Mostrar mensagens com a etiqueta jogos olímpicos. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta jogos olímpicos. Mostrar todas as mensagens

5.9.25

05.09.1972 - O massacre de Munique

 


Há 53 anos, o comando palestiniano «Setembro Negro» tomou como reféns onze membros da delegação israelita aos Jogos Olímpicos que tinham então lugar em Munique. Morreram logo dois desses reféns, mas, depois de uma intervenção de resgate falhada, levada a cabo pelas forças de segurança alemãs, acabaram por morrer mais nove atletas, cinco dos sequestradores, um polícia alemão e um piloto.



Se este foi, de longe, o mais dramáticos dos acontecimentos em Olimpíadas, não foi o único que ficou marcado por interferências políticas ou por protestos:

1896, Atenas (primeiros Jogos Olímpicos da era moderna) – Boicote da Turquia.

1936, Berlim – Os Jogos Olímpicos do nazismo.

1948, Londres – Japão e Alemanha (os dois grandes vencidos da Segunda Guerra Mundial) nem sequer são convidados.

1956, Melbourne – Boicote de Espanha, Holanda e Suíça contra a intervenção soviética em Budapeste e de Líbano e Iraque contra a posição da Austrália sobre o Médio Oriente. A China abandona os Jogos como forma de protesto contra a presença da bandeira de Taiwan.

1968, México – Power Salute

1976, Montréal – Boicote de vários países africanos como protesto contra a presença da Nova Zelândia, por esta ter disputado um desafio de rugby com a África do Sul, alguns meses antes (quando estava impedida de o fazer devido ao apartheid).

1980, Moscovo – Boicote dos Estado Unidos (seguido por 60 países) como protesto contra a intervenção soviética no Afeganistão.

1984, Los Angeles – Países do bloco soviético (excepto Roménia) e Cuba retribuem o boicote de 1980.

1988, Seul – Boicote de Coreia do Norte, Cuba, Etiópia e Nicarágua.

1992, Barcelona – Devido à guerra com a Croácia e a Bósnia-Herzegovina, a Jugoslávia não é autorizada a participar como país, mas os seus cidadãos são admitidos título individual.

(Podem faltar mais casos, evidentemente.) 
.

2.10.24

02.10.1968 – México: «Não queremos olimpíadas, queremos revolução»

 


No dia 2 de Outubro de 1968, na Plaza de las Tres Culturas (Tlatelolco), ao Norte da cidade do México, terminou um movimento dos estudantes mexicanos que durou 146 dias. Aproveitando a realização dos Jogos Olímpicos na capital do país, tinham procurado chamar a atenção do mundo para a corrupção do poder e o autoritarismo do Partido Revolucionário Institucional, no poder durante mais de setenta anos. «Não queremos olimpíadas, queremos revolução», gritava-se entre muitos outros slogans.

Acabou por ser o único movimento estudantil da época que terminou com uma matança brutal. Ainda hoje não se sabe exactamente o número de mortos que varia entre os 44 «documentados» e os mais de 300 reivindicados pelas famílias. E os responsáveis continuam impunes.




Dez dias depois começaram os Jogos Olímpicos que viriam a ficar na História pelo célebre Black Power Salute.


.

5.9.24

05.09.1972 - O massacre de Munique

 


Há 52 anos, o comando palestiniano «Setembro Negro» tomou como reféns onze membros da delegação israelita aos Jogos Olímpicos que tinham então lugar em Munique. Morreram logo dois desses reféns, mas, depois de uma intervenção de resgate falhada, levada a cabo pelas forças de segurança alemãs, acabaram por morrer mais nove atletas, cinco dos sequestradores, um polícia alemão e um piloto.



Se este foi, de longe, o mais dramáticos dos acontecimentos em Olimpíadas, não foi o único que ficou marcado por interferências políticas ou por protestos:

1896, Atenas (primeiros Jogos Olímpicos da era moderna) – Boicote da Turquia.

1936, Berlim – Os Jogos Olímpicos do nazismo.

1948, Londres – Japão e Alemanha (os dois grandes vencidos da Segunda Guerra Mundial) nem sequer são convidados.

