12.7.25

Que belas casa!

 


Quatro casas de estilo Arte Nova geométrico, St. Gilles, Bruxelas, 1901.
Arquitecto: Jean-Pierre Van Oostveen.

Daqui.

12.07.1973 – O dia em que a polícia invadiu a TAP



Ia agitado a ambiente entre os activistas da TAP, quando a polícia carregou em todos os que se dirigiam para uma assembleia na Voz do Operário, em 11.07.1973, na qual devia continuar a ser discutido um novo acordo colectivo na empresa. Os trabalhadores decidiram então concentrar-se no aeroporto, onde, no dia seguinte, as oficinas pararam e uma concentração ainda maior, calculada em 5.000 trabalhadores, exigiu explicações à administração da empresa pelos factos da véspera.

A polícia de choque entrou então nas instalações, abriu fogo e fez vários feridos. No entanto, a resistência dos trabalhadores, em terreno conhecido, rapidamente se tornou insustentável para a própria polícia. Esta tentou ainda entrar num dos hangares, mas renunciou à ideia ao notar que podia ser alvo do dispositivo anti-incêndios. Alvejada por fisgas e com esferas de rolamentos, decidiu retirar-se. Mas teve de o fazer sob uma chuva de projécteis, que a atingiam a partir dos edifícios de escritórios.

Nos dias seguintes, o conflito intensificou-se com a extensão da greve das oficinas à pista e aos escritórios. Só em 17 de julho se registou o regresso ao trabalho, após conclusão de um acordo em sede de comissão arbitral em que o advogado sindical (Jorge Sampaio) votou vencido, por não ver nele satisfeita a reivindicação de se realizar a assembleia impedida em 11 de Julho.

No entanto, o acordo representava para os trabalhadores uma meia vitória ou mais: garantia que não houvesse prisões ou outras represálias; que seriam libertados os presos na noite de 11 de julho; e que haveria informação sobre o estado dos feridos e tratamento dos mesmos por conta da TAP.

Texto resumido a partir daqui.
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Pablo Neruda

 


Pablo Neruda nasceu em 12 de Julho de 1904, em Parral, no Chile, e morreu em Santiago, em Setembro de 1973, poucos dias depois do golpe que vitimou Salvador Allende. Não se tinha candidatado às eleições presidenciais de 1970 por ter considerado que Allende tinha mais possibilidade de as vencer, como veio a verificar-se.

Recordemo-lo um pouco, com a sua voz inconfundível.




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A cloaca

 


«Estes são alguns dos cerca de mil comentários que foram publicados no Facebook da CNN, depois do último Princípio de Incerteza.

A mama e o tacho

Carlos Da Silva
Mais um que pensa que sabe tudo Acho que estam todos com medo de perder a mama.

Jose Figueira Dos Santos
Mais um chulo do sistema sempre a mamar a 50 anos

Daniel Calôba
Todo povo que é contra o CHEGA so tenho a dizer 2 coisas , ou anda a a viver as custas dos outros e teem medo da mama acabar ou querem arruinar Portugal , pessoas que nao teem um palmo de testa que nao veem que este Pais esta a ficar perigoso para nossos filhos e netos , cultivem se pessoas

António Silva
O Pacheco mama no sistema e está a ver a teta a acabar se o chega governar a mama vai acabar por isso viva o chega viva ventura viva Portugal sempre

Jose Cardoso
Estavas habituado a mama valia mais estares calado.devias estar na toca

Ribeiro Ribeiro
Vergonha é esse gajo a mamar durante 50anos a conta do povo sem fazer nada

Carlos Calvo
Mais um que andou somente a vida toda a encher o NALGUEIRO á costa do Zé Tuga. Parece que os tachos estão a ficar menores e as tampas a desaparecer

Antonio Margarido
Não consegues ser o último dos últimos.És um inútil faccioso e chupista do sistema.

Xéxé e dinossaúrio

Jose Carlos Conde
Este PP está senil!

Vasco Pina Cabral
PP já não e ouvido em lado nenhum...apenas um caquético velho do Restelo!

Fatimamedeiros Morais
Eu não acredito que estes velhos ultrapassados pela mentalidade tacanha, ainda venham dar palpites.chulos do sistema.

Filipe Silva
Pacheco Pereira, todos temos um tempo, e o teu já passou, estás senil, trata-se, e abstém-te de opinar, a tua geração foi a mais corrupta da democracia.

Mario Pestana
Cala-te velho do sistema,a tua reforma tambem devia ser cortada, para pagar os subsidios aos emigrantes

Charles AP
Este velho a apoiar a estrangeirada.

A nulificação do outro

António Silva
Mais um parasita à procura de poiso…..nunca foi nem fez nada na vida a não ser viver à conta dos papos que manda…agora que começa a ver o cerco apertar está à procura de alguém que acolha…(à esquerda pois claro)

Mario Barreto
Não vales um cigarro

Vitor Almeida
Viveu como um Lord, apesar de pertencer há ocmlp,MRPP, depois procurou o seu sustento, agora destila ódio e protagonismo, qualquer dia cândidate-se a presidente da República

Armando Saramago
Historiador de marretas !

Victor Mendes
Gostaria de saber quanto este senhor recebeu do estado para ter o projeto efémera

A censura

Miguel Ribeiro
Olá. Eu acho vergonhoso certas alarvidades que este senhor Pacheco Pereira brucifera. Não percebo como é que é possível tê-lo como comentador, há semelhança de muitos outros. O nosso dinheiro chega para todos?

Emilia Bastos
Para dizeres umas nugices na TV.

Carlos Silva
Pacheco zurra para outro lado que já não te ouço

Eugénio Assis Alberto
Outro que só está de bem com ele próprio. Renovem os "comentadeiros". Este já está podre...

