9.3.24

- Está lá, é de Belém?

 


- Senhor presidente? Não percebi nada da sua falada. Mas afinal onde é que quer que eu ponho a cruzinha?

- …

- Não pode dizer? E eu à espera das 8 para saber…
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Cuidado, Casimiro!

 


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Comentário político nos media 2023

 


Um estudo muito interessante.
(Vai até Maio de 2023.)

Ler e descarregar o pdf AQUI.
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Reflexão. O dia do faz de conta

 


«Não é falta de criatividade. Pelo menos do autor desta crónica. Quando muito, será de uma lei eleitoral desajustada, anacrónica e incompreensível, que patrocina portugueses de primeira e de segunda. O dia de reflexão chega a ser anedótico.

Em 2019, neste mesmo espaço, já se alertava para a discrepância imposta por esta lei na véspera das eleições. Nas legislativas de então, o voto antecipado foi opção para mais de 50 mil eleitores. Nas europeias, 14 mil foram mais cedo às urnas. Para o sufrágio deste domingo, as inscrições para o voto antecipado ultrapassaram as 200 mil. Na prática, há portugueses que elegem os seus representantes enquanto a campanha eleitoral está a decorrer e outros que são “obrigados” a refletir antes de o fazerem.

De resto, e também não é novidade, com a digitalização da sociedade e dos seus processos comunicativos, este dia não deixa de ser apenas um dia fingido. Um dia do faz de conta. A propaganda, na véspera e no dia da eleição, é proibida em páginas e cronologias pessoais. Portanto, as regras ignoram sistemas de partilhas de mensagens instantâneas. A violação à lei nas redes sociais também será impossível de fiscalizar caso atinja uma dimensão substancial.

Marcelo Rebelo de Sousa, precisamente em 2022, pediu uma “oportuna reponderação” do dia de reflexão. No domingo passado, repetiu a mensagem. Vários constitucionalistas também defendem a extinção da regra. Já a Iniciativa Liberal tentou acabar com a limitação, mas teve a oposição do PS, PSD, PCP, CDS-PP e PEV.

Há de facto muito para refletir. Este ano, ainda há mais motivos para o fazer, sobretudo quando assistimos ao crescimento do populismo e da aposta na política espetáculo. Não houve espaço para debater conteúdos programáticos e não faltou tempo para dar pontos a este e àquele, como se estivéssemos a atribuir estrelas Michelin. Há muito para ponderar, avaliar. Mas não num dia.»

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Acordei com isto na cabeça

 

Pr'a melhor está bem, está bem,
Pr'a pior já basta assim!



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8.3.24

8 de Março, ainda

 

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Balanços

 

«O grande problema criado por este início de campanha não foi o discurso de Passos sobre a imigração. Isso, digo-o com pesar, até pode ter rendido votos à AD. Foi a sua presença, como recordação de um tempo e de escolhas (bem para além da troika, na intensidade e na duração) que o PS queria que fossem recordados. Durante a campanha, Montenegro foi tropeçando em idosos que lhe falaram da companhia de Passos Coelho. A direita política adora Passos e nunca conseguirá entender até que ponto ele é um ativo tóxico. Espero que desta vez tenha ficado claro. (…)

O voto que Pedro Nuno Santos tem de segurar e reconquistar é demográfico e sociológico: os trabalhadores que viram o salário mínimo aumentar, os que sentiram grandes melhorias de vida nos últimos oito anos, os mais idosos, que veem, com razão, o PS como um “porto seguro” – e a entrada de Pedro Passos Coelho na campanha foi excelente – e as mulheres (a intervenção de Paulo Núncio ajudou). Tudo eleitores fundamentais para o PS, porque é neles que tem a base maioritária do seu voto. Por isso, é com eles que tem de dramatizar. E tem argumentos fortíssimos, porque o PSD esteve sempre na oposição a todas estas conquistas, salário mínimo incluído. E sim, estes últimos dias são mesmo para isso: dramatizar. Sempre foram.»

