10.6.17

Mercados Variegados (4)



Bazar Verde, Almaty. Cazaquistão (2016).
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Dica (566)



Capital, Crisis, and Corbyn (Michael Roberts) 

«This minority Conservative government is going to find it difficult to survive for long. There could well be a new general election before the year is out, and that could well lead to a Labour government aiming to reverse the neoliberal policies of the last thirty years. But if the UK capitalist economy is in dire straits, a Labour government would face an immediate challenge to the implementation of its policies.» 
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A Pátria - no dia dela



E assim aprendemos. E por cá andamos.
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UK: Os ratos a abandonarem o navio



Duas baixas de peso na equipa de Theresa May.

«Os dois colaboradores mais próximos da primeira-ministra britânica, Theresa May, estão de saída, depois de o Partido Conservador ter perdido a maioria absoluta no parlamento, segundo os resultados das eleições antecipadas realizadas na quinta-feira.»
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10 de Junho



Tenho um ódio de estimação à data de hoje. Por mais anos que passem, nunca deixará de ser, para mim, o tal «Dia da Raça», já que não consegui apagar da memória o que era até ao 25 de Abril. Mas ela existe e entra-nos pela casa dentro, agora com roupagens mais modernaças e viagens intercontinentais.

Assinala-se hoje o dia em que Camões foi transladado para o Mosteiro dos Jerónimos, em 1880. Feriado nacional desde os anos vinte do século passado, a data ganhou um novo significado em 1944, quando Salazar a rebaptizou como «Festa de Camões e da Raça». Fê-lo por ocasião da inauguração do Estádio Nacional, que ocorreu com grande pompa, em cerimónias a que terão assistido mais de 60.000 pessoas e que foram filmadas por António Lopes Ribeiro (vídeos aqui e aqui). Linguagem inequívoca: «Às cinco horas, chegou o chefe: Salazar. Salazar, campeão da pátria, era o atleta número um, naquela festa de campeões.»

Mais graves, e bem mais trágicos, passaram a ser os 10 de Junho a partir de 1963. Transformados em homenagem às Forças Armadas envolvidas na guerra colonial, eram a data escolhida para distribuição de condecorações, muitas vezes na pessoa de familiares de soldados mortos em combate (fotos reais no topo deste post).

De 1974 a 1976 não houve comemorações. Até que, um militar presidente da República as ressuscitou em 1977, primeiro como «Dia de Camões e das Comunidades» e, a partir de 1978, também como «Dia de Portugal». Mas continua-se a distribuir condecorações – outras, por motivos diferentes e eventualmente louváveis, mas que parecem cada vez mais anacrónicos e sem sentido. E, no mínimo, talvez fosse possível escolher outro data para o efeito, já que, pelo menos no que me diz respeito, sou incapaz de não associar qualquer distribuição de medalhas neste dia às trágicas imagens do Terreiro do Paço, em tempo da guerra colonial.

Porque era assim:


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9.6.17

Mercados Variegados (3)



Mercado de rua, La Boca, Buenos Aires. Argentina (2010).
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Dica (565)




«British Prime Minister Theresa May went all in -- and lost almost everything. Following a catastrophic result for the country's Conservatives, the UK is politically paralyzed. And it is unclear what will happen next.» 
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Magnífico Pirro


«Finalmente, há uma derradeira resposta a esta crise europeia com a fragilização do centro e dos partidos neoliberais, que é manipular as leis eleitorais. Cuidado com ela. Em alguns casos, isso ainda funciona: no domingo, em França, Macron com um terço dos votos pode eleger dois terços dos deputados. Em Itália fracassou. Em Portugal é a confusão: Montenegro tanto propõe um sistema brasileiro, que poucos acharão um caso de sucesso, quanto se distancia dos círculos uninominais, que por sua vez o PS deseja mas não consegue aprovar (estava no seu programa, ao cuidado dos que aplaudem o desejo de uma maioria absoluta). Mas, como se viu, leis eleitorais manipulatórias podem tornar-se um factor de exasperação popular. E agravar a crise retirando-lhes legitimidade não é solução para a crise dos governos, pois não? Pois é nisso que estamos. No topo ninguém sabe o que fazer. Excepto a Alemanha.»

