora.
Nesse processo, o Governo colonial-fascista português e a sua polícia política, a PIDE, acusaram 10 jovens – quase todos naturais de Angola – de desenvolverem “actividades atentatórias da segurança do Estado” e de colaborarem com “movimentos terroristas” “para fazer com que, por meios violentos e com o auxílio estrangeiro de países inimigos de Portugal, se separe da Mãe Pátria aquela parcela de Território Nacional (Angola)”.
Nessa ocasião, em 21 de Outubro de 1970, o representante em Argel do MPLA, Castro Lopo, leu, aos microfones da rádio “A Voz da Liberdade” um apelo do Movimento em que dizia: “Sob a acusação de conspiração contra a segurança do Estado português, assistimos na realidade ao processo sumário de todo um povo de mais de 5 milhões de homens, nessa hora submetidos a tribunais e leis que nunca recohecemos como legítimos.” O MPLA exortava todos os que escutavam, portugueses como angolanos, à solidariedade com os réus do Tribunal Plenário de Lisboa: “Que cada um de vós não se furte às responsabilidades que lhe cabem por cada um dos dez acusados sentados no banco dos réus. Que cada um de vós se sinta responsabilizado pelas centenas de angolanos que definham e morrem em campos de concentração, em Cabo Verde ou em Angola. Que cada um de vós se sinta responsabilizado pela sentença condenatória que vai ser lida e que foi decidida em vosso nome.”
Passaram 45 anos, e a prisão em Angola de Luaty Beirão e outros jovens que contestam o regime acorda em nós a memória desse processo em que fomos réus e advogados. Na acusação que lhes é feita encontramos o eco da que nos foi feita quando lutávamos pela independência de Angola, as “actividades atentatórias da segurança do Estado”. Mas na nossa consciência ecoam também as palavras do Apelo do MPLA: não, não nos furtamos à responsabilidade que nos cabe perante esses jovens encerrados nas prisões de Luanda, culpados de lutarem por um sonho que era também aquele que afirmávamos no Tribunal Plenário de Lisboa: o de um futuro livre, feliz e progressivo para todos os filhos de Angola independente. O sonho dos pais fundadores do Movimento Popular de Libertação de Angola. Não podemos furtar-nos à responsabilidade que nos cabe por não termos conseguido cumprir esse sonho, por não termos deixado aos jovens esse país que sonhámos.
Passaram 45 anos, Senhor Presidente, mas não nos esquecemos. E queremos acreditar que também o Senhor Presidente recorda ainda a sua juventude e os sonhos daquela a que Pepetela chamou A Geração da Utopia. É em nome dessa memória, Senhor Presidente, e com o mesmo amor por Angola que nos fez enfrentar a PIDE e o Tribunal Plenário, que lhe solicitamos a imediata libertação de Luaty Beirão e dos seus companheiros de prisão.
Para maior certeza de que esta carta chegará à sua atenção, permitir-nos-emos dar-lhe pública divulgação.
21 de Outubro de 2015
Diana Andringa
Manuel Macaísta Malheiros
Maria José Pinto Coelho da Silva
Mário Brochado Coelho
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