Teresa Ferreira
Um ditador comuna disfarçado ,nem deviam ter direito a comentar essa corja ,depois de tudo o que fizeram ao país e aos portugueses,,,sao uns ridiculos

O pseudotudo

Francisco Santos
Eh mano, vai lá limpar o pó dos.teus livros, nao chateies a gente Pacheco Pereira mais um chulo da política que agora vem dar uma de historiador. Vai nanar, tu e a CNN Portugal.

Vítor Timóteo
Vergonha.,foi teres desrrtado...abandonado os teus homens....e teres teabalhado com o inimigo da altura contta o teu povo

Burro

Jose António Pereira
Fostes sempre um tinhoso ,e não mudas nada!quando foi feita a distribuição da inteligência faltas-te à formatura. ÉS um triste.

Rui Loução
Deviam de ouvir este senhor. Esse escroque não vale meio tostão furado. Não lhe passei credêcial para dizer que me vem defender
Vá dar banho ao cão

Comunista

Jose Goncalves Ferreira
Pois e um comunistas a cara dele mostra tudo

Henrique Carvalho
A CNN tem um padrão nos seus comentadores estão senis ou são comunas. Só falta irem buscar a outra louca que está na SIC. O NOW vai limpar as audiência.

Manuel Gomes
Qur quer esse Cömuna ? Chega sempre Chega

Alexandre Branco
Assim se vê o caráter das pessoas um Marxista de extrema esquerda que virou "Democrata" a dizer mal da Direita como que a envergonhar o seu passado moralista de vão de escada

Jose Lima Oliveira
Este Pacheco é comunista está com pena das criancinhas que as leve pra casa dele

Puro insulto

Ligia Fernandes
Pacheco Pereira vai lamber sabão! Ora dá uma no cravo outra na ferradura.

Lelo Alberto Nunes
Se este porco quiser pode ligar-me terei muito gosto em compará-la publicamente com a dele

Paulo Brito
Este palhaço e os da mentalidade dele deveriam todos ser enviados para Sibéria...

Jorge Nogueira
Pacheco Pereira era so quem te desse com um gato morto nos cornos ate ele miar corrupto , esquerdalha

Vitor Gaspar Lopes
Sanguessuga

Jose Manuel Nunes
Mete menos tabaco

Orlando Ricardo Prata Leal
Quando apalparem uma das tuas netas na primária, assobias para o lado como se nada acontece&se

Jonas Alexandre
Porcoooooooooooooooooooooooooooossssssss este pacheco pereira e este elenco no estudio é so porcoooooooooooooooooooossssssssssssssssssssss

Mmgf Freitas
Este Pacheco que va comer bolota p o Alentejo

Vamos já precisar algumas coisas. A primeira é que não vale a pena dizer que não são militantes e eleitores do Chega. São mesmo, mais alguns do PSD. Outra é que considero que o insulto está no âmbito da liberdade de expressão, a única coisa que não cabe na liberdade de expressão é o crime. Outra é que muitos insultos são também dirigidos ao Chega, mas é suposto que uma coisa não lava a outra. Outra é a preocupação com o grau de violência que estes insultos traduzem.

É muita gente? Não, não é. Todos os que é possível identificar têm meia dúzia de seguidores, ou seja, é gente que não fala para ninguém, a não ser por este efeito de matilha.

Sempre tive relações cordiais com André Ventura, porque sempre distingui as ideias políticas, com que não concordo, das relações pessoais. Mas a minha pergunta é esta: é este o Portugal no qual se revê, no qual quer educar os seus filhos, no qual valores tradicionais e conservadores a que chamamos “boa educação” existem e são praticados? São isto valores cristãos? Onde está a caridade? Se isto é um retrato da “revolta”, esta revolta é na sua essência antidemocrática, antiliberal, violenta e autoritária, e muito pouco portuguesa, se queremos um Portugal com liberdade, com liberdade onde se podem escrever estes insultos.»


11.7.25

Não é Andróide nem IOS

 


Telefone de escritório “Lira”, 1905.
Fabricante: J Qual.


Daqui..

Querem ver…

 


… que o julgamento Joana Marques / Anjos é o que de mais importante acontece hoje no país? Alguma dúvida para quem tente ler, ou ver, OCS?

Somos mesmo só três sílabas (de plástico) como disse O’Neill.

Armas para um mundo em chamas

 


«Em poucos meses, a Europa avançou com propostas para investir até 5% do seu PIB em armamento, justificando-se com a guerra na Ucrânia, a instabilidade no Médio Oriente e o regresso de uma lógica de confrontação militar entre blocos. No entanto, sete meses antes, durante a Cimeira do Clima de 2023, no Dubai, os mesmos governos não conseguiram reunir consenso para garantir que o Fundo Global para Mitigação e Adaptação Climática atingisse sequer 1% do PIB global.

Esta assimetria diz-nos muito sobre as prioridades reais das elites políticas e económicas. Quando o desafio é militar, a decisão é imediata. Quando o desafio é climático – estrutural, difuso e planetário –, a resposta continua a ser adiada. Esta disfunção é, ao mesmo tempo, moral, estratégica e económica.

A crise climática já não é uma ameaça futura. É presente, concreta e cada vez mais letal. Na semana passada, Portugal continental viveu uma onda de calor intensa, com temperaturas que ultrapassaram os 46 graus Celsius e dezenas de concelhos sob risco máximo de incêndio rural. Mas o calor não mata apenas nas florestas. Mata também nas cidades, nos hospitais, nos lares e nas casas onde vivem milhares de pessoas em pobreza energética severa.»

Continuar a ler AQUI.


Habituados já estamos

 


DAQUI.

Eis o desígnio da AD: destruir a economia, outra vez

 


«Há dias, o ministro Leitão Amaro avisou que “a economia terá de se adaptar à diminuição da entrada de imigrantes no país”. A declaração merece ser levada a sério — e tem uma ressonância inquietante da anterior passagem da AD pelo Governo. Com a troika, Passos Coelho, movido por uma fúria moral e punitiva, decidiu aplicar toda a austeridade de uma só vez. O país enfrentava um problema macroeconómico, e o Governo escolheu somar-lhe uma camada adicional de dificuldades. Executado com zelo, o frontloading de má memória deixou a economia em cacos.

