13.6.15
G-7 e flores murchas de velhos impérios
«Las reuniones del G-7 tienen, cada vez más, olor a naftalina, a viejos escudos nobiliarios erosionados por el tiempo, a reunión grupal en la que sus miembros buscan reafirmarse en sus creencias, como si de una secta se tratara. Hasta hace, quizás, unos quince años, el G-7 reunía a los países más ricos y poderosos de la Tierra. Era, o quería ser, una especie de gobierno mundial, cuyas decisiones marcaban la pauta del planeta. Ya no es así. Atendiendo los últimos datos del FMI, de abril de 2015, en términos de paridad de poder de compra –que es, en última instancia, el dato relevante- China es la primera economía mundial, India la tercera y Rusia la sexta. El PIB de Brasil supera al del Reino Unido y el de México es mayor que los de de Italia y Canadá. La única nota destacada del G-7 es su afán –estéril- de seguir creyendo que gobierna el mundo y su pretensión –más estéril aún- de pretender dominarlo con amenazas. (...)
La historia reciente está llena de ejemplos demostrativos de la inutilidad de los sistemas de sanciones, cuando no de terminar siendo contraproducentes. (...) Los sistema de sanciones, aunque castigan en lo inmediato al país, a mediano y largo plazo se convierten en una bendición, pues sirven de estímulo para maximizar su potencial científico-técnico y convertirlo en autónomo. A mayor autonomía, mayor capacidad de actuación independiente. EEUU tiene vetada la venta de tecnologías punta a China, pese a lo cual China ya es la segunda potencia del mundo en investigación, con casi todas las cartas de convertirse en la primera.
Por otra parte, el poder creciente e irresistible de las economías llamadas emergentes va convirtiendo las sanciones económicas atlantistas más en una incomodidad –una especie de china en el zapato- que en una amenaza real a la economía de países como Rusia. (...)
La magnitud de los fracasos acumulados por la versión político-militar del Dr. Jekill y Mr. Hyde, que son la UE/OTAN sería manifestación del envejecimiento y la artrosis de las clases dominantes, incluyendo las políticas. La generación de grandes estadistas que alumbró la II Guerra Mundial ha sido sustituida por una clase política caduca, reaccionaria y militarista, que está depositando en la OTAN sus delirios por mantener una supremacía global perdida hace más de una década. Dado que no pueden competir econonómicamente contra sus grandes rivales, China y Rusia, la opción escogida es la confrontación armada, cuyo escenario más inmediato es Ucrania.»
Augusto Zamora R.
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12.6.15
Dica (72)
«Em Portugal, já sabemos com o que podemos contar. O PS apoiará o que o PSD e CDS fizeram no governo para garantirem que a Comissão Europeia, em nome de todos, acorde com os Estados Unidos uma grande operação de liberalismo entusiástico. Para os que se lembram de um PS “europeísta”, apresenta-se agora um PS regressado ao “atlantismo”. Afinal, quem manda no mundo manda mesmo e o que tem que ser tem muita força.»
, Portugal do pequenito
«Foi o último discurso de Cavaco Silva enquanto Presidente da República, nas comemorações do 10 de Junho. Finalmente, uma razão muito válida para comemorar o 10 de Junho. Foi um discurso de esperança, não pelo conteúdo, mas por ser o último.
Se, por um lado, me enche de alegria saber que estamos em contagem decrescente para nos livrarmos do homem de Boliqueime, por outro, confesso que estou em pânico porque Cavaco disse do país o que disse do BES. Aníbal veio dizer que Portugal está sólido e sabemos todos como isto acaba. (...)
"O país está melhor agora", disse Cavaco Silva, e elogiou o trabalho realizado pelo actual Governo. Já lá vai o tempo em que o nosso Presidente vivia com muita dificuldade com a sua pensão, ao ponto de desmaiar de fraqueza. Só faltou o Aníbal oferecer-se para ir colar cartazes. (...)
Talvez esperançado que Sócrates já estivesse em casa a ver pela televisão, Cavaco condecorou o ex-ministro das Finanças do homem que não usa pulseiras. Deve ter--lhe custado muito – não tanto como deveria custar a Teixeira dos Santos ser condecorado por Aníbal – mas, para chatear o 44, vale tudo.