E agora a França



Com o rescaldo da «vitória» de Mrs May, o futebol de hoje, os afectos de Marcelo no 10 de Junho, aquém e além-mar, o longo fim de semana (sobretudo para os lisboetas que fazem ponte para o Santo António), o reduzido número de gentes com menos de 50 e tal, que lêem francês, a primeira volta das legislativas francesas, que tem lugar no Domingo, arrisca-se a passar para décimo plano. E, no entanto, considero que será um acontecimento muito importante, não só para os franceses mas para a Europa – e para nós também.

Estão a sair os resultados de várias sondagens, realizadas nos últimos dias, e não parece haver grandes surpresas em perspectiva: o movimento de Macron será o grande vencedor, mais do que provavelmente com maioria absoluta e faz dó olhar para o gráfico que mostra as previsões para a composição da futura Assembleia Nacional (para a primeira volta, claro que haverá diferenças depois da segunda): repare-se na pequena «fatia» ocupada por France Insoumise / PCF e PSF… Tudo o resto é direita, pura e dura – na França dos sonhos molhados de parte da vida de muitos de nós!

Um outro dado preocupante diz respeito à previsão de uma elevadíssima abstenção (48%) com especial incidência nas classes populares (56%) e nas camadas mais jovens, entre os 18 e os 24 anos (65%).

Triste França, pobre Europa! 
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UK: Velhos são os trapos


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Santa Cabana da Misericódia



«Segundo o nosso jornal, o Montepio vai absorver mais de 18% do activo da Santa Casa. Comprar 10% do Montepio vai exigir que a Santa Casa mobilize quase 140 milhões. Investimento passará a representar mais de 18% do património da entidade liderada por Santana Lopes. Finalmente uma boa notícia, porque, até agora, a Santa Casa dos bancos temos sido nós. Se a Santa Casa é responsável por fazer excêntricos todas as semanas, os Bancos têm sido capazes de nos fazer mais pobres todos os dias. Mas, quando chegamos ao ponto em que é suposto Santana Lopes salvar um banco, está tudo dito sobre o nosso sistema financeiro. (…)

A Santa Casa, mais concretamente o Euromilhões, tem feito muito pelos portugueses. Foi graças ao Euromilhões que muitos portugueses passaram a conhecer os números até ao 50. É incrível a quantidade de jogos que existem hoje em dia. A Santa Casa tem o Euromilhões, o Totoloto, o Totobola, o Placard, o Joker, a Raspadinha, a Lotaria Clássica, a Lotaria Popular e a Instantânea. Ou seja, por semana, existem mais de dez hipóteses de podermos ficar milionários. E ainda dizem que Portugal é um país onde há poucas oportunidades.

O Euromilhões tem sido muito importante para os portugueses. Por exemplo, todas as semanas, eu vou a casa da minha avó porque ela quer jogar, mas já tem a vista cansada. A minha avó joga no Euromilhões, no Totoloto e no Joker, mas nunca ganhou nada. Felizmente… Porque eu nunca entrego os boletins e fico com o dinheiro.

Para terminar, e em jeito de conclusão, acho que, de certa forma, faz sentido a Santa Casa ficar com o Montepio se fizer um jogo de apostas em que podemos apostar no dia em que o Montepio vai falir, com um joker para quem adivinhar quanto lá vamos nós ter de pagar outra vez. Ainda assim, faz-me confusão que, com tanta coisa em que investir, como pastéis de Belém e tudo o que esteja ligado ao turismo, a Santa Casa escolha o negócio que mais prejuízo tem dado. Acho que a Santa Casa brinca com a sorte.»

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8.6.17

Mercados Variegados (2)



Mercado de Chichicastenango. Guatemala (2014).
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Dica (564)

Paula Godinho



Uma bela entrevista que merece ser lida. Faz bem à alma.

EMEL vs. ASAE: o recontro final



Ricardo Araújo Pereira na Visão de hoje:


Na íntegra AQUI.
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Reino Unido, hoje


Quem quiser «estar» hoje no Reino Unido, pode ficar por aqui todo o dia e uma parte da noite.

