30.12.23

Janelas

 


Janelas Arte Nova, arqueadas e redondas, todas de Bruxelas.

Daqui.
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E por vezes

 


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Peguem lá o soneto e vão com Deus

 

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A traição à Ucrânia e à Palestina

 


«A palavra traição é uma das mais duras que se pode usar para tratar de qualquer questão nacional e internacional, mas é a palavra certa para definir o que se passa na Ucrânia e na Palestina. Os traidores são os republicanos americanos chefiados por Trump, em conjunto com os bloqueadores europeus, em particular a Hungria, isto no que diz respeito à Ucrânia. No caso palestiniano, no massacre de Gaza, os traidores são todos aqueles que estão a permitir ao governo israelita matar indiscriminadamente crianças, mulheres e homens, a tornar Gaza inabitável e a atirar milhões de pessoas para mais uns campos de refugiados, a somar aos que desde o final da década de 1940 são o local de vida de uma parte importante dos palestinianos.

A Federação Russa pode ter imensas queixas do risco que representa para a sua segurança a proximidade da NATO às suas fronteiras, e Israel foi vítima de um ataque cruel e impiedoso do Hamas a civis, mas nem num nem noutro caso a resposta tem a ver com os motivos iniciais. A invasão da Ucrânia e o massacre e destruição de Gaza são muito mais do que uma resposta ao que aconteceu, são medidas de política próprias, com objectivos absolutamente inaceitáveis para a ordem e o direito internacional, para a soberania das nações, para os direitos humanos e, no terreno da realpolitik, uma ameaça aos poucos países do mundo que são governados em democracia e que têm liberdade. Tudo isto significa que em 2024 se entra no período mais perigoso para o mundo desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Eu disse e repito, para o mundo.

Aqui convém diferenciar os dois conflitos, porque não são da mesma natureza nem geram riscos de idêntica dimensão. O conflito em Gaza é mais uma página tenebrosa de uma guerra que conhece períodos de baixa intensidade e momentos de uma violência extrema. Mas é um conflito regional cujo impacto fora do Médio Oriente, para além do preço do petróleo, são as acções terroristas ligadas aos grupos palestinianos e árabes, do Afeganistão ao Irão, passando pelos territórios palestinianos até à diáspora muçulmana em todo o mundo, pelo 11 de Setembro nos EUA e pelos que andam sossegados nas suas compras e são esfaqueados ao acaso em Bruxelas ou em Paris, ou que vão pelos ares num atentado bombista. É um conflito localizado numa parte do mundo e na sua história densa de ódios, com uma herança violenta de contas a pagar, e cuja força de vingança e memória a torna muito difícil de amainar, quanto mais de resolver.

O conflito da Ucrânia é, num certo sentido, muito mais grave, com muito maior possibilidade de consequências. Não é uma minimização do que se está a passar em Gaza, é apenas porque é diferente a dimensão do seu alcance. É um genuíno conflito mundial, tocando por si só o frágil tecido das relações de força internacionais pelo seu risco de uma “mútua destruição assegurada”. A possibilidade de uma guerra nuclear é muito maior. Nunca se ouviram com tanta frequência as ameaças de utilização de armas nucleares como as vindas da Federação Russa, uma das grandes potências nucleares, que considera, sem qualquer motivo, que esta guerra é “existencial” para a sua sobrevivência. Pode ser para Putin, a sua clique e os seus planos, não é certamente para a Rússia, que foi quem a começou.

A guerra da Ucrânia é uma guerra de conquista territorial, de subjugação neocolonial para toda uma região, com um direito de definir o que várias nações podem ou não podem fazer, em termos militares, em termos de política interna e externa, de condicionamento das suas alianças políticas e económicas – hoje a Ucrânia, a Geórgia e a Moldova, amanhã os países bálticos e a Polónia, até à Finlândia. O risco de uma derrota ucraniana – e qualquer cedência de território é uma vitória para Putin –, associada a uma espécie de reconstrução da URSS pela força das armas, não é um papão qualquer, é suficientemente real para levar a Suécia, com a sua longa tradição de neutralidade, a entrar para a NATO.

