21.9.19

António Costa e a falta de memória – ou pior do que isso



Repesco um texto publicado no Expresso em 04.10.2016 – um ano depois das últimas legislativas. Será bom relê-lo com muita atenção, depois de António Costa ter afirmado ontem, em entrevista a Daniel Oliveira, o seguinte: «Vamos ser claros: esta solução [a futura Geringonça] foi construída apesar do BE, e a que depois o BE se juntou. Esta é a realidade dos factos» – pura mentira, como Fernando Rosas e Francisco Louçã recordaram, ontem à noite noite, em dois programas de televisão.

Ainda as urnas de 04.10.2015 não estavam abertas e já se reuniam elementos do PS e do BE – a pedido e por iniciativa de António Costa.

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Polígrafo especial 2021 (ou a fábula)



«Boa noite, seja bem-vindo a esta edição especial de final de 2021. Hoje vamos responder a muitos e-mails de leitores que nos pedem para verificar factos a partir das promessas dos programas eleitorais de 2019, que deram lugar à composição do atual Parlamento.

1. A economia vai recuperar? Todos os programas eleitorais de 2019 baseavam-se em cenários de crescimento económico para quatro anos que não se estão a cumprir. Nos meses seguintes às eleições legislativas, várias instituições internacionais (FMI, BCE, OCDE, UE) começaram a publicar previsões em baixa para a economia europeia. Com a reeleição do Presidente Trump em 2020, a guerra comercial dos EUA alargou-se à Europa, o que reduziu a eficácia das políticas do BCE e do investimento público da Alemanha, e tem aumentado as dívidas públicas europeias. O impacto na economia portuguesa levou ao adiamento ou escalonamento de várias promessas eleitorais de 2019, nomeadamente as que previam descidas de impostos e aumentos de despesa pública expressivos.

2. As contas públicas vão manter-se equilibradas? A promessa de descer a dívida pública para menos de 100% do PIB em 2023 soa já distante. Também o aumento do investimento público está aquém do defendido em 2019. Estão em estudo novas taxas e fontes de receita alternativas, mesmo que a carga fiscal continue a somar recordes.

3. Os serviços públicos vão continuar a degradar-se? A situação mais grave é na saúde, onde o investimento continua abaixo das necessidades, há demissões em bloco e os profissionais continuam a sair para o estrangeiro e para o privado. O aumento do número de consultas e de cirurgias não supre as carências, como se vê nas listas de espera. Sondagens recentes mostram que esta é a área que gera maior descontentamento social.

4. Os salários vão continuar baixos? Apesar dos compromissos dos programas eleitorais pela dinamização dos salários médios, o seu crescimento continua a ser feito quase apenas à custa do aumento do salário mínimo, e mesmo esse foi menor depois das eleições de 2019.

5. Os programas de habitação acessível contribuíram para a descida das rendas? Em média, não. O mercado de arrendamento nas grandes cidades não embarateceu.

6. As taxas de juro vão continuar baixas? É essa a perspetiva do BCE, que tem prolongado os seus programas de estímulo económico, mesmo que as cisões entre os governadores da zona euro no apoio a esses programas seja hoje mais evidente do que no tempo de Mario Draghi, que era um construtor de consensos. A sua sucessora, Christine Lagarde, tem tido maiores dificuldades, até porque não é reconhecida entre os seus pares como uma “banqueira central”, mas como uma política. O crescimento do crédito, a par da bolha imobiliária, fazem temer pelo impacto de uma futura subida das taxas de juro em Portugal, mas na Europa a discussão é outra: a inflação permanece demasiado baixa.

7. Quando veremos concluídos os processos judiciais BES e Operação Marquês? Não havia referências explícitas a estes casos nos programas eleitorais de 2019, mas todos defendiam reforço de meios para a Justiça, que foram tímidos. Os casos mediáticos de 2019 continuam a arrastar-se nos tribunais, com exceção do caso de Rui Pinto/Football Leaks, alvo de uma celeridade surpreendente. Recorde-se que, sendo mediático, Rui Pinto não era um “poderoso”.

8. O ministro das Finanças vai resistir? Depois da saída de Mário Centeno a meio da legislatura para um cargo internacional, o novo ministro das Finanças lida com um cenário orçamental difícil e uma popularidade baixa. Não há, no entanto, informações que indiquem a sua substituição. Até porque ninguém parece querer o seu lugar.