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Daqui p’rá frente

 


«A enxurrada de sondagens e barómetros por estes dias não nos deixam antever com clareza os resultados das eleições do próximo domingo. Sucedem-se indicações contraditórias, margens curtas e muitos indecisos. E lembramo-nos das últimas legislativas. As sondagens davam um “empate técnico” entre PS e PSD, mas António Costa ganhou nas urnas uma maioria absoluta, o que só tinha sido alcançado pelo PS uma única vez em toda a história da democracia portuguesa, na sequência do colapso por indecente e má figura do Governo de Santana Lopes.

Não sabemos o que estaremos a discutir na segunda-feira. Mas sabemos que há algumas tendências que se têm vindo a desenhar nos últimos anos na política portuguesa e que serão importantes para os tempos que temos pela frente.

1. A extrema-direita veio para ficar. Em apenas quatro anos conseguiu tornar-se a terceira força partidária e quer ser governo. Se olharmos o que foi acontecendo por essa Europa afora na última década, é bom reconhecer que essa polarização extremista não é conjuntural, não vai evaporar-se rapidamente. Na Alemanha, Áustria, Holanda, França, Itália, Espanha e noutros países, a nova e alguma velha extrema-direita conseguiu normalizar-se como voto de protesto de largos segmentos sociais que dizem sentir-se traídos pelas políticas das democracias liberais. Traídos porque o salário não cresce; porque os jovens não têm perspetivas; porque há escândalos e corrupção nos partidos “tradicionais” e nos governos; porque a globalização trouxe migrantes e há novas identidades sociais. A extrema-direita não tem propostas credíveis para resolver o sentimento de mal viver; é financiada pelas elites endinheiradas do sistema; e vai até somando os seus escândalos -- desde o financiamento russo à extrema-direita austríaca e francesa, aos vários escândalos/processos de Trump nos EUA, ou mesmo os casos criminais dos dirigentes do Chega noticiados em Portugal. Nada disso interessa. Este voto não procura uma alternativa credível, é antes uma expressão de raiva. Como alguém escrevia, a atual extrema-direita é o movimento anti-sistémico dos que não acreditam que há uma alternativa ao sistema. E não desmobiliza se parte dessa agenda for incorporada na direita tradicional. Como a França prova, os eleitores mantêm o seu voto no original. A incorporação que a AD fez dos temas do Chega, por vezes envergonhada e por entrepostos ex-líderes (imigração, insegurança, aborto, corrupção) não o vai esvaziar. Por isso, o combate democrático contra a política do ódio tem de buscar políticas de fundo que mudem as perspetivas no sentido de uma melhoria de vida, combatam as desigualdades que acicatam um sentimento de injustiça e com democracias em que não esteja já tudo decidido antes mesmo do voto ser expresso.

2. Aconteça o que acontecer no dia 10, o Partido Socialista tem uma reflexão a fazer. Na campanha tem apresentado o seu legado: equilíbrio (excedente!) orçamental; redução da dívida pública; regresso de Portugal à classificação A- nas agências de rating; crescimento económico acima da média europeia; baixo desemprego; e subida do salário médio, em parte insuflado pelos aumentos do salário mínimo. Mas isso significa que há um mistério. Porque é que em 2022, à saída da geringonça e com 6 anos de governo, o PS alcança a maioria absoluta; agora, apenas dois anos depois, sente-se um inegável cansaço com o seu Governo. A aposta de Costa na estratégia das “contas certas” -- para além do que já se intuía como razoável -- parece ter sido um erro. O “espaço mediático”, sempre disponível para acusar de “irresponsabilidade financeira” os antigos governos do PS, ignora agora alegremente os seus brilharetes. Não houve reconfiguração do eleitorado: os votantes do centro-direita afinal não acorreram a entregar-se nos braços dos socialistas; e a perda real de salário em segmentos intermédios, em particular nas carreiras públicas, desmobilizou parte do povo do PS. Costa maltratou uns, sem conseguir ganhar os outros. Era bom que os socialistas aprendessem algo com este percurso.