A traição dos republicanos “trumpistas” e dos “cansados europeus” garante tudo menos a paz, garante mesmo a guerra europeia, e isso também diz respeito a Portugal. Já não digo que o que está em jogo é da ordem da democracia e da liberdade – também é –, mas é essencialmente o valor da paz, que permite tudo o resto. A traição a Gaza retira muito da possibilidade de se usar um argumento de princípio por parte do chamado “Ocidente” e fragiliza qualquer superioridade moral. Mas, se querem pôr as coisas nos termos frios dos interesses e das relações de força, a traição à Ucrânia enfraquece-nos como nação soberana e prejudica os nossos interesses. A traição aos palestinianos coloca-nos do lado do mal e faz-nos ir para o Inferno.

Nenhuma das coisas é boa.»

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Guernica – Palestina

 


Cidades que não esquecem!

Mais de 3.000 pessoas apoiaram a Palestina formando um mosaico humano em Guernica, um dos lugares simbólicos da Guerra Civil Espanhola, que foi bombardeada em 1937.
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29.12.23

Pratos

 


Prato, Museu Nacional de Oslo, 1905.
Arquitecto e «designer»: Torolf Prytz.
Fabricante (provável): Jacob Tostrup.


Daqui.
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Mariana Mortágua – Quem são os facilitadores?

 




«Uma conversa sobre portas giratórias, que faz o mapa de algumas das decisões em que o interesse público ficou a perder. Da energia aos aeroportos, o regime de interesses que atravessa governos de PS e da direita. E também aparece na lista de financiadores do Chega.» 
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Temos todos consciência disto?

 


QUEM é atingido.

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Filho, filho, porque me embaraçaste?

 


«A história do menino que tem poder para curar os doentes e que é filho daquele cujo nome não pode ser usado em vão está a ser vivida com surpreendente intensidade, este ano. É, como sabemos, um menino chamado Nuno, que através da sua acção conseguiu obter um tratamento para duas doentes luso-brasileiras, usando indevidamente o nome do pai, e acabou crucificado na opinião pública. No dia 24 de Dezembro, Marcelo, que é o pai do menino, referiu-se a ele e às reuniões que ele manteve com o secretário de Estado da Saúde dizendo: “Quem organizou, quem fez esse encontro, essa audiência, essa conversa, fê-lo porque não conseguiu chegar onde queria por outro caminho, que era através do Presidente e da Presidência da República, por isso é que foi a seguir tentar outra coisa, porque não tinha obtido aquilo que queria.” São declarações tão duras que, muito provavelmente, fizeram com que o menino suspirasse: “Pai, pai, porque me abandonaste?” Mas são também um ensinamento, um modo de o pai mostrar ao filho que é possível referirem-se um ao outro sem ser necessário proferir o nome de cada um, lição que o filho deveria ter tido em conta quando andou a marcar as tais reuniões valendo-se do seu apelido.

Na véspera de Natal, Marcelo acrescentou ainda: “Tenho muita pena de não ter sabido há quatro anos e tal, porque era nessa altura que eu devia ter sabido e não nesta altura, mas isso diz respeito às relações pessoais e é evidente que, pessoalmente, retiro as conclusões de não ter sido dito o que devia ter sido dito, o que permitiria intervir para que não tivesse acontecido o que aconteceu.” Mais uma vez, estas considerações são uma proclamação política. Marcelo deixa claro que é o Presidente dos afectos mas apenas para os cidadãos que não pertencem à sua família. Em relação aos familiares, o afecto está suspenso pelo menos até ao fim do mandato.

O caso inaugura uma prática interessante. Sua Excelência, o Presidente da República, comunica com a família através da imprensa. Espero que todos os outros titulares de cargos públicos sigam este exemplo. Gostaria que o primeiro-ministro convocasse as televisões para informar a mulher de que é preciso ir buscar o mais novo à escola. Ou que o ministro da Saúde desse uma conferência de imprensa para transmitir ao primo que já é tempo de devolver a moto-serra que lhe emprestou em 2005. Assim como foi interessante saber pela comunicação social que o filho do Presidente da República, este ano, não receberá presentes.»

