10.5.25

10.05.1958 – Humberto Delgado: «Obviamente demito-o!»

 


Durante a conferência de imprensa de lançamento da sua campanha para as eleições presidenciais, no Café Chave d’Ouro em Lisboa, Humberto Delgado proferiu uma frase que viria a ficar célebre: «Obviamente, demito-o!»

Interessa o seu significado, independentemente das outras versões da frase em questão, que foram sendo reivindicadas.

«A 10 de maio de 1958, no café Chave d` Ouro, no número 38 do Rossio, em Lisboa, o candidato da oposição às presidenciais deu a conferência de imprensa em que o correspondente em Lisboa da agência noticiosa France Presse (AFP), Lindorfe Pinto Basto, fez a pergunta.
"Senhor general, se for eleito Presidente da República, que fará do senhor Presidente do conselho?", perguntou, depois de ter notado que, num país que vivia em ditadura, os jornalistas "estavam todos `nas encolhas`".
"Vi que os meus colegas estavam todos nas encolhas. Eles não podiam falar. Eu pertencia à France Presse. Fiz a pergunta. Tinha de a fazer. O general parecia que estava à espera", lembrou Lindorfe Pinto Basto numa conversa com Iva Delgado, filha do general que "perdeu" as eleições para o candidato do regime, Américo Thomaz, no meio de acusações de fraude.
"Obviamente demito-o!" foi a resposta usada pelos jornalistas, mas, mesmo passado meio século, as versões não são todas coincidentes, como descreve o neto do general, Frederico Delgado Rocha, no livro "Humberto Delgado - Biografia do General sem Medo" (Esfera dos Livros), agora reeditado por ocasião dos 50 anos do seu assassinato.
A frase, lê-se no livro, foi registada com "nuances" pelos diferentes jornalistas desde a pontuação ao tempo verbal e à própria ordem das palavras.
As duas variações assinaladas no livro são: "Demito-o, obviamente" e "mas obviamente demito-o".
Em 1998, numa conversa com Iva Delgado, Pinto Basto, que era correspondente da AFP desde 1948, registou outra frase: "Demito-o, é óbvio".»

(Fonte)

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Se isto não é o povo, então o que é o povo?

 


«Na viagem entre Pombal e Ovar, Montenegro foi até Mira, onde a sua mulher fazia uma pausa no percurso até Fátima com um grupo de peregrinos que a acompanha.» (Público)

Não sei se Montenegro vem hoje ao Benfica-Sporting mas devia fazê-lo. Completava os três FFF (assumindo que o dueto com Tony Carreira substituiu com vantagem uma homenagem ao Fado).

Braga, Chega e Louçã

 


A vergonha absoluta

 


«Acho que nunca escrevi um artigo em estado de maior indignação. O que se passa em Gaza e no território da Autoridade Palestiniana convoca não só a política, a geopolítica, as relações de forças entre Estados, o mundo do “Ocidente” e do Oriente, todos os conflitos em curso, o “Sul global”, o papel das Nações Unidas, mesmo o direito internacional, convoca tudo o que quiserem, mas tudo está abaixo de um repto moral, de uma obrigação de falar, de um dever de protestar e actuar perante um massacre cruel, diante dos nossos olhos, de um povo, o palestiniano. Só conheço uma comparação para esta indiferença, vergonhosa e também, ao mesmo tempo, a mais certeira e, num certo sentido, a mais diabólica: o encolher de ombros de todos os que sabiam que o Holocausto estava em curso – e havia muitos altos responsáveis entre os inimigos dos alemães que sabiam – e nada fizeram.

E não me venham com a história do anti-semitismo, que é um argumento insultuoso para justificar os crimes de Israel, da mesma natureza que o canto “desde o rio até ao mar” serve para justificar o massacre do Hamas. Estão bem uns para os outros.

Já sabemos que tudo começou com um massacre perpetrado pelo Hamas e que devia ter uma resposta israelita dura, como teve. Mas o que se passa nos dias de hoje é outra coisa, é outro patamar político, racial, nacional, que nada tem a ver com uma resposta com qualquer racionalidade militar para combater o Hamas. É uma política de destruição em massa de um povo e do seu “lugar”, e conheceu mais um agravamento na semana passada, com o anúncio da anexação de mais uma parte do território de Gaza ao Estado de Israel. Trata-se, certamente, de preparar a “Riviera” que um Presidente demente diz querer fazer. Bastava esta declaração de Trump, com a aquiescência cínica e interesseira de Bibi, para nós percebermos o grau de loucura que está à frente da maior potência mundial.

Ah! Sim, muita gente diz-se preocupada todas as vezes que Trump abre a boca, ou move as mãos para fazer aquela assinatura infantil em mais uma ordem executiva à margem da Constituição e dos poderes do Congresso, mas isso não chega. Em particular, não chega para a hipocrisia moral de muitos países da União Europeia, como Portugal, que nem sequer o passo de reconhecer o Estado palestiniano são capazes de dar. É uma atitude quixotesca? Se for levada a sério, com a instalação de embaixadas no novo Estado, a assinatura de acordos económicos, políticos e militares, com um Estado soberano, então a coisa fia mais fino. Acresce que Israel, violando todas as regras do direito internacional, conduzindo um massacre quotidiano, não tem sanções.