Agora, o caminho volta a ser o da resposta moral, em detrimento dos fundamentos económicos — desta vez, em torno da nacionalidade e da imigração. Aliás, por estes dias, a OCDE deixou o alerta: o crescimento económico está em risco por falta de trabalhadores. Segundo a organização, os países mais industrializados tiveram no mercado de trabalho o motor do crescimento das suas economias. O cenário próximo, porém, é mais desfavorável: a escassez de trabalhadores pode começar a travar a economia.

E quem foram esses trabalhadores que puxaram pela economia? Está fácil de ver: os imigrantes, cuja chegada é a única forma de compensar as tendências demográficas negativas. No caso de Portugal, a força de trabalho cresceu, em média, 0,7% nos últimos quatro anos, graças exclusivamente à entrada de trabalhadores estrangeiros. Sem imigração, a mão-de-obra disponível teria diminuído 0,1%.

Mas a OCDE não se limita a olhar para o passado. Estima também o que poderá acontecer se os fluxos migratórios diminuírem. Se a vontade da coligação AD/Chega se concretizar e o país passar a ter um saldo migratório nulo, a taxa de crescimento per capita da economia portuguesa recuará 0,6 pontos percentuais.

Atrair imigrantes é fundamental para o crescimento económico. Mas, claro, o Governo pode sempre considerar que é preciso “equilibrar” cultural e etnicamente o país e, desta feita, afirmar “que se lixe a economia”. É um caminho legítimo —, mas com danos colaterais. E a questão não se coloca apenas às empresas, sobretudo às dos setores mais dependentes de mão-de-obra imigrante (da restauração à hotelaria, passando pela agricultura e construção civil).

Repare-se: uma das rábulas do discurso anti-imigração assenta na ideia de que uma horda de estrangeiros está a capturar o nosso Estado social, ocupando os lugares dos portugueses. Ora, o crescimento da população e a sua recomposição demográfica exigem investimento no Estado social — da escola à saúde, passando pela habitação. Esse, aliás, deveria ser o debate prioritário.

Mas a realidade, hoje, diz-nos que os imigrantes são (grandes) contribuintes líquidos para a Segurança Social — só no ano passado, contribuíram com 3,6 mil milhões de euros, o que representa 12,5% da receita total. E, no que é menos sublinhado, representam uma fatia crucial dos cuidadores de que dependem as nossas respostas sociais.

Pois é. Ao contrário do que afirma Leitão Amaro, não são apenas as empresas que terão de se adaptar à diminuição de imigrantes. São também os lares, os centros de dia, as creches e os hospitais. Como se resolve esse problema? Vamos abandonar necessidades sociais num contexto de envelhecimento da população? Os hospitais vão reduzir a sua atividade e os lares a sua capacidade? De que forma o Governo pretende suprir a mais que previsível falta de trabalhadores nas respostas sociais? O que vale é que fomos avisados: teremos de nos adaptar.»


10.7.25

Há quem peça mais portas

 


Casa Tassel, Arte Nova, Bruxelas, 1893.
Arquitecto: Victor Horta (foi a sua segunda residência)
 
V. Horta projectou não só a arquitectura do edifício, mas também cada detalhe da decoração e mobiliário.

Daqui.

Dois porcos que viraram almirantes

 


De vez em quando, é bom recordar que também nos divertíamos na luta contra o fascismo.

Em Julho de 1972, as Brigadas Revolucionárias lançaram dois porcos nas ruas de Lisboa, no Rossio e em Alcântara, como reacção à farsa eleitoral que reconduziu Américo Tomás ao seu último mandato como presidente da República.

Estavam vestidos de almirantes (tal como Américo Tomás...) e untados para ficarem escorregadios. A polícia não conseguiu agarrá-los e teve de os matar à metralhadora. Grande sucesso nas ruas de Lisboa! Foram depois distribuídos panfletos, lançados por petardos, com o seguinte conteúdo:

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Se não tem médico de família...

 


A Europa precisa de visionários, não de sobreviventes

 


«Donald Trump faz o que quer da NATO, do G7, da ordem liberal internacional e dos líderes europeus. E fá-lo com o à-vontade de quem sabe que ninguém se lhe opõe, seja no Irão ou em Gaza. Há muito que deixou de ser apenas uma figura disruptiva: tornou-se, no palco atlântico, o único ator que realmente importa. Os restantes, de Mark Rutte a Emmanuel Macron, de Úrsula von der Leyen a Keir Starmer, limitam-se a desempenhar o papel de figurantes, uns mais elegantes do que outros, mas todos movidos por um instinto comum: não desagradar a Sua Majestade.

Contudo, mais inquietante do que aquilo que Trump faz é o que a Europa já não faz. Onde estão os Monnet? Os Schuman? Os Bevin ou as Veil? Os Adenauer ou os Delors? Onde estão os adultos na sala? O que nos resta é Mark Rutte. O mesmo que, durante 14 anos como primeiro-ministro dos Países Baixos, não cumpriu a meta dos 2% de investimento em defesa – alcançando-a apenas no ano em que se tornou secretário-geral da NATO – e se opôs ativamente, no Conselho Europeu, à emissão de dívida conjunta para salvaguardar a segurança europeia e ucraniana. O frugal de ontem é o apóstolo da defesa hoje. Não há coerência nem visão, apenas oportunismo.

Desde o seu regresso à Casa Branca, Trump tem testado os limites da diplomacia ocidental com a mesma brutalidade performativa que marca a sua política interna. Reescreve compromissos à sua medida, transforma cimeiras em cultos de personalidade e converte as relações multilaterais em instrumentos de chantagem. A última reunião da NATO, em Haia, foi disso prova evidente. A organização que durante décadas sustentou a dissuasão estratégica europeia, curvou-se perante Trump. Os aplausos ao novo “Kissinger” foram muitos. A dignidade, pouca.

