27.4.13

Mais uma carta


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Cartas de amor



Quando ainda se escreviam cartas, as de amor eram trocadas directamente entre os namorados. Mas tudo muda e vemos que passam agora por chaperons emissários.

Não irá longe o namoro, nem se vislumbra casamento no horizonte. Arranjem portanto outra telenovela porque esta já não tem glamour nem audiências que a justifiquem. E o povo é sereno mas não se sabe até quando. 
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As coisas não são feitas por acaso



Documentário sobre Eduardo Gageiro, filmado durante 4 anos.

«Estamos ao lado de Eduardo Gageiro quando o major Pato Anselmo lhe aponta a sua Walther de 9mm. Mas é Gageiro que dispara, fixando para sempre a última ameaça da ditadura Portuguesa que, segundos depois, e bem à nossa frente, se rende a Salgueiro Maia obrigando-o a morder o lábio para não chorar.

São agora os bancos de madeira do eléctrico 28 que nos transportam. Alfama, o Tejo, Campo de Ourique, Martim Moniz: é a preparação do próximo livro de Eduardo Gageiro. Aqui, constatamos a passagem da doença, e vamos assistindo ao ato fotográfico que das imagens quotidianas depura sínteses de vida. Presenciamos a espera, a escolha, o corpo em esforço para fixar a imagem imaginada. Matéria e ideia condensadas ao abrir do obturador. Gestos que este fotojornalista ensaia há mais de 65 anos.

Mas Eduardo fotografa ainda, é presente, actual, vivo e por isso, ao lado da grande escala assistimos às sessões fotográficas na humilde e lotada mesquita da mouraria, nos desgrenhados cabeleireiros para negros do Martim Moniz, e nas desarrumadas das lojas chinesas. “O dia-a-dia que soletramos sem dar por isso”, escreve o amigo José Cardoso Pires. Fragmentos unidos em torno do ponto de vista que este projeto, que durou cerca de 5 anos, foi instalando.

É este o olhar do filme sobre Eduardo Gageiro. Um filme que parte das histórias de duas imagens e que as cruza com a da preparação do seu último livro. Um filme que mostra como o olhar profundamente português deste fotógrafo viu as transformações em Portugal e no mundo nos últimos 60 anos. Um olhar que imaginou e que por isso viu e fotografou, o beijo de Dona Maria ao cadáver de Salazar em 1970, o rapto dos Israelitas nos jogos Olímpicos de 1972, o momento decisivo da revolução de 74, e as sedutoras revelações dos retratos de 95.

Um olhar que na precisão científica de Álvaro Cunhal só pode ter origem num “observador atento e incansável que, com talentosa criatividade, não só colhe como cria a imagem e com ela interpreta a pessoa e o acontecimento."»



Ante-estreia, dia 31 de Maio, 21h30, Sala Manoel de Oliveira, no Cine-Teatro São Jorge – Entrada Gratuita.
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Para Cavaco, a benevolência do esquecimento?



«A única maneira de a História ser benevolente para com Cavaco Silva, o político que deu rosto a todos os pecados e omissões da III República, é a de ela nunca ser escrita. Seria a benevolência do esquecimento, resultante do desaparecimento de Portugal como sujeito histórico, como lugar onde a aventura da vida comum se cristaliza em memória. Será essa a secreta esperança do Presidente?

Viriato Soromenho-Marques

26.4.13

Caxias, nas horas da libertação




Republico este post todos os anos, nesta data. Há sempre quem não tenha visto ou quem queira recordar.










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Resta-nos a força de não-querer



«Trinta e nove anos depois de Abril, que resta do "dia inicial inteiro e limpo"? Cantado por Sophia. A vitória de um capitalismo que se não confronta com nada; o regresso dos ódios ancestrais à Alemanha; a traição dos partidos socialistas; o retorno da violência nazi-fascista; a escassa força do comunismo; o recrudescimento de uma arrogância da chamada elite dominante (atente-se nas declarações dos banqueiros) que julgávamos definitivamente arredado do nosso horizonte. A Europa, dominada pelo Partido Popular Europeu, onde se acoitam as expressões mais hediondas da extrema-direita, e da direita encolhida, impõe normas violentíssimas aos países sob tutela. Portugal está entre as baias de uma política desordenada e sem direcção. O grupo do PSD, que trepou ao poder nos andaimes da mentira, da omissão e do desprezo, não passa de uma enunciação sórdida do que de mais suportável existe. Resta-nos a força de não-querer, a energia que advém da nossa história de resistentes. E nunca esquecer de que o 25 de Abril existiu, embora estes que tais desejem apagá-lo.»