3. Por seu lado, a esquerda à esquerda do PS tem mostrado dificuldade em captar o voto de desilusão com os socialistas. Se as preocupações com salários, saúde e habitação são reais, porque é que o Bloco e CDU, que sempre se centraram nestes temas, não sobem nas intenções de voto? Se calhar é tempo de dar um novo impulso a um campo político que partilha muito do seu programa e olhar os resultados que novas articulações políticas à esquerda têm conseguido em França e em Espanha. Continuar a fazer o mesmo e esperar resultados diferentes é que não parece muito sensato.

4. Finalmente: sobre os resultados eleitorais de domingo, estou com os sábios. Prognósticos, só no fim do jogo.»

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8 de Março – Sempre neste dia

 

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7.3.24

Há sempre mais uma porta

 


Porta de entrada da Casa Agustí Anglora, Barcelona, 1906.
Construtor: Isidre Reventós i Amiguet.


Daqui.
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Voto útil?

 


Fernando Rosas resume a história recente.
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Um pouco mais de azul (4)

 


Especialmente oportuno nos dias que correm.


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Maiorias absolutas?

 

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Os dilemas de Montenegro

 


«Qualquer que seja o resultado eleitoral de domingo, e a acreditar no que dizem as sondagens, Luís Montenegro sairá sempre derrotado. É óbvio que, se a AD ganhar, terá de governar com o Chega. Caso contrário, o Executivo liderado por Montenegro terá perna curta neste novo Parlamento. No caso de vencer estas eleições e precisar do Chega para formar Governo, Montenegro poderá ter de começar a legislatura apunhalando a confiança de uma parte considerável do eleitorado, a quem prometeu que uma coligação com Ventura seria “impossível de acontecer”.

Em caso de vitória do PS e de Pedro Nuno Santos, o líder da AD só terá duas opções: reeditar uma geringonça à Direita, como António Costa fez em 2015, juntando os partidos de Esquerda, o que permitiu ao PS, apesar de ter perdido as eleições, derrubar o Executivo de Passos Coelho.

Ou então, derrotado, sair da liderança do PSD. É que tendo de legitimar um Governo minoritário (ou não) de Esquerda, ressurgirá o fantasma de Pedro Passos Coelho, que regressado à vida política, será sempre um trunfo dentro do PSD. Em qualquer dos cenários, a vida não está fácil para Luís Montenegro. Daí que a estratégia do líder da AD, nestes últimos cartuchos, seja dirigida para os indecisos, aqueles que costumam contrariar as sondagens e que, por variadas vezes, mudam o tabuleiro de xadrez. Ignorar André Ventura tem sido um dos planos estratégicos, ao dizer que não entra “no recreio”, apesar de este continuar a assegurar que tem fortes apoios “fantasmas” dentro do PSD a favor de uma coligação. Na verdade, a AD está a conseguir “apagar” o Chega. A campanha está cada vez mais bipolar, quando esta já chegou a ser tripolar, como seria desejo de André Ventura. A única salvação de Montenegro é conseguir formar Governo sem necessitar de Ventura. Não espanta que o apelo ao voto útil vá aquecer nestes últimos dias.»

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6.3.24

Para grandes males…

 

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06.03.1927 – Gabriel García Márquez

 


Gabriel García Márquez faria hoje 97 anos.

Em rigorosa «peregrinação», fiz um desvio de dezenas de quilómetros para chegar a Aracataca, em 2012, sempre à espera de encontrar algum membro da família Buendía ao virar de uma esquina, um qualquer José Arcádio ou um dos muitos Aurelianos… Foi em Aracataca que GGM se inspirou para criar a mítica aldeia de Macondo de Cem anos de solidão.

Mais informação num post que escrevi na Colômbia, quando fui a Aracataca.
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A direita nas TVs

 


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Quando as orquestras desafinam

 

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Greve do “jornalismo mil euros”: em nome da democracia

 

@Gerhard Haderer

«Deixem-me fazer uma pausa na campanha. É que isto também tem a ver com a democracia. Tanto como a participação nas eleições.