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28.12.23

Pavões

 


Um pavão vienense em cristal de rocha cravejado de pedras preciosas, com prata dourada e esmalte. Cerca de 1880.

Daqui.
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E quanto a sondagens

 


Intercampus, 27.12.2023 (Clicar na imagem para ver maior.)

Notícia AQUI.
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Chega de normalização do Chega

 


«Em 2017, quando venceu as eleições pela primeira vez em França, Emmanuel Macron apresentou-se como um forte e convicto europeísta, acreditando nos valores de solidariedade, de unidade e de democracia. Como em tantos outros aspetos da sua vida política, e nos diferentes projetos que defendeu ou preconizou, Macron teve uma entrada de leão e uma saída de sendeiro. Seis anos depois, e pouco tempo depois de ter assegurado a sua difícil reeleição, Macron passou de um convicto europeísta a impulsionador de uma das mais nacionalistas e xenófobas políticas de imigração já aprovadas na União Europeia. Há poucos dias, o partido do Presidente francês aprovou uma lei que é retirada quase diretamente das propostas da extrema-direita francesa. Aliás, foi a própria Marine Le Pen que caracterizou a aprovação da nova lei da imigração como uma “vitória ideológica”. Ora, quais os principais pontos desta reforma?

/ O primeiro é uma alteração do critério do direito do solo, que deixa de reconhecer automaticamente como franceses os filhos de imigrantes nascidos em França aos 18 anos, dificultando o acesso à nacionalidade a quem nasceu em território francês.

O segundo diz respeito às alterações do reagrupamento familiar, aumentando-se o tempo exigido de permanência no país para início do pedido e o aumento da idade do cônjuge de 18 para 21 anos. Mais significativo é o facto de se aumentarem as exigências relativas à condição financeira do requerente, aumentando a discricionariedade das mesmas.

Em terceiro lugar, a imposição de restrições de entrada a estudantes estrangeiros, nomeadamente através da exigência do pagamento de uma caução financeira que assegure a possibilidade de regresso destes ao país de origem.

Em quarto, o regresso do delito de permanência ilegal, que havia sido eliminado por Hollande em 2012, depois de a França ter sido instada a adequar o seu ordenamento jurídico ao direito europeu. Assim, qualquer imigrante que permaneça em território francês de forma irregular ou para além do tempo concedido pelo visto fica sujeito a uma multa de 3750€ e uma interdição de entrada no país de três anos. Por agora, fica de fora a proibição de acesso ao serviço nacional de saúde francês por parte de imigrantes em situação irregular, mas esta medida – mais uma exigência de Le Pen – deverá ser alvo de revisão em 2024.

Finalmente, o ponto mais importante para a extrema-direita é o reconhecimento da denominada “preferência” ou “prioridade nacional”, que garante prioridade aos cidadãos franceses face aos estrangeiros em vários domínios, desde a seleção para postos de trabalho à atribuição de apoios sociais.

Ora, que tem tudo isto que ver com a extrema-direita xenófoba portuguesa, o Chega? As bandeiras que agita em Portugal contra os imigrantes – aqueles que em 2022 contribuíram com um saldo líquido de mais de 1600 milhões de euros para a nossa Segurança Social – são igualmente agitadas pelo seu partido irmão em França. Só que em França os portugueses são parte desses imigrantes contra quem são agitadas essas bandeiras. E os filhos de muitos daqueles que para lá emigraram veem agora restringida uma parte considerável dos seus direitos.

Em Portugal, a campanha eleitoral está aí à porta e os esforços da direita política e mediática para a normalização do Chega têm subido de tom e de intensidade. Querem-nos convencer que daí nenhum perigo advirá e que quem contra isso adverte está apenas a agitar bandeiras de medo e a fazer de menino a alertar para o lobo.

