«"Um voto que poderia ter sido subscrito pelo próprio Donald Trump": foi assim que o PCP definiu o voto de condenação apresentado pelo Bloco de Esquerda no Parlamento pelos "bombardeamentos e crimes contra a humanidade sobre as populações da região de Ghouta, na Síria". Os comunistas, a par dos dois deputados do partido ecologista Os Verdes, foram assim os únicos a votar contra o texto do Bloco de Esquerda.»
.24.2.18
24.02.1927 - David Mourão-Ferreira
David Mourão-Ferreira faria hoje 91 anos. Um dos nossos grandes poetas do século XX, ficcionista também (quem não se recorda de Um amor feliz), acidentalmente político como Secretário de Estado da Cultura, de 1976 a Janeiro de 1978 e em 1979, autor de alguns poemas imortalizados pelo fado, na voz de Amália Rodrigues.
Dois poemas ditos pelo próprio:
Amália:
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Ensino Superior e asneira à deriva
Foi com espanto que vi esta (possível) decisão do governo. Se acham que é necessário (até parece que não, ficam sempre por preencher muitos lugares por esse país adentro, mas enfim), por que é que é não se abrem mais vagas no interior, SEM as reduzir em Lisboa e Porto? Isso, sim, daria mais hipóteses a todos. Ou o que se pretende é que nas duas principais cidades fiquem os melhores alunos (já que, globalmente, conseguirão entrar menos) e chutar os outros para onde não querem? Oferecê-los às privadas? Repovoar o reino com «castigos»? Falta de pachorra!
.A zona cinzenta
José Pacheco Pereira no Público de hoje:
«Há um problema na política em democracia, e na política portuguesa em particular, que só se resolve com as pessoas. Nem as leis, nem muitas vezes uma lista de boas práticas, nem controlos burocráticos, são eficazes para o resolver. E, sem se darem passos para o resolver, não se consegue mitigar a pressão populista, nem prestigiar a vida política ou o exercício de cargos públicos.
Qualquer pessoa que tenha experiência política ou que conviva com a vida pública, mesmo para lá da política, nas instituições e no Estado, sabe que há muitas práticas que, não sendo ilegais, são inaceitáveis em si mesmas e por maioria de razão para a imagem das instituições e dos homens. Refiro-me a esta coisa tão simples: o acesso a determinados tipos de poder, quase sempre pequenos poderes, permite utilizar lugares e funções em proveito próprio ou dos próximos. Insisto: não estou a falar de crimes, nem mesmo na maioria dos casos de evidentes ilegalidades — estou a falar de abusos e aproveitamentos, infelizmente tão comuns na vida pública portuguesa. Conheci muita gente, e não é retórica o “muita”, que quando acede a um lugar ou um cargo deixa de ter a economia que a maioria das pessoas sem poder tem. Arranja maneira de quase todas as despesas pessoais e nalguns casos dos seus familiares e próximos serem cobertas por dinheiros públicos, aumenta-se a si própria, de forma directa ou indirecta, através de alcavalas ou de prebendas, usa o poder que tem para beneficiar amigos, familiares ou pessoas a quem se devem favores ou se quer que fiquem a dever favores.
Os instrumentos usados são muitas vezes meios que seriam legítimos em si mesmos — na verdade, ninguém deve “pagar” para ter um cargo, suportando despesas que lhe são inerentes e tem direito a que lhe paguem viagens, despesas de deslocações e estadia ou outras do mesmo género. Mas outra coisa é usar cada um destes direitos para os “aproveitar” para melhorar o seu trem de vida, com mil e uma pequenas (às vezes grandes) entorses ao que devia ser, sendo pagos por viagens e despesas hipotéticas com critérios que maximizam o que se recebe, sem apresentação de documentação, porque se está muitas vezes numa posição em que existe um poder discricionário para decidir pagamentos e prescindir de comprovativos. É isso que muitas auditorias infelizmente revelam, mesmo quando não há aparentes ilegalidades.
