9.6.07

«Countdown» para férias


Não, não vou para a margem sul do Tejo. A partir de amanhã e durante cerca de duas semanas, andarei por terras africanas - Namíbia e alguns arredores.

Tentarei actualizar o blogue, com a frequência que disponibilidade e facilidade de utilização da net permitirem - poderão não ser muitas...


8.6.07

De olhos fitos no altar da Pátria

Mais uma Feira do Livro, mais uns manuais escolares de antanho.

Salazar

Quando estudardes a história das outras nações, haveis de verificar que todas elas têm atravessado, no decorrer dos séculos, períodos mais ou menos agitados e crises mais ou menos violentas, a tal ponto que algumas dessas nações perderam para sempre a sua independência.

Não tem Portugal, no decorrer da sua História, escapado também a essas crises; mas sempre a Providência permitiu que, na hora crítica, aparecessem homens de boa vontade, que, cheios de coragem e de patriotismo, conseguiram libertá-lo das garras que tentavam asfixiá-lo. (...)

Foi nessa ocasião que um ilustre professor da Universidade de Coimbra, Dr. Oliveira Salazar, foi convidado para sobraçar a pasta das Finanças. Portugal inteiro fitou nele, ansiosamente, os olhos e ficou aguardando a sua obra. E essa obra aí está grandiosa e eloquente, gravando no granito da imortalidade o nome glorioso daquele que bem mereceu da sua Pátria.

Graças a Oliveira Salazar, a nossa administração pública é agora modelar, e Portugal goza, entre as outras nações, da consideração que lhe é devida.

O seu nome glorioso, depois de ter corrido Portugal de norte a sul, passou as fronteiras e tornou-se conhecido em todo o mundo. E quando, daqui a muitos anos, as gerações futuras o pronunciarem, hão-de dizer baixinho, de olhos fitos no altar da Pátria: – Foi um grande Português!

E não é que disseram mesmo?



7.6.07

6 de Junho de 1968 – Maurice Béjart expulso de Portugal (II)

Republicação corrigida e aumentada:

A Margarida emendou: em 1968, o que Béjart apresentou em Portugal foi «Romeu e Julieta». Razão tinha eu para dizer, no meu texto, «salvo erro» - errei mesmo. Para me redimir: podem ver
aqui e aqui parte de uma encenação de RJ de 1979.

O Rui Bebiano enviou-me um link para um «Le Sacre du Printemps» versão Pina Bausch, que inseri no fim dest post.


De «Entre as Brumas da Memória...», pp. 118-119

«Em 6 de Junho morreu Robert Kennedy, vítima de um atentado que tivera lugar dois dias antes. Nessa mesma noite, em Lisboa, Maurice Béjart apresentou o seu Ballet du XXe. Siècle, no Coliseu dos Recreios absolutamente repleto. Assistimos, salvo erro, a um magnífico Le Sacre du Printemps. Durante a última cena, ouviu-se gritar, repetidamente, "Façam amor, não façam guerra!". Simultaneamente e em várias línguas, eram lidas notícias sobre lutas, revoltas e injustiças. Foi arrepiante a emoção vivida na sala que se levantou em aplauso prolongado. Béjart veio então ao palco para afirmar que Robert Kennedy fora “vítima de violência e de fascismo” e para pedir um minuto de silêncio “contra todas as formas de violência e de ditadura”. Com a maior parte dos espectadores de pé, renovaram-se os aplausos, com mais força e com mais entusiasmo.

Informado do sucedido, Salazar proibiu os espectáculos seguintes e ordenou que Béjart saísse imediatamente de Portugal. Franco Nogueira cita uma nota distribuída à imprensa pelo Secretariado Nacional de Informação:
“Foram dirigidas à juventude exortações derrotistas e tomadas atitudes de especulação política inteiramente estranhas ao próprio espectáculo. Perante a luta que teremos que manter em defesa da integridade nacional, não pode consentir-se que uma companhia estrangeira aproveite, abusivamente, um palco português para contrariar objectivos nacionais.”

Béjart nunca se referiu a Portugal. Mas Salazar era bom entendedor e bastava-lhe menos de meia palavra para perceber – como nós – que Béjart quisera deixar um sinal de solidariedade aos antifascistas portugueses.

Momentos raros como este funcionavam para nós como bálsamo e como estímulo. Ajudavam-nos a não desanimar.»



Aqui ficam alguns minutos de «Le Sacre du Printemps» de Maurice Béjart.





Le «Sacre du Printemps» - Pina Bausch

Canções na memória (VII) - As time goes by

Casablanca...