9. O governo vai terminar a legislatura? A desaceleração da economia, o consequente adiamento de promessas eleitorais e a degradação dos serviços públicos levou a uma intensificação da oposição parlamentar, à esquerda e à direita, a greves e manifestações. O governo garante estar estável, mas queixa-se de falta de apoio político para as reformas que defende, quer dos partidos quer do Presidente. A relação do governo com Marcelo, reeleito este ano, é hoje tensa.

10. Os partidos sabiam em 2019 que os pressupostos económicos dos seus programas eleitorais jamais seriam cumpridos? Esta pergunta não é passível de confirmação.

11. Vamos ter mais austeridade? ...chegámos ao fim do nosso tempo. Voltamos no próximo ano para nova confirmação de factos. Tenha um Feliz Natal. E cumpra a nova campanha pública que, depois da guerra aos pombos em Lisboa e às gaivotas no Porto, vários municípios adotaram: “Não alimente as vacas.”»

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20.9.19

Parece anedota mas não é




«A largura do boletim de voto excede em cerca de meio centímetro a do envelope onde o documento deve ser inserido, o que impossibilita que os papéis sejam enviados para Portugal em condições de serem contabilizados, queixam-se os emigrantes. Tudo se torna ainda pior uma vez que, nas orientações facultadas pela Comissão Nacional de Eleições (CNE) aos cidadãos residentes no estrangeiro, o Ministério da Administração Interna (MAI) exige expressamente que as dobras já existentes no documento sejam respeitadas, impedindo portanto que este possa ser acondicionado de outras formas no envelope.»

Alguém é responsável por esta falta de profissionalismo. Nada lhe acontece?
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Natalidade? Problema resolvido




É só manter o ritmo e resolve-se a questão da natalidade e da desertificação: 7 milhões e 300 mil nos próximos dez anos. O mérito foi certamente de Centeno e de Costa «apesar do Bloco de Esquerda». Siga o baile e venha outro motivo de glória na campanha eleitoral.
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Fernanda Montenegro



(Fotografia para a capa da revista "451" por Mariana Maltoni)

«Quando acenderem as fogueiras, eu quero estar ao lado das bruxas.»
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Costa e os espelhos



«Foi preciso um frente a frente reunindo Costa e Rio à volta de meia dúzia de assuntos, num debate caracterizado pela ausência de ideias sobre o SNS.

Quando o PS parecia caminhar sólido rumo à maioria absoluta, o que permitiu uma inversão de percepção tão súbita, agora que estamos a três dias do início da recta final dos 15 dias de campanha? A ideia de que estas eleições legislativas são mais antecipáveis de que fava em bolo-rei, sofreu um significativo revés. Agora, não se antecipa somente se o PS terá ou não maioria absoluta. Agora debate-se, novamente, se Rui Rio pode afinal ter futuro na liderança do PSD num cenário pós-eleições. Foi António Costa que permitiu que tal sucedesse, foi ele que reabriu um dossier que estava morto e enterrado, ressuscitando a dúvida.

Há uma razão evidente que levou António Costa a não vencer o debate com Rui Rio, como seria expectável: o primeiro-ministro teve medo da soberba. Quando as sondagens colocam o PS próximo da maioria absoluta, a intenção é não forçar a barra, não arriscar o passo em falso, não colocar o eleitorado entre a espada e a parede, não demonstrar arrogância. Um conjunto de nãos. Falsos. Como se o PS não quisesse verdadeiramente a maioria absoluta, como se lhe fosse quase indiferente, como se não fosse aquilo que o seu aparelho mais espera e anseia na expectativa da redistribuição. Fazer de morto, matando o instinto. Evitar a soberba. Sinalizar alguma afabilidade e a condescendência como trunfos. António Costa quis fazer pleno para bingo e nem saiu da linha. Foi certinho. Traiu-se. Assistimos, assim, a um político atípico, anulando o seu "killer instinct", a olhar-se ao espelho sem saber qual o melhor reflexo, sem querer arrasar um Rio a quem bastou ser Rio. Sabe-se agora, Rio é muito bom sem oposição. Ou como candidato presidenciável à imagem de Cavaco.