Como se não bastasse, o G7 decidiu isentar as multinacionais americanas de um limiar mínimo global de tributação. Sob pressão da Casa Branca, e perante a possibilidade de um veto de Trump ao acordo da OCDE, os países mais industrializados do mundo cederam. Escudaram-se numa alegada “soberania tributária” dos Estados Unidos, mas o que está verdadeiramente em causa é o colapso de qualquer tentativa de criar regras comuns numa economia global. O sistema justaposto que agora se propõe é, no fundo, um eufemismo diplomático para a impunidade fiscal. A pergunta impõe-se: que soberania resta à Europa?

Trump não é apenas uma anomalia institucional. É o sintoma de um ecossistema mediático e político que recompensa o ruído em detrimento da substância. A sua interrogação favorita – how is it playing – substituiu o cálculo estratégico, a ponderação de custos e o interesse nacional. Se uma decisão militar ou diplomática gera um ciclo noticioso favorável, é boa. Caso contrário, deve ser disfarçada, distorcida ou pura e simplesmente negada. O que não aparece no ecrã, não existe. O que não cria drama, não tem valor.

O estilo de Trump é o do homem que exige ser protagonista mesmo quando os holofotes deviam estar virados para os factos.

E neste enredo, a Europa não passa de um ator secundário. O continente que outrora se uniu aos Estados Unidos para forjar a ordem liberal resigna-se agora a uma posição subalterna. Em vez de resistir, ajoelha-se. Em vez de liderar, segue. Em vez de propor, aquiesce. Nem mesmo a Alemanha, que jurou recuperar o seu lugar como eixo da estabilidade atlântica, contraria Washington, preferindo consensos apressados perante a possibilidade de impostos alfandegários de 50% a partir de 9 de julho. Já a França, apesar dos reflexos gaullistas do seu Presidente, não conseguiu evitar ser arrastada para o jogo da adulação. As elites europeias – herdeiras de Monnet e Delors – perderam o pé: confundem realismo com resignação, diplomacia com subserviência.

E Portugal? Participa nos rituais, mas raramente os questiona. Critica, nas entrelinhas, a hesitação de Espanha e gaba-se, nos bastidores, de ser ponte entre aliados. Proclama hoje 3,5%, como ontem proclamava 2%, com o mesmo entusiasmo retórico e a mesma vacuidade estratégica. Orgulha-se de ser membro fundador da NATO, como se a história bastasse para legitimar a irrelevância. Mas que valor acrescenta? Que influência exerce? Servirão as Lajes para justificar tudo? A ausência de uma posição inequívoca sobre a Palestina, a complacência perante o constante bloqueio no seio do Conselho Europeu e o seguidismo acrítico em relação a Washington revelam um país que também renunciou a ter posições próprias. Não se trata da presença em fotografias de grupo, trata-se de saber quando dizer sim e quando dizer não.

A questão, afinal, é simples. Quer a Europa continuar a existir como ator relevante, ou limitar-se a ser um apêndice da Casa Branca? Se a resposta for a primeira, então impõe-se uma refundação da sua arquitetura. Uma união fiscal verdadeira. Uma política de defesa realmente comum. Uma política externa capaz de superar o veto e a paralisia da unanimidade. Uma rutura clara com o infantilismo atlântico e a assunção plena da idade adulta geopolítica. Não para se opor aos Estados Unidos, mas para poder escolher livremente quando estar ao seu lado. Não há soberania partilhada quando apenas uma das partes dita as regras. Recordar a inércia europeia é apenas o começo. Convém perguntar por que falhámos em criar uma União da Defesa, mesmo depois da Crimeia. Porque não temos política verdadeiramente comum para o Indo-Pacífico, África ou Médio Oriente? E porque continuamos a reagir a Washington, em vez de nos prepararmos para os nossos próprios dilemas estratégicos? A cimeira da NATO expõe esse vazio. Ao omitir a China, que já garantiu que não deixará cair a Rússia, confirma a visão da Aliança como um instrumento de um só homem. Ao legitimar um ataque preventivo ao Irão, contribui para colocar em causa o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares. Ao evitar falar sobre Gaza, sobre a fome deliberada, os armazéns destruídos, as crianças a morrer à sede, abdica do papel de árbitro e aceita o de espectador cúmplice.

É por isso que a pergunta resiste e se torna mais premente a cada capitulação: onde estão os estadistas? Não os gestores do quotidiano, os calculistas de cimeira, os Ruttes do presente, mas os Monnets. Os que pensaram em décadas, não em ciclos noticiosos. Aqueles que ergueram instituições, não os que se escondem atrás delas. Os que traçaram horizontes comuns quando outros hesitavam; os que avançaram quando todos recuavam. Se não regressarem, a Europa reduz-se a um mero mercado, um espaço de deferência, um museu: politicamente periférica, moralmente esgotada, militarmente irrelevante.

A história não espera pelos indecisos – muito menos pelos subservientes.»


9.7.25

Rita Cid Matias (Chega)

 


Vieira Resurrected no Facebook.

Was ist das?! Silva?!

 


«O deputado suíço pediu a palavra e disse ao Parlamento que ia ler os nomes das crianças inscritas numa escola de Zurique. Eram nomes bastante exóticos na Suíça: “Silva. Santos. Ferreira. Costa. Oliveira. Sousa. Rodrigues.” Como é evidente, o caso gerou indignação em Portugal. Manifestando-se contra a presença de apelidos portugueses nas escolas suíças, o deputado hostilizava os nossos emigrantes, e revelava que o povo suíço não tinha especial vocação para acolher estrangeiros, ao contrário do português, celebremente hospitaleiro. Juntamente com a valentia, uma das características de que os portugueses mais se orgulham é a de saber receber e conviver com pessoas de outros povos. Por isso, este foi um episódio muito significativo — e o facto de, que eu saiba, nunca ter acontecido não lhe retira importância.