Baptista-Bastos

O Ministério foi ocupado



As antigas instalações do Ministério da Educação, no Campo de Santana em Lisboa, foram ontem ocupadas, como aqui se explica.

Lembro-me bem delas e de uma reunião que lá tive com José Hermano Saraiva, então ministro, integrada numa delegação de docentes da Faculdade de Letras, que reclamava parte de salários em atraso.

Hoje, regressarei ao local, em circunstâncias bem diferentes, para intervir numa sessão organizada pela Unipop.

(Parece que a polícia já lá esteve esta manhã, mas terá regressado a penates depois de algumas formalidades.) 
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Sai mais uma sondagem para o país do canto

(Clicar para ver maior)

Eu sei que sondagens são apenas sondagens e que a Pitagórica não tem sempre boa fama. Mas os resultados hoje revelados dão que pensar.

O PS desce 8% em comparação com o barómetro de Março (alguém se espanta?...) e fica apenas com uma vantagem de 1,7% em relação ao PSD que sobe um pouco mais de 1%. Os três partidos mais pequenos – CDS, PCP e BE – progridem mas cresce mais, sem surpresa, a previsão de Brancos e Nulos.

Que a esquerda da esquerda já tenha 21,5% sabe-me a pouco, o copo meio cheio para quem, como eu, abomina centrões, alternâncias e hipóteses de maiorias absolutas, está no facto de PSD e PS conseguirem pouco mais de 55%. Devagar, devagarinho, pode ser que isto vá... 
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Para que serve um Presidente?



O Público perguntou ontem, a um conjunto de 55 personalidades, que mudanças proporiam para melhorar a democracia portuguesa. Pedro Bacelar de Vasconcelos, constitucionalista, respondeu isto sobre a função do Presidente da República. Antes de ouvir o discurso que Cavaco Silva fez ontem, ou talvez os termos fossem ainda mais incisivos.

«Para que serve um Presidente que discursa, nomeia, empossa, promulga, veta, viaja, convoca o povo para decidir, mas ele próprio nem decide nem governa? Não se vê razão para não acabar com essa excrescência antidemocrática que é e a eleição por sufrágio universal de um Presidente da República que até podia demitir o Governo ou convocar eleições, mas só o faz quando "a maioria" o consente! Porque não elegê-lo no Parlamento a cuja maioria, de facto, já obedece? Jorge Sampaio bem teria sido o remate digno e elegante da história de uma instituição que, depois da democracia atingir a maioridade, apenas sobrevive para iludir a sua própria irrelevância, para engendrar intrigas e desresponsabilizar os eleitos.» 
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25.4.13

Ao fim do dia, na sede da PIDE



Por volta das 20:30 do dia 25 de Abril de 1974, a partir das janelas da sede da PIDE, hoje transformada no condomínio de luxo Paço do Duque, os pides abriram fogo indiscriminado, do qual resultaram 4 mortes e 45 feridos que foram socorridos pela Cruz Vermelha e encaminhados para o Hospital S. José e Hospital Militar.

Pouco depois, unidades de Infantaria 1 (Amadora) e Cavalaria 3 (Estremoz), equipados com dois carro de assalto e uma autometralhadora, criam um perímetro estratégico em volta do edifício da PIDE/DGS.

(Som do Rádio Clube Português)
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Aquele senhor contabilista



.... que encerrou hoje as festividades na Assembleia da República, fez o pior discurso presidencial em 39 anos de comemorações da democracia. A tal ponto grave que, simbolicamente, até os cravos que estavam mesmo à sua frente caíram (como é visível na fotografia).

