12.11.24

Regressam as casas

 


Fachada Arte Nova da casa Cauchie, Bruxelas, 1905.
Arquitecto: Paul Cauchie.


Daqui.

12.11.1975 - O «Cerco» ao Parlamento

 


No dia 12 de Novembro de 1975, operários da construção civil iniciaram o chamado «Cerco à Constituinte» que durou até ao fim da manhã do dia 13.

Num post de 2017, um breve resumo tirado de Os dias loucos do PREC (Adelino Gomes e José Pedro Castanheira) e um vídeo.
.

Elon Musk

 


«Não é possível deixar de olhar com algum cinismo a ideia de que Trump vence ao dar voz aos desapossados pelas elites, quando o homem mais rico do mundo se ergue como um dos seus mais poderosos aliados e, quem sabe, um dos seus principais conselheiros.

Também não vale a pena assumir a posição de virgem ofendida quando sabemos que os ricos e poderosos sempre procuraram influenciar em seu proveito os caminhos da política. Agora, foi só mais descarado e com novas e mais influentes ferramentas. Um dia após a vitória de Trump, graças à subida das acções da Tesla, Musk acrescentou quase 20 mil milhões de dólares à sua fortuna. Seja por contratos federais que esperará ganhar, seja graças à desregulação que quer ver em vários sectores onde tem interesses, Musk irá ter muitos mais milhões a arrecadar.

O que vale mesmo a pena sublinhar é que não será só Trump a ser imitado em todo o mundo. Com Musk, abriu-se uma nova era para a capacidade que os super-ricos têm para influenciar os destinos da política e da sociedade. As democracias que se cuidem.»


Intervenção musculada

 



A América não somos nós

 


«Todos sabíamos que era possível, mas poucos queriam acreditar que acontecesse. Foi assim em 2016, foi assim em 2024. O resto do Mundo civilizado que não é a América voltou a envergar as vestes da inocência. Mas os Estados Unidos não são a Europa. A América não somos nós. Basta conhecer um pouco da fauna sociológica da nação que elegeu Trump para se perceber melhor o resultado destas eleições. Trump conquistou terreno em geografias com maiores desigualdades sociais, mas também onde os custos com a habitação são altos e onde vive uma parte expressiva das populações “estrangeiras” nascidas nos Estados Unidos. Acresce que, desta vez, obteve a maioria do voto popular, além de ter varrido o colégio eleitoral. Portanto, este desfecho está longe de ser apenas resultado do malfadado voto de protesto. Os americanos escolheram Trump porque ele lhes falou ao bolso e não se preocupou em ser decente ou verdadeiro. “Se querem transformar alguém num ícone, tentem metê-lo na cadeia ou tentem arruiná-lo financeiramente. Tudo isso falhou. Só conseguiram torná-lo numa força política ainda mais poderosa”, sintetizou, a propósito, Roger Stone, destacado republicano.

A diferença, desta vez, reside no poder de choque do movimento trumpista e na enfraquecida resistência que irá encontrar mesmo entre os poderes responsáveis pelo equilíbrio do regime. Seja no âmbito das reformas legislativas, na política económica, na externa e em particular na estratégia que irá seguir no campo da imigração. Depois, e mesmo não sendo nós a América, esta vitória terá obviamente um impacto significativo no realinhamento ideológico e programático dos partidos mais à Direita de todo o Mundo. O conservadorismo tradicional levou porventura a sua maior facada dos últimos anos. O quanto pior melhor está a viver uma segunda vida. Com Trump ao comando não será o fim dos tempos, mas os seguidores da sua política do caos permanecerão muito para além do segundo mandato na Casa Branca do presidente-fanfarrão.»


11.11.24

As velhas já não funcionam

 


Presidenciais 2026

 


𝐑𝐮𝐛𝐞𝐧 𝐀𝐦𝐨𝐫𝐢𝐦 𝐚𝐢𝐧𝐝𝐚 𝐧ã𝐨 𝐞𝐬𝐭á 𝐧𝐚 𝐥𝐢𝐬𝐭𝐚 𝐝𝐨𝐬 𝐜𝐚𝐧𝐝𝐢𝐝𝐚𝐭𝐨𝐬?

Até os benfiquistas votariam nele.
Futebol sempre, tudo o resto nunca mais?

Dia delas

 



Ao fim de quantas mortes acaba um estado de graça?