No entretanto, todos os dias se mata gente inocente, crianças, mulheres, velhos, sem sequer qualquer racionalidade militar que não seja destruir, matar ou atirar para fora da sua terra milhões de pessoas, para depois terraplanar as ruínas e lá instalar colonos israelitas, os mesmos que andam também a matar palestinianos nas terras da Autoridade Palestiniana, a base eleitoral dos partidos da extrema-direita que estão no governo de Bibi. Quem acredita que o que Bibi quer é dar a Trump os hotéis de luxo e as praias da costa de Gaza para fazer vários Mar-a-Lago, e que alguma vez alguém vai lá por o seu rico dinheiro para fazer uma estância turística, rodeada, por terra, por três muros e um pequeno exército de segurança e, por mar, por patrulhas em lanchas, está tão demente como Trump. Não é o caso de Bibi que quer outras coisas, todas locais, todas no Médio Oriente, todas culminando num ataque ao Irão. Para isso, ele até é capaz de construir a tal Riviera vazia de gente, como as aldeias Potemkin em cartão, deslocadas de quarteirão em quarteirão, para a glória de Trump e depois, conseguindo o que quer, trazer o seu eleitorado de extrema-direita para tomar banho na sua Riviera.

E, já agora, não convinha perguntar, em plenas eleições, algo de verdadeiramente importante ao PS, ao PSD, ao CDS, ao Chega, por aí adiante, se, chegando ao Governo, estão dispostos a reconhecer o Estado palestiniano, estão dispostos a impor sanções a Israel e a usar todos os meios ao dispor de um Estado da União Europeia para punir os criminosos? E, para além disso, o que é que eles acham do que se está a passar com as crueldades de Israel em Gaza?

As respostas seriam até uma razão bem mais sólida e moral para decidir o voto.»


9.5.25

Cardeais não somos

 


… mas merecemos este anel que um bispo não desdenharia.

Anel de ouro, safira e vidro, esmaltado. 1900.
René Lalique.

Daqui.

Cábula para americanos perceberem

 


…o que é essa cena do XIV que colocaram à frente do nome do papa.


Democracia e banalidade

 


«A banalização da democracia significa também a banalização dos seus intervenientes. Uso aqui a ideia de “banalização” sem qualquer sentido pejorativo: é a habituação ao uso deste modelo, a sua interiorização, a sua neutralização do ponto de vista das opções e dos riscos, estando afirmada de forma inquestionável, pelo menos até agora, há algumas décadas.

Como qualquer vivência coletiva e provavelmente também pessoal, ao fim de algumas décadas, perde-se a épica do desafio e da sua construção inicial, esquecem-se os heróis, superam-se, bem ou mal, as crises e dificuldades de qualquer princípio. Entra-se na normalidade, o que é habitualmente um objetivo e uma vitória – mas também uma desilusão, para quem anseia sempre por conquistas e revoluções ou, pelo menos, por desculpas evidentes para não ir jantar a casa todos os dias.

Com essa normalização de regime, não é possível continuar a ter os mesmos ícones de regime na liderança política. As últimas três décadas em Portugal foram nisso exemplares. Por um lado, a normalização da atividade política retirou-lhe heroísmo e sentido de dever. Por outro, essa regularidade democrática, que nos parece óbvia e natural agora, mas que não o é necessariamente, trouxe também uma clientela associada, no sentido de uma classe de pessoas que, sendo aparentemente necessária ao funcionamento do modelo, até pela carência de candidatos, o depreciam. Desde logo porque este se constitui com base na temporalidade do exercício de cargos e funções, o que é efetivamente negado por quem faz do seu tempo neste mundo uma sucessão de dependências e favores político-partidários. Ao mesmo tempo que despejou um voyeurismo mais ou menos infamante sobre quem se dedique à causa pública, provindo igualmente do voyeurismo global em que todos estamos militantemente instalados, mesmo que a coberto da ideia salvífica de transparência e prestação de contas.»

Continuar a ler AQUI.

Lobo com pele de Hugo Carneiro

 


«Quando Hugo Carneiro sugeriu que as autoridades vasculhassem os telemóveis de deputados e jornalistas, em busca do autor da fuga de informação que revelou a lista dos clientes da Spinumviva, a comunicação social descreveu-o como “deputado do PSD”, o que me pareceu incorrecto. É sabido que o PSD sempre teve várias alas internas (os barrosistas, os cavaquistas, os santanistas), mas Hugo Carneiro inaugura uma nova modalidade: não protagoniza bem uma tendência do PSD, mas de um seu subsidiário, o PStasiD. Ao contrário, por exemplo, do cavaquismo, o carneirismo não implica a ambição de seguir um líder específico (Cavaco Silva, no caso do cavaquismo). O carneirismo é a manifestação da vontade de, simplesmente, seguir. É seguidismo — seja de quem for, e seja qual for o resultado. Por exemplo, quando sugeriu que o deputado responsável pela fuga de informação fosse punido com a perda de mandato, Hugo Carneiro não deu importância ao facto de esse deputado, independentemente de quem possa ser, na prática já não ter mandato, visto que o Parlamento está dissolvido. Trata-se de propor que o prevaricador seja punido com a perda de algo que já não possui, que é uma pena de difícil execução. Do mesmo modo, quando acusou a comunicação social de alimentar a desinformação ao publicar um documento oficial, Hugo Carneiro admitiu que a publicação de documentos oficiais desinforma, o que só pode significar que a lista entregue por Montenegro é falsa.