Quando Pedro Coelho, que dirigiu o congresso dos jornalistas, anunciou, na antiga rede social Twitter, a marcação da primeira greve geral de jornalistas para 14 de março, os comentários dos leitores não foram de solidariedade. Deixando de lado fanáticos ou bots que combatem a comunicação social livre porque gostariam de não ter resistência à desinformação a que se dedicam, muitas seriam pessoas normais que olham para os jornalistas como inimigos. Uns lidam mal como o pluralismo, outros queixam-se, com razão, da falta dele. Uns não aguentam o escrutínio, outros lamentam a decadência (real) do jornalismo livre e independente.

Poucos, quase nenhuns, perceberão que a crise do jornalismo não resulta da incompetência dos jornalistas, apesar de ela existir, como em qualquer profissão. O jornalismo não é menos sólido, menos livre, menos rigoroso e até menos relevante porque os jornalistas são piores. O jornalismo não é uma atividade solitária, apesar de o “star system” que também adotou passar a essa ideia. É feito por estruturas e a sua qualidade depende de como elas funcionam e para aquilo para que foram pensadas. A mercantilização da informação nada tem de novo. É tão antiga como o jornalismo. Nova é a incapacidade de os jornalistas manterem a autonomia em relação à lógica estritamente mercantil. Hoje, os diretores de informação são diretores de vendas e os jornalistas produtores de conteúdos, atentos aos ecrãs que lhes dizem quantos cliques conseguiram. E isto explica-se pelas condições que alienaram o seu trabalho.

O crime empresarial cometido contra a TSF, a rádio que mudou a forma como se informa em Portugal, o “Diário de Notícias”, jornal nacional mais antigo do país, e o “Jornal de Notícias”, diário com maior implantação regional, foi o grito de alerta para todos: nós seremos os próximos. A situação na Global Media era má há muito tempo. Sofre, como toda a imprensa, com uma crise de modelo de negócio trazida pelas redes sociais, que sugaram grande parte da receita publicitária sem produzir muitos conteúdos e pagando muito poucos impostos. Sofre com uma nova cultura de consumo que não aceita pagar para ler notícias ou consumir conteúdos culturais. E sofre com o preconceito de quem vê o apoio cego do Estado a um bem essencial para a sobrevivência da democracia como mais perigoso para a independência do jornalismo do que o mecenato ideológico privado.

Os cortes de pessoal e de meios têm levado à insustentabilidade de um jornalismo com mínimos de exigência e qualidade em todos os grupos de comunicação social. Mas na Global Media as coisas degradaram-se até ao absurdo. Depois da entrada de empresários sem qualquer relação ou conhecimento do setor, o toque de finados veio com a entrada de um fundo com sede nas Bahamas que ninguém sabia a quem realmente pertencia, que interesses promovia e que parecia depender da venda da participação da Global Media na Lusa ao Estado para pagar os salários nos meses seguintes.

O que aconteceu na Global Media vai acontecer a grande parte das empresas de comunicação social, presas fáceis para se transformarem em instrumentos de propaganda do poder do dinheiro. Isso, se me permitem, tem sido visível nesta campanha eleitoral. E só é possível porque os jornalistas se proletarizaram.

Jornalismo mil euros

O Inquérito Nacional às Condições de Vida e de Trabalho dos Jornalistas em Portugal, encomendado pelo Sindicato dos Jornalistas, diz-nos que o salário médio da classe está nos 1250 euros líquidos. Um terço recebe menos de mil euros – a grande maioria vive e trabalha nas regiões mais caras do país. Há muitos repórteres e editores de imagem com falsos recibos verdes, estagiários a receber 150 euros por mês, freelancer a trabalhar por 20 euros à peça. Esqueçamos a questão social, que atinge outras classes. É possível escrutinar os poderes públicos e privados com este nível de proletarização?

Os jornalistas perderam autonomia em relação aos editores e diretores, respondendo a eles como um operário responde ao encarregado. Perderam sentido critico, porque é impossível mantê-lo quando produzem em série várias peças por dia para manter ativos os portais de conteúdos em que se transformaram os órgãos de comunicação social. Hoje, muito menos jornalistas que recebem muito menos fazem muitíssimo mais. Segundo o inquérito referido, metade fala em “esgotamento”.