As Time Goes By (Dooley Wilson, 1942)

You must remember this
A kiss is just a kiss, a sigh is just a sigh.
The fundamental things apply
As time goes by.

And when two lovers woo
They still say, "I love you."
On that you can rely
No matter what the future brings
As time goes by.

Moonlight and love songs
Never out of date.
Hearts full of passion
Jealousy and hate.
Woman needs man
And man must have his mate
That no one can deny.

It's still the same old story
A fight for love and glory
A case of do or die.
The world will always welcome lovers
As time goes by.

6.6.07

6 de Junho de 1968 – Maurice Béjart expulso de Portugal

De «Entre as Brumas da Memória...», pp. 118-119

«Em 6 de Junho morreu Robert Kennedy, vítima de um atentado que tivera lugar dois dias antes. Nessa mesma noite, em Lisboa, Maurice Béjart apresentou o seu Ballet du XXe. Siècle, no Coliseu dos Recreios absolutamente repleto. Assistimos, salvo erro, a um magnífico Le Sacre du Printemps. Durante a última cena, ouviu-se gritar, repetidamente, "Façam amor, não façam guerra!". Simultaneamente e em várias línguas, eram lidas notícias sobre lutas, revoltas e injustiças. Foi arrepiante a emoção vivida na sala que se levantou em aplauso prolongado. Béjart veio então ao palco para afirmar que Robert Kennedy fora “vítima de violência e de fascismo” e para pedir um minuto de silêncio “contra todas as formas de violência e de ditadura”. Com a maior parte dos espectadores de pé, renovaram-se os aplausos, com mais força e com mais entusiasmo.

Informado do sucedido, Salazar proibiu os espectáculos seguintes e ordenou que Béjart saísse imediatamente de Portugal. Franco Nogueira cita uma nota distribuída à imprensa pelo Secretariado Nacional de Informação:
“Foram dirigidas à juventude exortações derrotistas e tomadas atitudes de especulação política inteiramente estranhas ao próprio espectáculo. Perante a luta que teremos que manter em defesa da integridade nacional, não pode consentir-se que uma companhia estrangeira aproveite, abusivamente, um palco português para contrariar objectivos nacionais.”

Béjart nunca se referiu a Portugal. Mas Salazar era bom entendedor e bastava-lhe menos de meia palavra para perceber – como nós – que Béjart quisera deixar um sinal de solidariedade aos antifascistas portugueses.

Momentos raros como este funcionavam para nós como bálsamo e como estímulo. Ajudavam-nos a não desanimar.»

Aqui ficam alguns minutos de «Le Sacre du Printemps» de Maurice Béjart.

5.6.07

«Jogging» em Fátima

Declaração de interesses - Eu tenho uma tal antipatia pelo personagem José Sócrates, que há dias em que só consigo viver com ela imaginando-o em situações rocambolescas.




Para assinalar a abertura da presidência portuguesa da União Europeia, o gabinete do primeiro-ministro vai solicitar ao reitor do Santuário de Fátima que encerre o recinto durante uma hora para a realização de uma sessão de jogging.

O evento terá lugar no dia 13 de Julho, data em que se deverão estar em Fátima muitos milhares de peregrinos, nomeadamente emigrantes portugueses em férias. Ser-lhes-á pedido que adiram ao acontecimento saindo rapidamente do recinto, quando este estiver para ser encerrado ao público, e que formem um cordão em redor do mesmo - de preferência ajoelhados. Espera-se que tirem muitas fotografias com telemóveis e que as enviem imediatamente para os quatro cantos do mundo.

Todos os responsáveis europeus que estiverem em Portugal serão convidados a participar no evento. Dá-se já como certa a presença de Nicolas Sarkozy.

A viagem das personalidades, feita em autocarro, terá início em Lisboa, com uma curta paragem na Ota, onde o ministro Mário Lino não será autorizado a usar da palavra. António Costa – cuja campanha eleitoral para a CML termina nesse dia – aproveitará para sublinhar, uma vez mais, que o problema do novo aeroporto não é uma questão lisboeta mas apenas nacional.

O objectivo desta iniciativa é mostrar ao mundo que José Sócrates continua a correr em toda a parte (mesmo no seu país), que Fátima não fica muito longe do ALLgarve e que os portugueses também têm a sua Praça Vermelha – sem o mausoléu de Lenin, mas com os túmulos dos pastorinhos, bem mais (clari)videntes.

Marques Mendes já protestou contra a ideia. Cavaco Silva prefere não se pronunciar para já.