Por outro lado, o PS tem respondido a esta lógica deficiente com a sua própria lógica deficiente, o que parece apropriado. Primeiro, os socialistas sugeriram que a informação tinha sido publicada por vontade de Luís Montenegro, como vergonhosa manobra eleitoralista de última hora. Mas quando se soube que o deputado socialista Pedro Delgado Alves tinha sido uma das pessoas a aceder à lista, e o PSD ameaçou pôr a polícia a fiscalizar telemóveis, o PS disse que o PSD estava era preocupado com a divulgação da informação, uma vez que lhe era prejudicial.

Em resumo, o PSD quer que deputados que já não têm propriamente mandato percam o mandato, por terem divulgado informação verdadeira que constitui desinformação; o PS acha que foi o próprio primeiro-ministro a divulgar, estrategicamente, para obter benefícios eleitorais, uma informação que, por acaso, o prejudica. Julgo que a campanha eleitoral está a contribuir como nunca para o esclarecimento de todos nós.»


Um pouco mais de azul (30)

 


8.5.25

Parem as sondagens!

 


A probabilidade de ter estes dois com o país na mão causa-me brotoeja.

Espírito Santo?

 


Zé-António Pimenta de França no Facebook.

08.05.1945: O Dia da Vitória




Foi há 80 anos. Os Aliados tinham decidido que a vitória seria celebrada no dia 9 de Maio de 1945, mas os jornalistas anunciaram a rendição alemã mais cedo do que previsto e precipitaram o início das celebrações para o dia 8 (tendo a União Soviética mantido as mesmas para a data previamente combinada).





Como é sabido, também se festejou em Portugal. Multidões saíram à rua com bandeiras dos Estados Unidos, da Grã-Bretanha e… do Benfica, estas últimas como substitutas das da União Soviética, obviamente proibidas. Como alternativa, vê-se também, nas fotografias da época, paus sem bandeira.
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O novo macarthismo é uma oportunidade para a Europa?



«Foram poucos minutos, mas os suficientes para o ato de resistência ser fotografado e partilhado. Hasteado numa residência estudantil de Harvard, um pequeno pano lembrava que a “liberdade de expressão inclui a Palestina”. A mensagem responde ao estrangulamento financeiro às universidades decretado pela administração Trump. Com base na acusação de inação perante o antissemitismo, Trump exige que alterem currículos com critérios políticos e pretende influenciar critérios na admissão de estudantes internacionais.

Quem não capitular perante o novo macarthismo sentirá, de forma ainda mais violenta, o apertar no torniquete dos cofres públicos. A Johns Hopkins despediu mais de dois mil funcionários após um corte de 800 milhões de dólares. A Universidade de Columbia cedeu, após ver congelados 400 milhões por causa dos protestos estudantis contra a ocupação de Gaza. Dos 25 estabelecimentos de ensino superior que mais financiamento federal receberam nos EUA em 2023, pelo menos 16 estão sob investigação. Entre estes, 10 estão a ser alvo de especial atenção por parte de uma task force governamental contra o alegado antissemitismo, tratando qualquer crítica a Israel como apologia do Hamas.

Rebecca Simmons, médica e investigadora há mais de 50 anos nos EUA,viu o seu projeto sobre complicações na gravidez entre mulheres negras e pobres bloqueado por uma ordem executiva que proíbe financiamento federal a estudos sobre diversidade. Como este, há centenas de casos semelhantes, com impacto direto na saúde pública e inovação médica.

Nem as universidades internacionais com protocolos com as americanas, como algumas portuguesas, são poupadas, exigindo a administração Trump o fim de políticas contra a discriminação ou o fim da investigação em áreas “sensíveis” como a saúde pública.

REVOLUÇÃO CULTURAL

Das grandes firmas de advocacia às cadeias de televisão, a capitulação perante as exigências autocráticas tem sido regra nestes loucos meses em Washington. Justiça seja feita a Trump: nem as instituições mais poderosas são poupadas. Pelo contrário, a sua capitulação é especialmente importante, exatamente pelo seu poder simbólico. Por isso o braço de ferro com Harvard se tornou tão relevante.

Em resposta à chantagem, Harvard decidiu enfrentar Trump, garantindo que prefere perder 2000 milhões de dólares vindos dos cofres federais do que abdicar do controlo da instituição e da liberdade de definir os seus currículos. Claro que o desafogo financeiro da universidade mais rica do mundo, com um orçamento anual de 50 mil milhões de dólares, ajuda a alguma resistência. Mas o reitor sabe que tem muito a perder, como a isenção fiscal de que beneficia, vital para apoios privados. Até agora, nem isso demoveu a instituição, que sente também a responsabilidade de defender as restantes faculdades sem o seu músculo financeiro, de enfrentar a administração Trump em tribunal. O que está em causa, com este corte financeiro, não é tanto o funcionamento da universidade, mas o dos seus centros de investigação médica. Dos 9000 milhões de dólares que Harvard recebe do Estado, 7000 destinam-se a onze hospitais em Boston e Cambridge.