O antigo ministro das Finanças, do governo socialista de José Sócrates, recebeu a Grã Cruz da Ordem Militar de Cristo, designação estranha que junta "Cristo" e "militar", o que é mais ou menos o mesmo que acasalar Dalai Lama com ataque de histerismo. Foram várias as vozes que, para dentro, exclamaram que Teixeira dos Santos merecia, sem dúvida, a condecoração, mas o mais adequado seria a Grã Cruz da Ordem Militar de Judas. Talvez seja exagerado, o nosso jornal que decida.»
João Quadros
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11.6.15
Tudo o que sei sobre imoralidade, devo-o à FIFA
Ricardo Araújo Pereira, na Visão de hoje:
«Tudo o que sei sobre imoralidade, devo-o à FIFA. (...)
Infelizmente, o voto de Portugal na FIFA não parece ser apetitoso e, pelo menos até agora, não há notícia de que nos tenham oferecido armas nem dinheiro. É uma pena porque isso faria mais pelo desenvolvimento sustentado da economia portuguesa do que vários governos. (...)
Se há coisa que não nos falta é gente com experiência em conspirar nos bastidores do futebol. (...) É uma vergonha que haja escândalos no futebol internacional e nós não participemos.»
Na íntegra AQUI.
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E a TV pública grega regressou
«No dia em que passam dois anos sobre o “apagão” do sinal da ERT, a estação pública grega de televisão voltou a emitir esta manhã. (...) O relançamento da ERT e a readmissão de todos os funcionários que o desejassem foi uma das bandeiras eleitorais do Syriza e o projecto de lei para a reabertura da estação chegou ao parlamento poucas semanas depois do governo tomar posse.»
Claro que as «instituições» devem estar contra: os gregos que se entretivessem a tocar marimbas para divertirem os turistas, não é?
Hoje é o dia para bater palmas à primeira emissão depois da reabertura:
Mas é também o momento adequado para recordar o emotivo e inesquecível concerto de solidariedade, que teve lugar em 14 de Junho de 2013, depois do encerramento, no qual participaram 500 músicos dos mais variados conjuntos, da Ópera Nacional Grega e da Orquestra Sinfónica da própria ERT:
(Notícia daqui.)
Para mais detalhes, ler também.
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É todo um país!
«Juntem a comenda a Carlos Gil, o estilista das roupinhas da mulher de Cavaco Silva que o Presidente da República nomeou ontem Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, ao bule "muito espaçoso" da Joana Vasconcelos inaugurado pelo primeiro-ministro no Portugal dos Pequenitos e fica feito o retrato do país. Antes de cortar os pulsos, veja-se o filme que a EDP anda a dizer que é a "última obra" de Manoel de Oliveira...»
Ana Cristina Leonardo no Facebook.
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As finanças crescem como um cancro
«Es asombroso como cada semana se presentan acciones judiciales en varias partes del mundo contra el sector financiero por delitos e irregularidades, sin que se registre una reacción considerable por parte de la opinión pública.
Es sorprendente, porque esto pasa en medio de una crisis muy grave, con altos índices de desempleo, trabajo precario y un aumento sin precedentes de las desigualdades, lo que en buena medida puede atribuirse a las finanzas especulativas.
Todo comenzó en 2008 con la crisis hipotecaria y el estallido de la burbuja de los derivados financieros en Estados Unidos, seguido por la explosión de la crisis de la deuda soberana en Europa. (...) Se calcula que habrá que esperar al menos hasta 2020 para regresar a los niveles económicos existentes en 2008. Eso significa una década perdida.
Para rescatar a los bancos, el mundo ha gastado en conjunto alrededor de cuatro billones (millones de millones) de dólares sustraídos a los contribuyentes. (...)
Cabe destacar que hasta ahora, las multas acumuladas impuestas desde 2008 por el gobierno de Estados Unidos a solo cinco bancos importantes, ascienden a 250.000 millones de dólares. Pero ningún banquero ha ido a la cárcel, las multas han sido pagadas y el problema ha sido sepultado.
Cabe preguntarse si todo esto se debe a la mala conducta de algunos administradores codiciosos, o a la nueva “ética” del sector financiero. (...)
