9.4.16

Novos heróis desta triste Europa



A "avó" dos refugiados mora em Idomeni. (com vídeo)

Na fronteira entre a Grécia e a Macedónia, «Panagiota Vasileiadou, uma habitante local de 82 anos, é descendente de uma pequena comunidade grega que, no início do séc. XX, que fugiu dos antigos territórios gregos, ocupados pela Turquia, durante a Guerra Greco-Turca entre 1919 e 1922.

Agora, faz tudo o que pode para ajudar aqueles que também fogem da guerra. Já recebeu em sua casa centenas de refugiados, que lhe pediam comida ou água para poderem tomar banho. Panagiota Vasileiadou tornou-se na "avó" dos refugiados, que lhe chamam "Mama".» 
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E ninguém lhe prometeu umas bofetadas?



Mas bem as merecia!

(Imagem via Rui Rocha no Facebook)
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Em tempo de «leaks»



… não há sigilo tuga que resista. E julgo que Marcelo nem se importará muito, neste seu «Tempo Novo» – antes pelo contrário.


«Já na segunda parte da reunião – sem a presença do presidente do BCE e o governador do Banco de Portugal, que nunca interveio -, a expectativa estava do lado de António Costa. Mas o primeiro-ministro deixou quase em branco um dos dois pontos da ordem de trabalhos: sobre o Programa de Estabilidade, pouco ou nada disse, alegando que estavam em curso as difíceis negociações com Bruxelas, sobretudo no que diz respeito à forma de cálculo sobre o défice público – a pedra de toque para se saber se Portugal se manterá ou não no procedimento por défice excessivo.» Etc., etc., etc. 
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Offshores: não é uma questão fiscal, é uma questão de democracia



Excertos do texto de José Pacheco Pereira no Público de hoje:

«Os offshores são, antes de tudo, do crime, da lavagem de dinheiro, da fuga ao fisco, uma questão que significa para as democracias a perda de um princípio básico — o de que o poder político legitimado pelo voto e pelo primado da lei se sobrepõe ao poder económico. Por isso, tratar a questão dos offshores apenas como sendo de natureza fiscal e andar às voltas por aí é já um mau ponto de partida.

A questão que muitas vezes é iludida é que não existe uma única razão económica sólida para que hajam offshores. Para que é que eles servem para a economia, para a produção, para o emprego, para a indústria, para o comércio, para o investimento limpo? Nada. Tudo aquilo para que os offshores servem é para esconder dinheiro e os seus proprietários, para esconder a origem do dinheiro, através de um conjunto de fachadas anónimas que depois vão desaguar aos grandes bancos sediados na Suíça ou em Londres.

O que os políticos europeus dizem, quando confrontados com esta realidade, ou com os escândalos periódicos, como o actual com os documentos da Mossack Fonseca, é que não podem fazer nada e que o que podem fazer fazem. (…)

Podem fazer alguma coisa? Podem fazer tudo. Repito: podem fazer tudo. E acrescento: mas não querem. Podem fazer tudo, mas não querem — esta é a frase que melhor resume o “problema para a democracia”. (…)

A solução da questão dos offshores é simples, se tivermos vontade para a aplicar. E desconfiem de quem venha com muitas complexidades e complicações, é sempre mau sinal. Insisto, não é muito complicado: trata-se de comparar o dinheiro dos offshores com o dinheiro dos terroristas. Um rouba, em grande escala, Estados e povos, o outro mata. Um mata à fome em África, outro nas ruas de Paris ou em Nova Iorque. Um destrói economias, poupanças, classes médias criadas com muitos anos e esforços para progredir, outro escraviza povos e reduz a ruínas países já muito pobres. É uma comparação que admito ser excessiva, mas, se partirmos dela, talvez possamos compreender (ou não) por que razão aquilo que se admite em termos de recursos de investigação, penalizações duríssimas, confisco de bens do crime ou da droga, ou da corrupção ou da fuga ao fisco, e se aplica ao dinheiro do terrorismo, se pode aplicar ao dinheiro ilegal dos offshores. Ah! Já estou a ouvir em fundo: “Mas muito desse dinheiro é legal.” Ai é? Então, qual é o motivo por que em vez de estar inshore vai para os offshores?