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Torço por Trump



«Então, é hoje. O ex-patrão do FBI James Comey vai falar ao Congresso americano contra Trump. Ele já entregou um testemunho escrito onde revela parte das notas que tirou depois dos seus nove encontros com o presidente. Espero com ansiedade as conclusões do Congresso. Torço para que não se confirme que Donald Trump pressionou o então diretor do FBI para não investigar as ligações com a Rússia do conselheiro da Segurança Nacional Michael Flynn. Este acabou por se demitir, por ter mentido sobre os seus encontros com o embaixador russo - mas, antes e depois da demissão, Trump disse a James Comey para não investigar o general Flynn. Porém, pressionou ou só deixou cair uma leve sugestão? Estou mortinho para que a segunda hipótese - a da sugestão - seja a que vença no Congresso. Aliás, faço, aqui, uma despudorada pressão, nos limites da minha insignificância, para que Trump não saia derrotado. Tenho um só argumento, mas forte: o calendário. Trump, toda a sua vida, nunca escondeu que não é de confiança. Mas os americanos elegeram-no. Não é ao fim de quatro meses de governar que ele pode cair por causa da diferença que vai da palavra "pressão" à palavra "sugerir". Acabaria por ser injusto derrotar Donald Trump pela semântica, um terreno onde ele é um incapaz profundo. Temos de esperar que a evidência que ele sempre foi nos factos seja alcançada por muito mais gente. Vai custar, mas há esperança: Donald Trump está a fazer por isso.»

Ferreira Fernandes

Dica (563)



Venezuela, meu amor (Joana Mortágua) 

«Bem sei que há uma esquerda cega que, 25 anos depois da queda do Muro, ainda acha que vale tudo na defesa de regimes pseudocomunistas. É escolha sua se Brejnev ainda lhes aquece os corações. A esquerda de que faço parte nunca foi ambígua sobre a condenação de regimes que oprimem o povo e sufocam a democracia. Isso vale para Angola e para o regime venezuelano, ainda que as calúnias da direita ignorante insistam que lhes temos amor.» 
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7.6.17

Mercados Variegados (1)



Mercado de Luang Prabang. Laos (2009).
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Racismo?

Multibanco à Venda. Estórias dos seus primórdios



Leio que a SIBS está à venda e não fico admirada: mais um dos nossos anéis, que se vai, alguém o comprará, como já todos os outros foram comprados. Ficam-nos os dedos e com eles continuaremos a digitar códigos, operações cada vez mais sofisticadas e a recolher uns tantos euros.

Mas este «anel» é-me especialmente próximo e não consigo deixar de recuar umas décadas, até aos anos em que surgiram em Portugal as primeiras caixas Multibanco – mais precisamente a 1984, quando se preparava o sistema que viria a arrancar em Setembro de 1985 (com 12 terminais, nas cidades de Lisboa e Porto). Nem tento descrever a complexidade do que estava em causa, quando o uso do que hoje é quase tão trivial como o mais elementar electrodomésico era então fruto de pioneirismo puro e duro - que resultou, fazendo de Portugal um indiscutível caso de sucesso a nível internacional, louvado e visitado.

Eu coordenava então na IBM uma equipe de técnicos, que, em conjunto com os da SIBS, desenvolviam o software necessário para que o projecto se concretizasse. E repito que nem tento resumir a dificuldade do mesmo e os problemas que foram ultrapassados. Mas recordo um, quase anedótico, que nunca mais esqueci. Na fase de testes finais de um grupo de máquinas ATM, realizados já nem me lembro em que país, a nota de 1.000 escudos com D. Maria II não «passava», as máquinas não a reconheciam, sem que se conseguisse identificar o motivo. Foram necessários muitos dias, julgo que semanas, para que o problema fosse resolvido (e já nem me lembro como o foi). Fiquei sempre a olhar de esguelha para a dita nota – mas onde é que ela já vai, com os míseros 5 euros que hoje valeria…

Os «anõezinhos» dos anos 80 (nome simpático pelo qual ficaram conhecidas as misteriosas máquinas, tão inteligentes que havia quem acreditasse que tinham dentro um homem pequenino…) cresceram, estão bem e recomendam-se. Os seus donos passarão a ser chineses, americanos ou coreanos. Who cares?! 
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Se Jeremy Corbyn pudesse…




… meter um pauzinho na engrenagem…
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A dívida eterna



«Nos tempos de Salazar, criou-se uma lei que proibia que os cidadãos andassem descalços. Quem fosse apanhado a prevaricar tinha de pagar uma multa de 2$50.