Os EUA estão a viver uma guerra cultural inspirada, na sua lógica, no estertor de Mao: a purificação do sistema político contra a imposição de um quadro de valores, não natural, pelas elites que dominam o sistema contra a vontade do povo. J.D. Vance não podia ter sido mais claro: “as universidades são o inimigo”. Vance, ele próprio formado em Yale, argumenta que a verdade e o conhecimento nos EUA têm sido moldados pelas universidades com base numa tirania. E perguntou: “Porque consentiram os conservadores esta tirania intelectual?” Quebrar as universidades é fundamental para impor uma nova hegemonia cultural.

A guerra cultural americana já não é meramente simbólica. Atacar as universidades serve três propósitos: destruir uma das últimas barreiras institucionais ao autoritarismo, castigar quem não se ajoelha e consolidar o ressentimento das bases contra as “elites do saber”. Trump segue o guião da Hungria, onde Orbán fez o mesmo, quebrando sem dificuldade a resistência das universidades, agora transformadas em fundações com amplo controlo político.

Vive-se, por cá, o mito da ausência de Estado no domínio tecnológico e científico norte-americano. A eficácia da chantagem de Trump, usando o corte de apoios públicos, desmonta a fantasia.

O investimento federal nas universidades ascende a 60 mil milhões de dólares, um valor trinta vezes superior (atualizado à inflação) às transferências anteriores à Segunda Guerra Mundial. Foi a corrida pela descoberta da bomba nuclear, um esforço titânico que juntou dezenas de investigadores das maiores universidades e institutos, que abriu o caminho para o financiamento de projetos de larga escala. A Guerra Fria, a conquista do espaço, a nova fronteira tecnológica, tudo foi consolidando o apoio público à investigação aplicada que abriu caminho a quase todas as grandes inovações do nosso tempo.

As empresas privadas investem quantias astronómicas em inovação aplicada. Mas ela repousa em décadas de investigação em ciência base que permite, anos depois, a massificação de produtos ou novas tecnologias. A nova geração de vacinas usadas para combater a Covid-19 foi possível graças à pesquisa e ao desenvolvimento efetuados nos anos 60 do século passado.

RIO

Consoante o ranking, 16 ou 20 das 25 melhores universidades do mundo estão nos EUA. Tirando uma breve aparição de Zurique, só as do Reino Unido, com três dos lugares cimeiros, se destacam nas europeias. Nenhuma de uma União Europeia que tanto fala em ciência e inovação. A China, pelo contrário, tem uma ou duas (e Singapura uma).

Não está escrito em pedra que as melhores universidades e centros de inovação fiquem sempre no mesmo país. A Alemanha foi o centro académico até 1933, e deixou de o ser com a perseguição aos judeus e à liberdade de expressão, essencial para o trabalho académico, dando origem a uma fuga de cérebros prontamente acolhida pelos EUA.

Mais de 75% dos investigadores que responderam a um inquérito conduzido pela Nature admitem abandonar os EUA para poder prosseguir o seu trabalho na Europa ou no Canadá. Algumas universidades europeias já sentem o aumento do número de candidaturas do outro lado do oceano e, como sempre, alguns estão mais acordados do que outros. Doze governos escreveram uma carta à comissária europeia da Inovação, defendendo uma estratégia concertada para tentar captar talento internacional para as universidades do continente. Entre esses países encontramos a França, Espanha, Alemanha ou Grécia, mas, como é evidente, nem sinal de Portugal.

É preciso repetir programas de atração, como o que os EUA levaram a curso no pós-guerra (Operação Paperclip), mas desta vez em sinal contrário. A Europa ainda tem uma vantagem em relação à China: é vista como um espaço de liberdade de pensamento, crítica e investigação.

Como avisa Bruno Maçães no Perguntar Não Ofende, a liberdade não chega (nem é certo que, em algumas áreas, isso seja assim tão relevante para os cientistas). A diferença salarial e de investimento em investigação é enorme. É preciso investir e coordenar investimento.

Primeiro Macron, depois Von der Leyen, foram bastante agressivos no discurso sobre a captação de talento das universidades norte-americanas. “A Europa deve continuar a ser a pátria da liberdade académica e científica”, disse a presidente da Comissão Europeia, na apresentação do programa “Escolhe a Europa”. Garantindo que a União Europeia já apoia investigadores que venham para o espaço europeu, atribuindo um complemento à sua bolsa, anunciou “um novo pacote de 500 milhões de euros para 2025-2027, para tornar a Europa um pólo de atracção para os investigadores.” Dá pouco mais 150 milhões por ano para todos os países europeus. Para que se perceba a gota no oceano, mesmo com os cortes de Trump, os EUA continuam a investir 7000 milhões só em Harvard.

Primeiro Macron, depois Von der Leyen, foram bastante agressivos no discurso sobre a captação de talento das universidades norte-americanas. “A Europa deve continuar a ser a pátria da liberdade académica e científica”, disse a presidente da Comissão Europeia, na apresentação do programa “Escolhe a Europa”. Garantindo que a União Europeia já apoia investigadores que venham para o espaço europeu, atribuindo um complemento à sua bolsa, anunciou “um novo pacote de 500 milhões de euros para 2025-2027, para tornar a Europa um pólo de atracção para os investigadores.” Dá pouco mais 150 milhões por ano para todos os países europeus. Para que se perceba a gota no oceano, mesmo com os cortes de Trump, os EUA continuam a investir 7000 milhões só em Harvard.