Deixem-se por isso de falsos espantos e falsas surpresas. Tudo o que está nos “Documentos do Panamá” não é novidade para ninguém. Como não é novidade para ninguém o discurso de “não se pode fazer nada”. Mas, se queremos salvar a democracia no século XXI, o problema do dinheiro anónimo, escondido, fugido e protegido algures numa caixa de correio humilde de uma casa nas Ilhas Caimão, ou num cacifo acolchoado de um luxuoso escritório de advogados no Panamá é objectivamente mais dissolvente do que os tiros de uma Kalashnikov nas ruas de Bruxelas. Faz-nos pior, porque os tiros são-nos exteriores, são do “inimigo”, e os biliões das Ilhas Virgens são de dentro, dos “amigos”.» 
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8.4.16

Afinal… não aconteceu


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Dica (265)



Sanders Over the Edge. (Paul Krugman) 

«The Sanders campaign has brought out a lot of idealism and energy that the progressive movement needs. It has also, however, brought out a streak of petulant self-righteousness among some supporters. Has it brought out that streak in the candidate, too?» 
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Infelizmente, é isto


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08.04.1929 - Brel: «Os velhos não morrem, adormecem»



Jacques Brel seria hoje um velho de 87 anos se não tivesse adormecido demasiado cedo: «Les vieux ne meurent pas, ils s’endorment un jour et dorment trop longtemps» – disse ele



Um dos meus monstros mais do que sagrados, com um registo especial: tive a sorte de o ver e ouvir, em pessoa, era ele jovem e eu muito mais ainda... Em Lovaina, na Bélgica, num espectáculo extraordinário a que se seguiu, já na rua, uma cena de pancadaria entre valões e flamengos, com bastonadas da polícia e muitas montras partidas à pedrada. Tudo porque Brel, em terra de flamengos, insistiu em cantar um dos seus êxitos – Les Flamandes – onde uma parte das suas compatriotas não é muito bem tratada. Ele era assim.



Uma das minhas preferidas:



E a inevitável:


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Pergunta do dia


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O bacanal do Panamá



«Não me vão levar a mal, mas este processo, dos jornalistas filtrarem e escolherem os "Panana Papers" para depois nos mostrarem as coisas como são, não me deixa muito descansado. Bem sei que nestas alturas a nossa comunicação social transforma-se e - tal como de repente foram todos Charlie - agora são todos jornalistas de investigação à caça dos poderosos. São todos Panamá Charlie. É aproveitar o embalo e vamos ver os jornais desportivos a fazer um artigo de fundo sobre a Doyen, ou o Expresso a publicar um trabalho de investigação sobre o Bilderberg. Na realidade, nada disto é novo. Não é graças a isto que existe capitalismo? Vamos fazer queixa a quem? Ao Junker? A Lagarde? Ao Goldman Sachs? Ao FMI? Pois.

Assunção Cristas veio logo dizer, antes que revelem os nomes dos portugueses que estão na lista (Jacinto Leite Capelo Rego pode constar), que é preciso ter calma e "separar entre o que é competitividade fiscal e outra coisa que é o uso de esquemas para esconder actividades ilícitas." De salientar a mão leve (e preocupação com privacidade) do CDS com os senhores com dinheiro nos "offshore", quando ainda há pouco, o mesmo partido queria mão pesada para todos os aldrabões do RSI e até usaram violação do sigilo bancário para os apanhar.