“O Chega não é um partido antidemocrático e tem toda a legitimidade de existir”: Pedro Passos Coelho, ex-primeiro-ministro do PSD, numa conferência realizada em Oeiras, em novembro deste ano. “Só há quatro partidos com quem o PSD não se pode entender: o Livre, o PCP, o Bloco e o PS. A partir daí, tem de haver uma diferenciação de blocos: o PSD lidera o bloco do centro-direita; o PS lidera o bloco do centro-esquerda”: Miguel Relvas, num comentário na CNN. “O Chega é um partido como outro qualquer”: Raquel Abecasis, jornalista e ex-candidata do CDS em eleições autárquicas e legislativas, também na CNN. E as citações poderiam continuar, com várias figuras da direita a abrirem caminho e a legitimar uma mais que previsível intenção de coligação governativa entre toda a direita portuguesa, o que significaria levar André Ventura e seus correligionários para um futuro governo liderado pelo PSD.

Tal como no caso da recente cedência dos liberais franceses a Marine Le Pen nas questões da imigração, e como sucede já em vários países europeus – Finlândia, Suécia ou Itália – ou como poderia ter sucedido em Espanha, com o acordo de coligação entre o PPE e o Vox –, por muito que o líder do PSD nos tente convencer do seu distanciamento tático de Ventura, também no nosso país corremos o risco de ter a extrema-direita no poder – à semelhança do que aconteceu nos Açores. E isso só nos pode deixar sobejamente apreensivos pelos riscos que comporta para a nossa democracia, para os princípios do Estado de direito e pelo respeito pelos direitos individuais, sobretudo de minorias.

Toda a política que assenta na lógica de “nós e os outros”, como defendem Ventura e seus acólitos, tem sempre este problema: num dia nós somos “nós”, noutro dia nós somos os “outros”. E todos aqueles que olham para esta dimensão da política da extrema-direita nacional como apenas um detalhe escolhem, propositadamente, passar um pano pela gravidade histórica que tem qualquer processo de desumanização. Como está bem inscrito num monumento evocativo dos crimes de genocídio do nazismo, em Auschwitz-Birkenau, o Holocausto não começou com os campos de concentração, mas sim com a retórica do ódio. É tempo de parar com esta normalização do discurso de ódio e daqueles que fazem da sua utilização o seu principal trunfo político. Antes que seja tarde de mais.»

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Sobe a calçada, Odete

 


@Vieira Resurrected no Facebook

Na morte de Odete Santos.
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27.12.23

Portas de muitas cores

 


Todas do mesmo autor, Arte Nova. Bruxelas, cerca de 1900.
Arquitecto: Ernest Blerot.


Daqui.
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Louro prensado

 

«Talvez alguns de vós já tenham ouvido falar na venda de louro prensado, na Baixa de Lisboa, em vez de haxixe. É um tratado. As pessoas que são enganadas são consumidores de droga. Claro que o embuste de que são vítimas não merece tutela legal: o sistema não lhes reconhece o direito a comprar droga verdadeira. Já os supostos traficantes aproveitam-se do vício dos seus clientes para os enganar. É precisamente este o caso de Ventura. O que escreveu sobre o caso das gémeas siamesas que foram operadas em Portugal é puro louro prensado.

Mais do que propagar mensagem racista, o líder do partido Chega desenvolve a sua atividade política aproveitando-se das fraquezas e falhas de muitos portugueses. São pessoas que precisam, como de pão para a boca, de formação em valores democráticos e progressistas ou mesmo em direitos humanos. Em vez disso, e com plena consciência daquilo que está a fazer, Ventura inventa problemas que lhes alimentam a chaga. Para aquilo que os falsos traficantes da Baixa de Lisboa estão a fazer, a lei portuguesa não tem solução. Mas para Ventura tem. A mensagem racista e xenófoba não precisa de ser verdadeira para ser contrária à lei. E um partido que a usa deve ser extinto. A lei está bem. Não é dela que nos podemos queixar.»

Carmo Afonso
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Joan Manuel Serrat

 


O polémico JMS chega hoje aos 80, deixou os palcos mas ainda não parou.