 


«Tem sido refrescante ver a mudança do ambiente do comentário político. Onde antes havia excitação, há ponderação. Onde antes havia julgamento, há compreensão. Toda a gente acha grave o que aconteceu com a greve no INEM, na semana passada. E quase todos os comentadores acham excessivas consequências políticas para uma ministra que, desde que chegou ao lugar, soma erros, conflitos e desastres.

Perante este caso, Marcelo Rebelo de Sousa disse que não gosta “de falar de problemas específicos da governação ou da Administração Pública, mesmo quando são muito urgentes ou muito prementes”. Que não se podia pronunciar sobre o que está em curso e casos concretos. Falou da urgência em encontrar soluções, ignorou as responsabilidades políticas. Todos acompanhamos a presidência de Marcelo há tempo suficiente para saber que nunca se esquivou, quando quis, a falar de problemas específicos da governação, em curso e bem concretos. Em enorme detalhe, quotidianamente e quase sem filtro. E a confrontar os governos com as suas responsabilidades.

O que disse o Presidente da República quando, em 2023, uma grávida teve de ser transportada para uma urgência a 200 quilómetros? “Que esse caso não é um caso que seja positivo – é muito negativo para o Serviço Nacional de Saúde e para o sistema nacional de saúde em geral –, é verdade. Que há erros, que há lapsos e que se tem de apurar o que aconteceu para, se for caso disso, responsabilizar quem deve ser responsabilizado, é fundamental. Um erro de 200 quilómetros é, se for assim, um erro muito grande”. Aparentemente, um erro que tenha custado mais de dez mortos, nem por isso.

Mais uma mentira

O debate, neste caso, não é sobre as fragilidades estruturais do INEM, que sabemos existirem. Tem menos de metade do pessoal que precisa num SNS que parece viver de horas extraordinárias. Um problema que atravessa grande parte dos serviços do Estado e que o governo pretende resolver ao sabor de cada escândalo, já que impôs a regra geral de que só entra um funcionário público por casa um que saia. A descida do IRC e do IRS para os jovens mais abonados não sai de borla. É paga por quem mais precisa do Estado.

O debate sobre a responsabilidade do último governo – e anteriores – na degradação dos serviços públicos é legitimo, desde que todos os que aplaudem o excedente orçamental não queiram ficar apenas com as boas notícias. O que não é legitimo é ignorar a responsabilidade direta neste caso: uma ministra negligente perante a marcação de uma greve. Repare-se que não estou sequer a aplicar a máxima que valeu nos últimos oito anos – que os ministros são politicamente responsáveis por tudo o que aconteça nos serviços que tutelam, mesmo que não tenham responsabilidade direta no sucedido. Estou a cingir-me ao que a ministra tinha de fazer e não fez.

Tudo começou com mais uma mentira, em que Ana Paulo Martins te sido recorrente –nas razões apontadas para a sua demissão do Santa Maria, quando já se sabia candidata a ministra; na novela sobre os contratos com os helicópteros de emergência; nos números que divulgou das operações de oncologia; na tentativa de esconder quais eram as urgências fechadas. “Nós não estávamos à espera, porque estamos de boa-fé” disse a ministra da Saúde, quando confrontada, na terça-feira, com a greve do Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar às horas extraordinárias.

Mentiu, porque, como noticiou o Expresso, a ministra foi notificada não uma, mas duas vezes da greve, tendo sido a última dez dias antes do seu início. A única exigência era começar uma negociação. Apesar da sensibilidade deste serviço, nem sequer responder aos mails. Dos constrangimentos causados por esta greve poderão ter resultado mais de dez mortos. Apesar de ser improvável a ausência de consequências de haver menos de dez pessoas a atender chamadas de todo o país, na segunda-feira, com o mais baixo atendimento numa década, a relação de causalidade terá de ser demonstrada. Se se confirmar, uma reunião bastaria para evitar mortes.

Andar atrás de mortes, não de avisos

Igualmente grave é o INEM não ter preparado serviços mínimos para uma greve que há muito sabia que iria existir. E só ter preparado os serviços para a coincidência com a greve da função pública quando tudo derrapou. A direção do INEM diz que os serviços mínimos para os funcionários públicos, no dia 4, já estavam definidos no acordo coletivo a Federação sindical afeta à CGTP. Acontece que o sindicato que marcou a greve nada tem a ver com essa federação, coisa que uma direção do INEM que não mudasse de três em três meses saberia.