Com o RSI partem do princípio que os pobres estão a roubar, portanto têm que provar que não estão. Com os ricos dos "offshore" - calma, pode ser legal, não se pode julgar assim as pessoas! - Ou seja, se um sujeito recebe o RSI e tem TV a cores, é suspeito. Há ali qualquer coisa! Não pode ser, é um aldrabão que nos está a roubar a todos! Ele que prove que é pobre, ou não lhe damos os 180 euros/mês! Se o indivíduo tem mega-iate, seis casas e dois aviões mas declara ordenado de trolha, não é um aldrabão. É um indivíduo competitivo fiscalmente.

Eu tinha uma amiga rica (e benzoca) que se fartava de roubar nas lojas. Uma tarde, em Torremolinos, após ela ter andado no gamanço, perguntei - Não tens medo de ser apanhada? Ela respondeu - Não. Os ricos nunca roubam. Esquecem-se de pagar.»

João Quadros

7.4.16

Acontece aos melhores


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Dica (264)




«Com estes paraísos a globalização ganhou novos e corruptos contornos, o capital sujo fica branco como clara de ovo, o terrorismo e as mafias consolidam o arsenal monetário para financiar o medo e espalhar a morte, a droga e o armamento progridem na amoralidade do vil metal. Neste domínio, os paraísos fiscais são a vergonha mais despudorada de que o crime compensa, a esperteza vence, o golpe rende. (…)

Uma última nota: enquanto nada mudar de substancial, serão sobretudo os rendimentos do trabalho os mais penalizados com taxas insuportáveis para compensar a fuga de rendimentos de capitais para offshores. Como de costume, tudo desemboca aqui.» 
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07.04.1893 - Almada Negreiros



Almada Negreiros  nesceu em S.Tomé e Príncipe, em 7 de Abril de 1893.




O Manifesto anti-Dantas, por Mário Viegas:



Vale a pena ouvir esta entrevista que Almada Negreiros concedeu ao programa Zip-Zip, em 1969 (ano anterior ao da sua morte):



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A Leste do paraíso fiscal



Ricardo Araújo Pereira na Visão de hoje:

«O que os chamados Panama Papers revelaram não é do âmbito da finança, é do âmbito da teologia: há paraísos fiscais e infernos sociais. O funcionamento é ligeiramente diferente do habitual. Quem se porta mal vai para o paraíso. Quem se porta bem (normalmente, porque não tem outra alternativa), vive no inferno.»

Na íntegra AQUI.
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João Soares ainda é ministro?



Eu sei que António Costa tem hoje um dia muito ocupado para almoçar com Draghi, participar na reunião do Conselho de Estado, etc., etc. Mas espero que, antes disso, tenha tirado uns minutos para aceitar o pedido de demissão de um ministro – ou para tomar ele a iniciativa de o demitir. República das bananas somos, mas nem tanto assim. 
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A sombra do pecado



«Os "Papéis do Panamá" são um canal com vista para um mundo paralelo que ninguém desconhecia, mas que todos contornavam. Verdadeiro e verosímil. Mas os "Papéis do Panamá" são uma pequena parte da "deep web" da internet do dinheiro escondido e reciclado: um mundo paralelo que nem Júlio Verne nas suas vinte mil léguas submarinas descobriria. Mostra que, entre dinheiro de acções legais e de ilegalidades várias, há um desejo de fugir aos impostos. E esse começa por ser o centro do debate que as "offshores" propiciam: elas põem em causa os princípios do contrato social, de troca por serviços públicos e pela representação democrática. A fuga de capitais e lucros aos impostos (hoje visível na arrogância de empresas como a Google, o Facebook ou a Amazon) é uma das faces desta terra de ninguém em que se tornou a globalização financeira. Por outro lado, a pressão fiscal incentiva empresas e pessoas comuns a tentar iludir a teia da lei.