Essas pessoas acham que isso é “natural”, não pensam que exista qualquer problema e que é uma espécie de direito próprio e conhecem mil e um truques para maximizarem os seus “aproveitamentos”. No caso do Parlamento Europeu, eu só percebi muitas das práticas habituais que se passavam à minha volta quando estava para me vir embora, porque quem as conhecia escondia-as. Algumas eram conhecidas e muitas vezes motivo de escândalo, como seja o emprego de familiares como assessores, nalguns casos pagando a uma única pessoa que ganhava o que devia financiar um gabinete, assim como a utilização de transportes e viagens desnecessárias, quando estas eram pagas por um preço simbólico, acima do valor real.
23.2.18
Dica (722)
What Happened To Europe’s Left? (Jan Rovny)
«It may be tempting to connect the failure of the European left to the recent economic recession. It was during this recession or its aftermath that many left-wing governments (in Britain, Spain, Denmark) lost their mandates. Undeniably, the recession with its massive social cost caused much electoral instability, and opened a political door to various populist challengers. It would be, however, naive to suggest that the economic crisis was anything other than a catalyst. It was an accelerator that speeded up the onset of consequences of a structural development that we have been witnessing for at least three decades.»
.Passaram ainda além da Traquitana
«O PSD pós-congresso não é um saco de gatos, é um ninho de vespas aziadas. Dos apupos à ex-braço-direito de Marinho Pinto, agora vice-presidente do PSD, passando pela voz não tão grossa, mas grosseira, de Montenegro - que afirmou no congresso: "Não deixe que o PSD se transforme no grupo de amigos de Rui Rio ou na agremiação dos amigos de Rui Rio", enquanto se preparava para formar um PSD de inimigos de Rui Rio - até à falta de Hugo Soares a uma reunião da Comissão Política, justificada por Rio e absolutamente injustificável segundo o ainda líder da bancada parlamentar, tudo leva a concluir que o PSD é um partido aos pedaços. Se a chamada Geringonça tivesse um dia assim, seria o fim. Se alcunharam o actual Governo de Geringonça, o mínimo é dar o nome de Traquitana a este PSD.
Enquanto Rui Rio se reúne duas horas e meia com António Costa para iniciar uma espécie de diálogo educado, a vice-presidente diz, em entrevista à SIC Notícias, que o actual Governo lhe "repugna por ser de esquerda". Deduzimos que Rio terá ido para a reunião com Costa munido de um daqueles sacos para vomitar que há nos aviões. Sendo esta crónica sobre o Congresso do PSD, não poderia deixar de recordar Sá Carneiro. Esta frase da ex-bastonária da Ordem dos Advogados faria Sá Carneiro dar voltas no caixão; o que seria terrível porque poderia dar origem a mais uma comissão de inquérito ao caso Camarate. Penso que o próprio Passos não chegaria tão longe. Ou seja, Elina foi além do Passos, proeza difícil se relembrarmos que o primeiro foi além da troika.
Escrevo esta crónica na noite de quarta-feira, na verdade já é quinta e, para bem de Rui Rio, suponho que quando o estimado e esbelto leitor estiver a ler, já Fernando Mimoso Negrão será o novo líder parlamentar do PSD. Não quero fazer trocadilhos com o apelido do recém-eleito, mas sempre achei que dava um excelente nome para actor de filmes porno. Dá jeito porque vai ser esse o ambiente na bancada que vai gerir.
Acrescentando a tudo isto, que descrevi nas linhas anteriores, Santana Lopes, que no Congresso foi quem protegeu Rui Rio como se fosse o seu bebé, talvez por solidariedade ao que teve de passar enquanto ainda estava na incubadora, veio avisar, e cito, não vão pensar que sou eu que uso uma linguagem popular: "Se Rio disser que vai para um Governo do PS, temos o caldo entornado." Santana, desta vez, não anda por aí, está aqui, em cima de Rio.
Entretanto, o denominado, com algum exagero, líder do PSD aparece sorridente na televisão, fazendo um sorriso às polémicas, e afirma: "Vai haver mais histórias. Cá estou para elas. É disso que eu gosto." Espero que Rui Rio não seja daquelas pessoas piegas que gosta de histórias com um final feliz.»