Outra das razões prende-se com a convicção de Costa de que, em oposição, Rui Rio será sempre um adversário mais simples ou um melhor aliado. Também aí, convém não mexer. Na ausência de maioria absoluta, Costa tem dois sonhos: que a dimensão do PAN lhe chegue para dar a mão ou que Rui Rio se mantenha como líder do PSD. Não será por acaso que o primeiro-ministro resolveu enjaular e dar férias ao seu animal político após disparar continuamente farpas sobre o BE. António Costa vê no BE o seu maior adversário e há muito que não o esconde. Mesmo durante a legislatura, foi o sentido de responsabilidade de BE e PCP que salvou a "geringonça", mantendo-a como solução governativa.

António Costa aborda a fasquia da maioria absoluta com a aproximação do saltador em altura que tem medo de tombar a barra com um salto exuberante. Enquanto Rui Rio dificilmente disfarça a perseguição a jornalistas e ao Ministério Público em nome do segredo de justiça e Gonçalo da Câmara Pereira, líder do PPM, considera que Portugal está a caminho da revolução bolchevique, o país só espera que António Costa também se revele na autenticidade. Nenhum eleitor quer ver António Costa a especular com os votos como especulou com os consensos da legislatura.»

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19.9.19

Legislativas? Isto está a ficar divertido


No Facebook, passo por murais de direita, bem de direita, e vejo defesas férreas de uma maioria absoluta do PS. Noutros, de militantes ou eleitores habitualmente fiéis deste partido, a referida maioria é quase subtilmente equiparada à peste negra.
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Dai-nos, meu Deus, um pequeno absurdo quotidiano que seja



Dai-nos, meu Deus, um pequeno absurdo quotidiano que seja,
que o absurdo, mesmo em curtas doses,
defende da melancolia e nós somos tão propensos a ela!
Se é verdade o aforismo faca afia faca
(não sabemos falar senão figuradamente
sinal de que somos pouco capazes de abstracção).
Se faca afia faca,
então que a faca do absurdo
venha afiar a faca da nossa embotada vontade,
venha instalar-se sobre a lâmina do inesperado
e o dia a dia será nosso e diferente.
Aflições? Teremos muitas não haja dúvida.
Mas tudo será melhor que este dia a dia.
Os povos felizes não têm história, diz outro aforismo.
Mas nós não queremos ser um povo feliz.
Para isso bastam os suíços, os suecos, que sei eu?
Bom proveito lhes faça!
Nós queremos a maleita do suíno,
a noiva que vê fugir o noivo,
a mulher que vê fugir o marido,
o órfão que é entregue à caridade pública,
o doente de hospital ainda mais miserável que o hospital
onde está a tremer, a um canto, e ainda ninguém lhe ligou
nenhuma. Nós queremos ser o aleijado nas ruas, a pedir esmola, a
a bardalhar-se frente aos nossos olhos. Queremos ser o pai
desempregado que não sabe que Natal Dai-nos, meu Deus…
há-de dar aos seus.
Garanti-nos, meu Deus, um pequeno absurdo cada dia.
Um pequeno absurdo às vezes chega para salvar.

Alexandre O’Neill
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19.09.1981 – Simon & Garfunkel no Central Park



Há 38 anos, foi gravado o mais que memorável concerto que Simon & Garfunkel deram no Central Park de Nova Iorque. Reza a história que assistiram 500.000 pessoas e foi gravado ao vivo, dando origem a um álbum lançado no ano seguinte. Os lucros obtidos reverteram para a reforma e manutenção do parque e nós herdámos um espectáculo inesquecível.

Fica o conjunto e algumas «pérolas».








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Eleições Legislativas



«Aproximam-se as eleições legislativas. No mês que vem os portugueses vão eleger os deputados da Assembleia da República e determinar o futuro do país, desenhando as coligações possíveis.

Sendo a sociedade composta por diversos grupos, classes e minorias étnico-raciais todas com interesses diferentes e alguns até antagónicos, é importante que todos estejam representados e que uma larga maioria sociológica possa contribuir com as suas propostas para a governação do país. A exclusividade política de um só partido é sempre negativa na medida em que este representa apenas um grupo social restrito, ficando assim a maioria excluída da governação.