Também aqui, o bom aluno português decide ficar para trás. Se a situação já não era boa com o anterior governo, agoratemos o orçamento mais baixo da Fundação Ciência e Tecnologia desde 2018. De nada nos serve ter investigadores internacionais com vontade de vir para Portugal se os nossos centros estiverem lotados de precários a trabalhar sem reconhecimento. Não é só uma questão monetária, mas também de estatuto, autonomia e ambiente favorável à investigação.

Ou encaramos a produção de saber como um fator de diferenciação e qualificação da economia, ou continuaremos condenados a olhar para o sucesso dos outros, a depender de monoculturas de baixo valor acrescentado, como a do turismo, e a baixar o IRC na esperança de que assim nasçam flores no deserto. É uma escolha que devia passar pela campanha eleitoral.»

7.5.25

Tão transparente como ele?

 


07.05.1974 – A absolvição das três Marias

 



Não tivessem os capitães acabado com a ditadura duas semanas antes e Maria Velho da Costa, Maria Isabel Barreno e Maria Teresa Horta teriam vivido um desfecho bem diferente do julgamento que decorria no Tribunal da Boa-Hora, em que eram rés, e que terminou em 7 de Maio de 1974 com a absolvição das três.

A história é conhecida e está hoje bem descrita, mas recorde-se que as três autoras decidiram, em Maio de 1971, escrever «a seis mãos» as Novas Cartas Portuguesas. Reuniam-se uma vez por semana para discutir o que tinham feito entretanto, mas prometeram nunca dizer quem tinha escrito o quê. (Mais tarde, em interrogatórios individuais, a PIDE bem tentou, em vão, descobrir qual delas havia escrito as partes consideradas de maior atentado à moral...)

A primeira edição de 1972 foi recolhida e destruída três dias depois de ser lançada (mas eu tenho aqui o meu exemplar, bem velhinho...), foi instaurado a seguir um processo judicial por o conteúdo ser considerado «insanavelmente pornográfico e atentatório da moral pública», com acusação por «pornografia, obscenidade, atentado à moral pública», a que se seguiu o julgamento que teve início em 25 de Outubro de 1973.

A onda de solidariedade foi grande a nível internacional, registando-se uma marcha de mulheres em Paris, invasão da embaixada portuguesa na Holanda, protestos em frente da embaixada portuguesa em Washington, etc., etc.

Por ocasião do 40º aniversário da publicação do livro, Maria Teresa Horta transcreveu, no Facebook, algumas passagens da sentença final: «O livro “Novas Cartas Portuguesas” não é pornográfico nem é imoral. Pelo contrário: é obra de arte, de elevado nível, na sequência de outras obras que as autoras já produziram. [...] Nestes termos, julgo a acusação improcedente e não provada e consequentemente a todos absolvo e mando em paz».

Com a chegada da liberdade e Portugal em festa, «o juiz ficou tão aliviado que organizou um jantar e nós fomos as três», disse também Maria Teresa Horta. 
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Luiz Pacheco chegaria hoje aos 100

 


Faria hoje 100 anos e, se ainda por cá andasse, Luiz Pacheco seria certamente tão irreverente como sempre foi. Alguma dúvida?

Para compreender melhor a sua pessoa e a sua obra, a leitura de «Puta que os pariu! – A biografia de Luiz Pacheco», de João Pedro George, é absolutamente obrigatória.


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Deportações na campanha e o ar de um tempo trágico

 


«Usando a câmara subjetiva e olhando do ponto de vista da personagem, vemos as pernas de alguém deitado numa cama do que parece ser um quarto de motel. Faz zapping numa televisão. Na tela, sucedem-se intervenções vigorosas de responsáveis políticos anunciando a deportação de imigrantes. Subitamente, ouve-se um feroz bater na porta, anunciando a guarda fronteiriça. Toda a cena transmite um ambiente opressivo de medo. Subitamente, a nota de humor. No telemóvel, toca: “take me home to the place I belong ..." ("Country Roads", de John Denver). O vídeo da Border Patrol (CBP), que junta aos piores instintos uma nota de humor negro, é o resumo do neofascismo no tempo das redes. Assim seria a propaganda do passado se tivesse estes instrumentos virais.

Aparentemente, as deportações também rendem votos por cá.

Não há qualquer novidade nas ordens de expulsão anunciadas pelo ministro António Leitão Amaro no último fim de semana. Como já várias pessoas assinalaram, até são inferiores, em número, a vários anos do governo do PS, assim como, nos EUA, Biden e Obama deportaram, e não foi pouco. Como explicou Manuela Niza, presidente do Sindicato dos Técnicos de Migração, estamos perante uma "não notícia", já que estas notificações acontecem, sem qualquer anúncio público, desde 2007. E este nem sequer foi o ano mais ativo. Aquilo a que assistimos é, no que se tornou um padrão de um executivo dominado pela propaganda e pelas perceções, fazer-se passar por ação política procedimentos quotidianos da administração pública.