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22.2.18
PSD: Criatividade Eleitoral
Fernando Negrão só teve 35 votos a favor na eleição para dirigir a bancada parlamentar do PSD, de um total de 88, mas soma-lhes os brancos (32), que considera serem «benefício da dúvida». Ena!
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Coragem: é a nossa vez
«Até há pouco tempo era considerado alarmismo a mais comparar o atual panorama político mundial aos perigosos anos 30 e 40 do século XX europeu. Hoje, essa questão paira no ar insistentemente: estamos na mesma atmosfera perigosa que precedeu a Segunda Guerra Mundial?
Líderes mundiais semearam retóricas de ódio e de discriminação, confundiram a opinião pública com notícias inventadas. Dos Estados Unidos à Turquia, à Hungria, às Filipinas, à Líbia, a Myanmar. Até em Portugal vimos já a discriminação e uma retórica aberta e perigosa que considera que algumas pessoas são menos humanas que outras.
O Relatório Anual da Amnistia Internacional sobre o estado dos direitos humanos no mundo mostra que já estamos a viver as consequências dessa retórica discriminatória. Desde os refugiados que vivem num limbo, sem segurança e à mercê do ódio daqueles que os perseguem e não deixam viver devido à sua religião ou etnia.
Nos primeiros dias do atual Presidente dos EUA em funções vimos a tentativa deste em demonizar todos os refugiados, muçulmanos e mexicanos. Vimos também a limpeza étnica dos rohingya em Myanmar. Na Hungria vimos as fronteiras do acolhimento fecharem-se aos refugiados. No Egito testemunhámos a perseguição feita a cristãos, a homossexuais, a ONG e a defensores de direitos humanos, especialmente dos direitos das mulheres.
Portugal não é exceção no que diz respeito à discriminação. País aberto ao mundo, continuamos a discriminar os outros. São muitas as formas como em Portugal alguns consideram os seus semelhantes menos humanos, seja por discriminação étnica e racial, seja pela discriminação e violência de género, seja no impedimento de acesso a condições dignas de habitação para os mais pobres e frágeis, com especial relevo das pessoas de ascendência africana e das comunidades ciganas, desalojadas à força e sem acesso a programas de realojamento dignos.
21.2.18
Marisa: a presidência do Eurogrupo “tem constrangimentos na abordagem dos problemas”
«O desempenho destas funções, na opinião da eurodeputada do Bloco, “limita a atuação de Mário Centeno, mais do que libertá-lo”. Apesar de tudo, Marisa crê que “há aqui alguma autoridade de alguém que conseguiu no país, com politicas contra-cíclicas e obviamente com um acordo maioritário parlamentar à esquerda, fazer exatamente aquilo que o Eurogrupo não permitiria”.
Finalmente, fica à espera de saber “o que vai ganhar”: “se é a influência de Mário Centeno no Eurogrupo, se é a influência do Eurogrupo em Mário Centeno”.»
Daqui.
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Dica (721)
Understanding Populism In Eastern Europe (Sławomir Sierakowski)
«Eastern European populism differs from that in the West in important ways, owing to the region’s weak liberal tradition, which translates into ineffective checks and balances on government and shallow support for institutions such as freedom of expression and independent courts. Sławomir Sierakowski, the founder of the Krytyka Polityczna movement, explains.» (Vídeo)
.Guião de uma direita infeliz
Francisco Louçã, no Expresso Economia de 17.02.2018.
«A direita tem um problema que a condena, sabe-se derrotada. O conclave do PSD vem lembrá-lo urbi et orbi, discutindo o que fazer com a calamidade de 2019 e com o líder vencível nessa fatídica eleição. Havia de se chegar aqui: nas eleições internas de janeiro, o que levantava ânimo era o fugaz governo de 2005, então despedido por indecente e má figura pelo Presidente, enquanto a era da troika foi sorrateiramente evocada como um deserto antes do oásis, apesar de este ter sido maliciosamente capturado por corsários ocasionais. Para o PSD, a história resume-se assim a carreiras incomodadas, pouco cuidando de quem paga impostos, procura emprego e vê os filhos emigrar. Falta gente vivida nessa narrativa.