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#ceasefire

 

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A política não é uma fábrica de “conteúdos”

 


«Esta campanha promete ser a mais longa de sempre. E temo que em vez disso permitir um maior esclarecimento sobre o programa de cada partido ou para conhecer os líderes de cinco partidos (dos oito com assento parlamentar) que concorrem pela primeira a legislativas – Pedro Nuno Santos, Luís Montenegro, Rui Rocha, Mariana Mortágua e Paulo Raimundo –, sirva para deixar os eleitores exaustos, desmotivando-os. Porque o efeito dos ciclos noticiosos de 24 horas não tem sido manter as pessoas mais informadas, mas cansá-las mais depressa.

É natural que, quando saímos de uma maioria absoluta e se espera um período de forte instabilidade política, com dificuldade em construir maiorias de governo, o tema das alianças e dos entendimentos esteja em cima da mesa. O crescimento do Chega, a fragilidade da liderança do PSD, a chegada de Pedro Nuno Santos e a possibilidade de refazer a “geringonça”, tudo empurra para esse tema. Mas a três meses e meio de campanha têm de ser mais do que isso. Até por sabermos que, quando os resultados eleitorais vierem e estivermos num impasse, muito do que foi dito será necessariamente desdito. Temos de falar de grandes escolhas para o país, quando é certo que quase todos os protagonistas serão diferentes.

Infelizmente, já se percebeu o que as televisões, que acabam por marcar o ritmo de todo o processo mediático, nos reservam. Com um ritmo noticioso permanente e a necessidade de ter tema para comentar a cada hora, é preciso inventar uma polémica diária. O modelo tem sido sempre a mesma e promete repetir-se em dose aditivada. Já começou, aliás.

Um repórter que acompanha o líder de um partido faz uma pergunta, quase sempre sem qualquer conteúdo relevante para o futuro do país. O repórter que acompanha a campanha adversária pede, tantas vezes por indicação do editor, reação à resposta do outro. O jornalista que acompanha o primeiro pede nova reação ao primeiro sobre a resposta do segundo. E dez comentadores passam horas a discutir o tema de que ninguém se lembrará daí a uma semana. Os lugares em que as perguntas são feitas – uma fábrica, uma cidade, um centro de investigação –, pensados pelas campanhas como ilustração de uma determinada mensagem, proposta ou crítica, passam a ser paisagem, a que se faz uma referência rápida. Podia ser ali ou num estúdio.

Na realidade, toda a campanha podia ser, para as televisões, feita em estúdio. Sem povo, sem vida, sem outros intervenientes que não fossem os políticos e os jornalistas. Sem outros temas que não fossem os que a própria comunicação social escolhe e onde os políticos perdem a sua própria vontade e cumprem o dever de preencher a programação de televisões em confronto por audiências.

Esta colonização da política pela comunicação social é especialmente evidente quando os lideres são obrigados a participar em dezenas de debates em estúdio (se se seguir um modelo inicialmente pensado para cinco partidos, e não oito, chegaremos este ano aos absurdos 24 debates), tempo que retiram à interação com os eleitores.

Houve um tempo em que a comunicação social relatava as campanhas, agora passou a ser guionista das campanhas. A escolha dos temas não corresponde mais ao interesse geral do que se fossem os políticos a escolher. É determinada pelas audiências, o que implica polémicas de consumo fácil e rápido.

O ecossistema mediático atual, totalmente dominado pela rapidez superficial de televisões em confronto por uma audiência cada vez mais escassa – a restante migrou para as bolhas das redes sociais, onde o algoritmo do ódio trata de radicalizar os eleitores -, promove a superficialidade política. E neste ambiente, safam-se os que, na política, dependem da superficialidade.