Una nueva “ética” se está instaurando y se propagará si no se interrumpe… y no es esto lo que está sucediendo. (...) La “nueva ética” es en realidad un cáncer de muy rápida metástasis.»
O texto de Roberto Savio merece ser lido na íntegra.
.Dica (71)
«Infelizmente para António Costa, Sócrates considera-se um preso político e tudo fará para “poluir” o debate eleitoral. Ao tornar-se o primeiro detido português que recusa a pulseira electrónica, que entrou em vigor durante o mandato de António Costa como ministro da Justiça, por ser “instrumento de suavização, destinado a corrigir erros de forma a parecer que nunca se cometeram”, e invocando o seu “sacrifício pessoal” e “sacrifício para família e amigos”, Sócrates tenta atingir o estatuto de mártir. Ele não é um preso político, mas é um político preso. A martirização de Sócrates é a pior coisa que pode acontecer ao PS e é impossível prever os danos políticos.»
. 10.6.15
10 de Junho, há 44 anos – linguagem diferente, mas...
E para acabar o dia, que venha Américo Tomás. Não consigo deixar de pensar nele desde esta manhã:
«Neste dia de cada ano, mais ainda do em qualquer outro, é dever do Chefe de Estado lembrar a todos os portugueses os riscos que normalmente resultam de egocentrismos que não aglutinam vontades, nem engrandecem os homens. A cada um de nós cabe despojar-se de vaidades que, na verdade, não são mais do que ilusões efémeras; evitar egoísmos que não prestigiam, nem criam ambientes saudáveis; arredar preconceitos, desconfianças, incompreensões, ressentimentos e obstinações, sempre inconvenientes para o estabelecimento de concórdia que tem de existir entre os portugueses. Enfim, é meu dever procurar afastar do caminho nada fácil por onde temos de seguir tudo quanto possa enfraquecer o esforço geral indispensável ao engrandecimento constante, harmónico e rápido do Espaço Português, em toda a sua imensa e sagrada dimensão.»
Américo Tomás, 10 de Junho de 1971
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Um outro 10 de Junho (1944), em Oradour-sur-Glane (França)
Oradour-sur-Glane foi palco de um dos grandes massacres cometidos pelos nazis durante a Segunda Guerra Mundial.
Muita informação, impressionante, nestes slides a serem vistos de preferência em ecrã cheio.
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«Deixe a Grécia em paz, Sr. Schulz!»
Manolis Glezos, eurodeputado do Syriza e herói da resistência à ocupação nazi, respondeu ao presidente do Parlamento Europeu, que nos últimos dias se tem desdobrado em críticas em relação ao governo grego.
Martin Schulz tinha acabado de fazer um discurso em tom de mea culpa, em nome da Europa, pelas promessas falhadas a Portugal e Espanha passados 30 anos desde a adesão à CEE, concluindo que pelo menos foi alcançada a estabilização a democracia contra a ditadura e opressão nos dois países.
Tradução em inglês:
I very much regret that I am forced again to talk about you personally. A short while ago we heard a nice rhetoric that corresponds to reality regarding the dictatorships in Spain and Portugal. But today the free Greece, a country that expresses the will of the Greek people in order to carve its own path, meets the fierce reaction from the three institutions, the troika, as well as by your side. And that strikes me. Who gave you that right? As a person you have the right to intervene and say anything, but as President of the European Parliament I think you do not have the right to express the European Parliament and to intervene in Greece trying to strangle it. All lenders, hands off Greece. Those who think that they can subjugate the Greek people are mistaken.
Mais detalhes AQUI.
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Quando o 10 de Junho era o «Dia da Raça» (E já não é?)
Assinala-se hoje o dia em que Camões foi transladado para o Mosteiro dos Jerónimos, em 1880. Feriado nacional desde os anos vinte do século passado, a data ganhou um novo significado em 1944, quando Salazar a rebaptizou como «Festa de Camões e da Raça». Fê-lo por ocasião da inauguração do Estádio Nacional, que ocorreu com grande pompa, em cerimónias a que terão assistido mais de 60.000 pessoas e que foram filmadas por António Lopes Ribeiro (vídeos aqui e aqui). Linguagem inequívoca: «Às cinco horas, chegou o chefe: Salazar. Salazar, campeão da pátria, era o atleta número um, naquela festa de campeões.»