Mas, perdoe-me quem se fascinar por estes mentideros, o problema dos problemas é mesmo que a direita política não representa a direita económica e talvez nem sequer a direita social. E desconfio de que uns e outros sabem dessa síndrome Deolinda.
Rui Rio e o futuro melhor
A moção que Rio apresenta este fim de semana, que já foi o seu mote de campanha para a presidência do PSD, abunda naqueles condimentos de língua de pau que fazem estes documentos úteis se irrelevantes. Ele há um Portugal que "se supera", se tiver "um propósito" e o "rumo certo". Já ouviu isto em algum lugar? A candura não ofende, mas ressoa também o tom celebratório do líder, que afinal reconhece que todos antes dele falharam, pois houve "quase duas décadas em que os partidos e os políticos não conseguiram conceber e transmitir uma visão inspiradora, coerente e convincente, capaz de mobilizar os portugueses para uma sociedade de futuro". Já se sabe, com uma "visão inspiradora", o tal "propósito", o líder será "capaz de mobilizar os portugueses para uma sociedade de futuro".
Temos futuro, portanto. Exatamente catorze futuros, alguns repetidos: a política de Rio vai "garantir o futuro", que será "melhor para todos", ou só "melhor", com uma "visão de futuro", para uma "sociedade de futuro", "rumo ao futuro", tudo "orientado para o futuro", com "esperança num futuro melhor".
Esta ideia de salvação é o melhor que Rio apresenta. Não por ser boa, é até arrogante, mas porque é a mais moderna: é assim que se faz a política populista nos dias de hoje. Líderes de discurso vazio, que se adaptam ao que for, de promessas várias, que se adaptam a quem for, e que procuram concentrar em si todo o poder, tais messias, esses são os émulos do sucesso Macron.
Rio tem dias nesse percurso salvífico, já teve êxito ao fazer frente a Pinto da Costa, o que nenhum presidente de Câmara tinha ousado, mas lançou depois Valentim Loureiro para a Junta Metropolitana do Porto, e apoiou e desapoiou Rui Moreira, por razões sempre misteriosas. A coerência, se porventura existe, está no que escreve agora: quer um líder com uma "visão" e um "propósito", que é simplesmente ele próprio.
A desvantagem da vantagem
Só que, para triunfar, Rio tem uma desvantagem que esmorece tanta virtude: é que quem não o conhece já o conhece bem demais. É antigo para estes propósitos e falta-lhe o carisma da renovação, não surpreende nem as emoções nem as razões. Tudo o que disser é repetido e, pior, não suscita curiosidade. A vantagem, em contrapartida, é que diz coisas novas mesmo quando repisa o mantra tradicional: Rio quer um "Estado forte e organizado para libertar os cidadãos", o que o distingue suavemente daquela direita estadófaga que tem como refrão "menos mas melhor Estado". No caso do presidente do PSD, é o seu temor das ameaças, como a globalização, insegurança, alterações climáticas e decomposição dos regimes, que o move para um "Estado forte", sempre prometendo que os cidadãos serão "libertados". Ou seja, é um liberalismo temperado por medos, que exige que o Estado abra negócios, mas que precisa de proteção, mais do que no passado.
Rui Rio e a sua moção são, portanto, a recapitulação daquela social-democracia mesclada com liberalismo no discurso e suficientemente negocista na governação que fez os melhores sucessos do PSD. E, no entanto, a direita económica não confia nele.
20.2.18
Polícia amigo, o povo está contigo
«No topo da tabela, as polícias inspiram confiança de forma transversal ao espectro partidário, com os eleitores do PSD, CDS, BE e CDU a convergirem na pontuação (15) e os do PS a mostrarem-se menos entusiastas (12).»