Há, portanto, duas responsabilidades: a ministra que ignora uma greve e depois finge que não sabia da greve e o presidente do INEM que não se apercebe que duas greves se vão sobrepor e reage tarde demais. Os problemas estruturais do INEM, reais, são outro tema que não absolve estas duas pessoas das suas responsabilidades. Tudo podia ter sido evitado com uma reunião, como ficou evidente no fim da semana passada. O tema é este.

Na reação a tudo isto, Luís Montenegro, para além de se ter limitado a pôr em dúvida a relação da causalidade entre a greve e as mortes, explicou que o governo não pode “andar atrás de pré-avisos de greve e a fazer reuniões de emergência”, preferindo, como se tornou um clássico, ficar-se pela herança que recebeu.

Para Montenegro, as negociações urgentes com os trabalhadores do Estado acabaram quando o governo deixa de sentir a emergência de preparar possíveis eleições. Governar é um grande plano de comunicação, onde as personagens entram e saem do palco quando o primeiro-ministro decide – assim como só responde aos jornalistas quando isso lhe interessa. Só que não é assim. A concertação social, assim como a gestão da coisa pública, é quotidiana, cheia de emergências e contrariedades. Por não ter ido “atrás de pré-avisos de greve”, o governo foi atrás de mortes. Num dia, resolveu um problema que poderia ter sido resolvido uma semana antes, evitando uma desgraça.

Regressando ao que o Presidente disse em 2023, mas achou que não devia dizer em 2024: “Melhorar passa por reconhecer humildemente que se falha e, quando se falha, corrigir, apurar e responsabilizar”. Tudo o que Montenegro se recusa a fazer.

Obviamente, demita-a

Ao contrário do que pensaria quando liderava a oposição, o primeiro-ministro acha que “a consequência política, quando há problemas, é resolvê-los”. Só que os trágicos problemas que podem ter sido causados pela ministra já não têm solução possível. E é sobre isso e apenas isso que, neste momento, a ministra da Saúde tem de responder. Confirmando-se a causalidade entre as mortes e uma greve que poderia ter sido evitada com uma simples resposta a um mail, a consequência política é óbvia: a demissão.

Se isto fosse um episódio isolado, poderia, com bastante esforço, haver tolerância. Só que esta é a mesma ministra que, para fazer um ajuste de contas com o seu antigo chefe, foi responsável pela demissão por uma direção executiva do SNS e, com isso, por mais um verão de caos nas urgências. É responsável por irmos na terceira direção do INEM. Tirando o anúncio de medidas, que, na realidade, correspondem quase todas à transferência de funções do SNS para o privado, ainda não houve uma coisa em que se visse trabalho. É, como se sabia pela sua passagem pelo Hospital Santa Maria, onde abriu uma guerra com o serviço de obstetrícia e de onde saiu inventando uma falsa polémica com Fernando Araújo porque já contava com um lugar no Ministério, um foco de conflitos e problemas. E agora foi isto.

Marta Temido demitiu-se por causa da morte de uma grávida, quando nem os serviços falharam, nem havia qualquer responsabilidade direta ou indireta sua. Poderão dizer que havia um grande desgaste pelo tempo de mandato e a pandemia. Mas neste caso, há muito mais do que isso: os serviços falharam por responsabilidade direta e negligente da ministra e disso poderão ter resultado mortes. Não há “estado de graça” que proteja um governante disto.»


Quando o MAGA venceu o 'wokismo'

 




José Mendes


10.11.24

Mais azul é difícil

 


Jarro azul-marinho, de gargalo esguio e pegas geométricas. 1882.
Rookwood Pottery.

Daqui.

Talvez respostas simples

 


Que o capitalismo age à rédea solta, como máquina afinadíssima de concentração de riqueza, de exploração de quem trabalha (e as “classes médias” cilindradas), de reprodução contínua de pobreza e miséria, mesmo em países onde se produz, ou onde circula, imensa riqueza. Os elevadores sociais são boicotados. Nunca os mais ricos foram tão ricos, e nunca foram tão poderosos. O capitalismo ultraliberal promove o ultraconservadorismo e o fascismo, nos EUA, na Europa e noutras latitudes. Já não os dispensa. E precisa da guerra.»