Há uns dias, e só o pude ver porque vi na rede social do partido, Paulo Raimundo bem tentou resistir às insistentes perguntas dos jornalistas sobre as declarações de Passos Coelho, as afirmações de Pedro Nuno Santos sobre a “geringonça”, umas frases de Rui Rocha sobre Pedro Nuno Santos e outras de Mariana Mortágua sobre cenários eleitorais. Os jornalistas procuravam, desesperados, um novo ping-pong entre dois protagonistas, fossem eles quais fossem. E, também desesperadamente, o líder do PCP tentava que as decolações que passassem na televisão fossem sobre temas substanciais. Não é o único que tenta, quase sempre sem conseguir furar a barreira de fait-divers imposta pela comunicação social. Raimundo estava na fábrica da Matutano, no Carregado, mas, para as televisões, aquele lugar não passava de um cenário a dar colorido aos ecrãs. Raimundo estava ali para falar de leis laborais, cortes na remuneração das horas extraordinárias e as condições em que se trabalha por turnos neste país, coisas que afetam a vida concreta das pessoas concretas que não habitam nos estudos das televisões.

O esforço do PCP ou de qualquer outro partido raramente é bem-sucedido. Os jornalistas acham que os políticos têm o dever de seguir o seu guião e que não o fazer é sinal de desrespeito pela liberdade de imprensa. Mas é mesmo isto que os políticos devem começar a fazer. De preferência nos diretos, quando a edição não permite retirar tudo o que não cabe na história que já vinha escrita de casa.

Os candidatos não devem ser donos absolutos da narrativa política, sem o incómodo de perguntas que perturbam a propaganda. Mas também não têm de cumprir o papel de atores em polémicas diárias para encher chouriços nas programações dos canais de notícias e em telejornais com duas intermináveis horas. Até porque, no fim da campanha, serão os mesmos jornalistas, editores, diretores e colaboradores daqueles canais a explicar que tudo aquilo foi uma perda de tempo, uma campanha vazia, confrontos sem ideias nem propostas. Que, enfim, são campanhas como estas que desmobilizam os eleitores. Pois bem, está na altura de os candidatos escreverem o seu próprio guião. A liberdade de imprensa não está em causa quando aqueles que elegemos não aceitem ser apenas “conteúdo” do negócio mediático.»

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26.12.23

Regressam os vasos

 


Vaso de vidro cortado com amores-perfeitos esmaltados, cerca de 1900.
Mont Joye.

Daqui.
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Mao Tsé-Tung

 


Chegaria hoje aos 130. E, com a diferença de fusos horários, até pode ter nascido no «nosso» dia de Natal...
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26.12.1930 - Jean Ferrat

 


Representante típico de gerações de intérpretes politicamente comprometidos, para sempre ligado a «Nuit et Brouillard» e a tantos outros títulos, o eterno compagnon de route do Partido Comunista Francês, que não hesitou em denunciar a invasão de Praga em 1968. E muito mais.

Alguns vídeos AQUI.
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A tranquilidade de Costa não é a do país

 


«Na mensagem de Natal do ano passado, António Costa falou da solidariedade necessária para enfrentar as consequências da guerra, do aumento da inflação e dos juros – e das acrescidas dificuldades que tal cenário trazia às famílias, às empresas, às autarquias, ao Estado central. Sublinhou que havia razões para o país “ter confiança no futuro”, mas não deixou de falar dos problemas.

Neste Natal, o país de Costa pareceu quase tão brilhante como a árvore de Natal que lhe serviu de cenário. Em menos de cinco minutos, mencionou 13 vezes as palavras “confiança” e “confiar”. A quadra é dada a optimismos, mas, mesmo dando o desconto de já estarmos em campanha, e de poder ser difícil a um primeiro-ministro prestes a deixar de o ser falar do futuro sem ser de forma abstracta, é bom não perder a noção da realidade.

“Juntos vencemos as angústias da pandemia”, disse. "Juntos garantimos” que a tragédia dos incêndios não se repetiu, criou-se emprego, houve “redução da pobreza e das desigualdades”, equilibraram-se as contas públicas, acelerou-se a transição energética… e continuou.

Sem prejuízo de nuns indicadores ser mais evidente que o país tenha realmente melhorado substancialmente face a 2015 do que noutros, há uma frase na qual muitos cidadãos terão uma grande dificuldade em rever-se: “Recuperámos a tranquilidade no dia-a-dia das famílias.” Num ano de inflação e juros a níveis históricos, que degradam o poder de compra e a capacidade de pagar uma habitação digna, “tranquilidade” é coisa que falta em muitas casas.