Quem em Portugal, com a pressão fiscal brutal que suga parte da riqueza, não sonha em colocar o seu dinheiro a salvo de um fisco amoral? Os "Papéis do Panamá" levantam mais questões do que dão respostas concretas. Porque trazem, na sua sede de transparência, as sementes da dúvida: porque não há aqui americanos ou alemães, porque os apanhados no esquema estão mais ligados ao financiamento terrorista e não de drogas (em linha com a política de investigação dos EUA)? A denúncia que abriu o caminho para a investigação serve para revelar abusos, mas que outros quiseram ocultar? Todas as teorias da conspiração servem para este caso.

Este mundo das sombras necessita de ser iluminado, até para demonstrar a apatia que tem encontrado em quem deveria fazer algo para impedir a existência de territórios sem lei. Afinal a evasão fiscal é fácil. A UE ou os EUA não estão inocentes neste processo. Todos falam da imoralidade da evasão fiscal. Há um consenso. Mas ninguém o pratica.»

6.4.16

Pobres meninos...



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Dica (263)




«This is an attempt to make the case that one of the justifications for our economic system, the idea that it magically produces an outcome that maximizes social welfare, relies upon assumptions that are increasingly distant from how our economic and political systems actually work. I don’t know if the forces that have allowed special interests to become so powerful can be overcome, but I am far more optimistic than I was before this year’s presidential campaign that change is on its way.» 
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Panamá?



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There is no free lunches



Amanhã há um almoço em Belém, que junta Marcelo, António Costa, Carlos Costa e Draghi. Desconhece-se a ementa.
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06.04.2011 – Bem-vinda, Troika



«Vale a pena relembrar o 6 de abril de 2011. Um marco que viria a condicionar a vida de todos até aos dias de hoje. (…)

Ao final da tarde, numa entrevista ao Negócios, o então ministro das Finanças deixava cair a bomba: “Perante esta difícil situação, que podia ter sido evitada, entendo que é necessário recorrer aos mecanismos de financiamento disponíveis no quadro europeu em termos adequados à atual situação política.” (…)

Cinco anos depois, a dívida pública está mais elevada, famílias e empresas continuam super endividadas e os bancos fragilizados, as contas públicas não estão controladas, o desemprego continua alto (e a subir), a taxa de poupança não para de descer e a economia teima em crescer muito pouco, ou nada. A grande diferença é que o BCE abriu os cofres e lançou sobre a economia europeia um programa de compra de dívida que permite manter os juros controlados. O Negócios escreve hoje que este programa do BCE só dura até ao final do ano.»

João Vieira Pereira, Expresso curto, 06.04.2016
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5.4.16

Paraíso Fiscal



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O cardeal e a eutanásia



Ao cardeal-patriarca, que rejeita uma hipotética legalização da eutanásia, há que comunicar o seguinte: diga aos seus fiéis cordeiros que não sejam adeptos da prática em questão, mas deixe os cidadãos portugueses legislarem como melhor entenderem. Porque vivemos numa República laica – quer ele goste dessa realidade ou nem por isso. 
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Dica (262)




«Messi quer fugir aos impostos, há bancos - como o BES - que querem fugir ao regulador, traficantes que querem fugir à lei, políticos que querem ocultar pagamentos de corrupção. Todos querem fugir, e todos querem sigilo absoluto. É disso mesmo que vive esta complexa teia, que não começa nem acaba no Panamá. Conforme o grau de beneficio fiscal, proteção e descrição que se procura, poder-se--á escolher entre Bahamas, a Suíça, o Luxemburgo ou mesmo a Madeira. (…) Ao mundo dos offshore só acedem os mais ricos. Para os outros, os que trabalham e ganham o salário mínimo, ou o médio, fica o peso de uma administração tributária implacável, e a responsabilidade de, com os seus impostos, financiar os estados.» 
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Parece que ontem foi dia da raiz quadrada



(Ver mais aqui.)

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Os impostos são só para os trabalhadores e para os pobres



«O escândalo revelado pelos Panama Papers não constitui uma surpresa. Há décadas que sabemos que as coisas se passam assim.