O último governo, com as suas múltiplas limitações, foi o melhor das últimas décadas. Tal só foi possível através da confluência de programas distintos (o do PS maioritariamente, mas também aspetos advindos dos programas do BE, do PCP e Verdes e por vezes mesmo do PAN).

O último governo do PS em maioria, o de José Sócrates, teve uma atuação bem diferente, conduzindo o país a uma crise sem precedentes e construindo, segundo o Ministério Público, uma rede de corrupção que se erguia até ao mais alto nível estatal.

Assim, sendo que cada português só tem um voto, todos devemos pensar na configuração final que queremos para a Assembleia da República e orientar o nosso voto nessa direção. Mesmo que tal pressuponha votar num partido diferente daquele em que normalmente votaríamos. Mesmo que tal implique votar de forma nova e diferente.

Por vezes muito que custe, devemos evitar a maioria absoluta do Partido que apoiamos e favorecer um maior equilíbrio político na Assembleia da República. Para que o partido nosso favorito governe melhor, com o contributo de outros que serão ignorados, esquecidos e ostracizados se em maioria absoluta.»

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18.9.19

Coimbra e a vaca



Para a preservação da memória num futuro Museu ou Centro Interpretativo da Universidade de Coimbra
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Catarina Martins e a social democracia



É assim tão difícil de perceber?
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O Ministério Público que temos



«Almerindo Lima, presidente da Associação de Solidariedade Social com a Comunidade Cigana e Minorias Étnicas do Médio Tejo, pergunta-se quando é que um comentário é, afinal, considerado racista pelo Ministério Público. “Cigano [s] para mim eram todos abatidos”, escreveu um homem num comentário a um post do Facebook. Para o procurador-adjunto estagiário Pedro Sousa Ferreira, isso é só uma opinião. (…)

Mesmo a frase “cigano [s] por mim eram todos abatidos”, nesta sua avaliação, é apenas a expressão da “opinião pessoal do seu emitente”. O procurador até concede que tal comentário “se possa qualificar de deselegante e rude”, mas julga que cabe dentro do “direito de liberdade de expressão, igualmente com dignidade constitucional”.»
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Direito a ser ouvida



«O “Brexit” pode estar a fazer com que se perceba que a discriminação e a hostilidade que sofrem os migrantes por toda a Europa pode também afetar os próprios europeus. A repulsa que se tem manifestado um pouco por toda a Europa contra a discriminação que podem vir a sofrer dentro do Reino Unido cidadãos de Estados-membros da UE faz-me lembrar o escândalo que se fazia sentir nos media quando a miséria atingiu milhões de argentinos de classe média nos anos seguintes à crise de 2001-02: parecia que ela só era chocante porque passara a atingir profissionais, licenciados, funcionários intermédios, depois de a vida toda ter atingido os pobres da cidade e do campo, os migrantes, os precários que nunca tiveram um contrato. Para aquela parte da sociedade convencida de que “sempre haverá ricos e pobres”, a perceção social da miséria, como agora da discriminação, parece despertar apenas quando afeta aqueles que se imagina que a não a merecem, como se ela fosse intrínseca a quem nasce para ser miserável...

Ana Telma Rocha, 42 anos, imigrante portuguesa no Reino Unido há 20 anos, perdeu há dias a paciência quando se apercebeu que se aproxima o prazo final do “Brexit” sem ter visto a sua situação legal resolvida enquanto cidadã de um Estado-membro da UE. Interrompeu um direto que um canal britânico fazia da manifestação contra a suspensão do Parlamento pedida pelo Governo para denunciar sentir-se discriminada no processo de tomada de decisão sobre o “Brexit”. Quando ela se pergunta se este “é um processo interno inglês?” e responde que “Não é! É um processo em que nós temos que estar todos envolvidos, porque todos trabalhamos para Inglaterra” (DN, 30.8.2019), o que ela reivindica é que os imigrantes possam participar nas decisões políticas do país em que trabalham, pagam impostos, obedecem à lei, contribuem para a vida da comunidade. É uma questão de democracia: são democráticas as sociedades em que se não reconhecem direitos políticos aos residentes estrangeiros, que, por o serem, não têm direito a participar nos processos de decisão mas estão obrigados a submeter-se a tudo quanto decidem os que o têm?

