Este texto
de Teresa Pizarro Beleza (Público, 10 de Janeiro de
2013) percorre o Facebook, e também alguns blogues, de forma TRUNCADA, o que
tem «desesperado» a autora. Na
sequência de vários pedidos que recebi, aqui fica.
Longas são as estradas da
Síria, curta é a piedade dos homens. Vendo-me tão pobre e tão só, os cães
viriam ladrar-me às portas dos casais. Decerto Jesus morreu; e com ele morreu,
uma vez mais, toda a esperança dos tristes" Eça de Queiroz, O Suave Milagre (adaptado).
Julgo que nos tornamos
verdadeiramente adultas no dia em que perdemos a nossa mãe. Ou talvez quando
nos tornamos nós próprias mães, não tenho bem a certeza. Uma coisa eu sei, ou
julgo saber: a única coisa que verdadeiramente não podemos deixar de ensinar
aos nossos Filhos é a compaixão. E esse é o sentimento que me parece mais
notoriamente longínquo da vida pública portuguesa e europeia neste tempo
cinzento em que o homo homini lupus
volta a ser o mote declarado da economia, da política e, suponho que não tarda
muito, do próprio direito. A "mão invisível" de Adam Smith (A Riqueza das Nações) está cada vez mais
trôpega, ou mais ineficiente, ou se calhar cada vez mais escorregadia, quem
sabe se untada. A desigualdade social e a desigualdade económica aumentam na
razão directa da progressiva privatização do património público, seja este a
companhia aérea nacional, vulgo TAP, e a correspectiva prestadora de serviços
aeroportuários, dita ANA, o banco do Estado (Caixa Geral de Depósitos), os
transportes (depois da Rodoviária Nacional, a CP), ou seja, o fornecimento de
serviços e bens essenciais como a electricidade (EDP, REN), a água (Águas de
Portugal), a televisão (RTP), ... ou a Saúde.
Uma das maiores
transformações sociais, demográficas e económicas em Portugal depois da
Revolução de Abril de 1974 decorreu da criação do Serviço Nacional de Saúde
(SNS), por Lei da Assembleia da República, em Setembro de 1979 (Lei nº 56/79,
de 15 de Setembro, sendo ministro da Saúde António Arnault).
O Art. 64º da Constituição
da República, apesar de muito alterado face à versão originária de 1976 - desde
logo, o SNS passou a ser apenas tendencialmente gratuito ("tendo em conta
as condições económicas e sociais dos cidadãos"), coisa que hoje talvez já
nem se possa dizer que seja, face à subida em flecha do valor das taxas moderadoras,
cada vez mais imoderadas -, continua a garantir a todos os cidadãos e cidadãs
"o direito à protecção da saúde", "realizado através de um
serviço nacional de saúde universal e geral".
Muito recentemente,
declarações de algumas pessoas com responsabilidades políticas ou
institucionais desencadearam a discussão em torno da subsistência e orientação
do SNS, designadamente no que respeita ao controlo na utilização de recursos
inevitavelmente escassos e finitos. As despesas com a Saúde tornaram-se um peso
incontrolável, claramente mal distribuído e pior aproveitado.