Num gesto de simpatia para com o primeiro-ministro, o presidente da câmara mandará substituir a placa que se encontra à entrada da cidade por uma nova, com o seguinte aspecto gráfico:


(f.)ÁTIMA

P. S. - Este último parágrafo é só para navegantes da blogosfera frequentadors de «glórias fáceis».




4.6.07

Ainda no rescaldo de Coimbra


No debate que decorreu durante a secção de lançamento do meu livro em Coimbra, a Manuela Cruzeiro fez-me uma pergunta relacionada com a evolução psicológica que levou tantos dos chamados «católicos progressistas» da década de 60 não só a abandonarem a prática religiosa como a optarem por formas de luta radicais.

Lembrei-me agora de que poderia ser interessante pôr aqui parte de um artigo que escrevi para o nº 3 dos Cadernos Socialistas, publicados no estrangeiro por exilados políticos portugueses. Não que acrescente algo de novo ao que foi dito em Coimbra, mas porque foi escrito no verão de 1968 (poucos dias antes de Salazar cair da cadeira) e mostra como me aparecia já como inevitável a debandada de católicos que veio a verificar-se pouco depois e a evolução para formas mais radicais de luta (explico este aspecto na última parte do artigo, em texto que constitui o Anexo 16 de Entre as Brumas..., pp. 237-239.)

N. B. – O artigo é longo e, por essa razão, inadequado para ser transcrito aqui na íntegra. Mas se alguém estiver interessado, terei o maior prazer em o enviar por mail.

Acção Eclesial e Acção Política
Por: Manuela Gomes (pseudónimo de Joana Lopes). Usei pseudónimo, porque, ao contrário dos outros colaboradores deste número dos Cadernos Socilaistas, eu vivia em Portugal...

«4. Foram-se fazendo diferentes tipos de evoluções pessoais que têm, pouco a pouco, dividido os “cristãos conciliares”. Essa divisão parece-nos não só inevitável mas salutar, mas ela é objecto de inúmeras discussões e é dificilmente aceite pelos que querem agarrar-se a uma unidade que já não existe.

Alguns (cada vez menos) continuam sinceramente a querer antes de mais “reformar” a Igreja, tendo dela uma visão renovada, a querer levar por diante, mesmo que muito dificilmente, a tarefa de “aggiornamento” que o Concílio prometeu e fez desejar, mantendo uma colaboração mais ou menos estreita com a hierarquia e o conjunto dos católicos. Crêem contribuir assim para a efectivação de uma sociedade portuguesa mais humana.

Mas sem dúvida alguma que a maior parte dos católicos de que temos vindo a falar, desde há um certo tempo que pretende simultaneamente, ou mesmo acima de tudo, o fim do salazarismo e subordina a esse objectivo o esforço principal da sua acção, mesmo quando tem consciência de que esta só pode corresponder longínqua e indirectamente a esse objectivo.

Uns deixaram já há um certo tempo de assinar cartas aos bispos e afirmam que deixaram de se considerar como fazendo parte da Igreja institucional.

Mas muitos mais são os que até agora mantêm ligações, mais ou menos estreitas segundo os casos, com as estruturas eclesiásticas, que assinam todas as cartas de protesto, que vibram intensamente com o caso do Pe.Felicidade, que ocupam longas horas em conversas e discussões mais ou menos religiosas sobre Deus, moral, violência ou não violência, que organizam colóquios, que passam noites a policopiar papéis e dias a distribui-los. Tudo isto pode parecer pouco, mas ocupa muito tempo de muitas vidas.

E, no entanto, para alguns a realidade começa a mudar:

• Eles sentem que o reformismo da Igreja, por que têm vindo a lutar, esbarra sistematicamente com inércia e conservantismo acompanhados de um exercício abusivo de poder – e se revela portanto globalmente ineficaz.

• Fizeram uma evolução interior do ponto de vista religioso que os vai desinteressando de um certo número de querelas e para a qual o Concílio pertence já a um passado que se encerra.

• Começam a ver que o papel policopiado (cartas, manifestos, “Direito à Informação”) têm a sua função, mas é por si só incapaz de abalar as forças opressoras ou mesmo de modificar em profundidade a opinião pública.

• Os padres que compartilham este estado de espírito interrogam-se cada vez mais sobre o mal-entendido em que se sentem envolvidos vitalmente e sobre os resultados destes anos de esforço e de incompreensão. Como em todos os países, alguns dos mais válidos pediram a redução ao estado de leigo, outros estudam no estrangeiro.

• Alguns leigos, que no período pós-conciliar tinham começado ou recomeçado a trabalhar em instituições eclesiais, estão a deixá-las, cansados e desiludidos, ou considerando, simplesmente, que elas correspondem a interesses de outros, mas não aos seus.»