As redações deixaram de ser intergeracionais, porque o os jornalistas mais novos, mais baratos, substituem quase todos os mais velhos, mais caros. Não sou dos que acham que as novas gerações estejam menos preparadas. Mesmo no jornalismo, que se tornou menos atrativo, isso não é verdade. Mas as redações perderam memória, o que é tantas vezes evidente no que chega às pessoas. E perderam o lastro deontológico que passa de geração para geração. O “jornalismo mil euros” não pode cumprir a função de informar.

A primeira greve…

O Sindicato dos Jornalistas deu um passo arrojado para uma classe com poucos hábitos de luta e de organização, em que tantos não se sentem “trabalhadores” até serem despedidos e em que tantas pessoas estão numa situação muito precária: marcar, quando o ambiente da comunicação social é de pré-colapso, uma greve geral para dia 14 de março, poucos dias depois das eleições. Uma decisão que resulta de uma deliberação do congresso dos jornalistas, realizado em janeiro. A mensagem principal deveria ser esta: resolver a insustentabilidade do modelo de negócio com a proletarização total do jornalismo pode resolver o problema aos empresários, não resolve os problemas do jornalismo e do seu papel para a democracia. Pelo contrário, agrava-os.

O que os jornalistas exigem é quase o regresso ao início do mais básico das relações laborais: contratos de trabalho estáveis, pondo fim a falsos recibos verdes, aos estágios ilegais e aos contratos a termo, que são, entre os jornalistas, estatisticamente mais comuns do que noutras profissões especializadas. Um aumento dos salários para mínimos de decência. Pagamento de horas extraordinárias ou isenção de horário. Compensações por trabalho noturno ou fins de semana. Tudo o que qualquer operário exige numa fábrica. E, já agora, que o governo português acompanhe o debate europeu para encontrar soluções de sustentabilidade para uma atividade que, sendo económica, é indispensável à sobrevivência da democracia e tem proteção constitucional. Não pode falir, como um todo.

Não nos podemos deixar limitar pelos discursos dos que conseguiram transformar o apoio dado ao setor durante a pandemia num ataque à liberdade e não no oposto. Mesmo que se tenham de encontrar soluções mais neutras, esse é o discurso de interesses privados e políticos que querem ver a comunicação social insustentável para mais facilmente a quebrar, pondo a desinformação nas redes no seu lugar, ou comprar, pondo-a ao serviço da propaganda.

...em muitos lugares

Apesar de muito difícil, esta greve não é uma aventura. Está alinhada com uma luta global em quase todas as democracias de que os jornalistas portugueses não se devem alhear. Nos EUA, houve greves de jornalistas um pouco por todo o país. Ao contrário de outros setores, como o automóvel, os jornalistas não conseguiram estancar a brutal perda de rendimento com a inflação. E as reduções de pessoal sucedem-se, com cada vez mais exigências para quem fica. Houve greves no Chicago Tribune, Los Angeles Times, New York Times, Washington Post, New York Daily News, Forbes, Vanity Fair ou Business Insider. Quase todas inéditas em mais de um século.

Também tem havido greves no Reino Unido, incluindo na BBC, e em Espanha (com marcações de greves e lutas no ABC, El Pais, El Mundo, La Vanguardia e El Perodico, protestando contra uma década de congelamento ou cortes salariais). A melhor imprensa internacional também deve ser referência no grau de exigência de quem nela trabalha.

Pelo menos por agora, os cortes brutais, mesmo nos órgãos de comunicação social mais globalizados, não resultam de uma modernização que permite fazer o mesmo com menos. Pelo contrário, está-se a fazer muito mais com muito menos. Resultam de uma crise do modelo de negócio (e da entrada de empresários sem qualquer relação com o setor) que não pode ser tratada como noutros setores. A economia sobrevive sem imprensa livre. A democracia é que não.

Por isso, o debate tem de ser diferente. Não pode ser de como as empresas de jornalismo podem ser viáveis, mas de como o jornalismo pode ser viável nestas empresas. Debate que só acontecerá quando a redução de pessoal e de salários até nenhum jornalista ser realmente livre de informar deixar de ser uma opção. A greve de dia 14 é dos jornalistas. Mas está muito mais em jogo do que eles.»