Palmas para as ausências de protesto da Associação 25 de Abril, Mário Soares e Manuel Alegre. Lamento para as presenças de Ramalho Eanes e de Jorge Sampaio. 
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Não houve só cravos: sons do tiroteio no Largo do Carmo







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Exactamente há 39 anos – 11:00 AM



Foi a esta hora que a fotografia foi tirada, há 39 anos. Sim, sou eu, no largo do Corpo Santo, em Lisboa, pelas 11 da manhã, quando ainda nada estava definitivamente decidido.

Há várias horas que andava pelas ruas e tinha acabado de perguntar a um soldado, empoleirado naquele chaimite, o que é que se passaria a seguir. Que não sabia, mas que tudo ia correr bem. E eu também não duvidei, nem por um minuto que sim, que ia acabar o pesadelo em que vivera desde que tinha nascido. Nunca me passou pela cabeça temer o que quer que fosse.

Era quinta-feira, como este ano. Mas se o céu está hoje bem mais quente, e o dia muito mais radioso, é só por uma daquelas ironias contraditórias da história. 2013 tem o 25 de Abril mais cinzento que alguma vez imaginei viver. Mais tarde irei para a rua, como sempre, mas com um cravo vermelho de raiva – que ninguém me peça alegria, hoje é um dia de luta.

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A cobardia é quem mais ordena

24.4.13

24 nunca mais (2)



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Exageros? Quais exageros?



«Tendo nascido no dia 28 de Abril de 1974, não vivi um único minuto sob um regime político autoritário. Tirando aqueles anos de Cavaco. E aqueles de Sócrates. E agora estes. (...)
Também não me lembro dos tempos do PREC, mas ouço dizer que houve exageros. Que surpresa. Ao fim de 50 anos de ditadura, a liberdade chega e há exageros durante uns meses. Vá lá uma pessoa perceber isto. O problema do exagero, em política, é que só é apreciado quando quem o comete veste fato e gravata. Nesse caso, não se chama exagero: é coragem política.» 

Na íntegra AQUI.
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24 nunca mais (1)



Termidor Errado

IX

E foi para esta farsa
que se fez a revolução de Abril, capitães,
ao som das canções de Lopes-Graça?
Foi para voltar à fúria dos cães,
ao suor triste das ceifeiras nas searas,
as espingardas que matam os filhos as mães
num arder de lágrimas na cara?
E, no entanto,
no princípio, todos ouvíamos uma Voz
a dizer-nos que a nossa terra poderia tornar-se num pomar
de misteriosos pomos.
E nós,
todos nós, chegámos a pensar
que éramos maiores do que somos.

José Gomes Ferreira, A Poesia Continua, velhas e novas circunstanciais 
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E o Álvaro falou



Quem não pensou o mesmo, ao ouvir ontem a longa prelecção do ministro da Economia, que levante o braço. Mesmo que tenha alguma biblioteca mas não saiba nada de finanças.

«Já começámos a crescer? Não? Hum... Isto é cruel de dizer, mas este pacote para o crescimento é mais souflé do que fermento. Defender o crescimento económico é como desejar a paz no mundo e o fim da fome: é discurso de Miss Universo. É bonito, enche a vista, não puxa carroça. (...)

O plano de Álvaro é uma boa resposta a Seguro. A cinco medidas vagas do PS responde com oito medidas vagas do Governo. O que foi apresentado é tudo bom, mas soa inconclusivo.»

Pedro Santos Guerreiro

(O link pode só funcionar mais tarde.)
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23.4.13

Livros e mais livros



... no dia deles.




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Dia Mundial do Livro? À portuguesa...



Imagine-se a cara do aposentado, fiel cliente da Caixa Geral dos Depósitos, se lhe tivessem dado hoje um livro, novinho em folha, com o título «Sr. Bentley, o Enraba Passarinhos»?

Petições? Manifestos?



Ando com uma ideia que está a tornar-se obsessiva: lançar uma Petição (também pode ser Moção, Manifesto ou Declaração) a ser assinada por todos aqueles que se comprometam a não subscrever, nos próximos tempo, qualquer documento da lista indicada.