1956, Melbourne – Boicote de Espanha, Holanda e Suíça contra a intervenção soviética em Budapeste e de Líbano e Iraque contra a posição da Austrália sobre o Médio Oriente. A China abandona os Jogos como forma de protesto contra a presença da bandeira de Taiwan.

1968, México – Power Salute

1976, Montréal – Boicote de vários países africanos como protesto contra a presença da Nova Zelândia, por esta ter disputado um desafio de rugby com a África do Sul, alguns meses antes (quando estava impedida de o fazer devido ao apartheid).

1980, Moscovo – Boicote dos Estado Unidos (seguido por 60 países) como protesto contra a intervenção soviética no Afeganistão.

1984, Los Angeles – Países do bloco soviético (excepto Roménia) e Cuba retribuem o boicote de 1980.

1988, Seul – Boicote de Coreia do Norte, Cuba, Etiópia e Nicarágua.

1992, Barcelona – Devido à guerra com a Croácia e a Bósnia-Herzegovina, a Jugoslávia não é autorizada a participar como país, mas os seus cidadãos são admitidos título individual.

(Podem faltar mais casos, evidentemente.) 
.

7.8.24

Jogos Olímpicos: pretendemos medalhas, mas ignoramos o desporto o resto do ano

 


«A propósito dos Jogos Olímpicos e dos resultados dos atletas portugueses, sinto-me impelido a abordar o tema do desporto escolar. A minha filha foi atleta profissional durante vários anos, por isso escrevo não apenas como observador, mas como pai profundamente envolvido na realidade desportiva.

O desporto em Portugal não pode ser apenas o futebol. Embora seja um adepto de futebol, também sou um defensor das restantes modalidades.

Na grande maioria das vezes, os nossos atletas enfrentam condições desoladoras no nosso país, o que dificulta a conquista de vitórias. Não há espaço suficiente para o desporto em Portugal. A prática desportiva é frequentemente vista como um obstáculo ao desempenho académico.

Embora existam algumas medidas facilitadas para atletas, há falta de consistência no apoio necessário para seguir uma carreira desportiva. A Educação Física não é levada a sério e a sua importância é subestimada. Há uma escassez de desporto nas escolas e uma evidente falta de incentivo e compreensão para aqueles que desejam dedicar-se ao desporto como parte integrante dos seus estudos.

Vamos analisar a Alemanha e a França, que têm um apoio ao desporto três vezes maior que o de Portugal.

Perguntemo-nos seriamente se queremos, de facto, medalhas olímpicas. A nossa realidade desportiva está muito distante destes países, não apenas em termos de infraestruturas, mas também no que diz respeito à valorização dos desportistas. É importante destacar que, até ao dia em que escrevi este artigo, o conjunto dos países da União Europeia, da qual Portugal faz parte, obtém mais medalhas nos Jogos Olímpicos do que a China e os Estados Unidos juntos. Este facto sublinha a importância de valorizar e investir no desporto, seguindo o exemplo de outros países europeus.

Criar uma carga lectiva mais favorável aos alunos e assegurar que o investimento necessário não recai apenas sobre os pais são passos cruciais para que os jovens possam verdadeiramente caminhar para serem atletas de alto nível.

Temos falta de cultura desportiva em Portugal (escolas, famílias e população em geral) e não acreditamos na importância do desporto. A Educação Física deixou de contar para a média, há falta de incentivo ao desporto nas escolas, ou se há desporto, há falta de compreensão pelos atletas.

Estamos a falar de jovens que chegam tardíssimo a casa, têm de conciliar duas áreas e não têm a possibilidade de escolher apenas o desporto. O desporto é um trabalho a tempo integral, uma dedicação e disciplina. É um caminho que Portugal aplaude, mas não estende a mão.

Os nossos atletas, com frequência, não dispõem das infraestruturas e do apoio necessários para triunfar. As viagens em companhias aéreas de baixo custo, com horários desapropriados, bem como as dormidas em aeroportos são uma triste realidade para muitos. Ainda assim, o país espera que conquistem medalhas olímpicas, sem proporcionar as condições mínimas para tal.

