24.11.24

A ética republicana não mora no Ministério da Saúde

 


«Com o inquérito da Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) em curso às mortes associadas às falhas no INEM, do qual fez depender o seu futuro político, a ministra da Saúde passou esta inspeção-geral para a sua dependência direta.

A 8 de novembro, a IGAS abriu inquérito. Entretanto, o Ministério Público anunciou a abertura de sete inquéritos aos acontecimentos. Dia 11, a ministra retira às suas secretárias de Estado a tutela do INEM e da IGAS. Dia 12, no Parlamento, a ministra da Saúde omitiu decisão na audição parlamentar e sem qualquer explicação pública posterior.

É legítimo que se conclua que omitiu porque sabia que seria fortemente censurada por querer manter-se em funções até às conclusões de um inquérito de uma entidade que afinal tinha passado a tutelar diretamente na véspera! Se esta circunstância não pode consubstanciar um inaceitável conflito de interesse, então o que pode?!

Importa recordar que, horas depois de sair da audição no Parlamento, em visita ao instituto, a ministra anunciou que chamou a si a tutela do INEM, mas continuou a esconder que fez o mesmo à IGAS! No âmbito desta decisão, de objetiva desautorização das duas secretárias de Estado, referiu que o seu dia-a-dia passa a ser dedicado em “mais de 70% a resolver os problemas do INEM”. E que tipo de problemas quer a ministra resolver na IGAS que justificam passar esta entidade para a sua dependência direta durante um inquérito em curso, do qual fez depender o seu destino?

Há um padrão comportamental nas decisões da ministra da Saúde — expetativas elevadas (rapidamente frustradas), passar as culpas para patamares inferiores, demitir compulsivamente dirigentes e administradores, omitir e mentir. Foi assim com a demissão de Fernando Araújo, as medidas falhadas do Plano de Emergência, a crise no acesso às urgências no verão, o apagão da atividade do SNS no portal da transparência, a mentira sobre o concurso público dos helicópteros, a demissão do presidente do INEM e a negligência perante o previsível impacto das greves na emergência médica.

Lembramo-nos bem das declarações do Presidente da República que levaram à demissão de Marta Temido. Lembramo-nos bem da postura de Luís Montenegro que, na oposição, por muito menos, não esperou por conclusões dos inquéritos para pedir a demissão de ministros e secretários de Estado. O primeiro-ministro foi mais exigente com os outros do que é hoje com os governantes do seu próprio partido e, pelos vistos, consigo próprio. Decididamente, a ética republicana não mora no Ministério da Saúde.»