Mais graves, e bem mais trágicos, passaram a ser os 10 de Junho a partir de 1963. Transformados em homenagem às Forças Armadas envolvidas na guerra colonial, eram a data escolhida para distribuição de condecorações, muitas vezes na pessoa de familiares de soldados mortos em combate (fotos reais no topo deste post).
Era assim:
Desde 1978 que não é Dia da Raça e, para além de Portugal e de Camões, passou a festejar-se também as Comunidades Portuguesas.
Neste preciso momento, vejo as cerimónias que decorrem em Lamego. O Presidente da República acaba de fazer um discurso «militarista». Populares, interrogados pelas TV, referem a honra de terem combatido no «Ultramar», o orgulho de terem tido familiares que o fizeram . São pedradas na minha memória.
Neste preciso momento, vejo as cerimónias que decorrem em Lamego. O Presidente da República acaba de fazer um discurso «militarista». Populares, interrogados pelas TV, referem a honra de terem combatido no «Ultramar», o orgulho de terem tido familiares que o fizeram . São pedradas na minha memória.
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Dica (70)
Brincar com a comida.
«Preferimos que sejam estes ou o Costa a dizer-nos (em Novembro) que as coisas afinal estão muito pior do que esperávamos e que afinal a vaselina vai mesmo ter que levar mais duas pazadas de areia?
E o espantalho que de Belém nos vai dizer que a reserva presidencial o impede de comentar a última escandaleira (depois de prometer regenerar e valorizar e mais não sei o quê a república) tem mesmo de ser alfabetizado ou serve o Rui Rio?»
. 9.6.15
Mercadorias, revoltem-se!
Texto de Sandra Monteiro em Le Monde Diplomatique (Ed. portuguesa) de Junho de 2015:
«Vivemos neste paradoxo. Quanto mais o neoliberalismo alarga a lógica do mercado às diversas áreas da organização social, mais constrói um mundo que tudo transforma em mercadorias. Transforma tudo… e todos. Incluindo os «todos» que mais teriam a ganhar, em ganhos de vida com bem-estar, vivendo numa sociedade de lógicas económicas plurais, em que o debate sobre as modalidades alternativas de organização social fosse encorajado.
Destruídos os vínculos sociais, a confiança de que os direitos e contratos serão respeitados, comprometida a convicção de que o poder político faz escolhas para defender a comunidade, como podem cidadãos reduzidos a mercadorias revoltar-se? Um dos caminhos passa por compreender o quanto o neoliberalismo é hábil e sistémico na construção do mercado e de mercadorias. Observando-o para o combater.
Projecto de vocação totalitária, o neoliberalismo evolui eliminando o espaço da divergência e reconfigurando os sectores ainda protegidos da lei da oferta e da procura, onde imperam lógicas de coesão social e territorial, de direitos (sociais, laborais, ambientais…), de trocas não-mercantis e não-monetárias. Mas não o faz à lei da bala. Fá-lo através de dispositivos sociais aparentemente inócuos e não conflituais, como analisa nesta edição o historiador Luís Bernardo no artigo «Neoliberais apaixonados», que parte da «educação para o empreendedorismo» para mostrar o quanto ela «é uma tecnologia social que visa a modificação das paixões (…) e a naturalização da racionalidade neoliberal».
(Continuar a ler AQUI.)
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Infâncias pobres e pobreza em Portugal como escolha política
«O aumento da pobreza e das desigualdades em Portugal, documentado em relatórios recentes, deve fazer-nos estremecer. As assimetrias profundas em que crescem as crianças e jovens, uma parte significativa delas sem acesso a condições consideradas básicas, colocam em causa os direitos humanos e o desenvolvimento, tanto pessoal como social.
Não nos podemos conformar com o argumento repetido diariamente nos noticiários da inexistência de recursos, quando, nos mesmos noticiários, poucos segundos volvidos, se documenta a circulação de enormes volumes de capital entre instituições europeias, administrações nacionais, grandes empresas, off-shores. Nunca houve tantos recursos no mundo. Como permitimos que tantas crianças continuem a crescer na pobreza? (...) Em Portugal, as desigualdades de distribuição de rendimento são das maiores da OCDE e da União Europeia e os últimos dados disponíveis (2013) apontam para o seu crescimento. (...)