Mas o fantasma de Bertrand Russell persegue-me e não consigo esquecer-me do maldito barbeiro
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Nem Super-homem



«Quando foi criado há 75 anos, o Super-homem tornou-se o símbolo da Depressão americana. Ninguém dava emprego aos seus criadores, Jerry Siegel e Joe Shuster, e por isso eles tiveram de inventar um.

Portugal precisava agora de inventar um Super-homem, mas para isso o país necessitava de não estar amarrado a uma austeridade asfixiante que impede a criatividade e a libertação da verdadeira economia de mercado. (...)

O seguidismo do Governo ao plano da troika está a revelar-se um hara-kiri total. Só mais tempo permitirá reequilibrar o défice, reformar o Estado e permitir pagar a dívida. A rapidez e a ferocidade do processo de ajustamento é semelhante a tentar que alguém que pesa 300 quilos passe a ser um top model em apenas 15 dias.

O resultado da dança da chuva do Governo é visível. Agora não há economia para pagar a dívida. Com isso o Governo e a troika destruíram a mais leve esperança dos portugueses criarem um qualquer Super-homem que os faça sonhar. »  

Fernando Sobral

(O link pode só funcionar mais tarde)
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22.4.13

Mapa-múndi/ 2



No Sul, a repressão. Ao Norte, a depressão.

Não são poucos os intelectuais do Norte que se casam com as revoluções do Sul só pelo prazer de ficarem viúvos. Prestigiosamente choram, choram a cântaros, choram mares, a morte de cada ilusão; e nunca demoram muito para descobrir que o socialismo é o caminho mais longo para chegar do capitalismo ao capitalismo.

A moda do Norte, moda universal, celebra a arte neutra e aplaude a víbora que morde a própria cauda e acha que é saborosa. A cultura e a política converteram-se em artigos de consumo. Os presidentes são eleitos pela televisão, como os sabonetes, e os poetas cumprem uma função decorativa. Não há maior magia que a magia do mercado, nem heróis mais heróis que os banqueiros.

A democracia é um luxo do Norte. Ao Sul é permitido o espetáculo, que não é negado a ninguém. E ninguém se incomoda muito, afinal, que a política seja democrática, desde que a economia não o seja. Quando as cortinas se fecham no palco, uma vez que os votos foram depositados nas urnas, a realidade impõe a lei do mais forte, que é a lei do dinheiro. Assim determina a ordem natural das coisas. No Sul do mundo, ensina o sistema, a violência e fome não pertencem à história, mas à natureza, e a justiça e a liberdade foram condenadas a odiar-se entre si.

Eduardo Galeano, O livro dos abraços
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Está tudo doido?



Segundo notícia do Público de hoje, muitos pais de crianças que frequentam o 4º ano precipitam-se para centros de explicações, em pânico com o terrível risco que os seus herdeiros correm para o resto da vida, caso tenham uma nota menos boa em algumas provas que têm o peso de 25% na classificação final do ciclo que frequentam.

Associações de Pais, de Professores e Psicólogos já vieram explicar que nada justifica este comportamento e que é o discurso dos adultos sobre os exames, que pode deixar as crianças ansiosas. Sublinham também os prováveis efeitos nocivos da sobrecarga que representam, para crianças de 9 ou 10 anos, horas adicionais de explicações depois de um dia inteiro na escola. Em vão, aparentemente.

Claro que os adversários da existência de exames, ainda por cima em locais fora da «zona de conforto» habitual, culpam a mesma de todos os males, mas isso é uma outra questão. Nada justifica este drama mais ou menos histérico, criado por paizinhos em busca de sensações fortes. 
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O artigo de que toda a Alemanha fala



Der Spiegel, 15 de Abril

Versão em inglês:

The Poverty Lie 
  • Part 1: How Europe's Crisis Countries Hide their Wealth 
  • Part 2: Two World Wars and a Partition 
  • Part 3: A Culture of Shirking Taxes 
  • Part 4: 'No Great Sacrifice' 