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O momento Kodak
«Alguém chamou "partidos Kodak" a muitos dos partidos que marcaram durante décadas a vida política da sociedade ocidental. Havia uma razão não fotográfica para isso: a marca que George Eastman fundou em 1888 dominou durante gerações o mundo da fotografia. A revolução digital levou ao colapso da empresa do dia para a noite. O PSD não se defronta com um "momento Kodak". Mas, ao aclamar Rui Rio como novo líder, o PSD não deixou de mostrar sinais de nervosismo: à porta já está Luís Montenegro, antecipando-se em versão Speedy Gonzalez a toda a concorrência interna (incluindo Passos Coelho), para lhe suceder. E isso acontecerá se, em 2019, o PSD não voltar ao poder. Seja como vencedor das eleições ou coligado num bloco central ou com o CDS. Rui Rio venceu, mas tem um quarto com vista para a guilhotina. E ele sabe isso. Talvez por isso o seu discurso de encerramento do Congresso do PSD tenha sido tão abstracto: na ausência de propostas políticas concretas, Rui Rio apelou à fé. É certo que o novo líder falou das questões sociais (um tema tabu no tempo de Passos Coelho), de acordos de regime, de vontade de vencer. Mas tudo pareceu ser ainda muito genérico.
O PSD, para regressar ao poder, neste tempo de bonança económica que favorece o Governo, precisa de ter um projecto com propostas sólidas e não generalidades com que todos podem concordar, porque são demasiado vagas. Precisa de abrir as janelas à sociedade civil (como soube fazer o CDS sob a batuta de Paulo Portas, antes de este rumar ao mundo dos negócios). Precisa de deixar de ser um partido apenas delimitado pelos seus políticos de carreira. Precisa de falar concretamente de outros temas que continuam a não ser considerados importantes: ambiente, cultura, segurança, património. Rui Rio, ao contrário do que se possa pensar, tem o relógio a correr contra si: 2019, com a sua chuva de eleições, é já aí. E esse é o tempo do novo líder neste PSD que necessita de poder como de pão-de-ló.»
Fernando Sobral
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19.2.18
Dica (720)
Informe especial: Capitalismo financiero, digital y Estado policíaco (William I. Robinson)
«William Robinson, profesor de la Universidad de California, advierte sobre la acumulación de tensiones internacionales que podrían derivar en el estallido de una nueva crisis global. Las condiciones estructurales que desataron la gran recesión de 2008 siguen vigentes. Estas incluyen niveles sin precedentes de desigualdad social, endeudamiento público y privado y especulación financiera. El detonante, sostiene, podría ser el estallido de la burbuja bursátil, el impago de deudas o una nueva conflagración militar internacional.»
.19.02.1997 – O dia em que morreu Rómulo de Carvalho / António Gedeão
Rómulo de Carvalho / António Gedeão morreu em 19 de Fevereiro de 1997. Foi um grande professor de Química, estudioso e grande divulgador da História da Ciência, que os seus alunos do Liceu Pedro Nunes e do Liceu Camões nunca esqueceram.
Também poeta, autor de numerosos livros e do texto que deu vida à inesquecível canção Pedra Filosofal. Um pretexto como qualquer outro para a ouvir de novo, com a beleza de sempre e oportuna, hoje como em 1969, quando Manuel Freire musicou o poema publicado em Movimento Perpétuo (1956).
Fica também este manuscrito com parte do poema «Como será estar contente», publicado em Máquina de Fogo, 1960:
Lançar os olhos em volta, / moderado e complacente, / e tratar com toda a gente / sem tristeza nem revolta? / Sentir-se um homem feliz, / satisfeito com o que sente, / com o que pensa e com o que diz? / Como será estar contente?
Deve haver qualquer mecânica, / qualquer retesada mola / que se solta e desenrola / no próprio instante preciso, / para que um homem de carne, / de olhos pregados no rosto, / possa olhar e rir com gosto / sem estranhar o som do riso. (...)
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Infiltrados e infiltradas
Absolutamente extraordinário!
«Creía que eso de infiltrar maderos o picoletos entre los malos era una cosa delicada, que por razones obvias se llevaba a cabo con discreción extrema. (…)
¿Adivinan ustedes cómo se recluta en España a policías para infiltrarlos entre delincuentes y terroristas? Pues sí, lo han adivinado: mediante convocatorias públicas que además salen en los periódicos. "Interior selecciona a 40 policías para infiltrarlos en grupos criminales", titulaba sin complejos un diario hace un par de semanas. A continuación exponía los criterios de selección –idiomas, pruebas psicotécnicas y psicológicas– y luego, eso es lo más bonito, detallaba en qué iba a consistir la tarea de quienes superasen tales pruebas.»