Se na Constituição e na Lei de Bases do Sistema Educativo portuguesas é reconhecido o acesso universal à educação e oportunidades iguais para todos, a pobreza infantil vem impedir que se concretizem os valores subjacentes àqueles normativos levando a que, em boa parte, não passem de retórica vazia. Não é por acaso que os indicadores de escolaridade e de escolarização da população portuguesa (crianças e adultos) são dos piores da União Europeia e da OCDE.
Neste contexto, qual tem sido o contributo do governo para contrariar este estado de coisas? As medidas de combate à crise que temos vivido mais não fazem do que ampliar os seus efeitos. O agravamento dos impostos indirectos e o corte nas prestações sociais são exemplos significativos de opções políticas que impactam negativamente nestas crianças e jovens. (...)
Nos últimos anos, o pretexto do combate à crise mais não tem servido do que para ampliar o processo extractivo que se verifica na sociedade portuguesa, por muito que isso signifique, literalmente, hipotecar o futuro negligenciando as crianças. Neste jogo há vencedores e vencidos e as crianças em situação de pobreza são vencidos ainda antes de entrarem verdadeiramente no jogo social.»
8.6.15
Dica (69)
«Así las cosas, IU se debate entre la desaparición o iniciar muy debilitada una negociación con Podemos que resultaría muy ventajosa para el partido de Pablo Iglesias.»
. Isto só com tugas não vai lá
Não podemos importar alguns curdos para concorrerem às nossas Legislativas?
A pátria em chuteiras
«Se o Brasil é a pátria em chuteiras, Portugal é o país em bandeiras de clubes de futebol. Sabe-se que o futebol português é uma espécie de refém do acaso. Por acaso ganhamos. Por acaso perdemos.
Nunca se ganha esmagadoramente. Nunca se perde porque fomos humilhados. Entre o acaso há a sorte e o azar. E as contas matemáticas. Portugal por estes dias está refém do mundo de Midas de Jorge Jesus, a começar pelo dinheiro que vai ganhar por ano num país que emagreceu devido à dívida, ao défice e à austeridade. Este, claro, é o país onde a austeridade não chegou ao futebol, como se pode ver. Mas, contra o futebol, a política encolhe-se, porque gosta de se fazer fotografar com as suas vitórias. (...)
O futebol continua a ser, neste país, uma boa forma de entendermos melhor a superestrutura política, nas suas alianças, conciliações, interesses, cumplicidades manhosas e negócios menos transparentes. Talvez isso seja a fragilidade de sermos um país latino, mesmo que não tenhamos as emoções são ácidas como espanhóis ou italianos. Mas tudo não deixa de ser um jogo medíocre, feito de personagens de duvidosas qualidades. O que se assiste na transferência de um treinador e no despedimento de outro mostra a decadência nacional. Onde os valores estão em saldo.» (Realces meus)
Fernando Sobral
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O último acto da Europa?
Este texto de Joseph E. Stiglitz, muito crítico em relação ao futuro provável da União Europeia e do euro, ganha uma acuidade especial no início desta nova semana, na qual se esperam mais desenvolvimentos, talvez graves, do caso grego.
Os líderes da União Europeia mantêm um jogo de diplomacia arriscada com o governo grego. A Grécia acedeu a mais de metade dos pedidos dos seus credores, mas, apesar disso, a Alemanha e outros continuam a exigir que adira a um programa que já provou ser um fracasso e que poucos economistas acreditaram alguma vez que pudesse, viesse, ou devesse ser implementado.
A mudança na situação fiscal da Grécia, que partiu de um grande défice primário e chegou a um excedente, quase não teve precedentes, mas a exigência de o país alcançar um excedente primário de 4,5% do PIB foi injusto. Infelizmente, na altura em que a troika (Comissão Europeia , Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional) incluiu pela primeira vez este pedido irresponsável no programa financeiro internacional para a Grécia, as autoridades do país não tiveram outra hipótese que não fosse aceitá-lo.
A loucura de prosseguir neste programa é particularmente grave agora, dado o declínio de 25% no PIB, que a Grécia sofreu desde o início da crise. A troika avaliou mal os efeitos macroeconómicos do programa que impôs: de acordo com as previsões publicadas, acreditou que, cortando salários e aceitando outras medidas de austeridade, as exportações gregas aumentariam e a economia regressaria rapidamente ao crescimento; acreditou também que a primeira reestruturação da dívida levaria à sustentabilidade da mesma.