Este ano, temos 73 atletas portugueses a competir nos Jogos Olímpicos, em 15 modalidades diferentes. A todos eles, os meus parabéns.

Erguemos as vossas medalhas de participação, num país onde o desporto não está em primeiro, não está em segundo e talvez nem em terceiro, e vocês estão em lugares tão perto do primeiro.

Portugal deve olhar para exemplos internacionais e refletir sobre as suas práticas desportivas. Se queremos realmente ver os nossos atletas no pódio olímpico, precisamos de um compromisso sério com o desporto. Isto implica reavaliar o sistema educativo, criar infraestruturas adequadas e proporcionar apoio contínuo aos nossos desportistas. Assim, Portugal não apenas aplaudirá os seus atletas, mas também lhes dará as mãos, apoiando-os integralmente nas suas – brilhantes – caminhadas.

Concluindo, olhemos para o desporto como algo em que o Estado deve investir, as escolas devem incentivar, e a cultura desportiva deve evoluir. Não sejamos apenas espectadores na plateia, mas também participantes ativos nos treinos.

Parabéns aos atletas portugueses que, com tão pouco, fizeram muito.»


5.8.24

JO: em 1968 foi assim

 




JO: em 1936 foi assim

 



Etíopes

 


37 que são 120 milhões

 


«Os Jogos Olímpicos (JO) são geralmente notícia pelas medalhas (ou a sua escassez) ou pelas polémicas, mais ou menos estéreis, que se esfumam rápida e inconsequentemente. Como a alegada paródia à última ceia de Jesus (que afinal era uma recriação da mitologia grega com Dionísio), as acusações de que a pugilista Imane Khelif é trans (quando nasceu e sempre viveu como mulher, ainda que tenha níveis de testosterona elevados) ou as suspeitas sobre o tempo conseguido pelo nadador chinês Pan Zhanle, que retirou 40 centésimos de segundo ao anterior recorde mundial também fixado por ele. Certamente alheia a controvérsias balofas, a pugilista Cindy Ngamba fez história ontem, ao garantir a primeira medalha para a Equipa dos Refugiados Olímpicos. Nascida nos Camarões há 25 anos, vive no Reino Unido e integra a equipa de 37 atletas refugiados que estão a competir em 12 modalidades.

A comitiva deste ano é liderada por Masomah Ali Zada, que despertou a ira do regime afegão por andar de bicicleta, a ponto de ser apedrejada quando pedalava nas ruas de Cabul. Fugiu para França, onde estuda engenharia e cumpre o sonho de praticar ciclismo de alta competição. Outra das estrelas desta equipa é o queniano Dominic Lobalu, muitas vezes comparado com o somali tetracampeão olímpico Mo Farah, que foi a sua inspiração para se entregar ao atletismo. O atual campeão europeu dos dez mil metros vai correr os cinco mil metros e quer conquistar uma medalha olímpica.

É a terceira vez que os JO acolhem desportistas de elite que tiveram de fugir dos seus países, dignificando a tradição olímpica de cultivar a paz e a amizade entre os povos. “Permite-nos chamar a atenção e compreender a realidade global de que 120 milhões de pessoas, ou uma em cada 69 pessoas em todo o Mundo, foram forçadas a fugir das suas casas”, justifica Jojo Ferris, diretora da Fundação Refúgio Olímpico.

A medalha de Cindy Ngamba é a primeira da equipa, mas é muito mais do que isso. Porque os 37 atletas em competição representam os 120 milhões de vidas invisíveis que o Mundo quer esquecer.»


4.8.24

O umbigo de Paris

 


«A cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Paris não correu bem; e a culpa não foi da chuva, esse álibi de costas largas. A sondagem em que 85% dos franceses consideram a cerimónia um sucesso revela apenas que gostam de si próprios, o que já sabíamos. Aliás, nesse estrito sentido, a sessão de abertura cumpriu.