Também é bom lembrar que a taxa de pobreza em 2022 baixou, sim, face aos valores de 2015, de 19% para 17%, mas é maior do que em 2019 ou em 2021 (16,6% e 16,4%). E o principal índice que mede as desigualdades da distribuição de rendimentos, o índice de Gini, voltou a subir em 2022 para níveis próximos de há oito anos (33,7 contra 33,9).

O país conseguiu iniciar o caminho para um novo modelo de desenvolvimento, desde logo com a redução, exemplar a nível europeu, do abandono escolar precoce e uma grande melhoria dos níveis de qualificações. E Costa pode e deve dizer que estas são armas essenciais para o futuro.

Mas num ano tão conturbado, e com umas eleições à porta que arriscam não trazer estabilidade, mencionar de passagem que "há problemas que ainda temos de ultrapassar” e “não desistimos de continuar a melhorar”, ignorando que em várias áreas a descolagem tem sido demasiado lenta e demasiado penosa para uma fatia importante da população, é um erro que alimenta o divórcio dos cidadãos de quem os representa.

A “tranquilidade” de Costa não é a de muitos portugueses.»

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25.12.23

Incontornável

 


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Saudades quem as não tem?



Dos conselhos do dr. Rui Portugal, então subdirector-geral da Saúde, no Natal-Covid de 2020.
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Calma!

 

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Os vendedores do Natal

 


«Percorrendo aos encontrões corredores e escadas rolantes do Corte Inglês, depois de na véspera ter desistido - por correr o risco de asfixia - de comprar um pacote de leite, um pack de iogurtes biológicos, um cacho de bananas e outras necessidades básicas para sobreviver ao grande bacanal natalício num dos super-giga-hipermercados que rodeiam a capital, dei por mim a amaldiçoar o homem que inventou o Natal. Não o Jesus, coitado, que não só era um recém-nascido isento de quaisquer culpas como até - asseguram as boas fontes - isento do pecado original porque, como o nome indicia e foi astutamente detectado por Santo Agostinho, foi "concebido sem pecado". Se o Santo o diz, e na sua infinita sabedoria que fez dele um dos Pais da Igreja até se pode hoje detectar uma capacidade de olhar para o futuro e prever quase dois milénios depois "concepções sem pecado" feitas em provetas, bancos de esperma, inseminações artificiais e manipulações genéticas e até o milagre de conceber depois de morto, pouco resta senão acreditar porque, como avisava outro sábio, São Tomé, há coisas que só depois de vistas se podem acreditar.

E uma delas eram as bichas intermináveis para as caixas dos hipermercados nas vésperas de Natal. Os portugueses ganham mal. Mais de um terço dos portugueses estão no patamar da miséria. A desigualdade social em Portugal, medida através do instrumento analítico que serve para medir essas coisas e que os técnicos designam como "coeficiente de Gini", é uma das maiores da Europa. Portugal conseguiu diminuir essa desigualdade até 2019, mas desde então - e a culpa não foi só da pandemia - tem vindo a aumentar. Os Açores e a Madeira são as regiões onde é maior a diferença entre os que mais ganham e os que menos ganham. Onde há menos desigualdade, dizem as estatísticas, é nas grandes regiões urbanas, provavelmente porque é também aí que se concentram serviços públicos e privados e as grandes empresas.

Uma maneira empírica e pouco científica de constatar essa desigualdade é o estudo de campo, como se diz em sociologia, a que fui obrigado nas bichas do hiper-super-gigamercado de subúrbio e do super-hiper-gourmet do Corte Inglês. E menciono o Corte Inglês não por ser particularmente exclusivo, mas porque - como outros estabelecimentos reputados e elitistas da capital - a sua fama e clientela o distingue e torna especialmente eficaz para efeitos de observação analítica, constatação sociológica e veredicto natalício.