As previsões da troika falharam, repetidamente. E não por pouco mas por muitíssimo. Os eleitores da Grécia tiveram razão quando exigiram uma mudança de rumo e o seu governo tem também razão ao recusar assinar um programa claramente falhado.
Dito isto, há espaço para negociar: a Grécia tornou clara a sua vontade de realizar reformas permanentes e congratulou-se com a ajuda da Europa para a implementação de algumas delas. Uma dose de realismo da parte dos credores da Grécia – sobre o que é possível e sobre as consequências macroeconómicas de reformas fiscais e estruturais diferentes – poderia fornecer a base para um acordo que seria bom não só para a Grécia, mas para toda a Europa.
Alguns, especialmente na Alemanha, parecem indiferentes a uma saída da Grécia da zona euro, alegando que o mercado já calculou o preço para tal ruptura, e há quem sugira mesmo que isso seria bom para a união monetária.
Penso que estas opiniões subestimam significativamente os riscos envolvidos, tanto actuais como futuros. Um nível semelhante de complacência foi evidente, nos Estados Unidos, antes do colapso do Lehman Brothers, em Setembro de 2008. A fragilidade dos bancos da América era conhecida há muito tempo - pelo menos desde a falência do Bear Stearns, em Março do mesmo ano. No entanto, dada a falta de transparência (em parte devido a uma fraca regulamentação), nem os mercados, nem os responsáveis políticos avaliaram plenamente as ligações entre instituições financeiras.
Na verdade, o sistema financeiro mundial ainda está a sentir as réplicas do colapso do Lehman. E os bancos continuam a não ser transparentes e estão, portanto, em risco. Ainda não conhecemos a verdadeira extensão das ligações entre instituições financeiras, incluindo as decorrentes de derivados não transparentes e de credit default swaps.
Na Europa, podemos já ver algumas das consequências de uma regulamentação inadequada e o falhanço da concepção da própria zona euro. Sabemos que a estrutura desta incentiva divergência, não convergência: como capital e pessoas com talento deixam as economias atingidas pela crise, os países afectados ficam menos capazes de pagar as suas dívidas. Porque os mercados sabem que há uma espiral viciosa descendente estruturalmente embutida no euro, as consequências para a próxima crise serão profundas. E uma outra crise é inevitável: ela está inscrita na própria natureza do capitalismo.
O conto-do-vigário de Mario Draghi, presidente do BCE, concretizado na sua declaração em 2012 segundo a qual as autoridades monetárias iriam fazer «o que fosse preciso» para preservar o euro, tem funcionado até agora. Mas como se sabe que o euro não é um compromisso vinculativo entre os seus membros, a situação repetir-se-á dificilmente numa próxima vez. Se os rendimentos de títulos aumentassem vertiginosamente, nenhuma espécie de garantia dada pelo BCE e pelos líderes europeus seria suficiente para os fazer baixar de níveis estratosféricos, porque o mundo sabe agora que eles não iriam fazer «o que fosse preciso». Como o exemplo da Grécia mostrou, fariam apenas o que políticas eleitorais míopes exigissem.
Temo que a consequência mais importante de tudo isto seja o enfraquecimento da solidariedade europeia. Estava previsto que o euro a fortalecesse, mas teve o efeito oposto.
Não é do interesse da Europa – ou do mundo – ter um país na periferia da Europa alienado dos seus vizinhos, especialmente agora, quando a instabilidade geopolítica é já tão evidente. O vizinho Médio Oriente está em tumulto; o Ocidente está a tentar conter uma Rússia recentemente mais agressiva; e a China, que é já a maior fonte do mundo em poupança, o maior país em termos de comércio e a maior economia global (em termos de paridade de poder aquisitivo), confronta o Ocidente com novas realidades económicas e estratégicas. Não há tempo para uma desunião europeia.
Os líderes europeus consideravam-se visionários quando criaram o euro. Julgavam estar a olhar para além das exigências de curto prazo, que geralmente preocupam os chefes políticos.