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5.3.24

Leques

 


Leque de seda pintado com amores-perfeitos e paus de madrepérola esculpidos. Victoria and Albert Museum, 1880-1900.
Pintado por Ronot-Tutin.

Daqui.
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Bloco de Esquerda

 


Eleitora e apoiante.
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Mário Zambujal, 88

 

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Não se deve fazer política com o medo

 


«Não restam dúvidas sobre isto: Portugal é um país seguro. O Global Peace Index 2022 garante-nos que vivemos no sexto país mais seguro do mundo, numa lista que inclui 163 nações, e que mais tranquilidade do que a nossa só se encontra na Islândia, Nova Zelândia, Irlanda, Dinamarca e Áustria. Em 2014, estávamos no 18.º lugar. Há muita gente que sabe disto em vários continentes.

É por isso que norte-americanos compram casa em Cascais, israelitas investem no mercado imobiliário do Porto e brasileiros trocam as maravilhas do seu país de origem pelo sossego nacional.

Os brasileiros que fogem com o medo das balas perdidas e de uma criminalidade omnipresente, e os bolsonaristas do medo da presidência de Lula da Silva, ignorando que emigraram para um país governado por um partido socialista, sabem muito bem o que é o crime e a insegurança.

Não são os únicos. Cerca de 83% da população mundial vive em países nos quais os níveis de criminalidade são considerados elevados.

Além da segurança, Portugal não tem grandes razões para se preocupar com os níveis de criminalidade, como o comprovam os relatórios anuais do Ministério da Administração Interna. Se há crime, aliás, que tem vindo a crescer, é um em particular: o crime de ódio.

Sobre os crimes de colarinho branco nunca teremos informação suficiente para fazer uma ideia aproximada da sua dimensão. O que sabemos é que o crime em geral teve uma redução de 20,3% entre 2008 e 2019 e que o crime violento registou uma descida de 40,8% no mesmo período.

O crime violento, sublinhe-se, representa 4,3% de toda a criminalidade participada às forças de segurança. É verdade que quem folhear os tablóides pode ficar com uma visão mais sombria e assustadora do país. Mas é ainda mais verdade que a criminalidade em Portugal incide, sobretudo, no património e não nas pessoas. E as pessoas que são mais sujeitas ao crime são as mulheres, por causa da intolerável violência doméstica.

O crime é um dado objectivo, o sentimento de insegurança não é assim tão tangível. O tema do sentimento de insegurança tornou-se objecto de investigação académica na década de 50, como forma de estudar a relação entre o espaço público, enquanto local do crime, e o Outro, o delinquente.

A insegurança urbana foi profusamente discutida nos anos 90 no Porto, quando se falava da desertificação da Baixa como um território de alto risco, em associação a uma preocupação que nessa altura era constante: o toxicodependente-assaltante.

Vários estudos dessa época vieram esclarecer que os mapas do crime estavam na periferia do centro ou da cidade, que era onde estavam as pessoas e o património, por oposição a uma Baixa vazia.

E disseram-nos, também, outras coisas que estão presentes na literatura desta temática: que o sentimento de insegurança estava associado a pormenores do espaço urbano, como a iluminação nocturna das ruas, a degradação dos edifícios, com vidros partidos ou pichagens, e ao que certos autores chamam incivilidades, entre as quais o balde do lixo incendiado será a mais icónica.

Um dos casos que então ilustravam o sentimento de insegurança era o de uma idosa que vivia no Bairro do Lagarteiro, no Porto, tido com um dos mais problemáticos da zona oriental da cidade, que não despejava o lixo no contentor do bairro, porque tinha medo que este explodisse. O medo tinha uma explicação simples: a senhora receava que acontecesse o mesmo que tinha visto acontecer no País Basco, onde a ETA tinha colocado uma bomba num contentor semelhante.