O que mudou é estas ordens de saída serem anunciadas, num arranque de campanha, como bandeira política e em celebração, contribuindo para a demonização dos imigrantes. Fazendo um paralelo com a segurança, há uma diferença entre o político que anuncia a diminuição do crime e o que se vangloria de ter aumentado o número de reclusos. E uma ainda maior se o fizer no meio de uma campanha eleitoral. Sabemos a que instintos pretende responder.

Ainda sou do tempo em que lamentávamos não conseguir segurar imigrantes, que fugiam para outros países europeus. Se continuarmos a repetir a performance económica do primeiro trimestre deste ano, esses tempos regressarão. Há muito mais imigrantes do que na altura, mas estamos próximos do pleno emprego, temos falta de mão de obra nos setores que estes imigrantes procuram, precisamos deles para garantir a sustentabilidade da segurança social, são responsáveis pelo repovoamento de várias zonas do interior e foram eles que travaram a nossa gravíssima crise demográfica.

É claro que precisamos, como em quase todos os domínios económicos e sociais, de regulação. Mas, com uma "via verde" direcionada a grandes obras e empregadores que se concentram na mão-de-obra temporária, e sem um grande reforço dos depauperados consulados, o fim da manifestação de interesses deixa um vazio. Quando acabar o processo de regularização de todos os que esperavam, os que entrarem aqui sem ser pela via demasiado estreita que se manteve aberta ficarão no limbo de uma ilegalidade impossível de ultrapassar, o que rapidamente se tornará num problema. Responder às exigências dos grandes empregadores não chega o essencial do nosso tecido empresarial e económico. Foram apenas os únicos que conseguiram se fazer ouvir junto do governo.

É evidente que a gestão da transição do SEF para a AIMA foi péssima, com boicote interno e incompetência externa. Mas não vislumbro qualquer estratégia no espalhafato deste governo. Segundo o DN, há quase 10 meses que o portal de renovações online da AIMA deixou de funcionar, impossibilitando milhares de imigrantes documentados a terem sua situação regularizada. Debater isto não dá votos porque os imigrantes não votam.

O que vislumbro é uma mudança política que resulta da transformação, aqui, em toda a Europa e nos Estados Unidos, dos imigrantes em bode expiatório de um processo de globalização que não distribuiu ou garantiu a mesma prosperidade do passado. E isso, mais do que nas políticas, nota-se no discurso sobre a imigração, vista como problema por um eleitorado ansioso e assustado, num continente em perda e sem lideranças políticas. Chegou a Portugal quando nos aproximámos da média europeia – mesmo os números são difíceis de debater, quando o governo os usa para pouco mais do que propaganda.

GANHA O ESPECIALISTA NO FILÃO

Um dia depois de Pedro Passos Coelho voltar à campanha de Luís Montenegro, é interessante recordar o choque com a intervenção que fez há um ano sobre imigração e verificar como o discurso mainstream mudou radicalmente desde então, tornando o que disse absolutamente aceitável. Ao ouvir o debate sobre o tema, os únicos partidos a falar como falava o antigo mainstream são os mais à esquerda. Nesta matéria, o PS está entalado entre o mau trabalho administrativo do governo de António Costa e o temor eleitoral de Pedro Nuno Santos. E o seu discurso sai confuso.

Melhor esteve o Presidente da República, que, perante este anúncio, deixou uns lembretes, no que seria a intervenção habitual dos partidos do centro, PSD incluído. Não sabendo ao certo quantos imigrantes temos nem quantos a nova lei deixará fora da regularização, recordou três coisas óbvias: que não devíamos ter estado " três anos sem tratar desta matéria", deixando milhares de processos pendurados; que o contributo dos imigrantes é transversal e que, sem eles, haveria "um colapso da economia portuguesa"; e que a expulsão "é sempre penosa" para quem é expulso, até porque não cumprir os requisitos não é sinónimo de ser criminosos. Ou seja, consciência dos erros administrativos, da importância económica da imigração e de valores básicos de humanidade, não usando a expulsão de pessoas que, como fizemos no passado, procuram uma vida melhor como vantagem eleitoral.

As deportações sempre aconteceram, porque são inevitáveis. O que mudou é serem anunciadas, num arranque de campanha, como bandeira e em celebração. O problema já não é o crescimento do Chega. É, como sempre disse, o contágio. A rampa deslizante será íngreme em toda a sociedade. Os partidos do centro limitam-se a respirar bem fundo o ar do tempo. E o ar do tempo é o do medo e da xenofobia. Não é por acaso que os ataques de Montenegro ao Chega são apenas à sua imprevisibilidade e falta de sentido de Estado. O resto veio para ficar.

No Reino Unido, como em muitos países europeus, os conservadores aproximaram-se da extrema-direita (até na linguagem) para a tentar travar. O efeito de normalização só desequilibrou ainda mais a balança. Não só foram derrotados, como a extrema-direita continuou a crescer.

Em Portugal, se vier uma crise económica (são cíclicas e o contexto externo não é animador), é expectável que os imigrantes, agora muito mais numerosos, venham a ser, como em todo o lado, o bode expiatório. O ambiente político que está a ser alimentado tornará isso ainda mais fácil. A direita tradicional está a meter-se num barco que a levará a portos sinistros, onde encontrará a derrota. Tratar a imigração como um problema quando ela é a nossa tábua de salvação é preparar uma bomba-relógio que rebentará quando as coisas correrem pior. Nesse campeonato, só ganhará quem se especializou no filão. Como os conservadores britânicos estão a aprender.»