Esta semana, André Ventura leu no Parlamento uma lista de nomes de crianças filhas de imigrantes inscritas numa escola portuguesa, para demonstrar que está em curso uma mudança cultural e civilizacional no nosso país. O presidente do Chega disse ter tido a preocupação de referir nomes “não identificáveis”, mas horas antes a deputada Rita Matias, do mesmo partido, tinha lido nas redes sociais uma lista com nomes e os respectivos apelidos. Rita Matias esteve melhor: como o Chega é um partido que se preocupa com os valores da família, identificar o nome de família das crianças é, obviamente, um gesto nobre e bonito.

Numa coisa, é preciso reconhecer, Ventura tem razão. Não há dúvida de que basta olhar para os nomes das crianças para perceber a profunda transformação cultural e civilizacional que o país sofreu. Há 40 anos, os nomes dos meus colegas eram Carlos, Fernanda, Paulo, Sandra, Vítor. Agora, as crianças chamam-se Martim, Sofia, Benedita, Vicente, Francisca. Parece outro país — o que, de facto, assusta. Além disso, Ventura tocou noutro ponto importante. Depois de ler a lista de nomes inscritos no ensino pré-escolar, bradou: “Estes senhores são zero portugueses!” Mesmo quem não vota no Chega há-de concordar que, se há senhores a inscreverem-se no ensino pré-escolar, as autoridades deviam fazer alguma coisa. Por outro lado, começa a ser difícil compreender o que é que o Chega defende no que toca à imigração. Às segundas, quartas e sextas, acusam: “Olhem para estes imigrantes, que nem sequer falam a nossa língua!” Às terças, quintas e sábados, denunciam: “Olhem para estes imigrantes, a inscreverem-se na escola para aprenderem a falar a nossa língua!” E ao domingo descansam a voz, que deve estar exausta.»


Mercedes Sosa

 


Mercedes Sosa chegaria hoje aos 90. Nasceu no Noroeste dessa extraordinária terra que é a Argentina, em San Miguel de Tucumán, cidade onde também num 9 de Julho foi declarada a independência do país (em 1816).

Quando a Junta Militar de Jorge Videla subiu ao poder e se foi tornando cada vez mais agressiva, Mercedes, considerada peronista de esquerda, foi detida durante um concerto em La Plata, em 1979, refugiou-se depois em Paris e em Madrid e só regressou a Buenos Aires, e ao magnífico Teatro Colón, em 1982.







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Quem não tem casas e médicos, caça com imigrantes

 


«Entre os inquiridos desafiados a escolher os dois temas a que o governo deve prestar mais atenção, 68% escolheram a saúde, 46% a habitação e 38% a imigração. Ou seja, saúde e habitação são as duas maiores preocupações dos portugueses, segundo o mais recente barómetro da Intercampus. E são as duas áreas em que o falhanço do governo é mais evidente. Por isso, é natural que se concentre na terceira.

Sobre a habitação, escreverei amanhã. Reduzindo a oferta (através da reversão de todas as medidas para travar o desvio de casas para outras funções, a começar pela turística) e pressionando a procura (com apoios e reduções fiscais à compra), a que acrescerá uma maior dificuldade na construção, devida a restrições mais amplas à imigração, a crise da habitação não se limitou a piorar. O governo atirou gasolina para a fogueira. Os últimos dados são claros: o aumento dos preços homólogos no primeiro trimestre deste ano foi de 16,3%, quando foi de 5,7% na EU e de 5,4% na Zona Euro. Três vezes mais.

Na saúde, a ministra criou o caos à sua volta, substituindo lideranças hospitalares (que insultou) com base em critérios partidários. Teve três diretores do INEM (e os problemas só se agravaram) e terraplanou a reorganização que tinha começado com a criação da Direção Executiva do SNS, apenas para alimentar as suas mesquinhas inimizades. A isto junta-se um concurso para o transporte aéreo de doentes, ganho, fora de todos os prazos por incúria da ministra, por uma empresa sem helicópteros para o fazer. Poderes bastante fortes na área dos negócios da saúde têm de estar próximos do governo para que esta ministra tenha sido reconduzida e se mantenha firme no lugar.

Só nas últimas semanas, tivemos a confirmação de pelo menos uma morte durante as duas greves em que o INEM não garantiu serviços mínimos por não ter sido avisado pelo ministério (e a ministra insiste em exigir uma correlação direta entre as mortes e a greve num dia em que todo o serviço entrou em colapso); o caso das duas grávidas que perderam os seus bebés – uma depois de ter estado em cinco hospitais diferentes em apenas 13 dias e outra, do Barreiro, em situação de risco, sem qualquer urgência de obstetrícia aberta na Margem Sul; e o doente com traumatismo craniano grave que esperou cinco horas porque o helicóptero da Força Aérea, necessário por falta de soluções da empresa contratada, era demasiado grande para aterrar no Hospital da Covilhã. Segundo os critérios da ministra Marta Temido, a demissão de Ana Paula Martins já teria acontecido. Segundo qualquer critério normal, com tanto acumular de incompetência, também.

Falhadas as duas principais prioridades para os portugueses, é natural que o governo, como manobra de diversão, se esteja a dedicar à terceira. Aí, pode contar com a ajuda do Chega, que se está nas tintas para os dois temas anteriores, (a não ser na medida em que possa culpar os imigrantes por eles).

A centralidade dada à lei da nacionalidade é, mais uma vez, desmentida pelos números. Tal como nas atribuições de nacionalidade em 2023, a maioria dos pedidos pendentes não é de cidadãos estrangeiros residentes em território nacional. Cerca de 30% são de descendentes de sefarditas (a lei já foi mudada), 40% de lusodescendentes e só os restantes 30% têm origem em imigrantes a residir em Portugal. O governo continua a não divulgar números oficiais para poder continuar a trabalhar na propaganda.