Isto para dizer que o sentimento de insegurança não está directamente relacionado com a criminalidade e que resulta de um contexto mais vasto. “A percepção do crime e do risco de vitimização na verdade não estão separadas da percepção de outros problemas sociais, riscos e ameaças de exclusão”, como explicam Manuela Ivone Cunha e Ximene Rego em Crime e medo no país dos brandos costumes.

Por outras palavras, o sentimento de insegurança “é um fenómeno mais amplo do que o da criminalidade e, até certo ponto, independente dele” e “prospera entre aqueles que se vêem a si próprios em situação de incerteza, de vulnerabilidade ou de queda social, e que são mais sensíveis à ausência de uma acção pública eficaz nos vários âmbitos da segurança, não apenas o criminal”.

Estabelecer relações entre imigrantes, aqueles que não têm dinheiro para comprar casa ou um “visto gold”, e um sentimento de insegurança é uma de duas coisas: uma associação ignorante ou desonesta. É grave em ambos os casos que alguém a faça, sobretudo alguém que teve as responsabilidades que teve Pedro Passos Coelho, que sugeriu a emigração aos “piegas” professores desempregados. Fazer política a partir do medo não fica bem a ninguém.»

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4.3.24

Elevadores

 


Um belo elevador do Hotel Central de Praga, 1898-1901.
Arquitectos: Friedrich Ohmann, Bedrich Bendelmayer e Alois Dryák.

Daqui.
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Tem piada e não ofende

 


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Passado ou não Passado?

 


«Questionado sobre o seu ídolo político, Montenegro não escolheu o óbvio (o mito de Sá Carneiro), nem o herói do governo de guerra recente (o sebastianismo de Passos Coelho). Quis o politicien-pas-politicien: a figura tutelar é, afinal, Cavaco Silva. Longe de aleatória, a escolha insere-se num claro esforço de recentramento ideológico que o timoneiro da AD tem vindo a travar. E, se a estratégia parece estar a funcionar junto do eleitorado, aumentando a intenção de voto, parece não ser consensual dentro da coligação.

A aparição de Pedro Passos Coelho era inevitável, mas carregava sempre o risco de cristalizar a associação de Montenegro ao período da Troika - estratégia que o PS andava a ensaiar há semanas. Montenegro procurou escudar-se na figura de Cavaco. Se Cavaco Silva deu aos pensionistas o 14º mês, Passos cortou-lhes o 14º e o 13º. Se Passos está associado, no imaginário público, a uma época traumática do país, Cavaco Silva é o primeiro-ministro de um tempo saudoso. Impopular junto do grupo mais importante para Luís Montenegro, Passos Coelho teria de centrar o seu discurso na figura do actual líder, criar o mínimo estrondo possível, e animar as hostes sociais-democratas. Mas decidiu, uma vez mais, contrariar tacitamente a estratégia de Montenegro.

O discurso de Passos conseguiu 3 coisas: 1. Pedro Nuno tinha acabado de perder o seu maior trunfo: depois do “não é não”, ficou claro que Luís Montenegro não iria ceder às pressões do Chega. Já não dá para usar a estratégia que deu a maioria absoluta a António Costa. Passos fez com que a AD perdesse a vantagem. A esquerda estava desmobilizada. Claro que o ex-PM iria sempre agitar as águas, mas o tiro final foi dado pela associação populista entre a imigração e a segurança. De repente, a esquerda teve exactamente o que precisava. E foi-lhes dado por Passos Coelho. 2. Evidenciou uma cisão no seio da AD. Não é segredo que a decisão corajosa de rejeitar quaisquer negociações o Chega não é consensual. Passos Coelho deixou um aviso subliminar a Montenegro: “o resultado natural é a vitória da AD. É a coisa mais natural do mundo”. Traduzido por miúdos: “Luís, se não ganhares, é por incompetência”. 3. Forçou a mão de Montenegro, que rapidamente se viu obrigado a fazer uma promessa que poderá, mais tarde, virar-se contra si. Numa tentativa de salvar o PRPC (processo de reconciliação com os pensionistas em curso), Montenegro prometeu demitir-se caso tivesse de cortar um cêntimo nas pensões. É uma promessa perigosa - e que teria sido desnecessária não tivesse Passos agitado tanto as águas.