Sabemos que existem paraísos fiscais que proporcionam este tipo de serviços – muitos deles no seio da própria União Europeia, apesar do hipócrita discurso moralista dos seus dirigentes. (…) Sabemos que os paraísos fiscais, mesmo quando não são ilegais, são imorais e ilegítimos e promovem a desigualdade, a pobreza, o crime organizado, a corrupção, as ditaduras e as guerras, sendo como são espaços impenetráveis ao escrutínio dos cidadãos.

Sabemos tudo isso. Sempre soubemos tudo isso. Há milhares de indícios que apontam nestas direcções e que sabemos que são minúsculas pontas de um gigantesco iceberg. (…)

O facto que esta fuga de informação põe em evidência é algo que a esmagadora maioria dos cidadãos continua a não querer ver: o facto de as leis serem aplicadas à massa de cidadãos trabalhadores, os cidadãos com menos rendimentos ou mesmo declaradamente pobres, que são obrigados a pagar os seus impostos, mas poupando ilegitimamente os mais poderosos, uma minoria de pessoas que detém quase toda a riqueza do mundo e que consegue viver à custa do sacrifício de todos os outros, comprando Lamborghinis com o dinheiro que não pagaram em impostos e que deveria ter sido usado para aliviar a pobreza, a fome e a doença. O sistema impõe regras aos mais pobres e permite todas as batotas aos mais ricos.

Esta é uma iniquidade moralmente intolerável e socialmente destruidora. Mas tem sido tolerada por legisladores, governantes e até pelos cidadãos eleitores, que aceitam com bonomia que um homem como Jean-Claude Juncker, cujo governo ajudou a transformar o Luxemburgo numa estância de evasão fiscal (como a LuxLeaks, uma outra fuga de informações, mostrou), seja, para nossa vergonha, presidente da Comissão Europeia.

Esperemos os próximos capítulos deste escândalo e esperemos os nomes dos políticos ocidentais e portugueses, que não deixarão certamente de vir à superfície. Depois, iremos deixar os paraísos fiscais na mesma, como temos feito até aqui?»

4.4.16

04.04.2016 - Um dia triste para a história da Europa



«Hoje é um dia triste para a história da Europa. Os líderes europeus sabem que a Turquia não é um país seguro, mas mesmo assim começaram os retornos. Temos de manter-nos COM OS REFUGIADOS e exigir os seus direitos.»
Amnistia Internacional Portugal

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Os islandeses não ficaram sentados



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04.04.1914 – Marguerite Duras



Marguerite Duras nasceu há 102 anos, em Saigão, actual Ho Chi Minh. Foi uma das grandes escritoras do século XX francês, também realizadora e guionista de filmes, para além de resistente durante a Segunda Guerra Mundial como membro do Partido Comunista Francês.

É vasta a sua obra no domínio da literatura, de início identificada com a corrente do nouveau roman, mas destaco dois livros que nunca esquecerei: L'Amant (1984) e antes, bem antes, de 1958, Moderato Cantabile.

Esta última obra viria a ser adaptada para cinema por Peter Brook, em 1960, e quem o viu terá certamente retido as interpretações de Jeanne Moreau e de Jean-Paul Belmondo. Inesquecível também, o guião que MD escreveu para que Alain Resnais realizasse aquele que foi para mim, durante algum tempo, o meu filme de eleição: Hiroshima mon amour. E quando há meia dúzia de anos fui ao Japão, e me passeei pelo local que foi vítima de uma das maiores tragédias da humanidade, não me saía da cabeça: «Tu n'as rien vu à Hiroshima!»