Para Ana Rocha, “porque trabalhei imenso neste país (...) não devia ser posta nesta situação” depois de “lhes [ter dado] a minha juventude!” Tem razão: trabalhar e contribuir para o bem estar de uma comunidade deveria ser sempre o critério básico para poder participar nos processos de decisão que a afetam. O que me dececiona é que ela, que definiu muito bem o critério de legitimidade de representação – “porque trabalh[o] neste país” –, estabeleça também critérios restritivos: “já chega [de] as pessoas europeias não terem voz.” Só as europeias? Mas não deveriam ter voz todos os demais imigrantes, identicamente afetados pelo “Brexit"? Além dos 2,2 milhões de imigrantes oriundos da UE (400 mil portugueses), há cinco milhões de outros que dedicaram também vidas, juventudes, sacrifícios, a um país onde não nasceram, e deveriam ter o direito a “não serem colocados nesta situação” de ilegalidade a que um imigrante pode estar sujeito. Ana Rocha, como milhões de portugueses por esse mundo fora, sabe bem o que também eles passam: em vinte anos teve “32 empregos diferentes” e sabe que muitos imigrantes “nunca descontaram” porque têm “contratos irregulares de trabalho”, mas que “sempre enviaram dinheiro para a família” (PÚBLICO, 30.8.2019).

“Os portugueses são um povo de emigrantes, que trabalham muito e devem estar orgulhosos do seu trabalho. São um povo nobre, que não merece ser tratado assim”, diz Ana Rocha (SIC Notícias, 29.8.2019). Mas o mesmo acontece com todas as comunidades de migrantes. Nobres todos. Indignados muito justamente com a possível perda de direitos, os imigrantes europeus no Reino Unido perceberam que poderão passar por um pouco daquilo que passam os imigrantes não-UE no Reino Unido – e centenas de milhões de migrantes por todo o mundo. Com umas quantas desvantagens menos: branca, com uma nacionalidade europeia, é muito mais improvável (mas não impossível) que Ana Rocha seja insultada na rua ou no autocarro, como ela receia, como seria se fosse negra e/ou usasse um véu e dessa forma pudesse ser identificada como muçulmana, por exemplo.

Até na discriminação há hierarquias. Uma vez considerada socialmente legítima, é inevitável que ela faça sempre cada vez mais vítimas.»

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17.9.19

Bansky e Brexit




«A pintura, com quatro metros de comprimento, foi exposta pela primeira vez no Museu de Bristol, cidade onde Banksy nasceu. Depois de ter sido comprada por um coleccionador anónimo, regressou este ano novamente ao Museu de Bristol a título de empréstimo, onde foi apresentada simbolicamente a 29 de Março, a primeira data prevista para a saída do Reino Unido da União Europeia.

Irónico é pensar que esta obra – apresentada pela primeira vez na exposição Banksy vs Bristol Museum – foi criada há dez anos, altura em que ainda se estava muito longe de abordar o tema “Brexit”. Ganha agora uma nova actualidade à luz do caos político que se vive no Reino Unido.»
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Espanha: do labirinto para o beco sem saída


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Eu nem vi o debate, mas…



Se fosse só um ou dois… Mas não, nas redes sociais, são mais que muitos os que se gabam de não terem visto Costa versus Rio, mas que têm mil opiniões e certezas. «Eu nem os vi, mas X até ganhou porque…», «nem vejo TVs portuguesas, mas Y encostou X às cordas embora não vá a tempo», etc., etc.

E depois eu é que sou parva?
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O empecilho absoluto



«Na abertura do período eleitoral o PS não falou das suas propostas nem assumiu compromissos concretos, pediu apenas maioria absoluta para governar sem "instabilidade".

Há dias, estes termos voltaram numa declaração do PS no Parlamento. Depois de se alongar em caricaturas primárias dos partidos com quem o PS fez um acordo há quatro anos, um dos vice-líderes da bancada socialista pediu votos para ter menos "barreiras" à "vontade reformista" do PS ou para, em suma elegância, "governar sem empecilhos".

Vamos ao que interessa: de que instabilidade fala o PS? E que ímpetos reformistas são esses que requerem uma maioria absoluta?