P.S. - E já há reacções: Are Germans Really Poorer Than Spaniards, Italians And Greeks?
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Para a Agenda


(Clicar na imagem para ler)

Sinopse:

«Depois de uma curta "Primavera Marcelista", o País assistiu a uma escalada da violência contra todos os portugueses que enfrentavam a ditadura. Entre 1973 e 1974, mais de 500 pessoas, pertencentes a vários movimentos políticos e oriundas de diferentes classes sociais, foram presas e violentados pela PIDE.
No forte de Caxias, muitas eram sujeitas às mais sofisticadas e brutais formas de tortura, ensinadas através de um manual entregue pela CIA à polícia política portuguesa, enquanto lá fora se preparava a revolução de 25 de Abril.
Depois de meses de sofrimento, os homens e mulheres detidos em Caxias enfrentaram momentos de angústia e incerteza quando souberam que houvera um golpe militar - seria um golpe da esquerda ou, tal como acontecera no Chile, da direita mais radical? Atrás das grades, os prisioneiros enfrentaram essa dúvida durante horas a fio. Sofrendo até ao fim, os últimos presos políticos do Estado Novo só conheceram a liberdade na madrugada de 27 de Abril de 1974 - dois dias depois da revolução que pôs termo a 48 anos de ditadura.»

Sobre esta obra, já escrevi umas notas de leitura
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Novembro em Abril



Eu sei que estamos em vésperas do 25 de Abril, e não do 25 de Novembro, mas um episódio da série «E depois do adeus», que a RTP1 transmite ao Domingo, traz à liça um facto curioso, sublinhado pelo seu protagonista – Manuel Duran Clemente –, em Nota difundida no Facebook: nunca a televisão tinha transmitido, até agora, em excerto tão longo da sua histórica intervenção, alegando que o registo da mesma se tinha perdido.

Como é sabido, pelas 21:10 de 25 de Novembro de 1975, quando Duran Clemente, segundo-comandante da Escola Prática de Administração Militar, falava na televisão a partir dos estúdios do Lumiar, a emissão foi cortada e passou a ser assegurada pelos estúdios do Porto. começando a ser imediatamente exibido um filme com Danny Kaye... O acontecimento ficou marcado, para sempre, como o símbolo vivo do fim do PREC. 


Texto de MDC, publicado ontem no Facebook:

«Ao ver hoje o programa "E depois do adeus" fiquei surpreendido. Pela primeira vez em 38 anos, passam parte da minha intervenção na RTP. Note-se que eu falei cerca de 10 minutos. Foi pedida pelo tribunal a cópia desta minha intervenção no seu todo, mas nunca foi cedida pela RTP. Foi pedida por mim, comprando-a, nunca me foi disponibilizada – tinha desaparecido da RTP a intervenção completa.

Era a desculpa. Sempre fizeram passar, ao longo dos anos, apenas os últimos momentos da parte "gaga" e final do corte... para desclassificar a intervenção.

Foi bom hoje ver parte da serenidade da minha intervenção, apesar do momento grave, e concluir como se escondem as coisas para denegrir os que têm razão... perante a História. Mais uma reflexão.

Vou colocar outra vez a intervenção completa.»

Que aqui fica também: 

21.4.13

Censura e liberdade de expressão



É já depois de amanhã, 23 de Abril, 15:00 
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas
Av. de Berna, Lisboa 
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Sichuan versus Boston



É só para dizer que a tragédia que ontem atingiu a China, onde o número de mortos já ultrapassa as duas centenas e o de feridos soma milhares, foi muito, mas muito maior do que a da maratona de Boston. Mas olhamos para umas imagens arrasadoras de Sichuan, ouvimos umas vaguíssimas notícias e passamos à frente. Porquê? Porque o Ocidente continua a ser o centro do (nosso) mundo. Se tivesse havido um terramoto, com a mesma gravidade, nos Estados Unidos, a reacção seria a mesma? Claro que não.


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O patrão de Vítor Gaspar já explicou



... e o resto é música para entreter.