A aparição do D. Sebastião beneficiou todos menos Luís Montenegro: à esquerda tiveram a associação que andavam há semanas a pregar, o PS conseguiu um bocadinho do seu trunfo de volta, os sociais-democratas que discordam da estratégia de recentramento de Montenegro podem voltar a sonhar com um líder mais à direita e que não nega o Chega caso precise de formar governo, e André Ventura teve o seu discurso xenófobo legitimado pela figura preferida da direita. Para Luís Montenegro, fica a dúvida: entre a externa e a interna, qual a campanha mais difícil?»

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02.03.2013 – Quem lá esteve não esquece

 


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3.3.24

Uma frase, duas frases

 

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Fantasmas

 

«A chamada crise da dívida soberana precipitou-se depois da crise financeira mundial, devido ao rebentar da bolha especulativa financeira originada nas hipotecas subprime, que obrigou os estados a pagarem grande parte do buraco financeiro deixado pelos bancos privados.

No início da crise, um dos grandes cronistas do Financial Times comparava as políticas da Troika à decisão de um condenado à morte, a quem é dada a possibilidade de viver caso ensine inglês ao cavalo do rei. O homem aceita o desafio pensando: “Este ano, o rei pode morrer, eu posso fugir e até o cavalo pode aprender inglês”.

Não consta que a Troika e Passos Coelho tenham resolvido a crise, e nem que o cavalo tenha aprendido a falar inglês.»

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Alfredo Cunha, 25 de Abril (10)

 


«Amigos

A partir de agora, recomeço a publicar, na medida do possível, fotografias relativas ao livro "25 de Abril de 1974, Quinta feira". Espero que gostem tanto como eu gostei de o fazer.»

Alfredo Cunha no Facebook
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Os embaraços de Montenegro

 


«Se a visibilidade mediática for um critério para mobilizar o eleitorado e criar uma dinâmica de vitória, a semana terá beneficiado claramente Luís Montenegro. Desde a aparição de Pedro Passos Coelho, que conseguiu um retumbante pleno na atenção dos partidos, até ao incidente com a tinta verde que atingiu o líder social-democrata, passando pela polémica do aborto e pelo negacionismo climático, os holofotes estiveram sempre virados na mesma direção. Resta saber o que sobra quando se faz uma leitura crítica das polémicas que obrigaram Montenegro a permanentes clarificações.

Há óbvias diferenças de impacto e de consequências nos sucessivos casos que fizeram a semana da AD. Paulo Núncio ou Eduardo Oliveira e Sousa não têm o peso político nem a autoridade de Passos Coelho, que continua a ser uma das personalidades mais respeitadas no PSD. Mas o facto é que ambos estão em posições de destaque nas listas (o vice do CDS é número quatro em Lisboa e o antigo presidente da CAP cabeça de lista por Santarém) e as declarações que proferiram foram feitas em nome da AD e em eventos de campanha, não sendo fácil - como tentou Luís Montenegro - reduzi-las à expressão de opiniões pessoais.

Tudo somado, a semana teve associações perigosas entre imigração e aumento da perceção de insegurança, críticas à ideologia de género nas escolas, defesa de um novo referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez, ataque às “falsas razões climáticas” que travam investimentos e alusão a milícias armadas nos campos. Algumas das frases proferidas contra a extrema-esquerda em Santarém facilmente se confundem com os ataques de André Ventura à “esquerdalhada”.

É possível admitir que essa aproximação é tática e visa secar a extrema-direita, mas há dois riscos evidentes nesta análise. Desde logo, são claras as divergências dentro dos partidos que integram a AD e dentro do próprio PSD relativamente a algumas das matérias, incluindo nos cenários de (não) diálogo com o Chega. Um segundo, mais grave, está demonstrado internacionalmente: longe de secar os extremismos, esse caminho é uma via rápida para a legitimação e normalização de discursos radicais e de propostas até agora fora da agenda dos partidos moderados. Resta saber se é ruído de campanha, ou sementes de um futuro a chegar.»

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Venham mais cinco

 

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