A triste realidade dos factos

 


6.5.25

Quando não víamos as horas em telemóveis

 


Relógio «Deux Figurines», de vidro transparente e fosco com base iluminada. Duas mulheres de estilo grego seguram uma grinalda em redor do mostrador do relógio. Cerca de 1926.
René Lalique.

Daqui.

06.05.1968 – Barricadas em Paris



 

Na segunda-feira, 6 de Maio, começou a semana das barricadas. A partir das 15:00 horas, registaram-se muitos e graves confrontos entre estudantes e polícia. Neste vídeo, o resumo do que se passou durante os dias que se seguiram, até à reabertura da Sorbonne:



Na véspera, 5 de Maio, Cohn-Bendit, fizera a seguinte declaração: «Nous disons que l'État est partie prenante de l'antagonisme de classe, que l'État représente une classe. La bourgeoisie cherche à préserver une partie des étudiants, futurs cadres de la société. Le pouvoir possède la radio et la télévision, et un parlement à sa main. Nous allons nous expliquer directement dans la rue, nous allons pratiquer une politique de démocratie directe.»
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É mesmo assim

 


Quando um deputado quer aceder ao registo telefónico de um jornalista é grave, senhor Presidente. Não é só campanha

 


«Não sei se foi a extrema-direita que se aproveitou da beligerância que vive acampada nas redes sociais, e cresceu, ou se foi ela própria que, com a sua violência, fez das redes sociais o chiqueiro certo para funcionar como campo de treino. Certo é que essa forma de debater, em que ninguém ouve ninguém, não sendo já um exclusivo seu no teatro político, mostra-a como o original que as cópias tanto valorizam. Transportam consigo uma agenda que não precisa que eles cheguem ao poder para si impor. Vejam como o governo está em campanha: no Algarve e no Alentejo, o PSD faz da imigração o tema central da sua propaganda, no dia seguinte a AIMA anuncia que deu ordem de marcha a milhares de imigrantes.

Ainda assim, sendo mau que a agenda mediática fique contaminada pela forma de tratar os temas mais sensíveis acrescentando divisão a uma sociedade já muito polarizada, há coisas piores a acontecer. O sorriso nervoso de Marcelo, gracejando com a ameaça feita a políticos da oposição e a jornalistas, por parte do partido que está no poder, diz-nos que o Presidente sabe que nós sabemos que ele sabe que não é apenas campanha. Não se quer comprometer e percebe-se porquê. Agora, que há reais possibilidades de deixar Belém com estabilidade política e uma maioria (AD+IL) no Parlamento, Marcelo não dirá nada que possa prejudicar a sua família política. E, sobretudo, que possa prejudicar o seu legado político. Imaginem a festa de arromba no Palácio de Belém, se no dia 18 se formar uma maioria parlamentar.

Só que a ideia de vasculhar registos telefónicos para descobrir a fonte de um jornalista do Expresso é tão estúpida que dá para perceber que não se resume a um simples desvio de atenções sobre a nova lista de empresas da Spinumviva. Se fosse só isso, Marcelo tinha razão, era só campanha. Só que a ideia também é atingir o Expresso conotando-o com uma fonte socialista, contando para isso com a preciosa ajuda da notícia do Observador sobre Pedro Delgado Alves. Seguramente, a Hugo Carneiro não lhe passaria pela cabeça pôr a PJ a investigar quem são as fontes que informaram o Observador em matérias que estavam em segredo de justiça. Ao Expresso, aposto, também não. Revelar possíveis fontes de um jornalista para responder a uma declaração política do líder da oposição, que apontava ao primeiro-ministro a responsabilidade da divulgação da informação, pode parecer assunto de grande relevância jornalística, mas é só mais um passo no caminho de descredibilizar o jornalismo, entrincheirando-o. Coloca o jornalismo no ponto onde ele pode ser manietado, insinuando que é apenas fiel depositário de interesses alheios. Pode não ter sido essa a intenção, mas foi esse o resultado. No final, ficou a insinuação de que a fonte do Expresso foi o deputado socialista.

Aliás, para contraditar a insinuação do líder do PS, bastaria dizer que o primeiro-ministro garantia não ter sido ele a fonte do Expresso e acrescentar que havia uma série de pessoas, na Entidade da Transparência e no Parlamento, com acesso àquela informação. Ir mais longe do que isto é pretender insinuar a fonte. Eu não sei quem foi, nem estou interessado em saber, o Observador não sabe quem foi, o PSD não sabe quem foi e ninguém ficará a saber. Nem mesmo com a peregrina ideia de pôr a PJ a vasculhar o registo telefónico do jornalista do Expresso por interposto registo de um deputado. Sim, para o efeito pretendido só haveria interesse se no registo de Pedro Delgado Alves houvesse uma chamada para um telefone de um jornalista do Expresso. Sim, o deputado do PSD queria aceder ao registo telefónico de um jornalista. Quando a campanha terminar, faça o favor de se meter ao caminho, senhor Presidente, e avise os deputados que não há Democracia sem liberdade de imprensa. Se quem faz as leis não as conhece, estamos muito mal entregues.»