Quanto à imigração, não se vislumbra que a alternativa à manifestação de interesses, que implicava um enorme investimento nos serviços consulares, vá funcionar. O que levará à falta de imigrantes ou a mais imigrantes ilegais. Ou voltarão as regularizações extraordinárias, que era como tudo se resolvia antes. Toda a conversa da integração foi aniquilada, dificultando o reagrupamento familiar.»


8.7.25

Musas

 


A musa adormecida, 1910.
Constantin Brancusi.

Daqui.

O esgoto

 


Edgar Morin

 


Conheci-o numa das suas primeiras vindas a Portugal nos idos de 60, sempre presente num mundo a que eu também pertencia. Lembro-me de muitas reuniões e colóquios, e até de termos assistido, na TV e em grande grupo, a um decisivo desafio de futebol. Também, de ter convivido com ele no Algarve, em casa de amigos muito próximos onde se refugiara para escrever.

No Twitter, vejo hoje que continua a partilhar muitos posts (ainda ontem o fez) e encontrei este, da sua autoria, de 5 de Junho: «Trop d'absurdité, trop de cruauté trop de barbarie, trop de haine, trop de mépris trop de carnages».
(«Demasiado absurdo, demasiada crueldade, demasiada barbárie, demasiado ódio, demasiado desprezo, demasiada carnificina.»)

Todos os nomes. Um dia será o do seu filho

 

«Seria apenas mais um episódio infeliz da deplorável miséria humana que caracteriza André Ventura e Rita Matias, se não se desse o caso de se estar a tornar o dia-a-dia de um Parlamento cada vez mais degradado pela ação dos que têm como objetivo político sério o desrespeito pelas instituições democráticas. Só vale a pena a nossa indignação para travarmos, porque ainda estamos a tempo de o fazer, a indigência moral coletiva para que estes seres nos querem atirar como país.

Começou nas redes sociais, pela voz da triste Rita Matias, continuou na Assembleia da República pela voz de André Ventura, com a muito infeliz concordância de Marcos Perestrello, que presidia aos trabalhos. Ler uma lista de nomes de crianças inscritas numa escola pública para fomentar o ódio aos imigrantes; só não sei se é o mais baixo a que se pode descer, porque tenho quase a certeza de que o Chega chegará ainda mais baixo nesta sua determinação em trazer à superfície toda a indignidade que a natureza humana pode gerar. (…)

Tenhamos todos bem noção do que é o Chega. É feito de gente sem moral e sem escrúpulos. Oportunistas que hoje defendem os que atacarão amanhã, ao sabor das suas conveniências. Hoje, foram os filhos dos imigrantes. Em breve, serão os nossos filhos.»


Sabe-se lá quem é de cá?

 


«Quando o Governo decidiu mudar a lei da nacionalidade, não respondeu a um excesso. Respondeu a um eco. Não quis reformar. Quis marcar posição. Quis, sobretudo, deixar claro que, em certos temas, já não teme parecer parecido com quem antes garantia nunca imitar.

A proposta não é neutra. Aumenta prazos, estreita acessos, reintroduz a ideia — insuspeitada numa democracia madura — de que a cidadania pode ser retirada como se fosse um favor e não um direito. Passa a ser preciso viver mais tempo em Portugal para pedir nacionalidade. Mesmo quando se nasce cá, mesmo quando se cresce cá, mesmo quando se pertence sem dúvida ao país, a dúvida passa a contar mais. Os filhos de imigrantes verão adiado o reconhecimento de uma pertença que já existe na prática. E, aos adultos, a nacionalidade poderá ser retirada se forem condenados a mais de cinco anos de prisão. A justiça já não basta. O castigo estende-se à identidade.

É um recuo. Não na lei apenas, mas na ideia de país. E apresenta-se como prudência, apesar de nascer do medo. Medo de parecer brando. Medo de não controlar o discurso público. Medo, no fundo, de ficar para trás numa corrida que a extrema-direita corre sozinha, porque escolheu o percurso. O PSD quis antecipar-se, mas chegou na mesma linha. E, ao fazê-lo, validou o terreno.

Nada do que é essencial se resolve. Os serviços continuam assoberbados. Os processos atrasados. A integração entregue a boas vontades. O tráfico sem dissuasão eficaz. Mas discute-se, com zelo, o número de anos que os pais de um recém-nascido precisam de ter acumulado para que o país reconheça que é de cá. E institui-se, com gravidade, o princípio de que há portugueses de primeira e portugueses de precaução.

É este o ponto: a nacionalidade deixa de ser vínculo para passar a ser vigilância. Deixa de ser pertença para se tornar uma cláusula. Quando um país faz isto, está a dizer que não sabe confiar. Que prefere desconfiar antes que aconteça. Que, perante a complexidade da imigração, escolhe o símbolo. E entrega à extrema-direita aquilo que ela menos merece: a agenda.

A Dinamarca enfrentou a mesma tensão. A diferença foi de método. E de coragem. Mette Frederiksen percebeu que o discurso extremado só recua quando a política ocupa o espaço. Endureceu regras, é certo, regulou a entrada, acelerou processos de expulsão de imigrantes sem documentos. Mas não cedeu no essencial: recusou a ideia de que a resposta à imigração deve ser baseada na retórica xenófoba.

Em vez de um conflito identitário, a Dinamarca construiu uma política de integração exigente, centrada na coesão social. Disse que a solidariedade nacional não se aguenta se for ressentida. Que o Estado social precisa de confiança mútua, não de desconfiança selectiva. E que só há legitimidade para exigir se houver clareza para proteger. Resultado: a extrema-direita encolheu. A tensão diluiu-se. O tema perdeu a carga tóxica. E a democracia respirou.

Portugal preferiu o contrário. Não resolveu, mas sinalizou. Não integrou, mas endureceu. E assim, em vez de responder aos desafios com política, respondeu com gestos. Porque é mais fácil parecer severo do que ser eficaz. Porque é mais fácil assustar do que governar.

