Era eu estudante em Lovaina quando recebi um telefonema do vice-cônsul de Portugal, irmão de uma amiga minha, em verdadeiro estado de pânico. Que estava à espera de um grupo folclórico português que devia abrilhantar um serão numa importante instituição de Antuérpia, que o dito grupo tinha cancelado a viagem, que me pedia por todas as alminhas de todos os céus que arranjasse uns estudantes portugueses que comigo fossem substituí-lo.
Do alto dos meus dezanove anos – semi-aventureiros, semi-escuteiros –, convenci mais cinco e lá fomos, três meninas à moda do Minho e três moçoilos trajados de campino (foram as vestimentas que a embaixada conseguiu arranjar). Dançámos o Vira (deixo-vos imaginar a qualidade da exibição...) para umas dezenas de flamengos já bastante acervejados, depois de termos sido anunciados, e entrevistados, como elementos de um grupo estudantil dedicado a danças populares, ido propositadamente de Coimbra.
Regressámos a Lovaina, divertidos e sem qualquer tipo de remorsos.
Só que o meu amigo vice-cônsul não mandava na maior potência mundial, não estavam em causa nenhuns transcendentes valores olímpicos exaltados com a máxima das perfeições, o local em Antuérpia não se chamava «Ninho de Pássaro», não tivemos sete anos para ensaiar o Vira – e não éramos crianças.