Nesse tempo, dois escudos e cinquenta centavos não eram suficientes para comprar um par de sapatos. Ou seja, os que eram apanhados descalços não tinham dinheiro nem para comprar sapatos nem para pagar a multa. Resultado: passavam uma noite no chilindró, como na época se designava a prisão. Eram devedores eternos e sem opções, tal como Portugal. A dívida faz parte de Portugal. Poderá um dia desaparecer? O estudo apresentado pela Plataforma para o Crescimento Sustentável, de Jorge Moreira da Silva, afirma que a dívida pode ficar abaixo de 100% daqui a uma década. É um sentimento extremoso. Tal como o documento feito pelo PS e BE há uns tempos, faz um diagnóstico sensato. As soluções são, claro, diferentes. Mas ambas contornam o Adamastor: quem decide o futuro da "reestruturação" da dívida está sentado num condomínio privado que não é afectado pelos nossos estados de alma. Portugal é um peão. Não é um rei. Não decide por si. Outros decidem por ele.

Temos pés de barro. Somos frágeis como porcelana. Em 1890, Anselmo de Andrade, o último ministro da Fazenda da monarquia, escreveu: "Tem (a dívida) quatro séculos de existência e começou logo com bons juros, dobrando o dinheiro em quatro anos, como se dizia na forte linguagem do tempo. No fim de cada gerência, saía-se sempre empenhado, pagando-se mais tarde, quando se podia. Fechava-se uma série e abria-se outra." Poderia ser mais claro sobre as nossas elites? Não. Nada mudou. Pode-se arranjar aspirinas (ter dívida de curto ou de longo prazo?), mas será difícil criar riqueza para a pagar. Se alguém não a apagar. A dívida é uma canga eterna. Sempre o foi. E o problema é que sempre faltou um John Wayne para a liquidar de vez.»

E quanto a França…



Sondagem divulgada em 06.06.2017: previsões para a 1ª volta.

Ver texto aqui.
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6.6.17

Transportes «fora da caixa» (16)



Passear pelos meandros do Rio Yangtzé, a caminho da barragem Three Gorges. China (2004).

(Bem antes de a China Three Gorges ser dona da EDP e de sonharmos que o dr. Mexia viria a ser arguido do que quer que fosse…) 
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Dica (562)




«El Gobierno británico quiere responder a los atentados de Manchester y Londres con su décima legislación antiterrorista en lo que va de siglo, esta vez, para impedir la encriptación de mensajes en red. "Es la salida populista", advierten los expertos, desmintiendo que este nuevo recorte de libertades facilite la persecución de terroristas.»
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6 dias ou 50 anos?



A Guerra dos Seis Dias teve início em 05.06.1967. 
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Depois absolveu-os e mandou-os rezar uma Avé Maria


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Não toquem na minha Alfama



«Em "Zelig", o filme de Woody Allen, o protagonista é alguém extremamente inseguro. Para conseguir passar despercebido transforma-se na pessoa que está ao seu lado.

Os turistas, já se sabe, não conseguem ser como Zelig: não se transformam em lisboetas ou portuenses para passar despercebidos. Nota-se a sua presença. Para mais quando, de um momento para o outro, os turistas se somam a cada vez mais expatriados e os centros das principais cidades portuguesas se transformam em "resorts" urbanos. O turismo é, não o duvidamos, um oxigénio precioso para a nossa economia. Uma verdadeira galinha dos ovos de ouro que cacareja no meio de um mundo inseguro. Não admira que o turismo se tenha tornado um dos motores da nossa recuperação económica. Mas, no meio da euforia, convém não voar como Ícaro e colocar os pés na terra. O turismo não pode ser a desculpa para afastar lisboetas e portuenses do centro das suas cidades. Não é a pontapé: é com preços de arrendamento que vão tornar, a curto prazo, Lisboa e Porto cidades onde só vivem turistas e expatriados. Os portugueses irão emigrar para os arredores. Mas, com os rendimentos que auferem, e o défice de transportes existente (a começar pelo lamentável metropolitano lisboeta), um dia destes não haverá quem faça os serviços no centro. Como aconteceu em Londres quando, devido a isso, polícias e enfermeiros, deixaram de querer trabalhar na cidade. Porque não era rentável.