Para dirigir o espetáculo foi contratado um ator e encenador de teatro, Timothy Jolly, e a realização foi entregue à Olympic Broadcasting Services, uma filial do Comité Olímpico, que faz todas as transmissões há mais de 20 anos, em estádios. Jolly rodeou-se de quatro outros criativos, em áreas complementares como dança e guarda-roupa. Ao todo, foram cinco os grandes responsáveis, unidos na vontade de “celebrar a diversidade”. Imagino que nas suas reuniões tenham passado o tempo a dizer uns aos outros “Mais ça c'est génial!” (mas isso é genial), sem que ninguém de seguida lhes editasse as ideias. A sessão de abertura acabou por se caracterizar por um barroquismo com pretensões futuristas, ambicionando surtir pasmo e arrebatamento. Houve mesmo um comentador que, ao ver uma estátua dourada a emergir do solo, narra com entusiasmo: “E agora vemos Olympe de Gouges, uma mulher muito importante na Revolução Francesa.” Em certa medida sim, foi suficientemente importante para lhe cortarem a cabeça.

Acima de tudo, a realização não mostrou ter léxico para dialogar com a escala da cidade. Bastaria o conhecimento mínimo de algumas regras elementares de realização, como o raccord de direção, para que o espectador se sentisse, no mínimo, orientado no espaço. Entradas e saídas de campo seriam exequíveis de forma elegante e barata com movimentos de câmara planificados: teria sido escusada a quantidade de elevadores e alçapões para fazer emergir estátuas e pessoas. Sei que o orçamento foi ultrapassado, mas era investir menos em alçapões e pagar a uma boa equipa de realização.

Porque o problema foi também narrativo: os criadores engendraram uma personagem original, com a cara coberta por uma espécie de máscara de esgrima, um vulto negro e expedito que galga a cidade, num parkour incansável. É a personagem que cola toda a emaranhada narrativa, e nós, como espectadores, investimos no seu mistério. Vem-se a revelar que o grande desígnio desta figura, depois de toda a aventura, era entregar a tocha a Zidane, num gesto pífio, e ir-se embora. Se porventura tirasse a máscara e fosse uma mulher, isso teria significado: equalité. Mas não: “Toma lá a tocha, Zidane, que me cansei para aqui chegar.”

Por outro lado, representar a diversidade através de uma profusão de cores e formas, tipo cada fatiota cada melro, também não foi o modo mais eloquente de figurar pluralidade. Na imagem, o conceito de diferença emerge de forma muito mais clara em presença de padrões que se quebram do que perante uma diversidade total. O espetáculo esqueceu-se de que era para ser gravado e emitido, que não era teatro de rua. Esta sessão de abertura sofreu de uma grave falha processual: ninguém trabalhou a sério a sua transposição para televisão.

Mas, como sempre, nem tudo foi mau, que para absolutos bastou a corte do Rei Sol. Quando anoiteceu, a sessão melhorou muito, talvez porque a iluminação pontual destacou as zonas de interesse e as câmaras passaram a saber para onde apontar. Atletas vestidos com um equipamento branco ágil e bonito fizeram caminho até à base do grande balão dourado que aguardava a tocha, com sede de fogo. A base incendiou-se e o balão voou. E desde esse dia que paira sobre Paris, como um umbigo da cidade — narcisa, potente, belíssima.»


3.8.24

Imane Khelif

 


A saga que invadiu as redes sociais sobre o combate entre a pugilista argelina e a italiana Angela Carini continua a ter uma tal extensão que já deve ter chegado aos deuses do Olimpo.

Precisamente por se tratar de um problema complexo, e pouco conhecido dos simples mortais, esperava-se calma, contensão, procura de alguma informação e até silêncio. Foi o que tentei fazer e ainda nem percebi tudo.

Mas não: armadilharam-se as espingardas com agressividade e vi várias dezenas de textos, e de comentários, em que é afirmado, em resumo, que Imane era um homem e que o combate tinha sido injusto. Isto mesmo por quem dizia nada saber sobre o tema e até nem ter lido acerca do mesmo. Quase todas as tentativas de esclarecimento falhavam.

Posso estar enganada, mas creio que não: há pouco tempo (dois ou três anos?), tudo era bem diferente. Discutia-se acaloradamente, mas sem maldade. Maldade, sim – pura e dura – é o que agora parece ter entrado para ficar. Entre os presentes e sobre ausentes.

