«Entre os inquiridos desafiados a escolher os dois temas a que o governo deve prestar mais atenção, 68% escolheram a saúde, 46% a habitação e 38% a imigração. Ou seja, saúde e habitação são as duas maiores preocupações dos portugueses, segundo o mais recente barómetro da Intercampus. E são as duas áreas em que o falhanço do governo é mais evidente. Por isso, é natural que se concentre na terceira.
Sobre a habitação, escreverei amanhã. Reduzindo a oferta (através da reversão de todas as medidas para travar o desvio de casas para outras funções, a começar pela turística) e pressionando a procura (com apoios e reduções fiscais à compra), a que acrescerá uma maior dificuldade na construção, devida a restrições mais amplas à imigração, a crise da habitação não se limitou a piorar. O governo atirou gasolina para a fogueira. Os últimos dados são claros: o aumento dos preços homólogos no primeiro trimestre deste ano foi de 16,3%, quando foi de 5,7% na EU e de 5,4% na Zona Euro. Três vezes mais.
Na saúde, a ministra criou o caos à sua volta, substituindo lideranças hospitalares (que insultou) com base em critérios partidários. Teve três diretores do INEM (e os problemas só se agravaram) e terraplanou a reorganização que tinha começado com a criação da Direção Executiva do SNS, apenas para alimentar as suas mesquinhas inimizades. A isto junta-se um concurso para o transporte aéreo de doentes, ganho, fora de todos os prazos por incúria da ministra, por uma empresa sem helicópteros para o fazer. Poderes bastante fortes na área dos negócios da saúde têm de estar próximos do governo para que esta ministra tenha sido reconduzida e se mantenha firme no lugar.
Só nas últimas semanas, tivemos a confirmação de pelo menos uma morte durante as duas greves em que o INEM não garantiu serviços mínimos por não ter sido avisado pelo ministério (e a ministra insiste em exigir uma correlação direta entre as mortes e a greve num dia em que todo o serviço entrou em colapso); o caso das duas grávidas que perderam os seus bebés – uma depois de ter estado em cinco hospitais diferentes em apenas 13 dias e outra, do Barreiro, em situação de risco, sem qualquer urgência de obstetrícia aberta na Margem Sul; e o doente com traumatismo craniano grave que esperou cinco horas porque o helicóptero da Força Aérea, necessário por falta de soluções da empresa contratada, era demasiado grande para aterrar no Hospital da Covilhã. Segundo os critérios da ministra Marta Temido, a demissão de Ana Paula Martins já teria acontecido. Segundo qualquer critério normal, com tanto acumular de incompetência, também.
Falhadas as duas principais prioridades para os portugueses, é natural que o governo, como manobra de diversão, se esteja a dedicar à terceira. Aí, pode contar com a ajuda do Chega, que se está nas tintas para os dois temas anteriores, (a não ser na medida em que possa culpar os imigrantes por eles).
A centralidade dada à lei da nacionalidade é, mais uma vez, desmentida pelos números. Tal como nas atribuições de nacionalidade em 2023, a maioria dos pedidos pendentes não é de cidadãos estrangeiros residentes em território nacional. Cerca de 30% são de descendentes de sefarditas (a lei já foi mudada), 40% de lusodescendentes e só os restantes 30% têm origem em imigrantes a residir em Portugal. O governo continua a não divulgar números oficiais para poder continuar a trabalhar na propaganda.
Quanto à imigração, não se vislumbra que a alternativa à manifestação de interesses, que implicava um enorme investimento nos serviços consulares, vá funcionar. O que levará à falta de imigrantes ou a mais imigrantes ilegais. Ou voltarão as regularizações extraordinárias, que era como tudo se resolvia antes. Toda a conversa da integração foi aniquilada, dificultando o reagrupamento familiar.»

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