São numerosas e longas as discussões sobre a opção de votar em branco, talvez mais que nunca nestes dias em que muitos não se revêem em nenhuma das candidaturas às eleições do próximo Domingo, sem no entanto pretenderem juntar-se ao batalhão dos abstencionistas.
Porque tenho participado em algumas das ditas discussões, e para assentar as minhas próprias ideias, aqui ficam, esquematicamente, alguns apontamentos.
1 – Antes de mais, recorde-se que é a própria Constituição Portuguesa que, no Artº 149, estabelece que é pelo método de Hondt que os votos são convertidos em números de mandatos.
2 – Quem quiser ver, ou rever, o funcionamento do referido método pode recorrer a muita informação disponível na net (Wikipedia incluída), mas no portal da DGAI (Direcção Geral da Administração Interna) encontra-se
uma explicação muito resumida e até uns exemplos muito simples que ajudam a compreender.
3 – Para a atribuição de mandatos, não são considerados os votos brancos e nulos, como está claramente explicado
num esclarecimento da CNE: eles apenas contribuem para reduzir a abstenção.
4 – Há uma contestação recorrente deste procedimento, concretizada neste momento numa
Petição pública, na qual se defende, para o caso das legislativas, a «junção dos votos em branco aos votos que irão ser convertidos em mandatos pelo método de Hondt». Não se faz nenhuma proposta de concretização e eu continuo sem entender o que se pretende na prática.
5 – Circula na net
um vídeo, que é enganador porque não se aplica ao caso português, mas que ilustra um outro método, que não o de Hondt, para distribuição de mandatos. A ser utilizado, mostra claramente que os votos em branco favorecem os grandes partidos em detrimento dos mais pequenos. Não sei se é para uma solução deste tipo que os subscritores da Petição implicitamente apontam (sem método de Hondt).
6 – Faz caminho a ideia de defesa de cadeiras vazias na AR, ou seja de mandatos não atribuídos, correspondentes à soma de brancos, nulos e abstenção.
Descendo à terra e falando só de votos brancos. Por mais voltas que dê, não consigo deixar de considerar que eles são uma mais do que legítima forma de protesto e que como tal devem continuar. Quem não se revê em nenhuma das 17 candidaturas apresentadas, e já não vai a tempo de propor uma 18ª, pode manifestá-lo dando-se ao trabalho de sair de casa. E os futuros deputados eleitos devem ter consciência do significado político desse acto. Mas... ponto final, na minha opinião e por vários motivos:
1 - Faz algum sentido querer «distribuir» votos brancos, de uma maneira ou de outra, por deputados em que não se quis votar?
2 – Em alternativa: cadeiras vazias com consequente diminuição do número de deputados (que num limite teórico de boicote nacional poderia significar esvaziamento da AR) e que, praticamente, prejudicaria os partidos mais pequenos?
3 – Quanto menos votos forem contabilizados para a atribuição de mandatos, mais se favorece os grandes partidos em detrimentos dos pequenos. É isso que se pretende?
4 - Last but not the least: até prova em contrário, tudo leva a crer que, neste momento, a direita está mais motivada e que são os eleitores de esquerda os mais desiludidos e, portanto, com maior tendência para votar em branco. Para bom entendedor não basta meia palavra? Creio que sim. Não é mesmo tempo para estados de alma… Que o voto em branco fique guardado para épocas menos turbulentas…
P.S. 1 – A ler:
O voto em branco não é como o algodão - engana.
P.S. 2 – O meu último ponto 2. Não está correcto: na hipótese de se decidir considerar o conjunto de votos brancos (e também os nulos e a abstenção) como um «partido» adicional – o das cadeiras vazias… -, daí não resultariam normalmente danos para os partidos mais pequenos.
Para quem se interesse especialmente por estas questões (vai longa a discussão sobre as mesmas, pelo menos no Facebook), aconselho a leitura de
A Votação e a Matemática
(Imagem de Kate MacDowel)
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