Medalhas sem pódio

 


«A catarse coletiva há de fazer-se no final, mas podemos desde já antever uma avaliação crítica, ancorada nos afastamentos prematuros de atletas em quem se depositavam grandes esperanças. Portugal corre o risco de ficar aquém das metas nos Jogos Olímpicos. É verdade que ainda temos Iuri Leitão no ciclismo, o sempiterno Fernando Pimenta na canoagem e Pedro Pichardo no atletismo para nos fazerem sonhar com uma prestação, se não melhor, pelo menos equivalente a Tóquio 2020 (quatro medalhas e 15 diplomas, a bitola do Comité Olímpico e do Governo), mas importa olhar para o que foram dizendo, por estes dias, os nossos atletas afastados: deram tudo (disso ninguém pode duvidar), mas tudo não foi suficiente.

Os Jogos Olímpicos vivem de resultados. E, por mais injusto que seja resumir anos de treino, dedicação e sacrifício a uma prestação mal conseguida, é essa a dura realidade. São os desempenhos, e as medalhas, que ficam para a história, não a abnegação pessoal ou as frustrações individuais.

Andamos há décadas a carpir mágoas e a culpar o futebol por secar tudo à volta. Mas não podemos ignorar, como bem notava Luís Alves Monteiro, presidente da Associação dos Atletas Olímpicos de Portugal, que ficamos muito mal na fotografia quando nos comparamos com países idênticos: desde que participa nos Jogos, Portugal ganhou 28 medalhas; a Bélgica 157; a Hungria e a Suécia 500 e a Bulgária mais de 90. O efeito eucalipto do futebol (que é evidente) não desculpa tudo.

Há razões estruturais que explicam este desempenho, mas num país onde o associativismo desportivo é forte e onde a disponibilidade dos miúdos para praticarem diferentes modalidades é notória, não podemos deixar de ficar frustrados. Não com os atletas, que esses, olhando para as condições em que treinam e se formam, são medalhados que não carecem de pódio, mas com a forma como encaramos o desporto nas bases. Na escola, nas comunidades. Traduzindo, a longo prazo, a aposta em infraestruturas num esforço contínuo para privilegiar, de facto, os bons atletas, não os transformando em super-heróis ocasionais que têm de resistir a tudo e, no final, ainda ficarem obrigados a embelezar o medalheiro da pátria. Sem estratégia e foco não há medalhas. Sem desportistas motivados e orientados não há milagres. Já só faltam quatro anos para voltarmos a ter esta discussão.»


28.7.24

Para alguns, foi “uma Sena triste”

 


«- É estúpido ficares aí sabendo que vai chover tanto. Dizem que chove intensamente durante toda a cerimónia. - É. Mas também é estúpido ir embora, porque quem fugir não vai poder contar o caos que vai ser.

Este diálogo, entre Paris e Lisboa, foi tido nesta sexta-feira, a três horas do início da cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos, na qual as bancadas de imprensa e de espectadores não tinham cobertura – ou sequer um mero toldo.

A decisão final foi ficar para assistir, numa clara atracção pelo abismo – e, por absurda que possa parecer, é essa atracção que permite dizer que o que se passou nesta sexta-feira em Paris foi um novo nível de bizarria.

É até cómico que uma cerimónia grandiosa e pensada ao detalhe tenha sido, para alguns, importunada por algo tão singelo como... chuva. Só chuva. Nem foi preciso granizo, trovoada ou vento. Só chuva.

A chuva que colocou jornalistas a dividirem protecções de plástico com os seus computadores – em rigor, não dava para ambos – e que justificou limpeza de mesas e cadeiras encharcadas em plena bancada de imprensa. Limpeza feita com a mão e com as mangas das camisolas, que panos são coisa de primeiro mundo. E, como todos sabem, não estamos na pobrezinha Paris, estamos no luxuoso Taiti, em cavaqueira com os amigos do surf olímpico.

O conceito para esta cerimónia era ter tudo ao ar livre – tudo menos a tribuna presidencial, claro. Há limites para o contacto com a natureza.

Espectadores, bem como fotógrafos e jornalistas, cuja maquinaria não se deu bem com chuva, teriam de ver tudo dali e deu-se um fim de tarde triste, que prometia ter sido de grandiosidade nunca vista em olimpíadas.