Fazê-lo em nome da ordem é uma contradição. Porque a ordem não se impõe com papéis revogáveis, impõe-se com instituições que funcionam. Com serviços públicos capazes. Com regras claras. Com justiça que não escolhe a dedo quem merece pertencer.

A proposta do Governo não é apenas errada nos seus efeitos. É errada na sua origem. Porque nasce de um cálculo que parte de um erro: a ideia de que, para travar a extrema-direita, é preciso antecipar-lhe o tom. Mas a história recente mostra o contrário. A cedência nunca basta. Aclara o caminho, valida o discurso, reforça a desconfiança geral em tudo o que não seja ruído.

A nacionalidade é um dos contratos mais sérios que uma democracia pode assinar com quem vive dentro das suas fronteiras. Torná-la precária é transformar esse contrato num favor revogável.

E isso não é prudência. É fraqueza.»


7.7.25

Quem se atreve a diminuir o que é tão virtuoso?

 


A insegurança num país seguro

 


«Luís Montenegro deslocou-se a Espanha para dizer coisas importantes sobre Portugal. O congresso do Partido Popular ouviu-o reclamar mais segurança para as ruas portuguesas e mais autoridade para a Polícia. Quem desconhecesse a realidade do nosso país, um dos mais seguros do Mundo, poderia pensar que, atendendo a tamanha preocupação, Portugal estaria a tornar-se numa espécie de anarquia onde a violência toma conta das cidades. (…)

Voltando à discussão de fundo lançada pelo líder do Governo, importa ter presente que talvez tenha razão, sobretudo se recuarmos umas semanas, ao dia em que Polícia Judiciária desmantelou um grupo neonazi com objetivos tão perigosos como o de invadir a Assembleia da República. (…)

uma das maiores ameaças à segurança do país estará escondida no submundo das organizações ultranacionalistas, cujo discurso de ódio, segundo peritos da União Europeia, é legitimado por partidos como o Chega. Portanto, para nos sentirmos seguros, também é necessário que o PSD saiba escolher os parceiros para negociar no Parlamento, até porque os indicadores dos últimos dias não vão nesse sentido.»

Na íntegra AQUI.

Espectáculo de drones pacíficos

 


Chongqing, China.

Morreu o “não é não”. A abjeção foi manobra de diversão

 

«O vídeo feito por Rita Matias, em que identifica o nome e apelido de crianças, revela, antes de tudo, a ausência de limites humanos de pessoas que acham que a política, sendo um jogo, não se relaciona com os valores que vão norteando as nossas vidas. Os juristas dirão se é crime e, se for, deve seguir para o Ministério Público. Parece-me que os dirigentes do Chega estarão convencidos que sim, já que, repetindo a rábula abjeta, André Ventura omitiu, no Parlamento, os apelidos.

A utilização de crianças para o discurso de ódio define a miséria humana de Ventura e Matias. Mas é errado pensar que nada tem a ver com política. A desumanização do outro é tema político. E não julguem que os eleitores do Chega se vão comover. Esta desumanização faz-se aos poucos e não tem fim, como aprendemos há cem anos (e estamos a reaprender em Gaza), o ódio normaliza-se muito para lá do que vimos nas bocas de Matias e Ventura. Nunca poupou os filhos dos que transformamos em sub-humanos.

A indignação é justa e é difícil não reagir, quando se ultrapassam os limites mais básicos da dignidade. Mas o truque é outro. Depois de culpar os imigrantes do colapso do SNS e da crise de habitação, o Chega também os responsabiliza pelo investimento insuficiente e a recusa em criar uma rede pública de creches. A função do Chega é esconder todos os problemas, transferindo para os imigrantes a responsabilidades de erros políticos. O Chega é o antídoto para a incompetência política de qualquer governo. A culpa está sempre em baixo.

Mas o mais relevante, na semana passada, foi uma mudança política radical. Quando se dizia que “não é não”, não se estava seguramente a falar na perigosa influência do Chega em questões fiscais (onde o governo também já se comprometeu a ir ao encontro das suas exigências) ou orçamentais. Ao assumir (e Luís Montenegro assumiu-o) a relação preferencial com a extrema-direita nos temas em que se esperava um verdadeiro cordão sanitário – a imigração e a nacionalidade – desfez todas as dúvidas sobre este tema. Há uma maioria entre o PSD e o Chega, a que o PS será chamado se Ventura trair os compromissos e para aprovar o OE e ficar amarrado.

No que conta para o Chega e no Chega, o diálogo preferencial é com o Chega. Que o mesmo partido que acusava o PS de se aliar ao Chega por votarem juntos o fim de portagens tente negar, quando o entendimento se faz no coração do programa da extrema-direita, é a demonstração de que nem o respeito pelo mínimo de inteligência sobrevive a esta guinada política.

Claro que o Chega iria mais longe na lei da nacionalidade. Irá sempre, mesmo com todas as cedências. Mesmo perante as denúncias de potencial inconstitucionalidade das medidas apresentadas pelo governo, apontadas por Jorge Miranda (retroatividade da lei, discriminação entre portugueses de origem e adquiridos e excesso de discricionariedade na atribuição de nacionalidade), a proposta de retirada administrativa da nacionalidade, sem ser como sanção acessória determinada por um juiz, não passaria a porta da entrada do Tribunal Constitucional. Foi apresentada para ser recusada. O essencial que o Chega defende está na lei.

O Chega precisa de continuar a garantir o seu espaço, mostrando ao país que é determinante para impor a sua agenda, mas não permitindo que os novos consensos lhe retirem a liderança e o palco. Sabendo-se vencedores na agenda da imigração, usou o dia da vitória para ficar sozinho no palco, com algo suficientemente abjeto que levasse a reações e polémicas, mantendo-se na liderança de todo o processo. Radicaliza mais um pouco para não deixar de estar fora quando há o risco da cedência do outro o pôr dentro.

