7.6.17

A dívida eterna



«Nos tempos de Salazar, criou-se uma lei que proibia que os cidadãos andassem descalços. Quem fosse apanhado a prevaricar tinha de pagar uma multa de 2$50.

Nesse tempo, dois escudos e cinquenta centavos não eram suficientes para comprar um par de sapatos. Ou seja, os que eram apanhados descalços não tinham dinheiro nem para comprar sapatos nem para pagar a multa. Resultado: passavam uma noite no chilindró, como na época se designava a prisão. Eram devedores eternos e sem opções, tal como Portugal. A dívida faz parte de Portugal. Poderá um dia desaparecer? O estudo apresentado pela Plataforma para o Crescimento Sustentável, de Jorge Moreira da Silva, afirma que a dívida pode ficar abaixo de 100% daqui a uma década. É um sentimento extremoso. Tal como o documento feito pelo PS e BE há uns tempos, faz um diagnóstico sensato. As soluções são, claro, diferentes. Mas ambas contornam o Adamastor: quem decide o futuro da "reestruturação" da dívida está sentado num condomínio privado que não é afectado pelos nossos estados de alma. Portugal é um peão. Não é um rei. Não decide por si. Outros decidem por ele.

Temos pés de barro. Somos frágeis como porcelana. Em 1890, Anselmo de Andrade, o último ministro da Fazenda da monarquia, escreveu: "Tem (a dívida) quatro séculos de existência e começou logo com bons juros, dobrando o dinheiro em quatro anos, como se dizia na forte linguagem do tempo. No fim de cada gerência, saía-se sempre empenhado, pagando-se mais tarde, quando se podia. Fechava-se uma série e abria-se outra." Poderia ser mais claro sobre as nossas elites? Não. Nada mudou. Pode-se arranjar aspirinas (ter dívida de curto ou de longo prazo?), mas será difícil criar riqueza para a pagar. Se alguém não a apagar. A dívida é uma canga eterna. Sempre o foi. E o problema é que sempre faltou um John Wayne para a liquidar de vez.»

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