Infelizmente, a sua compreensão da economia ficou aquém das ambições e as políticas actuais não permitem a criação de um quadro institucional que podia ter tornado o euro capaz de funcionar como previsto. Embora se esperasse que a moeda única viesse a trazer uma prosperidade sem precedentes, é difícil afirmar hoje que tenha tido resultados positivos significativos, para a zona euro como um todo, no período que precedeu a crise. E, depois desta, os efeitos adversos têm sido enormes.
O futuro da Europa e do euro depende agora de os líderes políticos da zona euro serem capazes de combinar um mínimo de entendimento económico com um sentido visionário e uma preocupação com a solidariedade europeia. É bem provável que o início da resposta a esta questão existencial possa ter lugar nas próximas semanas.
(Original AQUI)
Originalmente publicado no Observatório da Grécia.
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7.6.15
Dica (68)
«The Greek government incorporated this convergence in its proposal, while the lenders did not. Their attitude raises legitimate questions about their contribution to finding a mutually beneficial agreement. Most importantly, If their proposals were to be accepted, the tragic mistake of the previous governments that led the country to a strategic dead end, through fiscal austerity policies, would continue.»
. Um país a passo de caracol
(Para ver melhor, clique na imagem)
O Jornal de Negócios divulgou os resultados da última sondagem realizada pela Aximage para as eleições legislativas. Virão os do costume reclamar que nada isto é fiável, que os dados são manipulados, etc., etc. – good luck, se isso os consola e os anima...
Pergunta inocente: será que ainda há quem acredite que algum facto, pelo menos tão inesperado como a transferência de Jesus para o Sporting, vai mudar significativamente este cenário, ou outro necessariamente parecido? 0,8% separam os dois únicos possíveis vencedores da contenda. Maioria absoluta à vista para algum deles? Nem com o mais optimista e potente dos binóculos. So, what? Mais do mesmo, como nas últimas décadas – e pouca esperança, por mais que seja duro confessá-lo.
. Dois projectos para a Europa?
«A Comissão Europeia vai perdendo poder, o BCE (poder não eleito, recorde-se) é o único organismo com alguma capacidade de manobra, e as decisões estão agora cada vez mais nas mãos do Parlamento e diferentes conselhos onde Alemanha e França têm maiorias imbatíveis. E estes dois países em vez de procurarem um objectivo comum, vigiam-se e estorvam-se. A Europa unida é isto. E Portugal, devoto de Berlim, deixou de ter uma opinião sobre o seu próprio lugar na Europa. Como se não tivesse voz. Por isso hoje o debate que se trava na Europa (sobretudo se a união fiscal deve seguir a monetária) não é debatida pelos principais partidos políticos. Só a pequena política interna conta. E isso dá-nos a ideia da pobreza dos ideários políticos nacionais. (...)
Seja como for, por estes dias, a Europa move-se. Nas páginas do "Le Point", o antigo presidente francês, Valéry Giscard d'Estaing, escrevia que era necessário uma clarificação: "Desde logo reconhecendo sem ambiguidade a existência de dois projectos na Europa: um projecto de integração monetária, orçamental e fiscal", que interessa aos países da Zona Euro (de que a Grã-Bretanha não faz parte) e um espaço a 28 de "liberdade comercial que tem uma necessidade imperiosa de ser limitada e renovada". D'Estaing defendia mesmo a "integração fiscal e a gestão comum da dívida", criando um poder forte na Europa.
Emmanuel Macron, o ministro da Economia de França reforça a ideia: é preciso uma Europa "a duas velocidades", uma da Zona Euro (com orçamento comum, capacidade de endividamento comum e convergência fiscal) e outra mais simples, a 28. Sigmar Gabriel, do SPD alemão, e colega de coligação de Angela Merkel, defendia o mesmo. Isto é um claro aviso a Portugal e ao seu futuro na zona euro: se esta tese avançar, o que não é certo, como é que uma economia débil como a nossa sobreviverá num espartilho destes, guiado dos pelos interesses alemães e franceses? É uma pena que isto não faça soar alarmes nas lideranças do PSD, do CDS e do PS, que poderão ter pela frente um desafio muito problemático nos próximos tempos. Para lá dos seus jogos eleitorais, das promessas de estabilidade e crescimento e dos pequenos sonhos que ainda se propõem cumprir.»
Fernando Sobral
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