É assim que funciona: o governo cede ao Chega e o Chega faz qualquer coisa abjeta para a cedência parecer apenas a aceitação de mínimos. E nós caímos. A enumeração de nomes completos de crianças, num vídeo, poderá ter de seguir para o Ministério Público. Mas a política tem de falar da aliança entre a AD e o Chega, que se fechou, com mais ou menos conflitos.

Isto está a acontecer porque o PS acredita que pode usar a receita do passado: esperar que o governo se estatele ou que Montenegro seja engolido pelo regresso da Spinunviva, para voltar a existir. Ignora que, se e quando esse momento existir, quem se está a colocar para ser alternativa é o Chega. O “bom comportamento” do PS tem uma única consequência: permitir que o debate se desequilibre de tal forma (a imigração é apenas um dos exemplos), que, em pouco tempo, nem os mínimos de decência terão lugar no espaço público.»


6.7.25

Vaso com uvas

 


Vaso decorado com uvas cor de rosa, Museu de Belas Artes da Nancy, 1925.
Daum Frères.

Daqui.

O herói e a rotunda

 


«Como um doente de malária, Portugal sofre de acessos periódicos: uma febre de desespero que, no seu delírio, lhe evoca invariavelmente a miragem de um redentor. Com o Estado em chagas e a política num pântano, a nação, farta de uma liberdade desordeira, deixa de querer um governante: implora por um Licurgo. É o eterno e patético fantasma sebastianista: a busca por um homem de farda, de queixo firme e — pormenor essencial — de biografia convenientemente curta, que venha finalmente oferecer o mais simples dos pactos – a troca da liberdade, essa tarefa insuportável, pelo alívio da obediência cega. (…)

A Presidência da República é, para um homem de ação, o mais gélido dos mausoléus: a um executor, exige que se torne pregador; a um comandante, oferece um púlpito para homilias. A sua marcha para Belém, agora iniciada, irá reduzi-lo rapidamente à condição de um busto de gesso constitucional — com o dever de inaugurar rotundas e de sorrir para fotografias ao lado de autarcas pressurosos —, forçado a comentar a desgraça em vez de a poder travar, e condenado a presidir, com a dignidade possível, à lenta decomposição do país que um dia fantasiou poder salvar com um golpe de leme. É o mais triste dos fins para um herói: a nota de rodapé na página da história que sonhou escrever em maiúsculas.»


O «drama» das crianças imigrantes

 


«A “Class of Wonders”, startup portuguesa que, a partir de uma metodologia de gamificação, lançou dois jogos que facilitam a aprendizagem de numeracia e literacia, tem sido decisiva na integração de crianças migrantes ou filhas de pais estrangeiros e que contactam pela primeira vez com a língua portuguesa.»


Frida Kahlo

 


Nasceu em 06.07.1907 e nem chegou aos 68 anos.

Forte impulso regressivo

 


«De forma significativa, o novo ciclo político começa com o Governo do PSD/Montenegro a concertar entendimentos com a extrema-direita. Os resultados eleitorais não o obrigavam a tomar esta via: fá-lo por escolha. Este não é mais um Governo da Direita, como já tivemos muitos ao longo dos 50 anos da democracia. Trata-se de um Governo com uma agenda regressiva nunca vista, a executar com a extrema-direita, num contexto europeu e mundial perigoso.

A alteração à Lei da Nacionalidade é uma escolha política deliberada, não resulta de uma necessidade objetiva. Como já foi observado por vários constitucionalistas, incluindo o professor Jorge Miranda, ela estará ferida de inconstitucionalidade em vários aspetos. Esta alteração, onde até o acesso à nacionalidade pode ser uma questão de se ser ou não rico, é uma bandeira da extrema-direita para semear o ódio.

Segundo a última edição do “Expresso”, “60% dos novos portugueses vivem fora do país”. Em 2023, os “israelitas concentram 40% das nacionalidades adquiridas”, ou seja, atribuídas. “A nova comunidade do subcontinente asiático, que inclui Bangladeche, Nepal, Índia e Paquistão, ainda é uma minoria estatística de 7%”. São apenas 2795 naquele ano. Os argumentos do Governo e da extrema-direita são, pois, escabrosos.

Estão em marcha políticas regressivas para a vida das pessoas e para o exercício das liberdades. Propagandeiam-se políticas fiscais amigas dos cidadãos, mas as medidas que o Governo avança para o IRS são globalmente regressivas. Com as políticas migratórias a alimentarem práticas de baixos salários, com a habitação entregue à especulação e o SNS colocado como área de negócio, jamais teremos melhoria de rendimentos e de condições de vida da maioria dos portugueses. Começa a ser desmantelado tudo o que possa ser obstáculo à apropriação indevida da riqueza, em particular atacam-se os direitos do trabalho, que são direitos humanos e estão plasmados na Constituição da República. Os patrões que mais recorrem ao trabalho precário, mal pago e sem direitos (veja-se posições da Confederação do Turismo), são os mais ansiosos pelas “profundas alterações” que o Governo pretenderá fazer, “desejavelmente na Concertação Social”. Ou seja, se não o conseguir ali, avançará via Assembleia da República com apoio da extrema-direita. O ataque (ideológico) à Lei da Greve visa reforçar instrumentos do Governo e dos patrões no quadro muito delicado que se vai viver. Nenhuma organização sindical pode condescender com tais objetivos. Mas, até agora, só a CGTP- IN foi clara. Em 1987 e 1988, perante uma ofensiva forte (a atual pode ser maior), o movimento sindical foi capaz de responder com eficácia. A CGTP entrou para a Concertação Social, fez-se diálogo entre a CGTP e a UGT e as duas realizaram uma extraordinária greve geral (28/3/88) que travou por muitos anos a ofensiva.

Boas experiências vividas no passado, podem ser inspiradoras no presente.»