«Estas declarações do ministro das Finanças da Alemanha são muito idênticas às do presidente do Eurogrupo, o ministro holandês Jeroen Dijsselbloem, que provocaram controvérsia e turbulência nos mercados financeiros poucos dias depois de ter sido fechado o acordo sobre as condições do programa de ajuda financeira a Nicósia.
"No essencial, Dijsselbloem foi criticado injustamente. E não pela minha parte", disse Schäuble a este respeito.» 
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Escritores e escreventes



Eu sei que os tempos já não são o que eram e que os escritores também não. E nada tenho a favor ou contra José Luís Peixoto, já que tudo o que dele li me deixou totalmente indiferente. Mas, muito antes de ver, no último Ípsilon (sem link), o excelente texto de António Guerreiro que abaixo reproduzo, já tinha ficado perplexa com tanta agitação e vedetismo da pessoa em questão, sobretudo desde que percebi que se tornou também guia turístico. Enfim...

O que é um escritor?

Quando vemos José Luís Peixoto, em grande plano, nos cartazes publicitários da revista Visão, a exibir a sua figura, enquanto autor de dez contos, "inspirados" nos dez cantos de Os Lusíadas (contos e cantos que a dita revista está a editar e a distribuir para comemorar os seus 20 anos), apetece repetir duas perguntas que, outrora, foram feitas respectivamente por Robert Musil e René Char: "É possível dizer o que é um escritor?" e "Há incompatibilidades, para um escritor?". Na resposta de Georges Bataille a esta pergunta, podemos ler: "É claro que o escritor autêntico, que não escreve por medíocres ou inconfessáveis razões, não pode, sem cair na superficialidade, fazer da sua obra uma contribuição para os desígnios da sociedade útil". Desde então, a imagem e o estatuto do escritor mudaram muito, tal como a profissão literária, mas não ao ponto de conseguirmos olhar com indiferença e sem nenhuma interrogação a foto conspícua de José Luís Peixoto enquanto escritor-publicitário-homem de negócios. Nos seus Ensaios Críticos, Barthes estabeleceu uma vez uma oposição entre escritores e escreventes, onde dizia, entre outras coisas, que a palavra do primeiro, instransitiva, é um gesto que encontra o seu sentido na instituição literária, enquanto a do segundo é uma actividade produzida e consumida à sombra de outras instituições que nada têm que ver com a literatura e fazem parte de outros circuitos (o mercantil, sobretudo). A figura de José Luís Peixoto neste cartaz publicitário deve chamar-nos a atenção para uma transformação da instituição literária, por acção destes escritores que se dirigem prioritariamente a um "público" e respondem fundamentalmente a exigências externas, o que os coloca na dependência da sanção anónima do mercado. A sua consagração faz-se na rua, na esfera pública mediática. Eles situam-se num campo que não reivindica autonomia, ao contrário do que acontecia no campo literário, tal como o conhecemos até recentemente. Segundo as regras da instituição literária, no interior da qual adquirem sentido as perguntas de Musil e Char, o reconhecimento de um escritor pelos seus pares é o critério primeiro de consagração. E isso significa que eles devem o seu prestígio ao facto de não fazerem concessões ao grande público e de instituírem um mundo económico às avessas (o que não quer dizer que não haja uma lógica económica nesta economia carismática). Ora, esta convivência pacífica com a heteronomia (e já não com a exigência de autonomia literária), esta boa consciência no tráfico da figura pública do escritor, faz com que o Peixoto e todos os seus companheiros (ansiosos por se verem também em mupis de rua) nada tenha que ver com o que dantes se chamava "escritor", para quem a escrita começa quando o Autor entra no seu desaparecimento, na sua própria morte. Agora, trata-se exactamente do contrário: suprimir a escrita em proveito do Autor. O monopólio da legitimidade literária, isto é, o monopólio da autoridade para dizer quem é escritor e quem não é já não está do lado daquilo a que se chamou instituição literária, com as suas diversas instâncias; está do lado de quem vende Os Lusíadas por interpostos Peixotos; está do lado dos Peixotos, a quem cabe a definição legítima de Camões como escritor.

Ípsilon, 19/4/2013, p. 36.
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