Esta legislatura teve um Governo de maioria relativa suportado por uma maioria parlamentar assente em acordos claros. E isso foi bom para o país. Trouxe estabilidade à vida das pessoas e centralidade ao Parlamento. Foi graças a isso que houve aumento dos salários, pensões e apoios sociais ou redução do IRS. Esses acordos foram ameaçados uma única vez, quando o Governo PS negociou com os patrões uma descida da TSU dos empregadores. Aí sim, o PS encontrou na maioria parlamentar uma barreira, e acabou por desistir da aventura.

Fora das matérias de acordo houve outras divergências. A entrega do Banif ao Santander com 2000 milhões de euros públicos teve o voto contra do Bloco e do PCP e passou com a abstenção do PSD. A intenção de colocar gestores com salários milionários na Caixa sem declarações de transparência chumbou devido ao Bloco. E foi uma medida do Bloco para cortar nos privilégios das grandes elétricas que levou a uma vergonhosa pirueta do PS à última hora. O ímpeto reformista do PS esmorece à porta dos interesses poderosos.

Tenho a certeza que seria mais confortável ao PS fazer orçamentos em que não é obrigado a negociar o fim das cativações na Saúde ou a descida das propinas. Seria mais fácil fazer uma Lei de Bases da Saúde sem depender dos votos à Esquerda para cortar na promiscuidade com o privado. Ou esquecemos que é um ex-secretário de Estado do PS agora o principal representante dos hospitais privados?

A governação teria sido mais agradável sem a negociação, sem o escrutínio acrescido e as pressões para leis laborais mais decentes. Mas este quadro, que pode ser um problema para o PS, deu boas soluções ao país.

O programa do Bloco é claro, com medidas concretas e quantificadas. Combate à precariedade, serviços públicos fortes, ordem no sistema financeiro, justiça fiscal, proteção do clima. Em todas as reformas que contam o Bloco não faltará aos compromissos que assumiu com o país. São essas garantias que dão estabilidade à vida das pessoas.»

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16.9.19

Campanhas e campanhas



«Hoje é diferente, enquanto eu colei cartazes, o meu equivalente actual, não equivalente presidencial, o secretário-geral não está a colar cartazes, a não ser para exibir, são as empresas que o fazem, os serviços que se prestam, as dívidas que se criam, e as campanhas eleitorais que não têm nenhum sentido. O sentido necessário, a não ser de ajudarem os jornalistas a fazerem os telejornais. O grau de exigência tem de ser bastante maior, não podemos ter os mercados como elemento fundamental para as pessoas se abraçarem à frente da televisão e darem beijinhos.»

Jorge Sampaio em entrevista ao Público de 15.09.2019
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Resgatar a Memória da Resistência Antifascista


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Dias de franqueza



«A franqueza é uma virtude. Na política é-o ainda mais, porque contrasta com o que é dominante: a língua-de-pau da híper-prudência e a farronca do “agarrem-me senão eu vou-me a ele” encenada para prime time televisivo. Dizer sem subterfúgios ao que se vem, mostrar com clareza os propósitos – eis uma qualidade rara em política, que merece ser elogiada. Dou aqui três exemplos que cumpre enaltecer.

António Costa, em almoço no Hotel Ritz com empresários, explicou com clareza a sua proposta para o país. Nada de subida de salários “que afete a competitividade das empresas e a estabilidade macroeconómica em Portugal”. É um bocadinho língua-de-pau, bem sei, mas não há quem não perceba que estava a dizer “não haverá aumentos salariais contra a vossa vontade, queridos empresários”. E, não fosse ser mal compreendido, ainda reforçou mais a nota da franqueza: “Temos de fazer todos uma coligação para podermos em conjunto contribuir para melhorar o nível de rendimento”. Eis uma má notícia para quem se preocupa em perscrutar cenários de arranjos partidários futuros – é com o patronato que António Costa quer mesmo fazer uma coligação. Franqueza maior era difícil.

Segundo exemplo. Carlos Pereira, vice-presidente do grupo parlamentar do Partido Socialista, usou da franqueza máxima na intervenção do seu partido na última sessão parlamentar desta legislatura. Disse ele: “O que precisamos mesmo é podermos governar sem empecilhos”. Ocorreu-me até que António Costa – que, referindo-se à articulação com os partidos de esquerda, tinha dito “a porta que abri não a vou agora fechar” – tivesse ficado embaraçado com a tirada do seu vice-presidente. Mas isto é defeito meu, que não estou habituado a tanta franqueza. Porque, na verdade, Costa e Pereira estão ambos a ser francos: António Costa não precisa de se dar ao trabalho de fechar, porque há quem feche por ele.