A Marcha de Alfama deste ano coloca, de uma forma irónica, o dedo na ferida. "Não toquem na minha Alfama", original do concurso de 1950, vai voltar este ano. Não é um apelo ao fim do turismo. É um alerta. Se a cultura bairrista de zonas de Lisboa for riscada pelos interesses imobiliários reinantes, um dia destes a diferenciação e a cultura local, que atrai turistas e expatriados, evapora-se. Murcha, como os manjericos. O turismo, já o dissemos, é ouro. Não se queira inverter Midas e transformá-lo em chumbo.»

5.6.17

Transportes «fora da caixa» (15)



«O» táxi de Aracataca / «Maconde». Colômbia (2012).

Em honra do 50º aniversário de «Cem anos de solidão», hoje a imagem tinha de vir de Aracataca / Maconde…
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Dica (561)




«When the terror attacks happened I was in Borough Market, drinking with friends. Even while it was happening, I felt angry with Theresa May.» 
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Mais olhos do que barriga?

05.06.1967 - «Cien años de soledad»



Faz hoje cinquenta anos que foi lançada, na Argentina, aquela que viria a ser uma das grandes obras literárias da segunda metade do século XX: Cem anos de solidão, que Gabriel García Márquez escreveu no México, entre 1965 e 1956, e que teve uma primeira edição de oito mil exemplares, que esgotou rapidamente. São muitos os textos publicados nos últimos dias para assinalar a data, um deles na Revista do Expresso do último Sábado (só acessível a assinantes, pelo menos por enquanto).

García Márquez nasceu em Aracataca e lá viveu parte da infância, em casa dos avós, que o marcaram profundamente. De uma família desafogada, não aprovaram o casamento da filha com um simples telegrafista e exigiram guardar a custódia do neto.

Com dez anos, foi viver com os pais e só regressou a Aracataca com a mãe, em 1950, numa tentativa falhada de vender a casa da família, entretanto vazia. Terá sido o choque que teve ao ver o estado lamentável em que encontrou a sua querida terra natal, que esteve na origem da obra que viria a torná-lo célebre. Chamou-lhe «Maconde» e criou a família Buendía.

Guardadas as devidas proporções, não terá ficado muito mais orgulhoso de Aracataca quando lá voltou pela última vez, em 2007, para uma tripla comemoração: dos seus 80 anos, do 40º aniversário da publicação de Cem anos de solidão e do 25º da atribuição do Nobel da Literatura. Nem gostaria de saber que ainda há dois ou três dias os seus conterrâneos estiveram envolvidos em graves distúrbios quando se manifestavam contra permanentes cortes da distribuição de electricidade. 

Estive em Aracataca / Maconde há cinco anos e também a vi feia e desmazelada, sem honrar como devia o que de mais importante deu ao mundo (quando a Colômbia gasta fortunas, por exemplo, em iluminações faraónicas das suas grandes cidades).

Aracataca salva-se pela moradia em que «Gabo» nasceu, actualmente transformada num pequeno museu bem conservado, que justifica, sem dúvida, a deslocação e a visita. E pela «peregrinação» que significa passear pelas ruas onde brincou e que o viram crescer…

Casa e quarto onde nasceu:

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O Sol à volta de Trump



«Donald Trump acredita que o Sol gira à volta dos EUA. Ou melhor, que gira em volta da Torre Trump. E como, dentro desta, é possível criar um ambiente artificial, com ar condicionado, isso é igualmente possível em todo o mundo.