Mas paremos o queixume. Afinal, a maioria dos espectadores espalhados pelo mundo assiste a tudo nas suas casas – houve, portanto, uma larguíssima maioria de espectadores a verem esta cerimónia em boas condições.

Se for uma questão de números, a coisa até correu bem, porque uns milhares de jornalistas são só isso: uns milhares de jornalistas. E se o apertadíssimo e modesto orçamento dos Jogos já derrapou com bancadas destas, seria um desastre financeiro se houvesse investimento em toldos.

Para os jornalistas na tribuna de imprensa, não havia sequer linha visual para o rio Sena, mas sim para a Torre Eiffel, para o palco e para a tribuna presidencial – aquela com uma bela cobertura.

A cerimónia foi gira, sim, mas, por aqui, vista pela televisão. Tal como por aí.»


13.7.24

Vêm aí os Jogos Olímpicos

 


Karel Pott (à esquerda na imagem), meu padrinho, que terá sido o primeiro mulato moçambicano a licenciar-se (em Direito), concorreu às Olimpíadas de 1924, tenho ficado em 3º lugar numa das eliminatórias dos 100 metros.

3.10.23

02.10.1968 – México: «Não queremos olimpíadas, queremos revolução»

 


No dia 2 de Outubro de 1968, na Plaza de las Tres Culturas (Tlatelolco), ao Norte da cidade do México, terminou um movimento dos estudantes mexicanos, que durou 146 dias. Aproveitando a realização dos Jogos Olímpicos na capital do país, tinham procurado chamar a atenção do mundo para a corrupção do poder e o autoritarismo do Partido Revolucionário Institucional, no poder durante mais de setenta anos. «Não queremos olimpíadas, queremos revolução», gritava-se entre muitos outros slogans.

Acabou por ser o único movimento estudantil da época, que terminou com uma matança brutal. Ainda hoje não se sabe exactamente o número de mortos, que varia entre os 44 «documentados» e os mais de 300 reivindicados pelas famílias. E os responsáveis continuam impunes.




Dez dias depois começaram os Jogos Olímpicos que viriam a ficar na História pelo célebre Black Power Salute.


.

5.9.23

05.09.1972 - O massacre de Munique

 


No dia 5 de Setembro de 1972, o comando palestiniano «Setembro Negro» tomou como reféns onze membros da delegação israelita aos Jogos Olímpicos que tinham então lugar em Munique. Morreram logo dois desses reféns, mas, depois de uma intervenção de resgate falhada, levada a cabo pelas forças de segurança alemãs, acabaram por morrer mais nove atletas, cinco dos sequestradores, um polícia alemão e um piloto.



Se este foi, de longe, o mais dramáticos dos acontecimentos em Olimpíadas, não foi o único que ficou marcado por interferências políticas ou por protestos:

1896, Atenas (primeiros Jogos Olímpicos da era moderna) – Boicote da Turquia.

1936, Berlim – Os Jogos Olímpicos do nazismo.

1948, Londres – Japão e Alemanha (os dois grandes vencidos da Segunda Guerra Mundial) nem sequer são convidados.

1956, Melbourne – Boicote de Espanha, Holanda e Suíça contra a intervenção soviética em Budapeste e de Líbano e Iraque contra a posição da Austrália sobre o Médio Oriente. A China abandona os Jogos como forma de protesto contra a presença da bandeira de Taiwan.

1968, México – Power Salute

1976, Montréal – Boicote de vários países africanos como protesto contra a presença da Nova Zelândia, por esta ter disputado um desafio de rugby com a África do Sul, alguns meses antes (quando estava impedida de o fazer devido ao apartheid).

1980, Moscovo – Boicote dos Estado Unidos (seguido por 60 países) como protesto contra a intervenção soviética no Afeganistão.

1984, Los Angeles – Países do bloco soviético (excepto Roménia) e Cuba retribuem o boicote de 1980.

1988, Seul – Boicote de Coreia do Norte, Cuba, Etiópia e Nicarágua.