Terceiro exemplo. No tal almoço de empresários com António Costa, o empresário anfitrião disse o que lhe ia na alma: “Tudo indica que o seu partido vai ganhar as próximas eleições, consta que provavelmente por maioria absoluta, só posso dizer que se for bom para Portugal desejo que o senhor ganhe.” Os patrões são francos: para eles, a maioria absoluta é boa. Por isso, toca a apelar à dita, mostrando gratidão e confiança a quem não os quis incomodar com alterações das leis laborais e a quem não os quer incomodar com aumentos salariais.

Tudo franco, tudo virtuoso. Na verdade, é essa franqueza virtuosa que os une – os três querem mesmo é ver-se livres da esquerda, esse empecilho.»

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15.9.19

Mudam-se os tempos...


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40º aniversário do SNS



No dia em que comemoram 40 anos do SNS, a RTP3 convida Gentil Martins como comentador da efeméride. Estamos conversados, não?
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15.09.2012 - Que se lixe a troika!


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Ainda a maioria absoluta



«Em julho, escrevi um texto em que argumentava que seria difícil ao PS alcançar uma maioria absoluta. Com os dados novos, em particular os da sondagem do ICS/ISCTE publicados hoje, revisito o argumento.

Mantenho que será uma surpresa que o eleitorado em Portugal se comporte em contratendência, reforçando maciçamente o voto num partido de centro, quando o padrão europeu tem sido de recuo do centro tradicional e de crescente fragmentação parlamentar. Por outro lado, a estabilidade que caracterizou o ciclo político que agora finda dá incentivos para os eleitores repetirem o voto no BE e PCP, limitando a capacidade de o PS crescer à esquerda. Ao mesmo tempo, há segmentos do eleitorado e regiões onde os socialistas são menos competitivos, o que dificulta a maioria absoluta.

Mas, depois dos sinais deixados nas europeias, o conjunto das sondagens vem confirmando uma tendência: o voto somado na direita pode atingir valores impensáveis e, de facto, viabilizar uma maioria absoluta. Em eleições nacionais de primeira ordem, os piores resultados combinados do PSD e CDS foram em 2005 (36%) e em 1975 para a constituinte (34%). A possibilidade de o voto somado nos dois partidos se situar abaixo dos 30% altera profundamente o contexto.

Desde logo porque nos devolve a resultados eleitorais excecionais em que a diferença entre primeiro e segundo partido mais votado se aproximou dos 20 pontos — só aconteceu em 87 e 91 com Cavaco Silva. Com votações nos 44% por duas vezes, Guterres falhou a maioria absoluta — em ambos os casos, PSD e CDS juntos tiveram entre 40 e 43% dos votos e o PSD não baixou dos 32%. Sócrates precisou de 45% para ter maioria, em parte porque o PSD teve 29%. Se se confirmar um resultado com o PS acima dos 40%, PSD a cerca de 20 pontos e CDS em redor dos 5%, o limiar da maioria absoluta deve baixar. Aliás, o PS pode vencer em todos os distritos do continente (o que seria inédito) e o método de apuramento de deputados favorecerá os socialistas.

Porém, ninguém pode afirmar com precisão qual o resultado que torna possível uma maioria absoluta. O conjunto das sondagens conhecidas dá-nos um retrato do país que não nos permite extrapolar para cada distrito. Em particular, não sabemos se, nos grandes círculos de apuramento (Lisboa e Porto, mas, também, Braga, Setúbal e Aveiro), está a ocorrer alguma tendência — silenciosa! — de fragmentação do voto. Para algum lado os eleitores de direita estarão a ir: se parte significativa se encontra desmobilizada, outra pode fazer um cálculo estratégico, votando em partidos que, em círculos grandes, podem ultrapassar a barreira que permite eleger.

O que a sondagem nos diz é que uma esmagadora maioria dos portugueses acredita que o PS sairá vencedor, embora preferindo que os socialistas não tivessem uma maioria absoluta, e parece inclinada a dar essa maioria a António Costa. Durante a campanha vamos ver quem gere melhor esta aparente contradição.»

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