«As obras para a construção do Centro Interpretativo do Estado Novo, mais conhecido por Museu Salazar, em Santa Comba Dão, foram interrompidas há cerca de duas semanas. Isto pouco tempo depois de terem tido início, no meio de muita polémica. Os técnicos responsáveis pela reestruturação da antiga Escola-Cantina Salazar descobriram que uma parte das vigas que sustentam o telhado está podre.
“Neste momento estão já colocados 70 metros quadrados de telhas novas. Mas tivemos um percalço e fomos obrigados a parar temporariamente a obra por motivos técnicos. As vigas estão mais envelhecidas do que se julgava e vão ser substituídas por um novo material conhecido por aço leve”, conta ao Expresso João Onofre, vereador da Câmara Municipal de Santa Comba Dão.
As vigas estão em tão mau estado que um simples soprador elétrico de jardim (máquina usada para afastar as folhas no chão) fazia estremecer a estrutura, garante João Onofre.
As obras, que incidem sobretudo sobre o telhado, portas e janelas da casa, vão ficar agora oficialmente suspensas durante “algumas semanas”, para não haver derrapagem de prazos com o empreiteiro. Questionado se sabe quando é que a nova estrutura será montada, o vereador diz não ter ideia.
Ainda segundo o político social-democrata, foi necessário proteger a zona ainda sem telhado com um plástico, para que a velha Escola-Cantina Salazar não fique a céu aberto e inundada com a água da chuva. “Mas a obra é para avançar mal tudo isto seja resolvido”, garante.
João Onofre revela que esta semana, durante uma reunião de responsáveis camarários, foi aprovado um orçamento de “190 mil a 200 mil euros” destinado ao futuro Centro Interpretativo do Estado Novo.
Petições da polémica
Contactado pelo Expresso, Leonel Gouveia, presidente da Câmara de Santa Comba Dão, preferiu não fazer qualquer comentário, alegando não ter mais nada a acrescentar sobre o assunto. Mas em julho, em declarações ao Expresso, garantia que a abertura das portas do Centro Interpretativo do Estado Novo estava prevista para dali a três meses. Ou seja, sensivelmente entre outubro e novembro.
O espaço museológico está localizado na antiga Escola-Cantina Salazar, vizinha do lado da casa onde viveu o ditador e a quatro quilómetros do local onde Salazar foi sepultado. O objetivo é manter a traça original desta escola, a primeira do país a ter direito a uma cantina, em 1942: “Foi precursora da política de ação social escolar do Estado Novo”, lembrou na altura o responsável da autarquia, que explicou que numa primeira fase o museu terá duas salas de exposições temporárias, com mais conteúdos multimédia e interativos do que objetos pessoais do ditador.
Nos meses seguintes estalou a polémica. Grupos de cidadãos avançaram com petições pró e contra a construção do Centro Interpretativo do Estado Novo. Entre os detratores encontra-se um grupo de 204 presos políticos e historiadores que temem que o museu sirva para branquear a ideologia do Estado Novo e venha a ser mais um pretexto para romarias de neofascistas a Santa Comba Dão. Atualmente, a campa de Oliveira Salazar é já um local de peregrinação de saudosistas.
A autarquia emitiu um comunicado em agosto onde negava a criação de um “Museu Salazar”. Assumiu que, em conjugação com outras entidades da região, com destaque para a ADICES (Associação de Desenvolvimento Local), “tem vindo a trabalhar num projeto cultural agregador do potencial turístico da região, visando a criação de uma rede de Centros Interpretativos de História e Memória Política da Primeira República e do Estado Novo”.
Uma rede que, segundo Leonel Gouveia, visa “a promoção e o aprofundamento da democracia e do desenvolvimento integrado de um vasto território da Região Centro” e dar a conhecer a participação destes territórios na história política do século XX português. O presidente da Câmara sublinhou ainda que toda a consultoria científica e tecnológica é assegurada pela equipa do Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX da Universidade de Coimbra.
Também em agosto, a petição online “Museu de Salazar, Não!” foi encerrada, depois de terem sido recolhidas mais de 18 mil assinaturas. Os promotores — que a tinham enviado ao primeiro-ministro, António Costa, logo quando reuniu 15 mil assinaturas — aguardam agora uma resposta do Governo. Um pouco menos popular foi a petição a favor do espaço museológico em Santa Comba Dão, que se ficou nas 11 mil assinaturas.»
.