Não é, mas como Trump vive na Idade Média do pensamento, quando se acreditava que o Sol girava à volta da Terra, tudo é possível. Afinal os pequenos neurónios de Trump são uma espécie de bolas de "flippers": atiram-se e acertam onde calha. Sabe-se que a retirada dos Acordos de Paris é um logro. Desde logo económico. Porque, neste momento, as indústrias limpas nos EUA já geram o dobro dos empregos das ligadas ao carvão. Portanto a teimosia de Trump tem a ver com outras razões. Uma é acreditar que os EUA vivem sem o mundo. E que este não pode viver sem Washington. Outra é que tudo é um "negócio". Mas, como se sabe, neste planeta nem tudo é um "reality show" nem os acordos para construir uma Torre Trump. (…)

Há outra coisa mais grave ainda: a cerimónia de Trump foi digna de um congresso de Kim Jong-un. Havia na plateia aplausos e a seguir à declaração de Trump um ser qualquer veio dizer que ele era o guia redentor. Na Coreia do Norte não se faz melhor. O problema é que esta decisão de Trump é o reflexo de uma concepção ideológica mais vasta, onde o populismo e a pós-democracia se abraçam. Findo o contrato social sobram pessoas e ideias assim. Assustadoras.»

Fernando Sobral

4.6.17

Transportes «fora da caixa» (14)



Nada mais adequado do que estes românticos barcos para um passeio no Rio Perfumado. Hue, Vietname (2009).
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Dica (560)



Democratize This (Michal Rozworski) 

«Labour’s plans to pursue democratic models of ownership are the most radical aspect of Corbyn’s program.» 
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04.06.1989 – Tiananmen



Se os factos são conhecidos, é sempre bom tê-los presentes. Sobretudo em imagens, que falam por si e substituem muitas palavras. Ver aqui post do ano passado. 
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Trump, Europa e alterações climáticas


«Já se ouvem, entretanto, as vozes que, no desastre, reclamam a sua vitória: que esta é uma prova da superioridade da Europa. Juízo, por favor. Quem falou na União Europeia foi um comunicado de três governos, a Alemanha, a França e a Itália, porque acham que o que conta é o G7 (…). Ou seja, a União põe-se na fila, atrás de quem manda.

Mas, e mais importante, a UE colaborou sempre com o adiamento das soluções para as alterações climáticas, a começar pela promoção do mercado das emissões, que favorecia a não reconversão industrial dos países mais ricos a troco do empobrecimento dos mais pobres. Esse imperialismo recalcitrante foi a regra das políticas até ao Acordo de Paris e ainda lhe sobrevive. Numa palavra, depois de Trump recusar o Acordo de Paris, é preciso salvar esse passo e dar outros. Com quem for.»
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Portugal: que fazer?



«A globalização tornou-se um jogo de Monopólio. Só há um vencedor. E, neste mundo de hegemonias variadas, há quem tente manter-se à tona de água.

É o caso de Portugal, país periférico, com as suas valias, mas que é um peso-pluma quando comparado com as poderosas potências que fazem os grandes jogos. Seja no mundo, seja na Europa. Portugal, sendo um país com características perfeitas de porto franco (aqui chegam culturas variadas, como se vê com este "boom" do turismo), que tem condições para ser um pequeno paraíso neste universo de confusões e contradições, vive subjugado: por uma dívida que o torna refém de uma Europa que, até aqui, bebeu na ideologia da austeridade que satisfazia sobretudo as pretensões da Alemanha e da elite de Bruxelas, e pelas suas próprias debilidades, que começam por ter tido durante demasiado tempo uma elite extractiva sem visão de futuro. Neste momento vive um dos seus momentos de ruptura. Ainda amarrado à dívida, joga num tabuleiro onde é peão e outros reis e bispos. É o caso da luta contra as insalubres agências de "rating", sanguessugas de riqueza alheia e vozes de ideologias e interesses bem definidos. Não é um acaso a estratégia das "três grandes" do "rating" relativamente a Portugal. Só que, neste mundo de nivelamento ideológico, elas determinam as decisões. (…)

Seja como for, Portugal está refém destas motivações. Tal como as da Europa, que se tornou uma ortodoxia neo-liberal em termos económicos e financeiros. O mesmo Stiglitz disse no Estoril, com toda a razão: "(Os limites do défice, a dívida e a taxa de inflação) são números que são tratados como se tivessem sido dados por Deus, como se fosse uma violação das leis básicas da natureza quebrar essas regras". Presos ao euro, não poderemos sair delas. Para Stiglitz, o problema está na própria estrutura do euro. Então, que fazer? (…) É preciso pensamento estratégico. Algo que tem faltado entre nós.»