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Música do dia

PCP: a memória é uma coisa lixada


(Eduarda Sama)

«O PCP foi mesmo um dos partidos que lembraram no parlamento que o governo de Cavaco Silva recusou apoiar na ONU um voto pela liberação de Mandela, em 1987. Cavaco Silva alegava então que não podia intervir nos assuntos soberanos de um outro país e comentar o seu sistema de justiça. O argumento é inaceitável, disse o PCP, e outros partidos insistiram no mesmo. (…) Claro que me dirão que Luaty Beirão não é Mandela. Pois não. Mas os democratas defendem a liberdade de expressão conforme a pessoa em causa? Pois não, por isso Luaty ser diferente de Mandela é irrelevante para este efeito, pois ambos têm direito a serem livres e a protestarem contra um governo de que discordem.»

(Daqui)

As bruxas e o Banif



«Na Idade Média existiam meios peculiares de descobrir a verdade. O Tribunal da Inquisição garantia uma forma peculiar de justiça. Às mulheres acusadas de serem bruxas davam uma vassoura e depois atiravam-nas de um precipício.

Se voasse, era bruxa, e rapidamente ia novamente a tribunal para ser atirada para a fogueira. Se não voasse, e morresse na queda, era perdoada e a alma encaminhada para o Céu. A atitude de diferentes entidades, no caso da resolução do Banif, assemelha-se muito à aplicação nesta noção muito sombria de justiça. Pelo que se vai escutando de diferentes personagens que estiveram ligadas aos derradeiros suspiros do banco, a trapalhada não poderia ter um desfecho: o Banif fazia de bruxa. Voasse ou não voasse era indiferente porque o seu fim estava escrito. Quando António Varela diz que a Direcção-geral da Concorrência da CE "foi impondo um determinado conjunto de restrições, como os mercados onde poderia estar, o tipo de clientes ou produtos que poderia vender", tudo aponta numa direcção.

A DGCom fechou a torneira do oxigénio e ficou à espera que o doente melhorasse dos pulmões. De alguma maneira faz lembrar o ultimato que fez ao BPI por causa de Angola. Ou seja, a União Europeia deseja criar poucos, mas "bons" bancos e para isso não se importa de arrasar tudo o resto. Como política de concorrência a favor de quem tem músculo não se vislumbram melhores burocratas. Até porque se esquecem sempre de ver as conexões entre bancos, empresas e Estado alemão, onde tudo parece ser permitido à luz das leis europeias. Faz confusão outra coisa nesta telenovela Banif (que abre janelas para o que a UE tem feito quanto ao BES ou ao BPI): as autoridades portuguesas, a começar pelo Banco de Portugal, parecem servos da gleba do que se inventa em Bruxelas e Frankfurt. O que mostra o nosso grau de soberania e voz autónoma quando o interesse dos cidadãos e dos contribuintes merecia respeito. Não é o Banif que parece uma bruxa. É Portugal.»

3.4.16

E nem devem andar pelas redes sociais…


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03.04.1926 – Luís Sttau Monteiro



Faria hoje 90. Em jeito de homenagem, uma «Redacção da Guidinha» que descobri hoje por acaso.

Senhores da política:


Oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua oiçam o que se diz na rua senão qualquer dia estão no olho da rua a ouvir o que se disse na rua.

Jornal, 22.09.1978
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Dica (261)




Transcrição da teleconferência de 19 de Março entre os principais representantes do FMI nas negociações com a Grécia. Tsipras exige explicações a Lagarde e diz que não vai deixar Poul Thomsen desfazer a Europa.

Brasil em tempos de cólera



No Público de hoje, um longo texto de Kathleen Gomes, que merece ser lido na íntegra. Alguns excertos:

«É melhor pensar duas vezes antes de sair para a rua de vermelho no Brasil. Os testemunhos nas redes sociais tornaram-se rotina: no metro, na avenida, no supermercado há pessoas a serem hostilizadas por estarem vestidas com roupa dessa cor.

Se usar vermelho se tornou tão reactivo como numa praça de touros é porque é a cor do partido do governo, o PT (Partido dos Trabalhadores) e, claro, a prova mais empírica da ameaça comunista no Brasil.