1992, Barcelona – Devido à guerra com a Croácia e a Bósnia-Herzegovina, a Jugoslávia não é autorizada a participar como país, mas os seus cidadãos são admitidos título individual.

(Podem faltar mais casos, evidentemente.) 
.

27.7.22

E se se acabasse com os Jogos Olímpicos?

 


«Faz-se a guerra de todas as formas e em todas as frentes, a lição é conhecida. Toda a guerra procura ser total. Bombardear, destruir, ocupar, saquear, extorquir, animalizar o inimigo, essa é a essência do império, de qualquer império, e não há belicismo benévolo. A guerra é exterminista por natureza e aquela a que agora assistimos é a confirmação da regra sem excepção. Não é portanto de espantar que qualquer dos lados da guerra, seja o dos invasores, seja o dos invadidos, procure firmar vantagens em todos os terrenos e que a propaganda, a informação e a desinformação sejam das suas dimensões maiores num tempo de hipercomunicação. No entanto, temos direito a colocar a questão dos limites: deve a opinião pública ou, se se quiser, devem os opositores da guerra contrariar a contaminação generalizada dos territórios da cultura e do desporto pelas bandeiras da morte? A minha resposta é que não só o podemos como o devemos fazer.

Já se discutiu este tema nas primeiras semanas da invasão da Ucrânia e foi induzido pelo excesso de zelo dos censores. Da Rússia, pouca novidade, o regime de controlo da opinião foi reforçado por leis de exceção que proíbem o uso da palavra para designar a coisa e as manifestções continuam a ser reprimidas. A surpresa pode ter sido o comportamento de autoridades europeias (mas seria surpresa, ou houve outras guerras em que aconteceu o mesmo?), e a deriva frenética dos apaniguados, que proibiram Tchaikovsky e Dostoevsky, anularam as apresentações do Bolshoi ou a participação de filmes russos em festivais, culparam Tolstoy ou Tarkovsky pelos males de Putin e ergueram o sectarismo como um estandarte. Foram longe demais e pareceu pouco tino. Mas, como seria de esperar, voltam à carga quando a circunstância parece favorecer a queima dos livros, dos filmes ou dos músicos suspeitos. Nas últimas semanas, vários “influenciadores” dedicaram-se a tal tarefa, sob os mais variados e imaginosos pretextos.

Nesta escalada, dentro de pouco tempo estaremos a discutir se algumas delegações nacionais devem ser expulsas do Jogos Olímpicos. E vale a pena meditar sobre essa escolha extrema, porque se vai colocar e a resposta muito dirá sobre o caminho que seguimos nesta encruzilhada. A realização dos Jogos não será posta em causa, por se tratar de Paris e Los Angeles (jogos de verão) e Cortina (jogos de inverno), se bem quem possa ficar a dúvida sobre se seriam agora aceites os Jogos de Pequim do inverno passado. Mas tenha a certeza de que o Comité Olímpico Internacional será pressionado para excluir vários países em 2024. Não deve aceitar essa pressão.

Os Jogos terão começado em algum momento da antiguidade, talvez no século VIII antes da nossa era, juntando desportistas (e militares) de várias cidades-estado gregas, que se guerreavam mais frequentemente do que praticavam a paz. Aliás, algumas das competições tinham – e têm – um marcado cunho militar (lançamento do dardo, tiro ao arco e agora também com pistola, boxe e outras formas de luta), mas os Jogos exprimiam a festa religiosa e popular em que a guerra era suspensa. Os Jogos faziam paz e assim deviam continuar a fazer. Foi por isso um erro que alguns Jogos tivessem sido boicotados por protagonistas da Guerra Fria (os de Moscovo, 1980, e os de Los Angeles, 1984) e é essa estratégia que se vai repetir em 2024. Proibir músicos de atuarem onde quiserem, o que para já só é proposto pelos extremistas que buscam chamar a atenção para a extravagância da censura, é somente um aperitivo para essa nova Guerra Fria. O novo Muro será instalado dentro das bibliotecas, dos cinemas e salas de concertos, e as Olimpíadas vão ser o grande teste para este arame farpado. Não falta muito para se começar a falar da virtude de acabar com os Jogos como eles sempre se anunciaram.»

.