10.11.1948 – Mário Viegas

 


Mário Viegas festejaria hoje os 76, mas morreu novo, muito novo, antes de chegar aos 48. Fundou três companhias de teatro, actuou em vários países, participou em mais de quinze filmes e só quem for muito jovem não se recordará das séries televisivas «Palavras Ditas» (1984) e «Palavras Vivas» (1991).

Celebérrima ficou a sua leitura do Manifesto Anti-Dantas de Almada Negreiros:



Mas existiu também um Manifesto Anti-Cavaco, lançado por Mário Viegas durante a campanha eleitoral para as legislativas de 1995, em que foi candidato independente na lista da UDP (candidatou-se também à Presidência da República).



E inesquecíveis:




.

Em Loures e na América

 


«Faltaram a Kamala Harris os votos de todas as causas que não abraçou; faltou o élan que, apesar de todo o seu bom humor, não se instalou no terreno. Ela participa — e é exemplo — do erro geral que as forças progressistas estão hoje a cometer: procuram conluios à direita de si, sem se aperceberem de quanto nessa aproximação vão perdendo as suas convicções maiores.

Sobre o porte de armas, Kamala afirmou sentir o dever ético e coletivo de estar ao lado da luta dos jovens e dos professores por uma escola livre de violência armada. Lembrou e lamentou o número de feridos e vítimas mortais desses incidentes — 82 em 2023 e 58 em 2024. Poderia também ter-se mostrado preocupada com a saúde mental dos americanos e daí progredir para a erradicação da pobreza, causas seguras da maioria destes incidentes. Podia falar do seu sonho de pacificar a América e de a tornar emocionalmente segura ao ponto de as armas caírem em desuso, uma coisa fora de moda. Ainda que lírico, este discurso inspira, tem essa qualidade política — e poética — tão necessária. Mas o que a candidata fez em vez disso foi proclamar aos quatro ventos que também ela tinha uma arma.

Harris lê os relatórios, sabe que o fracking é uma atividade com sérios impactos no ambiente terrestre. E sabe que não investir no seu fim tem um custo acrescido a jusante, com a mitigação de desastres humanos e materiais infligidos por um clima zangado e intempestivo. Mas, a meio da campanha, muda de ideias; afinal não é contra o fracking, ou pelo menos não o irá banir absolutamente. Resultado: ambientalistas furibundos, clamores de “traição”.

Da Palestina, chegavam imagens abissalmente contrastantes com a exuberância dos comícios da campanha democrata. Sobre o conflito, Kamala reafirma a sua determinação em estar ao lado de Israel, mas devia na frase seguinte condenar as práticas de guerra do atual Governo israelita, identificando-o como extremista e instando-o a fazer diferente, com urgência, porque, com armas americanas e de forma indevida, estavam a morrer muitos palestinianos, todos os dias. Mas não, tristemente refugiou-se, ou teve de se refugiar, em declarações de impotência bem-intencionada, numa indignação contida de que quem adia consente.

Kamala resultou numa candidata programada, sem ginga ou swag, em oposição ao improviso laranja e tagarela do seu rival. Não existiu assim uma sinceridade nova à qual aderir, muito graças a esta recém-adquirida mania de arrastar o pé para a direita, num medo parolo de se ser tomado por extremista, socialista, comunista, radical, ou, mais recentemente, por woke. Quando Kamala é acusada de “perigosa marxista”, podia ter esclarecido que conhece mal o marxismo — o que deve ser verdade —, mas que a justiça social é um imperativo universal e que ninguém, nenhum nome ou ideologia, se pode dela apoderar. Em vez disso, distanciou-se de tudo o que pudesse figurar ligeiramente à esquerda de si.

Harris, em lugar de se tentar distinguir como implacável promotora pública que mandava resmas de homens maus para a prisão, tipo heroína bidimensional da Marvel, podia ter construído uma figura apaixonada pela justiça ao ponto de ter uma moral e uma sinceridade suas. Poderia ter manifestado um ideário justo, esperançoso, com valores progressistas e sarapintado de utopia. Se no cômputo geral isso lhe traria mais ou menos votos, fica por saber. Uma vantagem seria certa: todos estaríamos hoje mais preparados, unidos, animados e inspirados por uma “agenda” capaz de enfrentar o que aí vem. Por mim, não se arreda o pé; seja na América ou na Câmara de Loures.»


Comentar o governo, eu?