5.5.25

Houve um 5 de Maio que passei no Butão

 


Já passaram quinze anos. Fui como turista, mas sei de quem lá esteve muito recentemente, mais de um mês a trabalhar, e que pensa, tal como eu, que é um país que não se parece com nenhum outro. É dificil de explicar porquê, mas é assim…

Copio um paragráfo de um texto que escrevi lá nesse, 5 de Maio. Quem quiser pode clicar AQUI para ler o resto ou AQUI para mais reflexões sobre o país.

«Saio amanhã do Butão com uma enorme simpatia por este povo de uma delicadeza que roça a candura. E com uma grande curiosidade quanto à evolução política e social de tudo isto: para os nossos cérebros ocidentais, é difícil levar a sério o tal conceito de «Gross National Happiness». E confesso que ouvir dizer, sem pestanejar, que se mede o desenvolvimento e o progresso de um país pelo grau de sorriso das pessoas ultrapassa todas as utopias com que alguma vez sonhei…»

Cenas de um debate

 


O imigrante é uma arma

 


«Longe vão os tempos em que José Mário Branco escreveu “A cantiga é uma arma” – ainda que Luís Montenegro ache que vai ganhar votos (e se calhar vai) com o indigente hino “Deixem o Luís trabalhar”, que está uns metros abaixo, na escala da foleirice, do famoso “menino guerreiro” com que Santana Lopes se apresentou na campanha de 2005.

Para a AD, agora a grande arma chama-se “caça ao imigrante”. O imigrante vai ser rebaixado até ao infinito porque a AD precisa dos votos do Chega e de engordar a sua votação à conta do eleitorado que no ano passado votou no partido de André Ventura.

Valerá tudo. Sábado alvoreceu com o anúncio solene de Leitão Amaro de que nas próximas semanas vai atingir o lindo número de “18 mil pessoas com recusas já decididas” para abandonar o país. Mas que ninguém se engane: o Governo quer mostrar que está a trabalhar para nos libertar de imigrantes.

No Facebook, o socialista Francisco Assis escreveu: “O Governo e o PSD instrumentalizam de modo obsceno o complexo e sensível fenómeno da imigração com o exclusivo objectivo de obtenção de alguns ganhos eleitorais.”

A “trumpização” no discurso sobre imigrantes é óbvia, embora na lei o não seja. Montenegro chega à noite de sábado a ir muito mais longe do que Passos Coelho foi no ano passado no discurso de Faro. No comício de Paredes, Montenegro sacou da sua pistola particular: “Os que não cumprirem as regras temos de os fazer regressar à sua origem”. Afinal, este domingo em Bragança pôs Soflan no discurso: “O processo começou em Junho do ano passado. Não foi acelerado agora.” Pois. Só que interessou pôr o Governo a anunciar a suposta “montenegrização” do país.

Se o imigrante já é pau para toda a obra que os portugueses não querem fazer, o arranque da campanha serviu para mostrar que a humilhação do imigrante é uma arma eleitoral para a AD tentar recuperar os votos que foram para Ventura. Só falta associar a imigração à insegurança, como fez Passos Coelho no ano passado. A xenofobia vencerá.»


Desejo elementar

 


4.5.25

Azul, muito azul

 


Vaso, linha de esmaltes Black Iris, argila branca vidrada. Cerâmica Rookwood, Cincinnati. Morse de Arte Americana. Cerca de 1903.
Decorador: Charles (Carl) Schmidt.

Daqui.

Alô, eleitores do Chega, a AD chama por vós

 


Por pura «coincidência» de calendários, 4574 imigrantes serão avisados menos de duas semanas antes das eleições e deverão deixar Portugal logo a seguir.

Parvos somos, mas não tanto assim.

O PSD no seu labirinto

 



O apagão ressuscitou um monstro

 


«O SIRESP é calor em tempo de seca, tromba de água no dilúvio, cozido à portuguesa à noite. Quando a sua presença é dispensável, está sempre lá, prontinho a ser usado. Trata-se de um sistema em perfeitas condições de operacionalidade quando não é necessário operar com ele. Durante a última década e meia, apesar de se manter 24 horas por dia ligada à ficha, poucas vezes se falou da rede destinada às comunicações dos serviços de emergência e segurança em período de crise. O sistema mostrou pela primeira vez o grau de fiabilidade num incêndio no Caramulo, em 2013, voltou à cena mediática no pós-tragédia de Pedrógão, em 2017, e ressuscitou na segunda-feira, durante o apagão. Manteve-se, no entanto, moribundo, tornando a falhar em toda a linha. O único dado positivo que se consegue extrair desta análise rápida é que o SIRESP, ao contrário de outros serviços do Estado, é bastante previsível: em caso de catástrofe, nunca funciona. A falência deste monstro composto por antenas e falsas redundâncias ilustra bem a incompetência de sucessivos governos. Se custasse um euro, já seria caro, como o país paga milhões para sustentar o zombie, é lamentável que os constrangimentos persistam numa infraestrutura tão sensível e essencial para a segurança dos cidadãos, sobretudo em caso de catástrofe. Mas em vez de servir a comunidade, o SIRESP tem um potencial de destruição arrasador para credibilidade das instituições democráticas, porque ninguém compreende a inércia dos políticos perante o que está à vista de todos. Se não serve, é para desligar, depois de contratualizar um novo serviço. Passados quase 20 anos, será assim tão difícil perceber?»