Arturo Pérez-Reverte
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Rios não confluentes
«Durante três dias observadores e oradores do congresso do PSD dedicaram-se ao “sexo dos anjos”, como lhe chamou Rui Rio: o regresso do bloco central. Se o debate é saber se o PSD está disponível para debater com o PS ou qualquer outro partido as grandes reformas que defende, é só um debate idiota. Qualquer partido que não seja liderado pelo ressentimento, como foi nos últimos dois anos, está disponível para aprovar as reformas que defende. Se se trata de permitir que o PS passe a governar com o pisca-pisca, umas vezes à esquerda outras vezes à direita, não me parece que o próximo ano e meio o permita e que seja sequer isso que esteja na cabeça de Rio. Nas suas duas intervenções Rio deixou clara a naturalidade com isto tem de ser encarado. O facto deste ser o grande cisma deste congresso diz até que ponto é nebulosa toda a restante linha estratégica de Rui Rio.
É significativo que o discurso politicamente mais clarificador na noite de sexta-feira não tenha sido o do novo líder, mas a do cessante. Passos Coelho reafirmou o que disse nos últimos anos sem que, em nenhum momento, tenha sido contrariado no congresso. A sua intervenção, que pretendeu reafirmar a natureza “pragmática” do PSD, não poderia ter sido mais ideológica. Uma intervenção fortemente antissocial-democrata, que insistiu em tratar serviços e prestações públicas como mera resposta a clientelas eleitorais. E que repisou aquela que foi a maior marca discursiva da sua liderança: a ideia de que tudo o que permita que as pessoas respirarem um pouco é irresponsável. Se é tempo de crise são necessários sacrifícios, se a economia melhora continuam a ser necessários sacrifícios para prevenir o futuro. A austeridade eterna é a promessa que Passos Coelho quer que o PSD seja portador. O problema é que se o futuro for sempre uma promessa adiada a governação faz-se sempre contra a maioria das pessoas. Passos diz que isso é não querer agradar.
O grande problema das intervenções de Rui Rio (o de abertura foi muito mais fraco do que o de encerramento), é que julga poder manter-se na linha deste discurso passista em matéria económica, mudar o tom na agenda social e fazer ruturas do ponto de vista da saúde da nossa democracia. A crise da confiança dos cidadãos na democracia não resulta de questões institucionais, como o modo de eleição dos deputados, mesmo que essa seja a forma mais fácil de lidar com o problema. Ela é transversal a países com modos muito diferentes de eleger deputados e desenhos institucionais muito distintos. A crise da democracia corresponde à incapacidade da política responder às ansiedades das pessoas. É uma crise substantiva, com uma forte relevância no crescimento da desigualdade, não é uma crise formal. E Rio acredita que é mexendo na forma que resolve a substância.
Ninguém conhece em grande pormenor o que Rio considera serem “as reformas que são precisas” em matéria de regime político. Para além de umas generalidades, umas generosas outras disparatadas, elas não passam de um nobre desconforto com uma política que se afasta das pessoas e com um discurso demagógico que ganha espaço, a que ele próprio não consegue responder. Mesmo a sua corajosa posição em relação à justicialização da política e a politização da justiça, que subscrevo na integra, pouco ou nada depende de qualquer “reforma estrutural”. E a sua coragem logo tropeçou na escolha de Elina Fraga, antiga bastonária da Ordem dos Advogados que, em 2014, fez uma queixa-crime contra Passos Coelho e o seu governo por causa do mapa judiciário. Querem mais judicialização da política do que isto? Rui Rio tenta-se afastar da política de casos e escândalo, da demagogia e do justicialismo, em que a direita partidária e mediática tem apostado. É nobre da sua parte, mas poucas vezes um líder teve tão desfasado da corrente para onde segue o seu espaço político. Ao ponto de não conseguir rodear-se de pessoas que cumpram os mínimos nesta sua exigência.