Há três semanas, um menino de nove anos foi intimidado na escola por usar uma T-shirt vermelha. “Não é a primeira vez que o Brasil passa por uma crise dessas. Nem acho que é o fim da História. Mas se alguém disser que sabe o que está a acontecer, mente”, diz a historiadora Lilia Schwarcz, co-autora do livro Brasil: Uma Biografia.

O que está a acontecer remonta às últimas eleições presidenciais, em Outubro de 2014 (começaram aí as hostilizações a pessoas vestidas de vermelho), que foram extremamente renhidas e divisórias. Dilma Rousseff tem sido uma Presidente contestada e repudiada praticamente desde que foi reeleita, com manifestações sistemáticas e de grande escala. (…)

A sensação de que o Brasil pode explodir a qualquer momento começou há um mês, quando o país acordou com a notícia de que Luiz Inácio Lula da Silva, o Presidente mais popular da democracia brasileira (de 2003 a 2011), estava a ser levado de casa pela polícia para prestar depoimentos por suspeitas de ocultação de património e lavagem de dinheiro no âmbito da Operação Lava Jato. (…)

Um adolescente que gritou “Não vai ter golpe!” teve de ser escoltado pela polícia (de trânsito) na Avenida Paulista, em São Paulo, para não ser linchado por manifestantes contra o governo.

O arcebispo de São Paulo foi agredido no final de uma missa por uma mulher que o acusou de ser um “comunista infiltrado”. (…)

“No Brasil é uma coisa inédita. Antes isso era coisa de time de futebol: o Flamengo brigava com o Fluminense”, diz o escritor paulista Ricardo Lisias, 40 anos. “É difícil lidar com isso, não faz parte da tradição brasileira. A violência aqui ficava agregada às classes baixas, na periferia. Agora é geral. Agora tem briga na Avenida Paulista e o motivo é política.”

Ricardo acredita que uma das causas da polarização é o ressentimento das elites brasileiras por verem os seus privilégios históricos serem postos em causa pelos avanços sociais promovidos nos governos do PT. “Antes o acesso à universidade pública era só da classe alta, que dizia que era assim porque ela é que tinha o mérito. Agora que a classe baixa está a ocupar lugares, fica claro que é uma questão de poder e não de mérito da classe alta. É meio claro que a classe alta está com raiva, ódio. Você imagina: o filho do banqueiro ocupa na universidade a mesma sala que o filho da mulher da limpeza. Eu moro num prédio de elite. Tenho vizinhos que reclamam que o porteiro agora também viaja para a Europa. A elite brasileira perdeu a vergonha de ser conservadora. Antes ela tinha vergonha.” (…)

“Tem uma quantidade imensa de pessoas que não estão acostumadas a ter opinião política, que não estão acostumadas a conviver e a entender que é uma riqueza você ter alguém que pensa diferente de você”, diz Christian Dunker. (…)

Segundo o psicanalista, o que está a acontecer no Brasil hoje é reflexo da “entrada de uma massa” que não estava habituada a falar de política publicamente e que está a dar os seus primeiros passos. Pessoas cuja referência política, até aqui, era “aquela conversa de domingo, em que o tio fica dizendo que bons eram os tempos em que a gente tinha ditadura”. É uma caricatura mas, diz Dunken, “essa conversa caseira, muitas vezes mal informada, saiu para as ruas”. “Porque é o que as pessoas têm para dizer. É como elas até aqui mais ou menos participaram e se envolveram. Quando estão em público reproduzem a conversa de domingo.” (…)

“Esse é também um momento de aprendizagem, de educação política do Brasil. Isso começa com ódio, com coisas que a gente não gosta, mas que é parte do processo. Claro que você tem todo o tipo de coisa demoníaca saindo do baú, mas ao mesmo tempo você tem um processo de transformação não só institucional, mas um novo reposicionamento das pessoas diante de um futuro possível.”

Nada como um psicanalista para descomplicar.» 
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