Entre as bichas do super de subúrbio e as bichas do hiper do centro de Lisboa a diferença não era nem na densidade da multidão nem na sua qualidade embora, se fizesse alguma diferença ou fosse estatisticamente significativo, se pudesse desde logo observar os desníveis sociais atestáveis quer pela quantidade de fibras naturais - algodão, seda, lã, para nem mencionar outras origens animais menos consensuais como vison ou mesmo coelho presentes nas referidas bichas, por oposição à percentagem de fibras sintéticas. Roupa de plástico. Não, o que é estatisticamente significativo não é nem o cliente, nem as roupagens que envolvem o cliente - até porque, numa época de massificação de consumos e de imagens e de uniformização das multidões, o que distingue uns jeans baratos de outros caros é na maioria das vezes apenas uma etiqueta.

A massificação de usos e consumos atinge o apogeu no Natal - embora se possa admitir que a época pré-natalícia com a introdução das black fridays e a pós-natalícia com os saldos possam estar ao mesmo nível de consumo descontrolado. Mas há uma diferença. Não há black fridays de bacalhau ou rabanadas nem saldos de peru ou bolo-rei. O que caracteriza e é específico da orgia consumista do Natal é o que se põe na mesa, eventualmente na boca, e seguramente acabará nos sistemas de saneamento básico providenciado pelas autarquias. A comida. Ou o excesso dela. Compra-se comida com os olhos, com a imaginação, com a saliva mental de recordações de sabores passados. Compra-se comida a mais, numa glutonice democrática e universal e natalícia que a experiência e a ciência médica demonstra ser um exercício de desperdício e de abandono ao colesterol. Basta ver nas bichas o que as pessoas vão comprar.

Não. Quem inventou o Natal não foi Jesus. Nem Constantino, o imperador que decidiu transformar os rituais pagãos do renascimento na Natividade cristã. Nem sequer Dickens, apesar do talento e génio do escritor ter contribuído para mudar uma festa de família numa festa de solidariedade, paz e amor. Só até ao dia seguinte, claro. Não, quem inventou o natal actual, o natal das comezainas e dos excessos, foram os donos dos supermercados, os vendedores de comida e os vendedores de sais de frutos.»

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24.12.23

Bons conselhos

 

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Este sai sempre do baú

 

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Não digo do Natal

 

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Natal com musgo

 


«Nos invernos chuvosos da minha infância o musgo abundava junto aos ribeiros e não havia crise climática a ensombrar o ritual de o colocar no presépio. As figuras toscas e coloridas espalhavam-se pela sala dos avós e não faltavam elevações, pontes e outros efeitos para emprestar realismo ao cenário. Na noite de 24, o menino sorridente e de braços estendidos para o mundo era colocado no seu lugar até então vazio. Era fácil acreditar, porque na infância todas as possibilidades cabem dentro de nós.

Crescer é necessariamente ser cercado pela dúvida. No olhar sobre o Natal cancelado em Belém, na Cisjordânia, e sobre os destroços de Gaza onde milhares de crianças perdem a vida. No abandono dos sem-abrigo e de famílias inteiras encurraladas pelos preços altos da habitação. Na solidão de imigrantes explorados no trabalho ou olhados com desconfiança. No aperto de dois milhões de portugueses em risco de pobreza, sem salário ou sem mesa farta.

Perdida a ingenuidade de outros tempos, a estrela não brilha a apontar caminhos nem se ouvem vozes serenas a anunciar a paz universal. Mas, sejam quais forem os mistérios - da fé ou do entendimento -, há sempre alternativas para procurar soluções e construir uma sociedade mais justa, mais humanista e em que todos possam ter direito a uma noite feliz.

Os populismos, extremismos e individualismos alimentam-se de medo. Se há prenda que vale a pena pedir no sapatinho, em vésperas de duas idas às urnas, é a liberdade de pensar sempre além do medo. Sem deixarmos que o azedume nos encolha. Se nos permitirmos ser inteiros, límpidos como nas noites em que tudo brilhava e parecia seguro, é possível que os sinos toquem. Não por magia, mas porque nós assim fizemos acontecer.»

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