18.2.18
E quanto a Santana Lopes
«Quando o Presidente do teu clube te diz que não podes ler jornais nem ver televisão e ainda por cima és recasado.»
Rui Rocha no Facebook
.O «novo» PSD
Só agora ouvi o novo bem-amado líder, já que quando ele falou estava eu a almoçar na praia. Que eles continuem a ser um Rio, mas nestes tempos de seca não me parece que levem muita água. Bom fim de Domingo, Geringonça.
.Este artigo não tem título
«Não tem título para que não se corra o risco de formar impressões baseadas apenas no título. E é curto para que seja mais facilmente processado.
Vivemos numa sociedade em que tudo é rápido. Como vivemos na era dos anglicismos, talvez seja melhor dizer “fast”. Não há tempo para digerir a informação, para pensar e reflectir. Não sei se este termo existe, mas chamar-lhe-ei ‘fast-thinking’. A informação tem de aparecer já dissecada e processada para que não tenha de se perder um segundo nesse processo. Alguém que dê as respostas prontas, os resultados, para que não tenhamos de nos centrar no processo.
Olhamos à nossa volta e tudo acontece muito rápido. As crianças acumulam entradas de agendas gigantescas e assustadoras, divididas a cem à hora entre aulas, actividades extracurriculares e afins. Fins-de-semana de correria, a saltitar entre festas de anos dos amigos, actividades culturais, desportivas e afins. Férias programadas ao minuto, para que não sobre qualquer tempo livre, para que tenham um segundo que permita imaginar ou inventar algo para fazer.
Temos também os famosos “ATL” – Ateliers de Tempos Livres... onde existe tudo menos tempo livre. Actividades e mais actividades, mais entradas de agenda.
Se as actividades são boas? Claro que sim. Socializar com os amigos? Fantástico! Passear com a família e descobrir coisas novas? Obviamente que sim. Mas também é necessário algum tempo para não fazer nada. Tempo efectivamente livre, no qual as crianças aprendam a estar, a pensar, sem tarefas e programas. Sem o “ter de fazer”.
Estas crianças crescem e tornam-se em adolescentes de imediato. Membros entusiastas do “aqui e agora”. Do “já”, do “imediatamente”. Não há tempo para esperar por nada. O prazer não pode ser adiado e a tolerância à frustração é baixa ou inexistente. Perde-se, por vezes, o sentido da vida.
Estes adolescentes crescem e tornam-se adultos, muitas vezes impulsivos, que reagem sem o devido processamento cognitivo. Vivem segundo as primeiras impressões, as quais são aceites como válidas, como certas, sem contestação ou argumentário. Impressões que acabam por influenciar emoções e comportamentos. Tudo tem que ser muito rápido. A fotografia à comida, partilhada numa certa hora que, dizem as estatísticas, é a hora em que existe maior probabilidade de ser visualizada e, claro está, a ânsia de receber “likes”. As fotografias dos filhos, nas mais variadas situações e que se espalham pelas redes sociais com uma rapidez incrível, sem que os pais tenham a mínima noção de onde podem ir parar. Ou que uso poderão vir a ter...
Se algo não for fotografado, partilhado e “gostado”, é como se não existisse. As vivências deixam de ter o significado da experiência, dependendo mais da reacção dos outros a essas mesmas vivências. O número de “likes”, visualizações e partilhas dita tudo hoje em dia.
As redes sociais têm muitas vantagens, é certo, desde que não nos anulem a capacidade de pensar, com calma. Reflectir antes de agir ou reagir.
A pressão em nosso redor é de tal forma elevada que também eu, confesso, sou muitas vezes arrastada para esta forma “fast” de viver. Não apenas a agenda caótica, a multiplicidade de projectos, desafios e obrigações, mas também a necessidade de estar a par, de perceber em tempo quase real o que se passa à nossa volta. É como colocar os carris da linha de ferro com o comboio nas costas...
Vivemos tempos em que impera o imediatismo. Tente-se encontrar um equilíbrio, ou a velocidade deixará tudo para trás, inclusive nós próprios, esquecidos por uma vida demasiado rápida para reter o essencial.»
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